quarta-feira, 8 de abril de 2009

Eco-relações, profissão do futuro

O movimento ascendente do conceito de sustentabilidade nos negócios levará à criação de novas carreiras profissionais até 2020, algumas delas com nomes estranhos, como, por exemplo, gerente de eco-relações. Essa é uma das conclusões da pesquisa Carreiras do Futuro, realizada pelo Programa de Estudos do Futuro (Profuturo) da Fundação Instituto de Administração (FIA).

Baseado na metodologia Delphi, que consiste na aplicação repetida de um mesmo questionário, visando à construção de consensos entre os pesquisados, o estudo de cenário consultou 112 importantes especialistas. Sete em cada dez (72%) apontaram a já mencionada gerência de eco-relações como a mais promissora de um quadro de seis carreiras emergentes – as outras são Chief Innovation Officer, Gerente de Marketing e e-commerce, Conselheiro de Aposentadoria, Coordenador de Desenvolvimento e Educação Continuada e Bioinformationist.

Será atribuição principal do gerente de eco-relações fazer o meio de campo entre os programas ambientais da companhia e as suas diferentes partes interessadas – grupos de consumidores, ONGs ambientalistas e governos – assegurando boa comunicação e integração de esforços.

Trata-se, a rigor, de um nome novo para uma função já existente que, vem sendo cumprida, em algumas corporações líderes em sustentabilidade, por executivos de médio escalão ligados aos departamentos ou áreas de responsabilidade socioambiental – especialmente os de empresas que não apenas realizam o chamado “mapeamento de stakeholders”, mas também levam a sério a ideia de monitorar suas impressões, ouvir e incorporar seus pontos de vista na gestão do negócio por meio de encontros, painéis e canais de comunicação formais.

Nessa condição – vale dizer – não há muitas companhias no Brasil. A maioria que alega ouvir os públicos de interesse o faz quase sempre como uma obrigação protocolar (sem, portanto, a profundidade e cuidado necessários), não como um instrumento útil, inserido em sua cultura de transparência, para melhorar o negócio com base em uma ótica que excede a miopia dos interesses dos donos ou acionistas.

Com relação à carreira indicada no estudo da FIA, cabe uma observação pontual: mais do que gerentes de eco-relações (o termo remete exclusivamente à questão do meio ambiente), as empresas precisarão cada vez mais de profissionais, de diferentes formações, capazes de pensar o negócio a partir de uma estratégia de sustentabilidade, o que significa, na prática, cuidar para que os processos e produtos gerem resultados econômico-financeiros respeitando o meio ambiente, o desenvolvimento sustentável de comunidades e as necessidades e expectativas da sociedade.

Se vier a se consolidar, a gerência de eco-relações será, portanto, uma área-meio. No campo das áreas-fins, as companhias que quiserem ser sustentáveis necessitarão, entre outros profissionais, de engenheiros preparados para desenhar processos cada vez mais ecoeficientes, menos emissores de carbono e mais cuidadosos no controle socioambiental da cadeia produtiva. Também aumentará a demanda por administradores, gestores de marketing e especialistas orientados para desenvolver produtos que conciliem as legítimas ambições empresariais de lucro com as não menos legítimas aspirações das pessoas a uma vida de melhor qualidade.

Prevalece ainda hoje a visão de que meio ambiente e sociedade constituem elementos à parte dos negócios. Como causa ou consequência dessa lógica da economia industrial, felizmente em declínio, impõe-se uma noção perversa de que todo empreendimento gera, inevitavelmente, externalidades com as quais a sociedade precisa aprender a conviver em nome do desenvolvimento econômico e da maior distribuição de suas benesses. No futuro próximo, com o avanço do aquecimento global, do esgotamento de recursos naturais e dos desequilíbrios sociais, a sustentabilidade deixará de ser um “elemento transversal” para se transformar, segundo o economista Sérgio Besserman, da PUC-RJ, no próprio “eixo central dos negócios”. Externalidades como emissão de carbono e desgaste de ecosserviços, para ficar em dois exemplos contemporâneos, terão de ser precificadas a fim de que o seu custo seja pago hoje e não empurrado, como dívida, para as gerações futuras.

Nesse cenário – prevê-se – as empresas precisarão de economistas e planejadores preparados para reordenar novas equações de custo-preço ambientalmente honestas, de contadores capazes de tangibilizar os ativos socioambientais e de cientistas prontos para fazer pesquisa aplicada à inovação e ao desenvolvimento de tecnologias sustentáveis. É certo, portanto, que a ascensão da sustentabilidade nos negócios fará – como capturou a pesquisa da FIA – surgir novas carreiras. Não menos certo é o fato de que as carreiras tradicionais, especialmente as ligadas à gestão, terão de incorporar a visão sistêmica inerente ao conceito, o que implicará a deliberada formação de novas competências e habilidades, mas também de valores e atitudes. Eis um desafio importante para as universidades acostumadas a formar especialistas mais talhados para enxergar as partes do que o todo.


Ricardo Voltolini
Publisher da revista Idéia Socioambiental e diretor da consultoria Ideia Sustentável: Estratégia e Conhecimento em Sustentabilidade. ricardo@ideiasustentavel.com.br
Idéia Sustentável, 07/04/09


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