terça-feira, 14 de outubro de 2008

Conhecendo mais sobre o Censo GIFE

Chegando à quarta edição, o Censo GIFE 2007-2008 permite atualizar as principais informações que se tem na sociedade brasileira sobre os maiores investidores sociais privados do país. Assim, nas próximas páginas poderão ser conhecidos dados referentes a áreas de atuação, estratégias de intervenção na realidade, estruturas que viabilizam essas ações e desafios que se colocam neste caminho.

A coleta dos dados não foi simples, tanto pela complexidade do assunto como pela dificuldade em priorizar que áreas seriam tratadas e com qual profundidade. A esses desafios se soma o fato de que boa parte dos associados não dispõe facilmente dos dados solicitados, estendendo o tempo empregado na coleta e a atenção dada ao preenchimento correto. Entre as razões para tais dificuldades, nos deparamos com a falta de uma cultura de sistematização de informações sobre o investimento social, com equipes enxutas em muitas organizações, ou ainda com a falta de padrões e conceitos comuns ao setor.

Essa dificuldade apenas reforça o valor das informações aqui coletadas, tratadas e interpretadas, que acabam por refletir não só os associados GIFE mas também as tendências que irão guiar o campo do investimento social nos próximos anos. Entre os muitos números e dados que poderiam ilustrar esse quadro, pode-se destacar que os 80 associados respondentes investem em torno de R$ 1,15 bilhão em diferentes áreas sociais, principalmente educação, formação para o trabalho, cultura e artes e geração de trabalho e renda.

Apenas na área de educação, são beneficiadas direta e indiretamente mais de 50 mil entidades e cerca de 4 milhões de pessoas. Mas o acúmulo de reflexão e aprendizados trazidos dos outros Censos nos permite ir além.

Começa-se a traçar cruzamentos que permitem conhecer mais a fundo as características do associado GIFE e, por extensão, do investidor social privado brasileiro – este ator que se diferencia da prática tradicional da filantropia pela ação estruturada, planejada, e que busca resultados mensuráveis. São novas questões, como foco do investimento, estratégia de ação e perfil do investidor.

A análise do foco, aqui medido pelo número de diferentes áreas de atuação, chama atenção para um dos principais desafios de empresas, fundações e institutos: Como equilibrar profundidade e impacto com atenção às inovações e às diferentes necessidades de comunidades e parceiros?

Quando se fala em estratégia de ação, diferenciam-se os investidores que escolhem operar seus próprios projetos, financiar os de terceiros ou trabalhar com ambas as visões. Os dados encontrados começam a mostrar que diferentes tipos de estratégias levam a diferentes prioridades, estruturas e resultados.

Já a análise do perfil diz respeito à origem institucional do associado – isto é, se ele é de origem corporativa, familiar, comunitária ou independente. E aí os dados encontrados são claros em evidenciar a predominância do investimento corporativo.

Entre as 61 associações e fundações, nada menos do que 44 têm mantenedor corporativo, chegando a um total de 79% de associados de perfil empresarial. Cada vez mais, percebe-se no Brasil e no mundo que esse tipo de investidor social tem características específicas: o investidor corporativo revela-se mais operador de seus próprios projetos do que financiador de terceiros; tem horizonte de planejamento e ação de mais curto prazo; concentra suas áreas de ação em temas mais relacionados ao seu entorno e a seu ambiente de negócios, entre outras características.

Neste ponto, o Brasil ainda carece de maior volume e maturidade de experiências em filantropia familiar, comunitária e independente, que têm o importante papel de complementar o investimento das empresas e tratar de temas e estratégias que fogem do padrão corporativo. Uma sociedade civil forte e diversa também necessita de um setor de investidores sociais fortes e igualmente diversos. Tal desenvolvimento depende tanto de mudanças culturais como legais, buscando incentivos e leis que não beneficiem apenas empresas, mas também famílias e comunidades na organização de sua mobilização social.

Entendendo o investimento nos jovens: um olhar aprofundado
Mantendo a tradição inaugurada em sua terceira edição, este Censo GIFE busca aprofundar o debate em torno de uma das prioridades fundamentais dos associados. Em 2005-2006, essa atenção se voltou à educação, que era o foco principal das ações dos investidores sociais brasileiros. Se o assunto não teve publicação separada nesta edição, ainda assim ganha destaque importante em relação aos outros temas de investimento, de forma a dar continuidade ao olhar iniciado há dois anos.

A área escolhida para publicação própria no Censo 2007-2008 é a da Juventude, visto que é esta a faixa etária com maior número de investidores. À medida que o próprio debate sobre o conceito começa a sair de sua infância e se consolida no campo social – especificamente, do investimento social brasileiro –, o GIFE propõe um olhar mais detalhado sobre esse tema. Assim, entram questões como o perfil de quem investe em juventude, as principais estratégias e conceitos utilizados e os desafios de se investir no – e, sobretudo, com – o jovem brasileiro.

