segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Quanto custa a calhordice política

Gilberto Dimenstein
Publicado pela
Folha Online em 19/11/07

Até pouco tempo, a imagem das ONGs estava associada à generosidade e eficiência. Agora, se associa, graças aos escândalos que aparecem na mídia, à malandragem típica da política. A verdade sobre os escândalos, porém, não está clara.

A imensa da maioria das pessoas que apoiaram e apóiam entidades não-governamentais queriam fazer a diferença nas suas comunidades, mas também ficar justamente longe da política, onde corrupção e incompetência são rotina.

O ambiente mudou e o resultado dos escândalos é o surgimento de uma CPI para investigar as entidades não-governamentais. O ambiente mudou exatamente por causa da calhordice política.

É bom que se investigue qualquer entidade com dimensão pública. Quanto mais investigação, melhor. O chamado terceiro setor cresceu muito, misturando os mais diferentes tipos de entidades sem fins lucrativos, que envolvem um templo evangélico, um sindicato patronal ou de trabalhador, até um grupo que cuida de crianças com HIV. Há anos se fala na filantropia.

Mas o que provocou os escândalo é a forma como os partidos (e aqui se envolvem PT e PSDB) usaram o terceiro setor como recurso para ajudar aliados, a começar dos sindicatos. Basta ver que o que está na mira da CPI são grandes transferências de recursos a entidades suspeitas de alinhamento partidária --e, por isso, beneficiadas não por sua competência.

Não é à toa que dinheiro dado aos sindicatos para formação profissional foi, em muitos casos, desperdício. A junção de incompetência, esperteza e falta de fiscalização só poderia mesmo dar em escândalo.

É uma pena que um movimento generoso e com grandes conquistas de direitos de mulheres, crianças, idosos, negros, trabalhadores, portadores de deficiências, seja contaminado pela malandragem. Tudo isso talvez desestimule a participação dos brasileiros em desafios coletivos, especialmente dos jovens --esse é mais um custo da calhordice política.

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Internet: um bilhão online, mas mundo questiona como incluir cinco bilhões restantes

Agnes Dantas
Publicado pel'
O Globo Online em 18/11/07

Internet: um bilhão online, mas outros cinco bilhões excluídos

Foto Arquivo

Internet na tela do celular, via redes comunitárias sem fio ou mesmo por meio da tradicional linha telefônica discada. Já não importa o meio de acesso quando a questão é buscar alternativas para evitar o agravamento de um panorama mapeado pela Organização das Nações Unidas: mais de um bilhão de cidadãos em todo o mundo estão plugados à internet, mas pelo menos cinco bilhões de pessoas ainda são excluídos digitais. (Leia também: embaixador americano, David Gross, defende mais acesso, liberdade de expressão e elogia o Brasil) .

Para defender novos modelos de acesso às chamadas Tecnologias de Informação e Comunicação (ICTs, da sigla em inglês) na redução do vão que aumenta com o avanço da internet em todo o mundo, especialistas e organizações não governamentais de mais de 70 países sentaram à mesa no Rio de Janeiro durante o IGF Brazil 2007 - Fórum sobre Governança da Internet para conhecer e divulgar alternativas de acesso. Apoiado pela ONU, o evento ganhou ares de cúpula mundial e deixou o Brasil e suas políticas de democratização de acesso público expostos a elogios e críticas por parte de líderes de países ricos e pobres.

- Dados recentes dão conta que o Brasil tem 20 milhões de internautas residenciais, sendo que o programa Computador para Todos já facilitou a venda de mais de 1,5 milhão de computadores. Sabemos que é pouco, mas acreditamos que estamos indo pelo caminho certo - afirmou o ministro das Comunicações, Helio Costa, durante o evento.

Mas alguns especialistas defendem que a nova fronteira de democratização do acesso à informação já não deve ser limitada ao computador como intermediário. Valeria D'Costa, consultoria mundial do programa Informação para o Desenvolvimento (infoDev - www.infodev.org), mantido pelo Banco Mundial, destacou que políticas devem ser mudadas juntamente com as tendências mundiais. E citou como exemplo a Índia, país em que existem 50 milhões de usuários de computador e mais de 225 milhões de telefones celulares, plataforma móvel que "pode e deve ser usada como um novo veículo de inclusão" mas que não vem sendo considerada por governos e empresas de telecomunicações.

