terça-feira, 4 de setembro de 2007

"Estado deve superar dogmas da esquerda"

Cristiano Romero e Raymundo Costa
Publicado pelo
Valor Online em 04/09/07

Eduardo Campos: "Modernizar a gestão e medir resultados não podem ser bandeiras que a esquerda largue na mãos dos outros"
Foto Ruy Baron/Valor

Representante da nova safra de governadores, Eduardo Campos (PSB), de Pernambuco, conta que encontrou os serviços essenciais de seu Estado nas áreas de saúde, educação e segurança pública falidos e dominados por corporações, sindicatos e interesses privados. Segundo Campos, por causa dessa herança, Pernambuco é hoje "campeão negativo" em indicadores de duas dessas áreas (segurança e educação básica) e vice-campeão na outra (saúde).

O governador diz que sua geração não refuta o equilíbrio fiscal obtido pelos governos anteriores nem reivindica elevação dos limites de endividamento para enfrentar a situação. Em lugar disso, ele prega uma revolução na gestão dos serviços públicos, instituindo contratos de gestão na área educacional, a adoção de conceitos de produtividade nos hospitais públicos e a "estatização" e modernização das polícias.

Ao emitir suas opiniões nesta entrevista ao Valor, Campos, de 41 anos, único herdeiro político de Miguel Arraes, faz críticas abertas à esquerda, responsável pelas corporações que dominam o serviço público e que impedem a sua modernização. "Esses dogmas que a esquerda desenvolveu, tipo 'a escola será democrática se a gente eleger o gestor por eleição direta', não vão garantir qualidade no ensino", diz o governador.

Presidente do PSB, Campos também dá indicações de que a aliança que apóia o presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá mais de um candidato em 2010 e que não acredita que o PT abra mão de candidatura própria em favor do pré-candidato do PSB, Ciro Gomes.

Campos, que recebe hoje o presidente Lula no Porto de Suape para o lançamento das obras de terraplanagem da refinaria Abreu e Lima, informa que o investimento esteve ameaçado, mas que, agora, a Petrobras tomou a liderança, depois de se tornar majoritária no projeto - 60%, face a 40% da venezuelana PDVSA.

A seguir, os principais trechos da entrevista ao Valor:

Valor: A refinaria de petróleo sai ou não sai?
Eduardo Campos: Está saindo. O Estado fez a doação de um terreno de 630 hectares no Porto de Suape. Já fizemos o licenciamento ambiental. Licitamos as obras de três ações que estão sob nossa responsabilidade, totalizando investimento de R$ 235 milhões em infra-estrutura. A Petrobras fez a licitação da obra de terraplanagem, cuja ordem de serviço será dada hoje, pelo presidente Lula. O cronograma está inteiramente em dia para inaugurarmos a refinaria no segundo semestre de 2010.

Valor: Por que Hugo Chávez está se queixando de lentidão?
Campos: O protocolo do investimento dava 50% do negócio à Petrobras e 50% à PDVSA, e haveria investimentos do mesmo montante no Poço de Orinoco, na Venezuela. Em 2005, chegou-se a lançar a pedra fundamental do investimento no Porto de Suape, mas o negócio não andou. A dificuldade estava na governança de um processo em que duas grandes empresas, com culturas distintas, iam tocar um investimento 50-50. De outubro de 2006, após a reeleição do presidente Lula, até a primeira quinzena de janeiro, construiu-se uma saída: em vez de o investimento ser 50-50, passou a ser 60% da Petrobras e 40% da PDVSA. Já em Orinoco, as participações serão invertidas. A partir dali, a Petrobras acelerou o processo.

Valor: Há informações de que a Petrobras quer tocar a refinaria sozinha.
Campos: Ela está fazendo a refinaria acontecer. Até a conclusão do empreendimento, a PDVSA poderá estar ou não no negócio porque cabe à Petrobras fazer e os venezuelanos integralizarem ou não. O que declaram a Petrobras e o governo brasileiro é que desejam a parceria. Se ela vai se efetivar, só o tempo dirá.