No processo de construção e viabilização destas publicações, deve-se destacar a importante e frutífera parceria desenvolvida entre GIFE, Instituto ibi e Instituto Paulo Montenegro/IBOPE Inteligência. Mais do que a soma de diferentes e complementares qualidades, a parceria com dois associados simboliza a diversidade e a riqueza que a rede possui, e o potencial de ações que podem resultar da maior colaboração entre membros desta e de outras redes sociais.

Neste caso, o GIFE trouxe o histórico e o aprendizado acumulado de três edições anteriores, bem como o contato e o relacionamento com sua base de associados. O Instituto ibi, muito mais do que investir financeiramente na viabilização da iniciativa, trouxe sua credibilidade e inteligência na área da juventude. O IBOPE e o Instituto Paulo Montenegro, seu braço social, trouxeram não só as ferramentas e a precisão das técnicas de coleta de informações como a sensibilidade na análise e na interpretação dos muitos dados e tabelas disponíveis.

Além dos atores institucionais, é preciso aqui reconhecer duas especialistas do campo social e da comunicação, que tiveram o desafio de transformar meses e meses de discussões e dados em um texto compreensível, conciso e claro. No caso do Censo GIFE, o papel coube à jornalista Rachel Mello, que é professora de Jornalismo no Instituto de Educação Superior de Brasília e consultora em Comunicação. Foi Oficial de Comunicação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) por oito anos, além de ter trabalhado em diversos veículos de comunicação e em ONGs, como a ANDI – Agência de Notícias dos Direitos da Infância.

No Censo Juventude, o desafio foi enfrentado por Helena Abramo, especialista de longa data no assunto, socióloga e consultora da Comissão de Juventude da Câmara Municipal de São Paulo. Além de ter outras publicações sobre o tema, também já foi coordenadora do Projeto Juventude, pesquisadora da ONG Ação Educativa, consultora especial do Instituto de Cidadania e membro do Conselho Nacional da Juventude.

Mais do que transformar tabelas em texto, ambas buscaram contextualizar as discussões presentes no panorama maior da realidade brasileira e de seu desafio contínuo em busca de um melhor nível de desenvolvimento para todos. Às duas, o nosso muito obrigado pela dedicação e competência.

Qual um iceberg que apresenta apenas uma pequena amostra na superfície, o texto nestes dois volumes representa sobretudo uma decisão consciente por priorizar recortes específicos e concisos na disseminação e interpretação da massa de dados coletados. Cabe agora ao leitor buscar nestas páginas respostas a suas perguntas e nos desafiar com novas perguntas, para questões antes não imaginadas. Colocamo-nos à disposição para ir mais fundo com os dados disponíveis e não explorados nesta publicação ou para planejar novas pesquisas, em ocasiões futuras.


Este texto é uma reprodução da Apresentação do Censo GIFE, assinada conjuntamente pelo GIFE, Instituto ibi e Instituto Paulo Montenegro/IBOPE Inteligência.
redeGIFE Online, 13/10/08

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Formação profissional é foco de programas para jovens

Os institutos, fundações e empresas de origem privada não apenas priorizam a juventude em seus investimentos sociais, como o foco de atuação é a inserção do segmento no mercado de trabalho. Essas conclusões são fruto do Censo GIFE 2007-2008, mapeamento que o GIFE faz sobre o Investimento Social Privado (ISP) de seus associados, que nesta edição traz uma publicação especial dedicada à faixa-etária.

Realizado em parceira com o IBOPE Inteligência/ Instituto Paulo Montenegro e do Instituto ibi, o levantamento mostrou que 77% da Rede GIFE atuam em programas para jovens (em pelo menos uma das três faixas etárias – de 15 a 17 anos, de 18 a 24 anos e de 25 a 29 anos). Destes, cerca de 80% trabalham com temas relativos à educação e formação para o trabalho.

As ações de apoio ao desenvolvimento formativo dos jovens para aumentar suas oportunidades de inclusão social, em especial na geração de trabalho e renda, também aparecem na pesquisa, nas ações de 45% dos respondentes. “O foco na inserção no mercado de trabalho atende a uma demanda evidente desse público, o mais atingido pelo desemprego jovem”, lembra a consultora especial do Instituto de Cidadania e membro do Conselho Nacional da Juventude, Helena Abramo, responsável pelo Censo Juventude.

Embora se restrinja ao universo de 80, das 101 organizações associadas ao Grupo, na época da consulta, o levantamento aponta para as tendências do conjunto do investimento social do setor no país. Isso porque a Rede GIFE é considerada referência nacional na realização planejada de investimentos no campo social.

Para saber, o setor privado brasileiro investe cerca de R$ 5.3 bilhões por ano no campo social, segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O GIFE representa 20% desse montante, com R$1,15 bilhão (base 2007), enquanto o resto do investimento está diluído em mais de 500 mil empresas.

Aprofundamento dos dados
Entre os associados GIFE, o crescimento da atenção aos jovens se verifica desde o Censo 2005-2006, quando ficou evidenciado que a principal faixa etária a compor o público-alvo de seus associados foi o grupo dos 15 aos 24 anos. Neste Censo a tendência se confirma: o grupo etário mais visado pelas atuações é aquele na faixa etária entre 18 e 24 anos, que recebe ações de 67% dos associados; logo atrás vêm os grupos de 15 a 17 anos (para quem 59% dos associados dirigem ações) e o grupo entre 7 e 14 anos (51%).