- Investir em tecnologias é levar aos cidadãos todos os serviços a que eles têm direito, como saúde e educação. Se isso pode ser feito pelo celular, por uma estrutura já acessível, para quê serve uma rede de gigabyte de velocidade se isso não chega a quem é de direito? Chegar a estes bilhões de excluídos significa ouvir o que eles têm a dizer e oferecer acesso à internet e à tecnologia da forma mais direta possível - defendeu a especialista, que citou a massa de mais de 100 milhões de usuários de telefones celulares no Brasil.

Em localidades remotas de países como a Colômbia, Peru e Uruguai, vilarejos fugiram às regras de mercado e estão se conectando entre si através de rede sem fio nos mais diversos padrões (Wi-Fi, WiMESH, WiMax etc) - inclusive a partir de equipamentos usados e readaptados para freqüências de rádiotransmissão. Na prática e sem ameaçar redes já existentes de comunicação - como freqüências de aeroportos e emissoras de radiodifusão - vilas inteiras acessam a internet, realizam comércio eletrônico e preservam sua identidade cultural em redes sociais locais. O exemplo do "Instituto para la Conectividad en las Américas" e da Fundação Escola-Latino Americana de Redes, da Colômbia (ESLARED) foi exibido pela consultora Sylvia Cadena, uma das coordenadoras do projeto e representante da WiLAC, entidade que debate o compartilhamento de tecnologias sem fio na região (www.wilac.net).

- Mais de 70% da população da América Latina vive em zonas rurais. O que acontece é que os atuais modelos de regulamentação, de negócios e de serviços de telecomunicações são baseados em padrões que atendem apenas áreas urbanas. É nesta realidade, da periferia e das áreas rurais que os modelos de leis e de negócios devem estar baseados, e não serem tratados como exceção - destacou Sylvia Cadena, que questiona os modelos de regulamentação de internet e de tecnologias que limitam a democratização do acesso público.

A consultora lembrou que os marcos regulatórios limitam o uso de tecnologias alternativas para a popularização de baixa renda ou de áreas remotas. Segundo ela, as pequenas comunidades não conseguem ter acesso a internet via rede de energia elétrica "porque têm que pagar altas taxas pela importação dos equipamentos", ao mesmo tempo em que taxas impostas aos provedores de acesso e de serviços (ISPs, da sigla em inglês) reduzem os incentivos para a oferta de acesso em comunidades remotas ou populações rurais.

- Em uma comunidade remota do Peru, entregamos nas mãos dos cidadãos de vilarejos rurais antigos equipamentos de rede e eles foram adaptando cada uma destas tecnologias para construir engenhocas capazes de conectá-los. Foi uma das soluções encontradas para buscarmos representatividade, já que o mercado ignora esta realidade - relatou a consultora, ao se referir ao Tricalcar, projeto de redes sem fio comunitárias em vilas da América Latina e Caribe.

Roque Gagliano, um dos executivos da Antel, única operadora de telefonia fixa e 100% controlada pelo governo, reforçou o argumento de que para incluir digitalmente os próximos bilhões de usuários será preciso mudar os modelos vigentes de acesso à internet. Ele lembrou que o Uruguai paga 100% de custos sobre a interoperabilidade de acesso para levar internet ao país porque não há alternativas.

- Atualmente as empresas que precisam se conectar a servidores ou a provedores de serviços e estes entre si precisam trafegar dados entre países, precisam entrar em redes internacionais de acesso para oferecer serviços localmente. Não precisamos interconectar países. Precisamos permitir que provedores de conteúdo, empresas ou clientes se comuniquem localmente, precisamos defender a conectividade regional - afirmou.

E quando o assunto é inclusão digital em massa em países pobres, a África exibe alguns dos mais bem sucedidos exemplos de superação, destacaram integrantes da ONU presentes ao IGF Brazil 2007. A ONG Associação pela Comunicação Progressiva (APC, da sigla em inglês) é uma das entidades não governamentais que tem unido governos, iniciativa privada, mídia e sociedade civil na implementação de programas de inclusão digital no continente, e apresentou casos de comunidades rurais que alfabetizam adultos e crianças, que geram conteúdos locais na internet e que têm criado redes de comunicação entre vilarejos com a ajuda da rede mundial. (http://apc.org)

- As comunidades usam a infra-estrutura da qual dispõem, que as vezes é (acesso) via celular ou via modem (internet discada), e através dela criam atividades e grupos responsáveis pelo desenvolvimento social e cultural, pelo resgate dos valores daquela pequena sociedade - afirmou Anriette Esterhuysen, diretora-executiva da APC, referindo-se a telecentros comunitários gerenciados pela ONG em países como o Quênia, a Etiópia e o Senegal.