Valor: A nova geração de governadores está sendo derrotada pela violência e pelos baixos indicadores de saúde e educação?
Campos: Essa geração tem um grande desafio, que é aproveitar este momento, em que o Brasil reconquista os fundamentos para poder crescer, para voltar a pensar o país dentro de um grande projeto nacional de desenvolvimento. Para isso, é preciso que o poder público garanta o ambiente de empreender. Os Estados chegaram a um equilíbrio tênue em suas contas, mas agora o desafio é fazer as coisas funcionarem. Não adianta ter só equilíbrio nas contas. É preciso ter equilíbrio nos serviços.

Valor: Como se alcança esse equilíbrio?
Campos: Só se faz isso com gestão, melhorando a qualidade do gasto; enfrentando distorções geradas pelo corporativismo, pela falta de controle e modernização; reduzindo o custeio, inclusive, por meio da revisão de contratos. É fazer mais com menos. Para responder a isso, não adianta ter apenas sensibilidade política. É preciso ter capacidade de gestão, equipe profissionalizada, e mudar a cultura política também.

Valor: De que forma?
Campos: Temos que enfrentar a própria base política. Na educação, diretor regional em Pernambuco não é mais indicado por prefeito ou deputado. Estou buscando os diretores em faculdades. Eles vão lá, se candidatam, fazem uma prova, participam de uma banca e, aí, escolho o gestor porque preciso de alguém nas escolas com qualidade para tocar o plano de educação. Vamos medir resultados. Não posso admitir que uma escola, junto de uma outra, com os mesmos salários, a mesma população, não funcione bem e a outra, sim. Temos que premiar o mérito. Não é feio fazer isso. A esquerda precisa saber que premiar o profissional que mostra resultado é uma necessidade.

Valor: Os diretores das escolas são escolhidos por eleição direta. O que o senhor acha disso?
Campos: O fato de se eleger um gestor não garante democracia na escola. A escola será democrática se ensinar, de forma decente, os filhos dos trabalhadores e dos pobres. Esses dogmas que a esquerda desenvolveu, tipo 'a escola será democrática se a gente eleger o gestor por eleição direta', não vão garantir qualidade no ensino.

Valor: O senhor acabou com a eleição direta?
Campos: Não, mas estou cobrando que os contratos de gestão sejam cumpridos. O gestor eleito não pode repetir na escola o patrimonialismo que condenamos nos velhos coronéis. Tem gestor que se elege e acha que é dono da escola. Não cumpre o contrato de gestão, permite que o eleitor dele não vá dar aula e obriga o que não votou a dar. O Estado tem que botar esse gestor para fora.

Valor: O senhor impôs contratos de gestão?
Campos: Eles já existiam, mas não eram cobrados. Como tem uma lei que garante a eleição direta nas escolas e dá mandato de dois anos, estou pegando os contratos de gestão e chamando os diretores. Já afastei 12. Se eles forem culpados nos inquéritos, vou expulsá-los do Estado. Encontramos 12% da carga horária sendo paga (dada como cumprida) sem que os professores estivessem dando aula. Ao mesmo tempo, havia ações na Justiça, movidas pelo Ministério Público e por associações de pais, me obrigando a contratar mais cinco mil professores. Encontrei 78 escolas com o telhado caindo, onde embaixo havia 78 mil estudantes, centenas de funcionários e professores. Precisei interditar. Encontrei 1.200 professores à disposição de outros órgãos, recebendo gratificações por estarem fora das salas de aula. Encontrei também mil professores com licença sem vencimento há anos, mantendo vínculo e me impedindo de fazer concurso para substituí-los. Achei ainda 6% das nossas turmas com menos de dez alunos cada. Descobri que, em alguns casos, essa situação era normal, mas nos outros era o gestor querendo que a escola tivesse muitas turmas porque sua remuneração é calculada também em função do número de turmas.