Caso seja considerada a faixa mais ampla que tem sido definida como juventude (de 15 a 29 anos), 81% dos associados a têm como público-alvo.”O tema juventude entrou na agenda política brasileira na última década, com ações de movimentos sociais e do governo. O setor privado acompanhou essa tendência, que na verdade é mundial”, afirma Helena Abramo, lembrando que o ano 1985 já havia sido instituído como o Ano Internacional da Juventude, pela Organizações das Nações Unidas (ONU).

No total, são quase 600 projetos ou programas voltados especificamente para jovens, somando aqueles executados diretamente pelos associados – ou aqueles executados por terceiros e financiados por eles. O número total de jovens envolvidos nas iniciativas passa de 9 milhões (9.111.731).

”O alcance do benefício é um dado complexo, pois há projetos que beneficiam 5 jovens, há outros que atingem a 1 milhão. Isso pode ser explicado por exemplos simples: enquanto um associado oferece bolsa de estudos para estudantes, outro fornece tecnologias de aprendizados para um rede pública de ensino”, argumenta Helena Abramo.

Investimento
Para atender aos 9 milhões de jovens, os associados destinam mais de R$ 130 milhões para seus programas ou projetos. O dado relativo ao investimento, contudo, alerta para certa ambigüidade presente na importância atribuída à juventude neste universo: embora o público juvenil seja eleito como foco das ações, o volume de recursos aplicados não passa de 11,5% do volume total de investimento do Grupo.

Segundo a socióloga Helena Abramo, as explicações para essa questão se centram na nas diferentes estratégias adotadas pelas instituições. A primeira está na prioridade dada ao segmento frente a outros investimentos sociais: para 29%, ele é a base dos programas; para 39%, ele é um entre outros, constituindo parte de programas maiores; e em 33% das organizações, esta variação está presente em suas definições interna, em que a juventude pode ser considerada público preferencial de alguns projetos, enquanto compõem com outros segmentos, o alvo de outros projetos.

Além disso, também é importante analisar que variam o montante de investimento e o público atingido entre diferentes associados. Enquanto algumas instituições (apenas 3 dos respondentes) investem 100% do seu ISP em programas para jovens, outras (9, ao todo) destinam menos de 10% dos recursos para ações sociais; a proporção daqueles que investem mais de 50% não passa de 20%.

Por que jovens?
A maior parte dos motivos se relaciona, de um lado, 66% dos respondentes, aos fatores que tornam a juventude um segmento populacional especialmente afetado pela estrutura social e conjuntura histórica (peso demográfico, desemprego, índice de violência etc) e, por outro, 63% dos associados, o papel que os jovens podem ter na sociedade – como protagonistas de mudanças sociais e desenvolvimento. Por fim, a percepção de que faltam políticas públicas para o segmento é destaque em 43% das respostas.

Diferentes pesquisas corroboram para essa visão. De acordo com o relatório Jovens em Situação de Risco no Brasil, divulgado pelo Banco Mundial em 2007, as taxas de desemprego excepcionalmente altas entre jovens de 16 a 24 anos resultam em rendimentos anuais perdidos de até R$ 1,2 bilhão.

Pelo levantamento, um em cada cinco jovens trabalha e estuda simultaneamente e 60% dos brasileiros entre 15 e 19 anos são trabalhadores não-pagos ou sem carteira de trabalho assinada. São dados preocupantes que terão um impacto extremamente negativo a curto e longo prazo.

Outra pesquisa, esta realizada pelo Ipea, mostrou que cerca da metade do total de desempregados no Brasil tem entre 15 e 24 anos. Segundo os dados do estudo, a proporção entre o número de jovens desempregados e o total de pessoas sem emprego no País era de 46,6% em 2005, a maior taxa entre os dez países pesquisados. No mesmo período, no México, esta proporção é de 40,4%; na Argentina, de 39,6%; no Reino Unido, de 38,6%; e, nos Estados Unidos, de 33,2%.

A pesquisa chama atenção também para a defasagem escolar. De acordo com o estudo, cerca de 34% dos jovens entre 15 e 17 anos ainda estão no ensino fundamental, enquanto apenas 12,7% dos jovens de 18 e 24 anos freqüentam o ensino superior. "Em suma, com o aumento da idade diminui a freqüência de jovens à educação escolar", aponta o estudo.

Esse contexto explica, pelo menos em parte, porque os associados colocam a educação e trabalho como as prioritárias. “Mas a discussão do trabalho é muito polêmica no país. Quanto esses programas são capazes de impactar no segmento? O aumento da escolaridade significa inserção no mercado?”, questiona Helena Abramo.

Avaliação
Os participantes do Censo GIFE acreditam, majoritariamente, no impacto positivo na vida dos jovens beneficiados, principalmente com relação a chances de acesso, retorno e desempenho escolar e à profissionalização/capacitação para o trabalho, em alguns casos promovendo sua inserção no mercado de trabalho.

