segunda-feira, 7 de abril de 2008

Tecnologia em RH: necessidade essencial para o século XXI

O uso da tecnologia da informação na administração dos recursos humanos é, cada vez mais, um requisito indispensável para empresas que buscam competir em uma economia globalizada. Esses departamentos estão descobrindo, cada vez mais, que a tecnologia é a aliada perfeita para otimizar a gestão e os custos de serviço por empregado. Entre outras coisas, permite que essas áreas se concentrem mais em outros papéis de valor agregado, como o de consultor, por exemplo, apontando soluções pioneiras aos clientes ou parceiro- adaptando a estratégia e programas de recursos humanos às necessidades do negócio.

Na América Latina, já vemos empresas implementando sistemas de informação para administração de pessoal, nos quais os empregados, além de receber informação de maneira rápida e homogênea, podem atualizar seus dados pessoais, solicitar férias, imprimir recibo de salário, acessar benefícios e inscrever-se em cursos, entre outras vantagens.

Com estes sistemas, a relação de dependência direta dos empregados com recursos humanos é cada vez menor, o que permite à área se concentrar em outras funções mais estratégicas para cumprir os objetivos do negócio tais como gestão de mudanças, aquisição, retenção e desenvolvimento de talentos, gestão do desempenho da organização ou gestão do clima trabalhista.

Dessa forma, o uso de sistemas para a gestão de recursos humanos permite aos chefes e supervisores realizar avaliações e planejar táticas operacionais com base em dados mais claros e acessíveis. Ao mesmo tempo, dá mais autonomia aos empregados, que se tornam responsáveis pelo uso e benefício que obtêm dos sistemas.

Nas avaliações de desempenho, por exemplo, os sistemas de gestão de recursos humanos contam com ferramentas que possibilitam a avaliação do empregado não só por seu supervisor direto, mas também por seus parceiros de trabalho e, em alguns casos, até por fontes externas, como fornecedores ou clientes.

Outro benefício que a tecnologia aplicada à administração de recursos humanos oferece é a redução dos custos das tarefas administrativa. O investimento nestes sistemas é relevante quando são instalados pela primeira vez, mas seus custos de manutenção costumam ser muito baixos e, em médio e longo prazos, têm impacto muito positivo sobre os resultados finais, remunerando amplamente o investimento. Além disso, a adoção da tecnologia abre portas para iniciativas mais importantes, como os programas de capacitação.

Uma das áreas em que o uso da tecnologia da informação pode ter um impacto direto é a de capacitação profissional. As empresas obtêm enormes benefícios ao utilizar treinamentos virtuais tais como eliminação ou redução de custos relacionados a viagens, transporte e perdas de horas de trabalho do pessoal.

Uma das características básicas do e-learning é seu enfoque centrado no usuário. Diferente da formação tradicional, onde o instrutor e o conteúdo são os elementos centrais, esses programas colocam o usuário no centro do processo de aprendizagem, transformando-o em motor e protagonista de sua própria experiência educativa.

Os cursos on-line, que o empregado pode acessar no escritório ou em sua casa, oferecem também benefícios secundários muito importantes, sobretudo em relação à produtividade. Isto é especialmente significativo, por exemplo, quando a empresa procura impulsionar uma mudança estratégica e utiliza as soluções de e-learning como suporte.

Neste cenário, já se pode afirmar que a utilização de aplicações de TI nas áreas de recursos humanos, transforma o papel desses departamentos, migrando-os de escritórios de reclamações permanentes para verdadeiras bases de melhora no rendimento profissional, fomento da criatividade, desenvolvimento, retenção e satisfação dos empregados, o que se traduz em níveis mais altos de produtividade e na valorização do maior ativo das empresas modernas-seus empregados.


Francisco Mateo-Sidrón, vice-presidente regional de recursos humanos para a SAP América Latina.
Publicado pelo Valor Online em 07/04/08

Mais...