Valor: O senhor diria que encontrou situação de falência total na educação?
Campos: Reconheço que há uma experiência bem-sucedida: 13 Centros de Ensino Experimental, feitos em parceria com a iniciativa privada, inclusive, no Ginásio Pernambucano, com a participação do Marcos Magalhães (ex- presidente da Philips e principal liderança do Instituto de Co-Responsabilidade pela Educação). Os alunos são recrutados por notas, os professores são melhor remunerados. Trata-se de um serviço extraordinário, mas temos 1.105 escolas. São 950 mil alunos, sendo nove mil nessas escolas. Tenho que valorizar isso. Na minha gestão já fizemos mais sete parcerias, mas meu desafio é fazer dessa realidade de poucos a realidade de tantos outros. Quando nos prometeram equilíbrio fiscal, reduzindo o tamanho do Estado e fazendo privatizações, nos diziam que iam nos legar saúde, educação e segurança melhores. Isso não aconteceu. Esses serviços nunca estiveram tão deficientes quanto agora. Nessas três áreas, Pernambuco é 'campeão negativo' em duas - no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e, ao lado do Rio e do Espírito Santo, nos indicadores de violência. Na saúde, temos o segundo pior resultado no indicador que mede o número de anos de vida perdidos.

A esquerda precisa saber que premiar o profissional que mostra resultado é uma necessidade da gestão pública"

Valor: Como fazer os serviços funcionarem?
Campos: Sob um nova conceito. Na saúde, o SUS foi uma grande conquista, mas é preciso revê-lo sob o interesse da população. O papel das corporações no debate do novo modelo é importante, mas não se pode definir uma política de saúde em função só da visão dos médicos e dos profissionais de saúde. Precisamos definir um modelo de gestão que atenda ao interesse de quem está bancando isso, que é a sociedade por meio dos tributos. O SUS, criado há quase 20 anos, já falava em conselhos federal, estadual e municipal de saúde, controle social, produtividade, racionalização, fim da superposição dos entes federados, hierarquização, valorização da prevenção. A saúde curativa, que são os hospitais e que levam a maior parte dos recursos públicos, exige um novo modelo de gestão. O sistema é unificado, mas não é uniforme. No Rio Grande do Sul, por exemplo, 65% da população coberta pelo SUS é atendida nas santas casas. No Nordeste, 90% da população depende do SUS porque não temos tanta gente, por motivos óbvios, com previdência privada quanto no Sul e no Sudeste. Em Pernambuco, herdamos uma herança pesada do Inamps - 32 hospitais. A governança desses hospitais inexiste. Não sabemos quantos médicos há em cada um, quanto custa cada estrutura, qual é o seu perfil. Cada hospital faz o que sua direção e os médicos acham que devem fazer, quando na verdade seria preciso ter a hierarquização prevista pelo SUS.

Valor: As corporações tomaram conta dos hospitais?
Campos: A gestão é feita a partir da conveniência dos que estão lá e não da necessidade do Estado de responder ao cidadão. Muitas vezes, falta médico na urgência, mas sobra em outras. Achei uma enfermaria com 30 leitos e 114 médicos. Na urgência desse mesmo hospital, faltavam médicos daquela especialidade para o plantão. É uma irracionalidade absoluta.

Valor: Como o senhor vai enfrentar isso?
Campos: Estamos chegando ao fim do ano com um modelo concebido. Ouvimos instituições, como as santas casas, que têm boa governança no Brasil, e hospitais privados. O SUS previa a adoção de indicadores de produtividade, mas o que acontece nos grandes hospitais é que há um valor 'x' usado para essa finalidade. O hospital pega esse recurso e divide por igual para todo mundo. Portanto, deixou de ser prêmio por produtividade e passou a ser salário. Vamos resgatar princípios de uma gestão eficiente, com fixação de metas e medição de resultados.

Valor: E quanto à segurança?
Campos: Não vamos resolver esse problema só com polícia. Os jovens que hoje são vítimas ou fazem parte do crime são filhos de uma geração que viveu quase três décadas perdidas no Brasil. Este é um fato que precisa ser entendido do ponto de vista sociológico. As cidades mais violentas são as que receberam todo o desmonte do campo para a periferia das metrópoles e das cidades-pólo em cada região. Nesse período, houve também uma desestruturação das famílias e perda de qualidade das escolas públicas. É preciso um olhar no ciclo completo da violência.