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Conferência de Saúde rejeita a legalização do aborto no país

Evandro Éboli
Publicado pel'
O Globo Online em 19/11/07

Delegados votam durante a plenária final da 13ª Conferência Nacional de Saúde, em Brasília

Após forte pressão de setores da Igreja Católica, a maioria dos cerca de 2,7 mil delegados da 13ª Conferência Nacional de Saúde rejeitou, na manhã deste domingo, a proposta de apoio a projeto de lei que legaliza o aborto no país. O Ministério da Saúde saiu derrotado. O governo apoiou, na conferência, a descriminalização do aborto. A proposta havia sido aprovada em sete das dez plenárias na última quinta-feira, mas o resultado não se confirmou no plenário.

Mais organizados, os católicos ocuparam os lugares estratégicos à frente da mesa que dirige os trabalhos. A votação se dava com levantamento dos crachás de cada um dos delegados. A proposta rejeitada diz o seguinte: "Assegurar os direitos sexuais e reprodutivos, respeitar a autonomia das mulheres sobre seu corpo, e a questão do aborto, reconhecendo-o como problema de saúde pública e discutir sua descriminalização por meio de projeto de lei".

Para Clóvis Boufleur, da Pastoral da Criança, entidade contrária ao aborto, a decisão da conferência foi uma "vitória da sociedade", que, segundo ele, é contrária a descriminalização. O diretor de Ações e Programas Estratégicos do Ministério da Saúde, Adson França, que defendeu a proposta no encontro, afirmou que não reconhecer o aborto como um grave problema de saúde pública é "hipocrisia".

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Gasto anual do gabinete presidencial passou de R$ 223 milhões para R$ 350 milhões

José Casado e Gustavo Paulo
Publicado pel'
O Globo Online em 19/11/07

O mezanino do Palácio da Alvorada, residência oficial do presidente da República

Presidentes sempre custam caro aos bolsos dos contribuintes. A administração Luiz Inácio Lula da Silva não foge à regra. Com uma diferença: seus custos são crescentes. Nos últimos três anos, as despesas do gabinete da Presidência subiram de R$ 223 milhões por ano para R$ 350 milhões, de acordo com os registros do Tesouro Nacional, levantados pela organização não-governamental Contas Abertas. Os números constam da segunda reportagem da série sobre mordomias publicada pelo jornal O Globo.

A assessoria particular do presidente Lula também inchou de 68 para 149 integrantes, com salários acima de R$ 6 mil. Já a equipe de "apoio" cresceu de 28 para 49 pessoas, quase todos com raízes no movimento sindical.

As contas da Presidência agora incluem despesas com propaganda governamental e boa parte dos gastos são classificados como "secretos". Com cartão de crédito no ano passado, só a secretaria da Presidência gastou R$ 4,9 milhões, dos quais R$ 4,8 milhões são sigilosos. Neste ano os dispêndios com cartões duplicaram: R$ 64,8 milhões até outubro. As despesas do Planalto incluem até massagem para funcionários.

O Palácio da Alvorada, residência oficial projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer, é um edifício de 7,3 mil metros, com seis suítes (a principal tem 120 metros), salas de cinema e música, academia de ginástica, piscina olímpica aquecida, sauna com sala para massagens e uma adega para ao menos 2 mil garrafas.

Ali, há 60 servidores - não incluída a equipe de segurança, cujo custo anual de R$ 4 milhões abrange as despesas de proteção do escritório e residência do presidente em São Paulo, além dos familiares em Florianópolis e Blumenau.

Leia a íntegra aqui , no Globo Digital (somente para assinantes).

Ao mesmo tempo em que o combate às mordomias na administração direta se tornou mais fácil com o Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), a falta de transparência ainda é o principal entrave para o controle de privilégios dos dirigentes nas empresas estatais e das embaixadas e consulados brasileiros no exterior.

O Tribunal de Contas da União (TCU), por exemplo, não tem como acompanhar diariamente o desembolso das despesas das estatais federais, cujo orçamento global para 2008 é de R$ 782,3 bilhões (dos quais somente R$ 224,7 bilhões são de responsabilidade da Petrobras).