De um clube de herdeiros à formação de uma gestora

(Da esq. para a dir., em pé): Paolucci, Skaf, Atalla e Ermírio de Moraes Filho; (sentados) Rosenberg e Perego: sócios da Perfin, com R$ 100 milhões sob gestão
Foto Marisa Cauduro / Valor


Eles podem ser jovens, o mais velho com 26 anos, mas levam o investimento em ações a sério. Tudo começou quando três amigos, Mickael, Luiz Guilherme e Ralph decidiram abrir um clube de investimentos. Naquela época, os três, com idades entre 16 e 17 anos, nem tomaram muito conhecimento da aplicação e, três meses depois, a corretora sugeriu que o clube de ações fosse encerrado, já que contava com módicos R$ 10 mil de patrimônio. A atitude da corretora, no entanto, mexeu com o brio dos rapazes, que decidiram dar maior atenção à carteira. Investiram mais e começaram a divulgar a aplicação entre os amigos e familiares. Foi quando José Roberto, o Beto, entrou para o clube e, mais recentemente, Gabriel.

Essa seria mais uma história de amigos que decidiram se aventurar no mercado acionário não fosse um detalhe: todos vêm de famílias abastadas, herdeiros de renomadas empresas brasileiras. A família de José Roberto Ermírio de Moraes Filho, de 22 anos, comanda um dos maiores grupos privados do país, o Grupo Votorantim. Ele é neto de José Ermírio de Moraes, irmão falecido de Antônio Ermírio de Moraes. Outro nome de peso é o de Gabriel Skaf, de 24 anos, filho do presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf. No caso de Mickael Villela Brandão Paolucci, de 24 anos, a família é dona da empresa têxtil Diana Paolucci. O pai de Luiz Guilherme Atalla Camasmie, de 23 anos, é sócio do Folha de Uva, tradicional restaurante de comida árabe de São Paulo. Já a de Ralph Gustavo Rosenberg, de 26 anos, foi proprietária do extinto grupo petroquímico Cevekol.

Quando Moraes Filho aderiu ao clube, eles resolveram montar um escritório que, além da gestão do clube de ações, iria buscar participação em empresas de capital fechado, mas com grande potencial de crescimento. Assim nasceu a Infinity Invest que, apesar do nome, não tem nada a ver com a gestora independente Infinity Asset Management.

No clube, a partir de uma gestão mais profissionalizada, os amigos conseguiram fazer o investimento em ações crescer e, em março de 2007, o patrimônio atingiu os R$ 15 milhões. Muitos podem achar que era só dinheiro das famílias. Ledo engano. Na época, a carteira contava com 150 cotistas, o máximo permitido num clube de investimentos. "O problema é que já havia interesse de outros investidores que tinham outros R$ 15 milhões e não podíamos aceitar por conta da regulação", conta Luiz Guilherme.

Foi nessa época que surgiu a idéia da associação com a Perfin Investimentos, gestora fundada por Luís de Oliveira Perego, que iniciou sua carreira em 1983 na divisão financeira do então Banco Francês e Brasileiro (BFB), comprado pelo Itaú em 1995. Mais tarde foi para a tesouraria do BankBoston e depois para a Sanbras DTVM, do Grupo Bunge. Em 1988, o executivo integrou o Grupo Votorantim, sendo um dos responsáveis pela montagem do Banco Votorantim, onde permaneceu como diretor executivo responsável pela área financeira e de investimentos até 1995. Em seguida, passou pelos bancos BMC e Fibra, abrindo em 2003 a Perfin.

Instalados em um prédio que leva o nome da família de um dos sócios, a gestora, que até então contava apenas com um multimercado, decidiu abrir um fundo de ações que adotasse a mesma estratégia do clube. Hoje, a Perfin tem um patrimônio de R$ 100 milhões sob gerenciamento e 320 clientes. O próximo passo é agora buscar distribuidores, lançar um fundo para estrangeiros (offshore), fechar parcerias no exterior e montar um conselho independente para auxiliar a decisão de investimento. O clube será incorporado ao fundo de ações, assim que obtiver autorização da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

No fundo de ações Perfin Infinity Equity, a estratégia de investimento está em aplicar 30% da carteira em papéis de menor liquidez ("small caps"), 40% em ações de empresas médias e os outros 30% em papéis de grandes companhias, diz Moraes Filho. Entre os setores presentes no fundo hoje estão construção civil, saúde, fertilizantes, siderurgia e consumo, além das tradicionais Petrobras e Vale. Normalmente a carteira fica concentrada em dez papéis. Lançado em julho do ano passado, o portfólio acumula perda de 6,20% até o dia 2, para uma alta de 19,73% do Índice Bovespa no período. Neste ano, com a forte oscilação da bolsa, a carteira perde 10,21% até o dia 2 para uma queda de 0,82% do Ibovespa.