Valor: Como?
Campos: Por exemplo, introduzindo uma ação de inteligência. A polícia não se modernizou para enfrentar a situação atual. Em muitos Estados, passou a trabalhar simplesmente para setores privados que a remuneravam via convênios. Precisava de um carro, então, um conjunto de lojistas comprava um. Aquele carro servia para patrulhar aquele comércio. Era justo que, na ausência de segurança, o comércio procurasse esse tipo de parceria, mas a população pobre da periferia, que não tinha condições de fazer isso, foi ficando sem polícia. As polícias também deixaram de ter carreira, de se profissionalizar. Guetos e grupos passaram a comandá-las. A um só tempo temos que cuidar preventivamente da violência com ações de inclusão, com foco na juventude nas áreas de maior risco, e ter uma ação planejada de combate ao crime.

Valor: De que forma?
Campos: Não havia antes a cultura de se usar o geo-processamento, a estatística, de colocar a tropa na rua em função dos números de violência gerados nos próprios boletins de ocorrência. Não existia porque os recursos humanos não foram qualificados para isso.

Valor: O senhor já obteve algum resultado com as políticas que adotou?
Campos: O número de homicídios de mulheres diminuiu 17% em sete meses. Desde o lançamento do "Pacto pela Vida", em maio, tivemos queda mensal de 9% na taxa total de homicídios.

Valor: O lema da gestão foi usado pelo candidato Geraldo Alckmin (PSDB) em 2006, mas não pegou.
Campos: A plataforma não é só gestão. É ligar o país a um modelo de desenvolvimento que seja integrador das nossas regiões, que seja inclusivo. O Estado brasileiro foi reformado dentro de uma visão que produziu um equilíbrio fiscal estático. O desafio é que, ao mesmo tempo em que o país cresça, reconceitue as políticas públicas. Temos que deixar de ter preconceitos. Modernizar a gestão e medir resultados não podem ser bandeiras que a esquerda largue na mãos dos outros.

Valor: O senhor identifica a esquerda como um obstáculo a essa modernização?
Campos: Quem fica refém das corporações e ainda pensa dessa forma, a meu ver, não está pensando como esquerda. Está ultrapassado.

Valor: O PSB pode ser uma alternativa ao PT, uma vez que o PT perdeu prestígio e força depois dos escândalos de corrupção?
Campos: O PT ganhou um papel hegemônico no nosso campo porque conquistou isso com militância, entusiasmo e com os erros que as outras forças cometeram. Tem pago um preço alto nos últimos tempos não só pelos erros que cometeu, mas também pelo enfrentamento de forças poderosas que vêem no PT o seu maior adversário. O PSB não deseja reproduzir o comportamento de oposição que o PT, em muitas oportunidades, teve em relação aos nossos governos.

Valor: A possibilidade de o PT impor aos aliados uma candidatura própria em 2010 não prejudica a aliança?
Campos: É açodamento tratar de 2010. Não é isso que a sociedade brasileira deseja dos partidos e dos homens públicos. Precisamos discutir soluções dos problemas do povo brasileiro, que não é filiado a partido nenhum.

Valor: O PT, no poder, tornou-se refém das corporações? As greves se sucedem no setor público...
Campos: Temos que defender o direito democrático de greve, mas não é possível que não possamos regulamentá-lo no serviço público, observando o que é essencial. Precisamos de mecanismos ágeis para mediar o conflito entre governante e servidor público. Por que uma greve na educação tem que durar 54 dias? Vimos nos oito anos do governo que me antecedeu, ao qual fiz oposição, sete greves. No nosso primeiro ano de governo, montamos uma mesa de negociação e, mesmo assim, tivemos uma greve de 54 dias na educação. Isso é razoável? Não é e não pode acontecer. A sociedade não suporta isso.

Valor: O PSB terá candidato à sucessão de Lula?
Campos: O PSB tem um quadro, como o companheiro Ciro Gomes, que foi duas vezes candidato a presidente, mas nem ele nem eu nem o PSB queremos discutir 2010 agora. Até porque estamos num bloco que tem outros partidos e quadros. Precisamos do êxito do governo Lula, ajudá-lo a ser um governo mais avançado. 2010 será a primeira eleição, desde a redemocratização, sem Lula candidato. O presidente chegará até lá como o maior eleitor do país.