Mordomias se alastram pelos três poderes
As mordomias no serviço público se alastram pelos três poderes . Uma elite de 74 mil servidores federais desfruta de mordomias como auxílio-moradia de R$ 3 mil, carro de luxo, TV de LCD, celular com gasto ilimitado, apartamentos com banheira de hidromassagem e enxoval renovado a cada dois anos. Hoje, a elite do funcionalismo ganha 24,5 vezes a renda média do brasileiro e é mais bem paga que a cúpula burocrática dos Estados Unidos.

Três anos atrás, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por exemplo, começou a desfilar a bordo de um Chevrolet Ômega e, desde então, o carro fabricado na Austrália virou símbolo de poder na capital da República. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), por exemplo, gastou R$ 5,4 milhões na compra de 37 deles - 33 para seus juízes e mais quatro para a diretoria. O Senado, a Câmara e alguns ministérios adotaram o estilo. Cada sedã importado custa US$ 81 mil (R$ 146 mil). O modelo só consome gasolina - e muita, à média de um litro para cada seis quilômetros.

Sua inclusão na frota pública é paradoxal, sobretudo num governo que faz propaganda dos biocombustíveis como alternativa para um mundo ameaçado pelo efeito estufa. Mas esse é apenas um detalhe: a conta de luz das repartições federais já soma R$ 3,9 milhões por dia útil. Gasta-se R$ 954 milhões por ano para iluminar os prédios públicos - 200 vezes mais que o investimento governamental realizado no programa Luz para Todos.

Vantagens compõem 37% dos salários
O dinheiro dos tributos paga tudo, dos desperdícios aos privilégios de um grupo de 74 mil pessoas que detém os altos cargos do governo, do Legislativo e do Judiciário. É a elite civil do contingente de 2,2 milhões de servidores públicos (17,5% do total de assalariados), entre os quais 1,1 milhão ativos.

Numa quarta-feira, um Vectra do Tribunal de Contas do Distrito Federal, placa 0007, foi flagrado quando participava de uma missão nada secreta na capital: transportar a conselheira Anilcéia Machado, ex-deputada distrital, e uma amiga numa manhã de compras. A "parada" foi numa loja na quadra comercial 105 Sul. De lá, seguiram para a quadra comercial 305 Sul, mais conhecida como a Rua das Butiques. Durante cerca de uma hora, entraram e saíram de lojas de sapato. O resultado das compras podia ser visto em algumas sacolas.

Consultada, Anilcéia identificou a colega de passeio como sua chefe de gabinete e disse ter usado o veículo para almoçar num restaurante e, no caminho de volta ao tribunal, consertar um relógio e trocar um sapato. A conselheira disse considerar "perfeitamente normal" o uso do veículo oficial para essas atividades em horário de serviço. Ao ser lembrada de que segurava mais de uma sacola, justificou-se:

- Quando vou trocar um sapato, compro dois. Mulher quando vai a uma loja não sai sem um pacote...

Desde 1950, a legislação brasileira condena o uso particular de veículos oficiais. Uma lei federal sancionada pelo então presidente Eurico Gaspar Dutra já determinava que "os automóveis oficiais destinam-se, exclusivamente, ao serviço público" e dizia que é "rigorosamente proibido" o uso dos carros para o "transporte de família do servidor" ou de "pessoa estranha ao serviço público".

Para assinantes: matéria na íntegra no Globo Digital

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Emissão cresce mais que o PIB no Brasil

Claudio Angelo
Publicado pela
Folha de São Paulo em 19/11/07

Gás carbônico emitido na economia teve alta de 45% entre 1994 e 2005. Cálculo foi feito por grupo do RJ a pedido do governo e integrará novo inventário nacional; térmicas e carros foram fatores de elevação
Foto Caio Guatelli/Folha Imagem

As emissões de gás carbônico na economia brasileira cresceram 45% entre 1994 e 2005. Nesse período, a média de crescimento anual da produção de gases-estufa excluindo o desmatamento foi de 3,4%, enquanto o PIB (Produto Interno Bruto) cresceu 2,6%. Ou seja, o país está poluindo mais do que gerando riqueza. Os dados integram relatório do balanço de carbono do Brasil, feito em convênio com o Ministério da Ciência e Tecnologia pela Economia & Energia (www.ecen.com), uma organização sediada no Rio.

Eles formarão a base do próximo inventário nacional de emissões, ainda sem data para ser concluído, que será entregue à Convenção do Clima das Nações Unidas. O inventário atual, lançado em 2004, já nasceu desatualizado: seus dados refletem as emissões de 1994.