Essa percepção sobre a importância das ações para os jovens segue na mesma linha da avaliação que os associados fazem do conjunto de suas ações: 55% avaliam que o impacto causado sobre os beneficiários é positivo, e mais 36% o percebem como muito positivo.

ISP como inovação
Para o ex-diretor regional para a América Latina e Caribe da Fundação Kellogg, Francisco Tancredi, os investidores sociais devem assumir o que ele chama, humoradamente, de “Escala Tancredi de Ousadia em Filantropia” . O modelo nada mais é que uma linha evolutiva do próprio ISP: aquela que se diferencia da prática tradicional da filantropia pela ação estruturada, planejada, e que busca resultados mensuráveis.

Segundo ele, existem três tipos de estratégia:
a) o fazer o bem: “quando o investidor social tem um trabalho comunitário nobre, mas limitado, com retorno imediato”;
b) o de inovar: “quando o investidor financia uma idéia para se tornar uma tecnologia social inovadora, que seja eficaz para mudar uma realidade. Esta estratégia exige certa pré-disposição para a perda. Mas, quando a idéia dá certo, é como ganhar na loteria”; e
c) o de incidir em políticas públicas: “quando o investimento se centra em inserir essas tecnologias inovadoras em políticas nacionais, seja de educação, cultura ou saúde. Em que você mude sistemas públicos”.

As colocações de Tancredi levam ao seguinte raciocínio: para os próximos passos, associados devem encaram com mais ousadia seus projetos em juventude. “O investidor social privado deve iluminar caminhos, despertar a sociedade para temas que não estavam em pauta. Não pode apenas remendar situações”.

Tal como Helena Abramo, ele acredita que existe um passo importante para trabalhar com jovens, percebendo-o como agente de transformação social. “Ele deve ser um ator político, para pensar o país que o Brasil quer ser no futuro. Não podemos tê-lo apenas como um beneficiário de projetos de qualificação profissional. O prisma para enxergá-lo é maior”, crê o ex-diretor do da Fundação Kellogg.

Um dos passos para isso é escutar o jovem, acredita um dos membros do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), Rui Mesquita, Program Associate da Fundação W.K. Kellogg para a América Latina e o Caribe. Ele lembra da 1ª Conferência Nacional da Juventude, realizada em abril deste ano com a participação de 400 mil pessoas, que definiu 22 políticas públicas prioritárias para o segmento.

Legitimadas por movimentos juvenis de todo o Brasil, além de temas como educação e trabalho, as proposições abarcam cultura, saúde e sexualidade, participação política, meio ambiente, segurança e direitos humanos, diversidade e políticas afirmativas, esporte e lazer, fortalecimento institucional da política da juventude, mídia e tecnologia da informação, drogas, cidades, família, campo, povos e comunidades tradicionais.

“Essas demandas podem ser caminhos que os associados e, por extensão, do investidor social brasileiro, adotem para a diversificação de seus projetos”, acredita Rui.

Contexto
Segundo o Censo Juventude, é possível ter uma medida da amplitude e da diversidade que tem ganhado esta questão, no plano internacional, quando a juventude entrou na agenda de dois atores muito diferentes na sua constituição e propósito: o Banco Mundial e o Fórum Social Mundial.

O primeiro, entre suas ações, produziu recentemente o “Relatório de Desenvolvimento Social 2007: o desenvolvimento e a próxima geração”. O segundo, inclui, desde sua primeira edição, um espaço especial para os jovens, consubistanciado pelo no Acampamento Internacional da Juventude, que, na última edição no Brasil, em 2005, reuniu 35 mil jovens de diferentes países.

No plano continental, a articulação dos países da América Latina com dois países ibéricos ligados à sua história (Portugal e Espanha) gerou uma série de cooperação intergovernamental, fomento e estímulo para a implantação de uma agenda voltada para a Juventude: desde 1987, a realização de Conferências Intergovernamentais sobre Políticas Públicas de Juventude e a estruturação da OIJ (Organização Ibero-americana de Juventude) são os principais marcos.

O Brasil, polarizado por uma agenda interna diferenciada, incorporou-se a essa movimentação um pouco mais tarde, com algumas singularidades. No período sbsequente à reestruturação democrática e ao processo constituinte, quando se reoganizaram as pautas referentes aos direitos e às políticas públicas, o esforço da movimentação social ficou concentrado no tema urgente e dramática da infância e da adolescência, que pautou a implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Apenas mais recentemente, depois da segunda metade dos anos 1990, é que a “questão da juventude” entrou efetivamente na pauta. É a partir desse período que se pode observar “a passagem das políticas de Juventude como estado de coisas para a formação de uma agenda pública que considera os jovens como um problema político, isto é, como objeto especifico de intervenção do Estado”, aponta o Censo.

No plano governamental, assistimos à proliferação de organizamos gestores específicos de Juventude nos âmbitos municipal, estadual e federal, principalmente com a proposição e criação da Secretaria Nacional da Juventude e do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), ambos definidos por decreto presidencial em 2005, além de iniciativas no Legislativo, como a criação da Frente Parlamentar, que desenvolve o debate sobre a elaboração de um plano nacional para o segmento.