Valor: Quem ele apoiará?
Campos: Ele vai tentar juntar a todos. Se não conseguir, a gente vai ter que estar vivo para ver o que ele vai fazer. Não nos esqueçamos de que o presidente é fruto da construção não só do PT, mas de muitas forças, inclusive, do PSB. Uma coisa é a força do presidente, outra é o seu governo e outra são as forças que compõem o governo e a sua base de sustentação. Não é uma situação simples para ser administrada.

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Estudo diz que pecuária desmata a Amazônia, e não a soja

Cibelle Bouças e Bettina Barros
Publicado pelo
Valor Online em 04/09/07

É a pecuária, e não a soja, a maior responsável pelo desmatamento na Amazônia. É isso o que diz um estudo divulgado pelo Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon-DF) e que vai ser utilizado como base pelo Ministério da Integração Nacional para definir o planejamento territorial na região.

"A gente fica batendo na tecla errada, esquece o efetivo responsável e acaba adotando políticas públicas erradas", afirma Julio Miragaya, autor do estudo e coordenador-geral de Planejamento e Gestão Territorial (CGPT), ligado ao Ministério da Integração Nacional. "O fantasma da Amazônia não é a soja, é a pecuária".

O economista, que escreve sua tese de doutorado sobre o papel da pecuária na ocupação da Amazônia, revela que um projeto de lei será encaminhado até outubro para o Congresso Nacional. A intenção é criar áreas de zoneamento determinando onde será permitido a criação de gado. "Terá de ser uma política de Estado e não de governo, senão não dará certo", diz ele.

Com base nos dados da produção de pecuária municipal do IBGE, o documento afirma que 34,667 milhões de hectares da Amazônia foram ocupados com pecuária entre 1990 e 2005. Outros 5,405 milhões foram ocupados com soja, seguida por milho (930 mil hectares), arroz (508 mil) e algodão (432 mil).

Nesse período, o Brasil registrou um aumento expressivo de 40,8% de gado bovino no seu rebanho. Das 60,05 milhões de cabeças, nada menos que 80,5% se deram nos nove Estados que compõem a Amazônia Legal.

Miragaya salienta que o avanço do plantio de soja em áreas que antes eram ocupadas pela pecuária, sobretudo no Centro-Oeste, forçou o avanço do gado para as áreas amazônicas. Esse efeito indireto, segundo ele, teria sido equivalente a 4,62 milhões de hectares (ou 15% das áreas utilizadas para o agronegócio).

A conjuntura internacional foi determinante para esse movimento. Grandes exportadores de carne bovina estão encurralados, diz o economista, cuja tese de doutorado é sobre o papel da pecuária na ocupação da Amazônia. Ele cita como exemplos Austrália, Argentina e EUA. O denominador comum é a limitação de terras disponíveis para o avanço do gado, no momento em que soja e milho ganham importância nos mercados internacionais.

"Ao contrário dos nossos concorrentes, o Brasil tem terras demais. E para onde o gado está indo? Para a Amazônia, enquanto nas demais regiões do país os rebanhos estão em declínio", diz.

É o que se conhece como movimento de "subida do boi". Expulsos por culturas mais rentáveis do sul, sudeste e centro-oeste do país, os rebanhos bovinos encontraram na região amazônica condições ideais para crescer: terras baratas (em muitos casos griladas), solos e clima impróprios para lavouras em algumas localidades. A falta de infra-estrutura, indispensável para as grandes plantações de grãos, é outro fator que explica esse movimento.

Rondônia e Acre registraram em 15 anos o crescimento mais acelerado na criação de boi na Amazônia Legal - 560% e 478%, respectivamente. Mato Grosso e Pará incrementaram suas criações em 200%, cada um. Amazonas, Tocantins e Maranhão foram os únicos que registraram expansão de pecuária abaixo dos 100%, no período de 1990 e 2005.

"Quase todo esse crescimento foi puxado pelas exportações", diz Paulo Barreto, especialista em cenários de ocupação do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). Segundo ele, no início dos anos 90 eram exportados apenas 5% de toda a produção nacional de carne bovina. Em 2006, os embarques representavam 25%.