No multimercado, aberto em outubro de 2007, 60% dos recursos estão em operações de arbitragem (long/short). Da parcela restante, 20% fica em renda fixa e os outros 20% em ações, com estratégia direcional, que aposta na alta ou queda de um ativo. Na opinião de Rosenberg, a queda do mercado acionário neste ano abriu muitas oportunidades de investimento para o longo prazo. "O ano, no entanto, será de muita volatilidade até que o cenário internacional fique mais claro", acrescenta Perego.

Jovens e herdeiros de empresas importantes no país, eles reconhecem que muitas vezes sofrem preconceito, como se fossem apenas um grupinho de jovens mimados brincando de gerenciar parte da fortuna dos pais. "Preconceito acontece, mas o histórico de alta rentabilidade (obtido no clube) mata qualquer pré-julgamento", diz Camasmie.

Os executivos ressaltam, ainda, que do total de R$ 100 milhões gerido pela Perfin, apenas 25% representam dinheiro de familiares. "E os nossos pais só começaram a investir depois de dois ou três anos, após termos um histórico de performance", diz Gabriel Skaf. "Até hoje tento trazer mais dinheiro do meu pai, mas, como ele é avesso a risco, é difícil."

Por Luciana Monteiro, de São Paulo
Publicado pelo Valor Online em 07/04/08

Mais...

Investimentos de R$ 16 bi em projetos

O total de recursos investidos em projetos de infra-estrutura no Brasil chegou a R$ 16,23 bilhões no ano passado, um recorde histórico e mais do que o triplo dos R$ 4,58 bilhões de 2006, segundo a Anbid (Associação Nacional dos Bancos de Investimento). No início deste ano já há outros mais de R$ 55 bilhões em projetos no forno, segundo levantamento do Valor. Mesmo que só metade dos investimentos previstos se concretize, 2008 promete bater novo recorde no setor.


"A estabilidade política, econômica e social do Brasil atrai cada vez mais investimentos de longo prazo, necessários para o setor de infra-estrutura", diz Bernardo Parnes, diretor-geral do Bradesco Banco de Investimento (BBI), primeiro colocado no ranking da Anbid de assessor financeiro das estruturas de "project finance" de 2007. O banco de investimento saiu na frente também no ranking de líder ("arranger") dos financiamentos, enquanto o banco comercial Bradesco foi o maior emprestador. "O dinheiro disponível para projetos cresceu em 2007 e o país vinha com falta de investimentos de base há tempos", continua Parnes. "Juntou a fome com a vontade de comer", brinca ele.

"A carência de infra-estrutura no país ainda é grande e muitos projetos estão para sair neste ano e nos próximos", concorda Carlos Mellis, superintendente de project finance do Unibanco, o primeiro colocado nos rankings de assessor financeiro e de "arranger" por número de operações. O Unibanco também divide com o Bradesco a primeira posição no ranking de emprestador por número de projetos.

"O Brasil passou a crescer mais e a requerer mais investimento de base", afirma Isacson Casiuch, diretor-executivo do Banco Brascan e coordenador da subcomissão de financiamento de projetos da Anbid. Foi esse mesmo crescimento que estimulou o setor privado a tirar projetos da gaveta. A grande disponibilidade de recursos externos para investimento tanto em dívida quanto em capital nos mais diferentes projetos também ajudou a ampliar o volume de investimentos, lembra Casiuch. O risco-Brasil foi a recordes de baixa histórica no ano passado - chegando a 138 pontos básicos no dia 18 de junho, seu menor nível. Os custos de captação até então, quando a crise das hipotecas americanas ainda não havia contaminado outros mercados, atingiu seu menor patamar para o Brasil.