No que cerne as políticas públicas, o programa federal mais significativo foi o o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (PROJOVEM). Executado em parceria com os governos estaduais e o Distrito Federal, por meio dele, jovens entre 18 e 24 anos que não concluíram o ensino fundamental têm oportunidade de elevar seu grau de escolaridade, tal como oferece qualificação profissional voltada à inclusão social e estimula a prática de ações comunitárias e o exercício da cidadania.

O jovem matriculado no ProJovem recebe um benefício de R$ 100,00 mensais durante o período do curso (12 meses), desde que cumpra as metas estipuladas e tenha freqüência mínima de 75% nas aulas.

Segundo o secretário executivo do Conjuve, José Eduardo de Andrade, as previsões orçamentárias para o programa ficaram em torno de R$ 4 bilhões para os próximos três anos. “Mas é uma previsão, pode não ocorrer. Daí a importância do ISP nessas ações. Esses investidores estão na vanguarda das ações sociais”, alega.

Organizações de origem privada
Tal como nas políticas governamentais, também foi crescente o número de ações realizadas por diversas entidades da sociedade civil organizada e do setor empresarial. Movimentos de articulação público-privadas, na busca de parâmetros para programas e na criação de redes sociais.

De acordo com a pesquisa “As fundações privadas e as associações sem fins lucrativos no Brasil”, que levantou dados sobre 275.895 entidades, em 2004, houve um crescimento de organizações voltadas para a promoção e defesa dos direitos (em especial das crianças e adolescentes). Promovido pelo IBGE, IPEA, GIFE e Abong, o levantamento mostrou que esse tipo de entidade representava 16% do total, sendo que ¾ delas foram criadas a partir de 1990.

Em 2006, o IBGE realizou uma nova pesquisa, focada neste último conjunto, sobre as “Entidades de Assistência Social Privada sem Fins Lucrativos” (PEAS), em que se notou a importância do público adolescente e jovem como foco das ações: das 16.089 entidades pesquisadas no país, 51,7% desenvolvem ações que envolvem pessoas com idades entre 15 e 24 anos; 46% na faixa de 7 a 14 anos.

Outro estudo, este realizado pelo Ipea em 2006, diagnosticou que, entre os anos de 1999 e 2003, os jovens começaram a despontar como um grupo significativo nas empresas que realizam ações sociais. O percentual de organizações do setor privado com projetos para o segmento cresce de 23% (em 1999), para 39% (2003), com foco principalmente na qualificação profissional.


Rodrigo Zavala
redeGIFE Online, 13/10/08

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4ª edição do Filme em Minas

A 4ª edição do Filme em Minas – Programa de Estímulo ao Audiovisual receberá inscrições até 31 de outubro de 2008. O programa do Governo de Minas Gerais, por meio da Secretaria de Estado de Cultura, vai distribuir R$ 4,26 milhões no biênio 2009/2010.

Os recursos contemplam nove categorias distintas, buscando dar conta da diversidade da produção audiovisual do Estado. As categorias são: produção de longas-metragens, distribuição de longas-metragens, finalização, curtas-metragens, documentários em vídeos, formato livre, incentivo Minas Film Comission ao cinema nacional, desenvolvimento de roteiros e publicações, digitalização de acervos e copiagem.

Para conhecer o edital completo, o regulamento por categoria e acessar o formulário de inscrição, entre no site www.cultura.mg.gov.br .

Fonte: Secretaria do Estado da Cultura de Minas Gerais

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Números da cultura

Apenas 8,7% dos 5.564 municípios brasileiros possuem salas de cinema; as capitais com maior percentual de público que lê, pelo menos, um título de jornal por semana são Porto Alegre (68%) e Rio de Janeiro (57%); com relação a orquestras, São Paulo (132 formações) e Pernambuco (77 formações) são os Estados que mantêm maior número de grupos atuantes. Esses e outros dados estatísticos do setor cultural brasileiro, que fazem parte do primeiro volume do Anuário de Estatísticas Culturais a ser lançado oficialmente pelo Ministério da Cultura (MinC), em formato digital, no início de novembro, e em formato de livro em 2009, foram apresentados no 3º Seminário de Políticas Culturais, realizado nos últimos dias 24, 25 e 26 de setembro, na Fundação Casa de Rui Barbosa, no Rio de Janeiro.

A resolução de publicar o Anuário surgiu com a constatação da inexistência de um documento que centralizasse as informações estatísticas da cultura no Brasil. Apesar das pesquisas existentes, faltava organizar as informações, de modo a permitir um cruzamento de dados, além de uma posterior interpretação do cenário cultural brasileiro com o intuito de gerar subsídios para a formulação de políticas públicas mais ajustadas e auxiliar na democratização dos investimentos na área. “Embora identifiquemos muitas pesquisas no setor cultural, o fato de terem sido divulgadas de forma isolada não propiciava a formação de um centro de referência para o gestor cultural, para o empresário, para formadores de opinião ou para o público em geral”, explica Pablo Martins, gerente de Planejamento, Estudo e Pesquisa da Secretaria de Políticas Culturais do MinC e responsável pelo projeto.