O estudo mostra que o impacto da soja ainda é bastante limitado em relação ao desmatamento provocado por outros setores do agronegócio. "Não é a pecuária a responsável pela invasão na região amazônica. Falta na região um melhor controle do direito de propriedade. Muitas das propriedades não têm título e é isso que gera a disputa pela terra e fomenta a invasão de áreas", afirma Cesário Ramalho, presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB). Para ele, no entanto, não há necessidade de se criar um zoneamento por culturas da região amazônica. "O próprio mercado decide se vale a pena plantar ou não", diz, citando como referência a moratória da soja assinada pelas indústrias esmagadoras, que se comprometeram a não comprar grão produzido em áreas desmatadas do bioma amazônico.

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Varejista suíço compra biocombustível do PR

Assis Moreira
Publicado pelo
Valor Online em 04/09/07

A Migros, a maior rede de supermercados da Suíça, vai distribuir biocombustível produzido por agricultores de Capanema (PR), que é apresentado como o "primeiro a contemplar princípios ecológicos e igualitários". O grupo suíço se comprometeu a importar 1,5 milhão de litros de por ano, mas o volume pode aumentar na medida em que os suíços aceitarem pagar 60 centavos de franco suíço a mais por litro do produto.

O projeto foi montado pela empresa de comércio justo Gebana, de Zurique, para garantir preço melhor aos agricultores que ajudam no combate ao desmatamento e na preservação de florestas.

Desde 2002, a Gebana trabalha com 350 famílias na cidade de Capanema, dando consultoria e apoio na produção de soja para evitar danos ao meio ambiente.

Pelo acordo com a rede de supermercado Migros, a Gebana busca atrair consumidores para encomendarem o produto pela Internet, pagando 60 centavos de franco suíço a mais por litro.

A Migros, através de sua filial Migrol, garante então a importação da mesma quantidade encomendada pela Internet, que será misturada à gasolina, mas vendida pelo preço do diesel normal.

Ou seja, o consumidor ecológico paga na Gebana 2,35 de franco suíço (US$ 1,96) por litro do biodiesel brasileiro e vai se abastecer no posto da Migrol, que venderá a todos o produto misturado pelo preço normal de 1,75 franco suíço.

Do valor adicional pago à empresa de comércio justo, 30 centavos irão para os agricultores, 23 para financiar custos de desenvolvimento e marketing e 7 centavos para custear o projeto no Brasil.

Assim, quanto mais interessados houver em apoiar o projeto, maior será o volume de importação. A iniciativa com os produtores de Capanema ainda é um projeto-piloto, mas reflete a crescente conscientização ecológica entre os suíços. Em Genebra, muitas famílias aceitaram pagar mais pela energia elétrica para estimular projetos de energia solar.

A ONG suíça Aliança Sul faz avaliação "muito positiva" sobre o projeto "porque mostra outro caminho de produzir biocombustivel sem devastação ecológica". Estudo financiado pelos suíços constatou que o biocombustivel brasileiro produz 70% menos emissões nocivas do que o diesel convencional.

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Editoras reforçam área de marketing

Tainã Bispo
Publicado pelo
Valor Online em 04/09/07

Leila Name, da Nova Fronteira, tem R$ 1,8 milhão para investir neste ano e diz que "a concorrência é enorme"
Foto Leo Pinheiro/Valor


Até pouco tempo atrás, o livro era um produto que falava por si só. A força das idéias bastava num mundo não globalizado e sem internet. Mas, depois de megalançamentos como os livros da série "Harry Potter" e "O Código da Vinci" ficou mais difícil ganhar destaque na prateleira em meio a uma enxurrada de mais de 1,2 mil títulos lançados por mês. As editoras decidiram, então, fortalecer sua estratégia de divulgação, contratando profissionais do mercado publicitário e aumentando o investimento em marketing.

O grupo Ediouro, que divide a liderança do setor com a Record, contratou o publicitário Lula Vieira, há 30 anos no mercado, para dirigir um departamento de 30 pessoas. A Melhoramentos, por sua vez, aumentou a equipe do departamento de marketing para cinco pessoas (até março eram duas) e a verba da área para R$ 2,3 milhões - um acréscimo de 53% em relação a 2006.