Agora, o dinheiro tanto para capital quanto para dívida está mais caro e raro. "Isso poderá reduzir o interesse de participantes nos projetos que o governo e a iniciativa privada têm colocado à mesa", diz Mellis. Casiuch concorda. Segundo ele, no entanto, o impacto do crédito mais caro nos projetos de longo prazo é menor. "Alguns projetos poderão sofrer atraso, mas o contágio maior da crise americana no Brasil se dará em 2009", avalia. Parnes lembra que as agências de crédito à exportação e organismos multilaterais vão manter seu crédito de longo prazo a custos competitivos, sem falar da importância crescente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Dos 36 projetos realizados em 2007, a maior parte - 23- foram no setor de energia. Inúmeras pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) pipocaram em todo o país, além de centrais de energia eólica. Há ainda usinas maiores, como a de Foz do Chapecó, com investimentos de R$ 2,2 bilhões, o quinto dos 20 projetos de hidrelétrica do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) com recursos aprovados pelo BNDES.

Houve ainda três projetos na área de agronegócio, todos de açúcar e álcool: Tropical Bioenergia, Usina Ouroeste Açúcar e Álcool e Usina Camen.

O setor de petróleo e gás também teve destaque, com seis projetos. Cerca de R$ 6 bilhões foram investidos em plataformas de perfuração de petróleo que serão alugadas pela Petrobras. Os recursos vieram em sua maior parte de bancos estrangeiros.

As estruturas de "project finance" pressupõem uma empresa de propósito específico com capital e dívida próprios. Os sócios-controladores da empresa e os credores são remunerados de acordo com o fluxo de caixa do projeto. Segundo a Anbid, o volume de dívida para os projetos passou de R$ 3,165 bilhões em 2006 para R$ 11,763 bilhões em 2007.

Outro levantamento da Anbid que considera as concessões mostra que o total de recursos investidos caiu 61,4% na comparação com 2006, ficando em R$ 2,724 bilhões no ano passado. Houve uma mudança de metodologia nesse ranking, que dificulta comparações. Mas, parte do movimento fraco se explica pelo volume menor de Parcerias Público Privadas.

Cristiane Perini Lucchesi, de São Paulo
Publicado pelo Valor Onine em 07/04/08

Mais...

Habib's fatura mais com dinheiro extra da classe C

Alberto Saraiva, do Habib's, bateu recorde vendas em 2007 e no início deste ano nem precisou baixar o preço da esfiha
Foto Marisa Cauduro/Valor


Com mais dinheiro no bolso para gastar fora de casa, as classes C e D passaram a comer nos restaurantes de fast-food mais freqüentemente. Habib's nunca vendeu tanta esfiha, o prato mais famoso da popular casa de comida árabe, como em 2007. E a demanda continua tão aquecida que Alberto Saraiva, fundador da rede, não precisou reduzir o preço neste ano, estratégia usada em fevereiro do ano passado para evitar o esfriamento sazonal das vendas.

Habib's vendeu o recorde de 600 milhões de unidades em 2007 - ou três esfihas para cada brasileiro. A saída foi 30% maior do que a de 2006. Pelos 300 restaurantes do Habib's passaram nada menos do que 150 milhões de clientes no ano passado.

Este ano começou ainda mais aquecido. "No primeiro trimestre, nossas vendas já cresceram 20% em relação aos três primeiros meses de 2007. O normal seria crescermos entre 10% e 12%", diz Saraiva. Com tanta demanda, Saraiva até se deu ao luxo de não reduzir os preços da esfihas neste começo do ano, período em que, sazonalmente, a demanda costuma ser mais fraca. O produto custa atualmente R$ 0,65 nos restaurantes do grupo.

Em fevereiro de 2007, para evitar a tradicional queda do consumo, o Habib's promoveu uma das campanhas mais audaciosas no setor de fast-food e baixou o preço da esfiha de R$ 0,59 para R$ 0,39. "As vendas aumentaram 40%, tanto assim que mantivemos este preço por mais seis meses", diz Saraiva, que, por enquanto, não precisou recorrer novamente a esta arma poderosa de marketing. Mas, se for preciso, o Habib's irá usá-la.