Há cerca de cinco anos, o Ministério da Cultura iniciou um trabalho de coleta de dados, de incentivo e fomento a inúmeras pesquisas pelo País, além de firmar convênios com órgãos como o IBGE –Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o Ipea –Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e o Ibope–Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística), com o intuito de reunir as informações que serão publicadas agora.

Pablo Martins explica que a compilação desses dados permitirá um diálogo constante com os públicos que se interessam pelo setor e ajudará a tornar os números mais “palpáveis”. Para ele, o Anuário terá também a função pedagógica de criar e estimular o hábito da pesquisa dos números da cultura, o que poderá acarretar no surgimento de projetos mais maduros e desenhados conforme as reais demandas da sociedade. Como exemplo, Martins citou o fato de 10% dos municípios brasileiros não terem bibliotecas. “De posse de informações como essa, os investidores poderão direcionar melhor seus recursos e definir metas para alcançar o que desejam em termos de cidadania cultural”, salienta.

Com estatísticas culturais de mais de 20 segmentos do setor – teatro, biblioteca, museu, artes plásticas, moda, design, cultura digital, cinema, festa popular, rádio comunitária, provedor de internet, entre outros – Martins acredita que o compêndio poderá auxiliar o desenvolvimento do País de forma objetiva. Para isso, o MinC deve atualizar o volume anualmente, com dados de outros indicadores e de outros índices desenvolvidos no Brasil, como o IDCULT– Indicador de Desenvolvimento Cultural, lançado pelo IPEA, que é uma espécie de IDH – Índice de Desenvolvimento Humano da cultura. Além dessas informações, o Anuário trará curiosidades sobre cada segmento e peculiaridades da formação cultural brasileira. A primeira edição abarca dados dos anos de 2005 a 2007 e, de anos anteriores, quando necessário traçar a evolução histórica da cultura no País.

O Anuário está dividido em cinco grandes áreas, que são oferta da cultura, demanda por cultura, indicadores culturais, gestão cultural e projetos apresentados, aprovados e com captação via Lei Rouanet. As duas primeiras áreas estão baseadas no conceito econômico de oferta versus demanda, mas trarão também dados sobre a qualidade dos equipamentos disponíveis para o acesso, a freqüência dos cidadãos às atividades artísticas e os números sobre o consumo e o consumidor cultural.

Já a área de indicadores mostrará a cultura no universo de produção industrial brasileiro, sua participação no comércio e nos serviços, as despesas públicas dos municípios e o consumo familiar brasileiro. Com relação à gestão, serão apresentados itens como o turismo cultural e a existência de Secretarias ou Conselhos Municipais exclusivos de cultura. Por fim, na área referente aos projetos aprovados, o anuário pretende prestar contas do que vem sendo feito com recursos públicos e permitir maior transparência nos dados federais de projetos incentivados pela Lei Rouanet ou pelo Fundo Nacional de Cultura, discriminando os investimentos por região e por pessoa física ou jurídica. Será possível, também, relacionar o volume de empregos gerados por Real investido nos projetos.

Formação cultural brasileira
Entre os dados que serão apontados pelo primeiro volume do Anuário de Estatísticas Culturais, chama a atenção o baixo índice de leitura verificado entre os brasileiros – a média de leitura no País é de 1,8 livros a cada ano – que teria relação com o também baixo percentual de associações literárias existentes no País. O Rio de Janeiro é o Estado que tem mais municípios que declararam possuir esse tipo de associação, 44% deles. Nos demais, o número é discreto e concentrado, novamente, nas capitais.

Verificou-se, também, que o brasileiro vai pouco ao cinema, apenas 7% freqüenta o equipamento cultural ao menos uma vez por mês. Mas, por outro lado, há um consumo cada vez maior de informações via internet, assim como um aumento na locação de filmes em videolocadoras.

A explicação parece estar na proposição que diz que, em cultura, é a oferta que induz à demanda. Assim, já que existem poucas salas de cinema no Brasil – apenas 8,7% das cidades possuem pelo menos uma sala de cinema –, o público acaba consumindo menos esse tipo de produto. A pesquisa apurou que a quantidade de salas de cinema e livrarias vem caindo paulatinamente. E, embora essa realidade seja pouco observável nas capitais, onde há maior concentração desses instrumentos, o baixo número é comum mesmo em Estados como Rio de Janeiro – 41% dos municípios têm cinemas – e São Paulo – somente 22% das cidades têm o equipamento cinematográfico. Mesmo com poucas salas e sendo apenas o 8º Estado no ranking brasileiro de salas de cinema, Santa Catarina apresenta a melhor distribuição entre as cidades, com apenas 25% das salas concentradas na capital Florianópolis e o restante espalhado pelo Estado.