Naquela época, as emissões industriais brasileiras (que incluem indústria, geração de energia e transportes) eram de 62,9 milhões de toneladas de carbono, menores que as da Romênia. Em 2005, chegaram a 91 milhões de toneladas, ultrapassando as emissões somadas de Áustria e da Holanda. Tudo isso excluído o desmatamento, que responde por cerca de 75% das emissões brasileiras -e que torna o Brasil o quinto maior poluidor global.

Segundo Carlos Feu, diretor da Economia & Energia, dois fatores responderam pela elevação das emissões: o brasileiro está andando mais de carro e consumindo energia mais suja.

"No primeiro inventário, quase não existiam usinas termelétricas no Brasil. Agora existem e continuarão existindo." A matriz energética nacional, antes predominantemente hidrelétrica (cujas emissões não são contabilizadas por falta de critério científico), passou a contar a partir desta década com usinas movidas a combustíveis fósseis como gás natural, diesel e carvão mineral. O governo federal já dá como fato consumado que o crescimento futuro do país demandará mais energia fóssil.

O Plano Nacional de Energia, elaborado pela EPE (Empresa Brasileira de Pesquisas Energéticas), prevê que a participação do gás na matriz nacional em 2030 terá quase dobrado em relação ao 2005. A capacidade instalada de usinas a carvão deve quadruplicar no período, de 1.400 para 6.000 megawatts. As estimativas foram feitas antes da confirmação do potencial do campo de petróleo de Tupi, na bacia de Santos -que tende a tornar o óleo uma fonte de energia ainda mais importante no país.

Segundo o relatório do balanço de carbono, o setor de geração de energia foi o único que cresceu sua participação relativa no total de emissões entre 1994 e 2005: de 12% para 17%. As emissões desse setor duplicaram no período, de 7,6 milhões de toneladas de carbono em 1994 para 15,2 milhões em 2005. Os transportes mantiveram a fatia de 40%, mas suas emissões saltaram 45%: de 25,4 milhões para 36,9 milhões de toneladas de carbono.

Para Carlos Feu, o aumento no consumo de veículos no país -que se reflete primeiro na queima de combustíveis fósseis- é parte da explicação para o aumento nas emissões ter ultrapassado do PIB.

Intensidade
Isso tudo contribui para que a chamada intensidade de carbono, ou seja, o total de carbono emitido por US$ 1.000 gerados na economia, ainda seja alta no Brasil. Nos países ricos, a tendência é que ela caia, seja por eficiência, seja pelo aumento da participação do setor de serviços. "Ainda estamos num caminho de subir a intensidade de carbono", diz Feu.

O relatório, no entanto, ainda não conseguiu avaliar o peso dos motores flex na redução das emissões. Os carros flex, que aumentaram o uso do álcool (combustível que emite pouco carbono) no país, só entraram no mercado em 2004.

O crescimento das emissões industriais deve colocar o Brasil numa posição ainda mais delicada nas negociações do acordo substituto de Kyoto, que começam no mês que vem em Bali, Indonésia. O país, como o resto do Terceiro Mundo, é desobrigado por Kyoto de cortar emissões mas vem sendo pressionado pelas nações industrializadas a adotar algum tipo de compromisso obrigatório no período pós-Kyoto. A posição tradicional brasileira é não aceitar metas.

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Receita do petróleo e gás pode pagar fundo antiaquecimento

Daniela Chiaretti
Publicado pelo
Valor Online em 16/11/07

Capobianco: "O fundo para mudanças climáticas pode ter 70% de R$ 1 bilhão"
Foto Fabiano Cerchiari/Valor


A idéia é buscar o antídoto no veneno. É a partir dos recursos da extração do petróleo, o combustível fóssil tido como o grande vilão do efeito estufa, que o governo brasileiro pretende criar um fundo nacional para enfrentar as mudanças climáticas. A proposta faz parte de um conjunto de medidas elaboradas pelo Ministério do Meio Ambiente e que acaba de aterrissar em outros ministérios. Se aprovado, o fundo pode significar cerca de R$ 700 milhões ao ano para ações de adaptação aos impactos do aquecimento global, redução na emissão de gases e desenvolvimento de pesquisas no tema.