Outra popular cadeia nacional de fast-food, Giraffas, sediada em Brasília, também está vendendo como água no deserto. "No primeiro trimestre, nossas vendas aumentaram 25%, mantendo o mesmo ritmo de expansão registrado em 2007", afirma Alexandre Guerra, gerente financeiro da rede, que já possui 250 restaurantes espalhados pelo país.

Em lojas comparáveis, ou nas unidades em funcionamento há pelo menos 12 meses, as vendas do Giraffas cresceram 12% em 2007, um índice invejável para o varejo. Neste mesmo conceito, as vendas do Grupo Pão de Açúcar, a segunda maior cadeia de supermercados do país, aumentaram apenas 2,8% no passado.

Isto mostra uma mudança nos hábitos de consumo no país. Com renda extra, mais famílias preferem ir diretamente ao restaurante do que gastar mais no supermercado, tendência que está obrigando os varejistas de alimentos a buscar negócios alternativos. Um deles são as seções de rotisseria, de comida pronta, segmento em que o Pão de Açúcar, por exemplo, vem reforçando sua atuação.

Até mesmo os restaurantes de fast-food estão se adaptando. O Giraffas, que só vendia sanduíches, "tropicalizou" o cardápio e incluiu há alguns anos pratos prontos, que se transformaram no carro-chefe de vendas da rede durante o dia. A cadeia de fast-food percebeu que os brasileiros gostam mesmo de comer com garfo e faca, principalmente no almoço.

O Giraffas fechou 2007 com faturamento de R$ 279 milhões, 24,7% superior ao obtido em 2006. Neste ano, Guerra prevê chegar a R$ 340 milhões e elevar de 250 para 350 o número de lojas.

O Habib's também mudou. Saraiva criou uma nova bandeira, a Ragazzo, que vende pratos italianos, e também ampliou a oferta de produtos no cardápio do Habib's. O empresário prevê abrir pelo menos 50 novos restaurantes em 2008 com a bandeira árabe, chegando a 350 lojas. Diferentemente de outras redes de fast-food, 45% das lojas pertencem ao grupo, que só costuma franquear lojas em locais mais distantes. A grande maioria, ou 80%, dos restaurantes do Habib's estão em ruas, e não em shopping centers, e 23% do faturamento do grupo já é gerado pelo sistema de entrega a domicílio.

Claudia Facchini, de São Paulo
Publicado pelo Valor Online em 07/04/08

Mais...

Povos da floresta querem ter voz e renda no novo mercado de mudanças do clima

O cacique Gilberto Arias: aliança entre os povos da floresta é fundamental
Foto Fernanda Preto


Na sua vez de falar, o cacique Gilberto Arias, 76 anos, contou a versão resumida de uma lenda dos Kuna, do Panamá. "Na copa de uma árvore que produz muitos frutos vivem bem algumas pessoas", começou o líder indígena. "Mas embaixo da árvore há muita gente, que vive apenas dos restos dos que estão acima", continuou. São centenas os que vivem precariamente. Em determinado momento eles se juntam, dão uma chacoalhada na árvore e fazem com que os frutos caiam. "A aliança que se quer consolidar entre os povos da floresta é fundamental e estratégica", pensa Arias. "O sentido de mexer com a árvore é mudar o sistema, para que as gerações que vierem possam seguir com um novo processo".

A versão em papel das palavras do cacique, menos poética e mais estrutural, sairia horas depois, numa reunião em um barco navegando pelo Rio Negro, perto de Manaus. Foi ali que líderes seringueiros, de comunidades ribeirinhas e de nações indígenas do Brasil e de outros dez países da América Latina, da Bacia do Congo e da Indonésia, acertaram os termos da "Declaração de Manaus". No documento buscam o reconhecimento por preservarem as florestas e, assim, ajudarem na redução das emissões dos gases de efeito-estufa, "sem que nenhum tipo de mecanismo reconheça ou compense tal função". Aí está uma de suas reivindicações: participar ativamente na construção do REDD, os dispositivos de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação das matas, que começam a ser discutidos pelos governos nas reuniões internacionais sobre clima.