Nos últimos cinco anos, as editoras estão mais dispostas a desenvolver estratégias de marketing. Parte dessa disposição é explicada pela chegada de empresas espanholas ao mercado nacional, como Planeta e Santillana - a concorrência aumentou e a busca pela profissionalização do setor (formado, basicamente, por empresas familiares) também. "A concorrência é enorme", diz Leila Name, diretora de produção editorial e gráfica da Nova Fronteira, selo do grupo Ediouro. "O marketing tornou-se uma ferramenta importante nos últimos cinco anos." A Nova Fronteira criou, há três anos, o primeiro cargo dentro da casa voltado para um profissional de publicidade - que tem cadeira cativa no comitê editorial.

A editora tem uma verba de R$ 1,8 milhão para investir em marketing neste ano, que são distribuídos em duas áreas: oferecer condições ao livreiro para que ele destaque determinado título, como displays e sacolas de plástico, e publicar anúncios em jornais e revistas. Um dos investimentos importantes deste ano da Nova Fronteira é a campanha do livro "A cidade do sol", de Khaled Hosseini, autor do best-seller "O Caçador de Pipas". O plano é investir US$ 100 mil ao longo de doze meses para promover a nova obra.

Para Leila, um maior investimento em marketing pode ajudar a democratizar o livro em um país em que se lê muito pouco - cerca de 1,8 livro por ano por habitante. "O consumidor tem que tropeçar em livros o tempo todo e os escritores precisam estar mais próximos deles. O autor ainda está muito distante, é como se fosse uma pessoa iluminada", diz ela.

Além disso, um plano de marketing bem feito tem sido considerado critério de desempate em leilões - por meio dos quais as editoras disputam o direito de publicar determinados livros. "De uns três anos para cá, o diferencial numa concorrência, além do adiantamento, tem sido o plano de marketing", diz Sérgio Machado, presidente do grupo carioca Record. "É algo que tem se tornado mais freqüente em disputas agressivas."

E não só em leilões internacionais. A Companhia das Letras ganhou a concorrência pela obra de Jorge Amado, até então na Record, em grande parte pelo plano de divulgação, já que a editora não fez a oferta financeira mais alta. Mas traçou um plano que envolveu a agência de publicidade AlmapBBDO, a gravadora Biscoito Fino e uma programação de seminários, teatro e cinema no Sesc.

Uma das editoras que mais trabalham a divulgação de seus títulos, a Sextante aposta, desde o início, na dobradinha de poucos lançamentos anuais e investimento em marketing. Em geral, destina 5% do investimento do lançamento para marketing. O livro "Transformando Suor em Ouro", de Bernardinho, técnico da seleção masculina de vôlei, recebeu uma verba de R$ 50 mil e vendeu 135 mil exemplares desde que chegou às livrarias, no fim de 2006. Marcos Pereira, sócio da editora, reconhece que uma verba de R$ 50 mil é pouco para propaganda. "Mas é grande para um livro."

Machado, da Record, diz que a idéia é otimizar as ações através de permutas e parcerias. O grupo destina cerca de 5% do seu faturamento para o marketing e tem procurado experimentar novas mídias, como internet e "bikedoor" - cartazes acoplados a bicicletas e que podem ser vistos em praias do Rio e no parque Ibirapuera, em São Paulo. Cinema tem sido uma tentativa também, já que permite aproximar o conteúdo do livro de uma platéia específica.

Lula Vieira, há um ano como diretor de marketing do grupo Ediouro - que tem apresentado um crescimento agressivo através de aquisições -, gerencia a divulgação de 30 a 40 lançamentos por mês. "Nunca vi nada tão diversificado. Fazemos filmes, 'banners', internet, 'busdoor', 'bikedoor', rádio", diz. "Neste momento, estamos reorganizando o departamento", explica.