A área ambiental chega nesta discussão dentro do governo com um trunfo na manga. Nos próximos dias será divulgado o índice oficial do desmatamento da Amazônia para 2006/2007 e que, estima o governo, ficará em 10 mil km2. "Este terá sido o ano com o menor índice de desmatamento da Amazônia desde o início do monitoramento em 1988", diz João Paulo Capobianco, secretário-executivo do MMA. O aumento das queimadas e de áreas desmatadas registrado em agosto e setembro só entrará na taxa do ano que vem. "Trata-se de uma redução contínua por três anos consecutivos, e isto é importante", diz Capobianco. "Claro que o aumento verificado a partir de agosto preocupa. Temos que reverter esta tendência."

A proposta do fundo criado com recursos provenientes da extração de petróleo e gás depende de um ajuste à Lei 9.478, de agosto de 1997. Hoje a legislação prevê uma participação especial sobre a receita bruta da produção (deduzidos royalties, investimentos na exploração e custos operacionais) de 10% ao MMA para pesquisas relacionadas às fragilidades ambientais das áreas de extração e a danos causados por acidentes e vazamentos de óleo. É esta cláusula que o MMA sugere modificar. "Trata-se de cerca de R$ 1 bilhão ao ano para o ministério, mas como existe restrição ao uso, hoje a verba não pode ser utilizada na questão climática", diz Capobianco.

Segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, a ANP, de outubro de 2006 a setembro de 2007, o MMA recebeu R$ 656 milhões como repasse de participações especiais. Parte desta verba tem sido utilizada no mapeamento ambiental e de risco dos campos de petróleo, especialmente das bacias de Santos e Campos. O restante vai para as contas do governo, já que não têm ocorrido acidentes. A idéia, agora, é destinar 30% desta verba na contenção de eventuais vazamentos e acidentes e 70% para iniciar o fundo nacional de mudanças climáticas. Em princípio, a sede do fundo seria o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, o BNDES.

O fundo é um dos vértices de um triângulo de medidas que o governo vem discutindo nos últimos dias tendo as mudanças do clima como foco. Há ainda um decreto presidencial que pretende organizar a ação federal na área, com ações de vários ministérios e desembocando em um plano nacional de mudanças climáticas. O plano, anunciado pelo presidente Lula em setembro, durante evento nas Nações Unidas, só deve estar pronto em maio. A partir daí, será submetido a consulta pública.

Na base do tripé está a política nacional de mudanças climáticas, uma lei que envolverá o governo federal, os estaduais e municipais. Dará as normas gerais em quatro áreas: mitigação das emissões, adaptação às mudanças, pesquisa e comunicação com a sociedade. A intenção é enviar o projeto ao Congresso no início de 2008, adianta Capobianco. "O fundamental é institucionalizar no país um processo para criar oportunidades e ações nesta área", diz ele. "Ações em mudança climática são transversais. Temos que ter um sistema de articulação do governo."

De imediato serão anunciadas duas investidas na esfera do Ministério da Ciência e Tecnologia, o MCT. A primeira é uma rede nacional de pesquisas em mudanças climáticas que vem sendo estruturada há meses, deve reunir os principais institutos e universidades do país e será coordenada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o Inpe. A outra é um centro de pesquisa e monitoramento de florestas tropicais, com sede em Belém, e também sob o guarda-chuva do Inpe. Trata-se de um projeto ambicioso que prevê o trabalho em cooperação com países amazônicos e, no futuro, com África e Ásia. Os investimentos iniciais no centro são de R$ 10 milhões.

Outra iniciativa é a implantação de uma antena na região de Boa Vista, em Roraima, para que se obtenham as imagens que faltam ao monitoramento da floresta, com cenas da Amazônia Ocidental e da América Central. No futuro, o monitoramento de queimadas e desmatamento, hoje feito a partir de São José dos Campos, a sede do Inpe, passará gradativamente a ser feito dentro da própria Amazônia.

As propostas foram apresentadas na quarta-feira em reunião com vários ministérios e serão coordenadas pela Casa Civil. As sugestões foram bem recebidas, na avaliação de Capobianco. "A idéia do fundo foi vista como uma boa solução, de curto prazo, com base em um recurso que já tem provisão legal", diz ele. "Agora depende do cenário econômico." O dinheiro vindo da exploração de petróleo seria só um dos alicerces do fundo, que pretende captar recursos também da cooperação internacional. O plano de incentivos positivos à redução de emissões por desmatamento evitado, nome da proposta brasileira para preservar a Amazônia, é outra fonte possível. O debate destas propostas deve estar fechado para que o resultado saia antes do encontro da ONU sobre mudanças climáticas, em dezembro, em Báli, na Indonésia.

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