A idéia é não perder o bonde. Um dos artigos do Mapa do Caminho de Bali, a conferência das Nações Unidas sobre clima de dezembro de 2007, coloca foco no que diz quem vive na mata. É isso que discutiu um evento em Manaus, na semana passada, organizado pela Aliança dos Povos das Florestas, entidade que reúne o Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), pescadores e pequenos agricultores do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB).

A aliança brasileira, criada meses depois do assassinato de Chico Mendes, começa agora a adicionar novas línguas, diz o seringueiro Manoel Cunha, presidente do CNS. "Queremos participar das discussões referentes às mudanças climáticas e entender que benefícios os povos da floresta podem ter com processos de REDD". A intenção é chegar ao Fórum Social Mundial, em Belém, em 2009, com a rede mais estruturada para uma aliança mundial dos povos da floresta - como na história do líder Kuna.

Há uma selva de siglas pela frente, na agenda internacional que discute o tema. É o périplo de reuniões que preparam e subsidiam a conferência de clima das Nações Unidas em 2008, na Polônia, e em 2009, em Copenhague. "Temos que abrir um mecanismo muito forte para que possamos ser mais ouvidos na ONU", diz o seringueiro Julio Barbosa, do CNS de Xapuri. A declaração de Manaus será submetida à reunião do SBSTA (o órgão técnico da Convenção do Clima), em junho, na Alemanha.

Espera-se que o encontro em Manaus tenha sido o início do processo. "A crise das mudanças climáticas não é só um problema de dinheiro, de informação, ou de acesso à informação", diz Paulo Moutinho, coordenador de pesquisas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, o IPAM, que apoiou o evento. "É também uma crise de oportunidade de diálogo entre os vários atores da questão".

A discussão de REDD, nos fóruns internacionais, pode levar quem preserva florestas tanto ao mercado de créditos de carbono como à construção de fórmulas originais de combate às mudanças climáticas. Na Bolívia, por exemplo, a escassez de água em Los Negros, bacia hidrográfica fundamental para 2.700 pequenos agricultores, está sendo equacionada com a doação de caixas de abelhas a quem vive rio acima. Quem mora nas cabeceiras, sem outra opção, pressionava as matas do entorno. A água do rio começou a escassear e a prejudicar a produção de hortaliças da cidade lá embaixo. A compensação pelo serviço ambiental hídrico foi doce - com as caixas de abelhas iniciou-se a produção de mel e a mata foi poupada, conta a boliviana Paulina Pinto Uribe, da Associación de Apicultores del Amboró Sur.

No Brasil há pouca poesia na trajetória das questões indígenas. Marcio Santilli, do Instituto Socioambiental, o ISA, lembra situações diferentes de vida entre os índios por aqui. São entre 350 mil e 800 mil pessoas distribuídas em 230 etnias e que falam 180 línguas. "É um contingente de menos de 1% da população brasileira que ocupa cerca de 12,5% do território nacional. Este é o bode político da questão", prossegue o ex-presidente da Funai. Mas a equação distorce a realidade, já que 99% das terras indígenas estão na Amazônia Legal, onde vivem 60% dos índios brasileiros. "Ou seja, aqui tem índio que não tem floresta. E estes como podem se beneficiar de REDD?", questiona. "Os direitos das minorias puderam avançar no Brasil sempre em cima de alianças. É a lição que podemos tirar desta trajetória".

Daniela Chiaretti, de Manaus
A repórter viajou a convite do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM
Publicado pelo Valor Online em 07/04/08

Mais...

Oposição européia ameaça projeto brasileiro do etanol

UE já vê etanol como vilão e ameaça planos do Brasil

Manifestações recentes de governos, partidos e entidades sugerem uma abrupta mudança de humor dos europeus em relação ao uso de biocombustíveis, mas mais especificamente contra o etanol. As conseqüências para os Brasil podem ser graves, desde a falta de estímulo para a criação de um mercado mundial de etanol até a perda de terceiros mercados.