Como parte dessa reorganização, Vieira abriu uma concorrência para a tradicional marca "Coquetel", de revistas de passatempo. A disputa começou há cerca de um mês e envolve cinco agências de publicidade. "Devemos ter um ganhador dentro de um mês", informa. O publicitário acredita que seja adotada a mesma idéia para outras marcas do grupo também. "Vamos estudar se é o caso, e eu acredito que seja, de termos mais duas ou três agências. Uma voltada para o institucional e outras duas para grandes lançamentos", diz.

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Países discutem agência ambiental mundial

Chico Santos
Publicado pelo Valor Online em 04/09/07

O Brasil tenta, em reunião informal de 22 países que termina hoje, no Rio, encontrar um caminho consensual que permita colocar em prática a proposta francesa de criação de um organismo especial das Nações Unidas que coordene e financie as ações internacionais voltadas para a proteção do meio-ambiente. Os Estados Unidos, partidários das iniciativas voluntárias neste campo, consideram desnecessária, cara e burocrática a criação de mais uma agência da ONU. Para os brasileiros, a iniciativa é correta desde que fique claro, inclusive na denominação do órgão, que ele trabalhará simultaneamente pela proteção ao meio ambiente e pelo desenvolvimento econômico sustentável.

Ontem, na abertura do evento, os ministros Celso Amorim, das Relações Exteriores, e Marina Silva, do Meio Ambiente, foram explícitos quanto à posição brasileira. "Deve ter por fundamento os pilares ambiental, econômico e social que compõem, de modo indissolúvel, o conceito de desenvolvimento sustentável, a grande conquista da Rio-92 (a 1ª Conferência Mundial para o Meio Ambiente)", disse Amorim, acrescentando: "Para que não haja dúvidas, essa vinculação deve, a meu ver, estar reconhecida até mesmo na denominação da própria entidade que se venha a criar".

"O Brasil tem buscado uma mediação (das posições), ainda que, no caso brasileiro, não se tenha nenhuma restrição a que se crie um organismo, desde que ele contemple os instrumentos que viabilizem o desenvolvimento sustentável, que possamos internalizar recursos novos e adicionais para os esforços dos países em desenvolvimento, bem como a transferência de tecnologia", disse Marina aos jornalistas. A posição brasileira é de que os países ricos poluíram mais e, por isso, precisam também dar uma contribuição maior para combater o problema.

A ênfase dada ao tema pela França e pelos Estados Unidos pode ser medida pelas respectivas delegações. Enquanto os francesas trouxeram ao Rio uma delegação de 11 membros, chefiados pelo ministro do Meio Ambiente, Jean-Louis Borloo, a delegação americana de cinco integrantes veio sob o comando da secretária-assistente do Gabinete de Oceanos, Meio Ambiente Internacional e Assuntos Científicos, Claudia A. McMurray.

Embora se pretendesse que a reunião, que é informal, devesse ser de nível ministerial, o ministro Amorim minimizou a ausência de um ministro americano, argumentando que poucas delegações vieram chefiadas por ministros. Amorim disse ainda que, no seu entendimento, os Estados Unidos vêm evoluindo na sua posição que, no passado, era praticamente de negação do problema. Agora, ele avalia que os americanos não só estão tomando iniciativas para atacar o problema como já começam a aceitar que a ONU tome a frente dessas iniciativas.

Em conversas informais o Valor constatou que os americanos continuam longe de aceitar a idéia de um orgão da ONU, semelhante à Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Mundial do Comércio (OMC) para cuidar dos problemas ambientais. O discurso americano é de que já existem inúmeros órgãos dentro da própria ONU, como o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), cuidando do tema e que a criação de um novo só iria gerar despesas e mais reuniões, retardando as ações efetivas que poderiam ser tomadas por iniciativa dos países.

É, na interpretação de um diplomata brasileiro, o discurso antiburocrático camuflando a opinião americana de que, neste assunto, é melhor manter-se livre para agir à sua maneira, como já estaria demonstrado na recusa da nação mais rica do mundo a subscrever o Protocolo de Kyoto, firmado em 1997, contendo compromissos formais para reduzir emissões de poluentes. A reunião do Rio termina hoje, no horário do almoço. A ministra Marina Silva deverá anunciar os resultados alcançados.

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