Pablo Martins interpreta o alto índice de locações como conseqüência de existirem locadoras em 82% das cidades brasileiras. O Espírito Santo, por exemplo, contabiliza locadoras em 98,7% de seus municípios. Em termos absolutos, Minas Gerais e São Paulo ainda ficam à frente, com 643 e 592 locadoras, respectivamente. “Temos visto um outro tipo de consumo audiovisual, já que o cinema não atinge, em uma primeira instância, a maior parte dos municípios. Mas essa tendência reflete também a mudança dos hábitos dos brasileiros. Hoje, as pessoas querem decidir os horários e o tipo de programação que vão consumir. Os aumentos vertiginosos das horas gastas com internet e dos provedores e usuários nos municípios demonstram isso mais claramente. O cidadão quer cada vez mais buscar conteúdos específicos”, explica.

Outro dado verificado que merece atenção é a baixa institucionalização da Cultura pelos municípios, sendo que apenas 4% deles possuem secretarias exclusivas para a área cultural. Essa informação se alinha ao fato de de existirem poucos investimentos e políticas públicas para a cultura nos municípios brasileiros e acena para um cenário desafiador, que pode ser revertido com a ajuda da constatação a partir de instrumentos como o Anuário.


Boletim da Democratização Cultural - Edição 42

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Estranhos na Noite

Nos últimos dois anos eu tenho colaborado com o Fundo Global para as Fundações Comunitárias para avaliar se elas deveriam ou não estabelecerem-se como entidades independentes. Um dos pontos mais interessantes deste envolvimento tem sido o diálogo entre o Fundo Global e o empreendimento Desenvolvimento Comunitário do Banco Mundial, o maior mantenedor do Fundo Global. O Banco Mundial, por méritos próprios, tem considerado se vale a pena testar a utilidade das fundações comunitárias como um meio para o desenvolvimento comunitário, ou seja, uma ação nada comum.

Sempre me surpreendeu como algo inusitado os profissionais de desenvolvimento, seja em agências governamentais de desenvolvimento, instituições multilaterais, ONGs e praticantes de fundações comunitárias viverem, ao que parece, em universos paralelos. Em qualquer reunião de peritos em desenvolvimento aparece muita discussão sobre quais instituições podem levar adiante e manter o processo de desenvolvimento; no entanto as fundações comunitárias são raramente mencionadas. Aqui defino desenvolvimento como o progresso de um conjunto de variações que, como um todo, mede a qualidade de vida. Poderíamos discutir sobre a inclusão de quais variáveis específicas, mas o objetivo é determinar o que torna a vida das pessoas mais gratificante.

Enquanto os profissionais do desenvolvimento raras vezes mencionam as fundações comunitárias, os profissionais das fundações comunitárias dificilmente batem nas portas das reuniões de desenvolvimento. Ao contrário, parecem envolvidos em disputas internas. Nos Estados Unidos, onde está a metade das fundações comunitárias do mundo, os profissionais estão finalmente aparecendo após uma longa, demorada e basicamente inútil discussão a respeito se os detentores são os da comunidade onde trabalham, ou os doadores que fornecem os recursos para servir essas comunidades. Por que é tão difícil concordar que ambos são detentores e seguir em diante?

No exterior, onde o número de fundações comunitárias em alguns países está estourando, o foco na comunidade tem permanecido mais centralizado. O debate, então, tem sido se as áreas locais pobres têm os recursos para dar início e, sobretudo, sustentar as fundações comunitárias. Este debate tem polemizado as discussões sobre ajuda estrangeira na sustentabilidade das fundações comunitárias. A resposta, da forma como estamos aprendendo, parece ser a de que existem recursos não descobertos nas mais miseráveis comunidades e que os recursos estrangeiros podem ter um papel legítimo como catalisadores e sustentadores. Isto é, caso a liderança da fundação for vista “como parte da comunidade”.

Se as fundações comunitárias e a comunidade em desenvolvimento são como “estranhos na noite”, então está na hora de juntarem-se, saírem e juntas darem um passeio. Qualquer casamenteiro que se preze poderá ver que elas têm muitas coisas em comum. Em primeiro lugar, as fundações comunitárias geralmente abrangem uma área geográfica gerenciável. Junto com o conhecimento profundo delas é imprescindível entendê-las a fim de se ter condições de desenvolvê-las de forma a fincar raízes sólidas. Somando-se à estes três atributos das fundações comunitárias a combinação adequada ao desenvolvimento parece ser boa demais para ser verdadeira. As fundações comunitárias de certa forma são propriedades das comunidades: a liderança delas vem da comunidade e suas prioridades são definidas pela própria comunidade e não impostas por pessoas de fora.

No entanto, há um quinto atributo irrefutável. Hoje em dia somos bombardeados por filantropos de risco alegando que a grande diferença entre eles e o velho estilo de filantropia tradicional é que eles entram nas suas iniciativas com uma estratégia de saída embutida. Isto ajuda a reduzir a dependência e ficar atolado na rotina de colocar recursos e fazer esforços contínuos não sustentáveis. Este não é o lugar para debater os méritos da filantropia de risco direta, mas vale a pena assinalar que as fundações comunitárias podem ser as intermediárias no processo de desenvolvimento com este precioso atributo: uma estratégia de saída embutida no processo de filantropia.