O mais recente episódio ocorreu na sexta, quando o governo alemão voltou atrás na decisão de dobrar para 10% o conteúdo de etanol na gasolina consumida no país a partir do ano que vem. O governo argumentou que muitos carros antigos não poderiam rodar com essa mistura de etanol e seus motoristas seriam obrigados a usar uma gasolina premium, mais cara.

Na quinta, o presidente francês, Nicolas Sarkozy, acusou os governos do Brasil e dos EUA de dar subsídios fiscais à produção de etanol.

Já o Reino Unido retirou no mês passado o financiamento para um programa de E85 (mistura de 85% de etanol e 15% de gasolina), apesar de continuar a defender a mistura de 5% de etanol à gasolina.

Oficialmente, a Comissão Européia (órgão executivo da UE) mantém sua proposta de misturar 10% de etanol à gasolina na região até 2020. O porta-voz de energia da UE, Ferran Terradelas Espuny, foi incisivo: o objetivo da Comissão não muda. Reagindo à decisão da Alemanha, disse que os países da UE podem fazer o que quiserem, pois a proposta da Comissão ainda está em negociação e talvez só seja aprovada (ou não) no final do ano.

Mas, segundo a agência de notícias espanhola Efe, organizações ambientalistas como Greenpeace, Friends of the Earth e Birdlife estão pressionando a UE e os governos europeus a abandonarem o objetivo de 10% de biocombustíveis, por temerem que a medida seja contraproducente.

Na diplomacia brasileira, a decisão alemã acendeu o sinal de alerta. Um importante especialista disse: "A mudança de humor da Europa em relação ao etanol é muito séria". O Brasil tem o plano estratégi-co de tornar o etanol uma commodity mundial. Para criar esse mercado, a UE é indispensável. Se o etanol ficar restrito a Brasil e EUA, nunca vai ganhar escala para valor mais elevado. A UE é "decisiva" porque, se entra no jogo, teria efeito de demonstração para outros países. Mas, se o recusa, o "baque é tremendo" nos planos brasileiros.

O baque é forte porque o Brasil apostou seriamente na expansão dos mercados, e não só no europeu. Se Bruxelas freia o desenvolvimento do etanol, o resto do mundo pode desistir e talvez no futuro até os EUA, porque o etanol americano é uma extravagância econômica e ambiental - - é muito caro e de efeito cada vez mais questionado sobre o aquecimento global.

O Japão, que vem avaliando o que fazer em relação ao etanol, pode desistir. Ou seja, o que a Alemanha - o maior produtor europeu de biocombustíveis, mas principalmente de biodiesel - fizer, pode ter efeito em cadeia.

A Europa parece mais inclinada a apostar no biodiesel, pois sua indústria automobilística vem apostando em motores a diesel mais eficientes, de consumo menor.

A sorte do etanol começou a mudar na Europa no começo do ano, quando estudos científicos contestaram o benefício do uso do etanol no combate ao aquecimento global. Uma pesquisa da Universidade de Minnesota (EUA), publicado em fevereiro pela prestigiosa revista "Science", indicou que a conversão de florestas no Brasil, no Sudeste Asiático e nos EUA para o cultivo de grãos e outras plantas usados como matéria-prima para biocombustíveis pode gerar emissões de dióxido de carbono maiores do que as que se economiza com combustíveis fósseis.

O estudo aponta como mais prejudicial o etanol de milho, produzido nos EUA, mas diz que mesmo o etanol de cana-de-açúcar produzido no Brasil pode trazer um déficit no curto prazo em termos de emissões de carbono. Esse déficit seria compensado após 17 anos, mas o problema é que é preciso reduzir as emissões já.

Esse e outros estudos começaram a erodir a imagem dos biocombustíveis na Europa como uma alternativa ecologicamente viável aos combustíveis fósseis. Um sinal dessa crescente oposição foi a adoção, por parte de ambientalistas europeus, do termo agrocombustíveis, bem menos positivo, em lugar de biocombustíveis.

Nas últimas semanas, a mídia européia deu amplo destaque aos problemas e às incertezas relacionadas aos biocombustíveis. O principal jornal espanhol, o "El País", disse que eles estavam perdendo o rótulo ambiental. Uma das intenções do governo britânico, ao abandonar o programa de E85, foi ajudar a frear o avanço de plantações em áreas de floresta com o uso excessivo de pesticidas.

Além questionar o ganho ambiental dos biocombustíveis , os europeus estão preocupados com a alta de preços que eles estão causando em commodities agrícolas, do milho à carne, e que ajudou a levar a inflação anual na zona do euro ao recorde de 3,5% em março.

A Comissão Européia avalia que o etanol está sofrendo duas linhas de ataque. Primeiro, do lado ambiental. A implicância de ONGs está estigmatizando o etanol, como ocorreu com os transgênicos. Segundo, do lado social, com a acusação de que o etanol eleva o preço de alimentos e só beneficia fazendeiros ricos do Brasil e dos EUA.

Michael Mann, porta-voz de agricultura da UE, disse que o objetivo europeu é claro: estimular a produção de etanol de primeira geração, a partir de matérias-primas agrícolas. Mas, assim que for possível, partir para a produção de etanol segunda geração, para não usar commodities alimentares.

É preciso notar, porém, que a Suécia recentemente foi o primeiro país a obter autorização da UE para eliminar a tarifa de importação sobre o etanol brasileiro, e por razões ecológicas. Há uma ala, como o governo liberal sueco, que acha o etanol brasileiro importante para a questão ambiental.

Para alguns especialistas, se o quadro piorar para o etanol, o Brasil em todo caso tem chances com o biodiesel (que tem tarifas baixas na UE). Só que o protecionismo para biodiesel também é forte.


----------

A crescente oposição na Europa ao uso mais amplo de biocombustíveis já preocupa autoridades brasileiras. Teme-se que essa política prejudique o projeto estratégico do Brasil de transformar o etanol em commodity mundial e que desestimule outros países, como o Japão, a ampliar o uso de biocombustíveis. "A mudança de humor da Europa em relação ao etanol é muito séria", disse um diplomata brasileiro na região que pediu para não ser identificado.

A Alemanha voltou atrás, na sexta-feira, da sua decisão de dobrar para 10% a mistura de etanol à gasolina. Na quinta, o presidente da França, Nicolas Sarkozy, acusou Brasil e EUA de dumping de biocombustíveis. Em março, o Reino Unido retirou o financiamento a um programa de etanol. Segundo avaliação da Comissão Européia, os biocombustíveis sofrem ataques de duas frentes. Do lado ambiental, vem se questionando o seu benefício no combate ao aquecimento global e teme-se que eles estimulem a devastação de florestas. Do lado social, eles estão sendo responsabilizados por parte da expressiva alta dos preços das commodities agrícolas, o que vem elevando a inflação em todo o mundo e ameaça causar fome em países pobres.


A Comissão Européia vem sendo pressionada por ONGs ambientalistas para abandonar sua proposta de uso de 10% de biocombustíveis até 2020. Por enquanto, a entidade continua apoiando a proposta, mas diz que as ONGs estão estigmatizando os biocombustíveis como ocorreu com os transgênicos. Um sinal disso foi a recente adoção, por grupos ambientalistas e partidos verdes, do termo agrocombustíveis, menos positivo que biocombustíveis.

Representantes do setor de etanol no Brasil vêem interesses comerciais, desinformação e má-fé por trás dessa mudança de humor na Europa. Para Géraldine Kutas, assessora internacional da União da Indústria de Cana-de Açúcar (Unica), a indústria automobilística européia está investindo em motores a diesel e não tem interesse no etanol. Outro mito disseminado na Europa é que o Brasil vai desmatar a Amazônia para plantar cana, como a Indonésia faz para plantar dendê para biodiesel. "Isso não é desconhecimento, é má-fé mesmo", disse José Carlos Hausknecht, sócio da MB Agro.

Assis Moreira, Humberto Saccomandi e Patrick Cruz, de Genebra e São Paulo
Publicado pelo Valor Online 07/04/08

Mais...



Acesse esta Agenda

Clicando no botão ao lado você pode se inscrever nesta Agenda e receber as novidades em seu email:
BlogBlogs.Com.Br