Todos nós, na filantropia tradicional, filantropia de risco e desenvolvimento, temos medo de criar dependência e ficarmos presos ao assistencialismo com esforços insustentáveis. As fundações comunitárias quase que por definição têm como objetivo atingir níveis de auto-suficiência gerados por meio de recursos vindos da comunidade. Eles fazem isto para se assegurar que a fundação será orientada por líderes comunitários, propriedade da comunidade e terá as próprias prioridades definidas pela comunidade. Quanto mais e melhor os profissionais de desenvolvimento entenderem a comunidade, um maior fluxo de recursos poderá ser canalizado para elas. Isso é o que eu chamo de um encontro de grandes resultados!


Barry D Gaberman
Ex-vice Presidente da Fundação Ford. Pode ser contatado no bgaberman@gmail.com.
redeGIFE Online, 06/10/08

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Avaliação ainda causa confusão no campo social

O que se entende por avaliação no campo social e como seu processo é implementado em 211 empresas com investimentos comunitários. Esse foi o enfoque de pesquisa divulgada pelo Instituto Fonte e pela Fundação Itaú Social, no último dia 2, que mostrou existir não só uma confusão conceitual sobre o tema, como também soluções caseiras para seu desenvolvimento.

Realizado pela TNS InterScience, empresa de pesquisa de mercado, com apoio do GIFE, o levantamento trouxe dados curiosos quanto ao planejamento, aplicação e validação das análises realizadas pelas empresas. Enfim, o “estado da arte” da avaliação do setor privado sobre seus projetos, nos anos de 2006 e 2007.

“Quando a idéia de filantropia passou a ser investimento social, foi incorporado o conceito de resultado. O objetivo da pesquisa foi identificar as percepções e decisões dos investidores sobre a avaliação”, afirmou o presidente da agência, Paulo Roberto Secches, durante o evento de divulgação dos dados, na sede do Instituto Itaú Cultural, em São Paulo.

Entre os números apresentados, um dos que mais chamam a atenção se refere à questão central do trabalho: se a organização avalia seus projetos. Segundo as respostas, 75% afirmam que o fazem, contra 25%. No entanto, quanto estes 75% são questionados sobre o valor gasto nessa avaliação, 69% disseram “não saber”.

“Como não sabe? Se não tem essa informação é porque não o faz. Creio que o número verdadeiro, daqueles que realmente avaliam é o oposto, apenas 25%”, analisou Secches. Mesmo assim, ele não perdeu o otimismo: “creio que a resposta politicamente correta para isso é que, pelo menos, eles acham importante pensar em avaliação”.

Para aqueles que não fazem, os 25% restantes, apenas 2% não acham necessário realizar avaliação. Para os respondentes, as principais razões são: confiam nas organizações sociais que apóiam (28%), falta de recursos humanos e financeiros (21%) ou realizam ações de mensuração, mas não de forma estruturada (17%).

Outro número importante mostra quem são os responsáveis pela avaliação. Em 53% dos casos, ela é interna, coordenada pelos profissionais envolvidos nos programas. Isto é, em mais da metade há um conflito, em que não há diferença entre avaliador e avaliado. “Isso mostra uma solução caseira para o problema. Quem faz não pode avaliar, por melhor que seja a intenção”, argumentou Secches.

Confusão
Para analisar os dados da pesquisa, o Instituto Fonte e a Fundação Itaú Social realizaram um evento com a participação da diretora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Anna Maria Peliano, e do gerente de Projetos do GIFE, Fernando Nogueira. Eles trouxeram novos estudos para contextualizar o debate com a platéia. “Os dois maiores desafios globais atuais são como avaliar os resultados das ações sociais e como dar escala a esses projetos”, apontou Nogueira.

Ele apresentou alguns números do censo realizado pelo GIFE com seus associados, cujo investimento somado em iniciativas sociais chegou a R$ 1,3 bilhão em 2007, cerca de 72% das fundações e institutos e 74% das empresas fazem o monitoramento de todos os projetos. Dessas, 64% das fundações e institutos e 58% das empresas fazem avaliação de resultado de todos os projetos.

No entanto, segundo dados do IPEA, as empresas não tem sido tão eficientes quanto os associados ao GIFE. Para saber, o setor privado brasileiro investe cerca de R$ 5.3 bilhões por ano no campo social. O GIFE representa 20% desse montante, enquanto o resto do investimento está diluído em mais de 500 mil empresas. Essa é a base do estudo divulgado por Anna Maria Peliano. Realizado em cinco regiões do país, o levantamento concluiu que elas falham na hora de avaliar o destino dos recursos.

Questionadas se possuem avaliação documentada das ações sociais desenvolvidas, 79% disseram não. “Não há compreensão sobre o conceito, tal como não existem metas ou objetivos claros. Pelas entrevistas realizadas percebemos que os responsáveis pelos investimentos têm entusiasmo para fazê-lo, mas confundem monitoramento com avaliação”, afirmou.

A diretora acredita que essa imprecisão conceitual explica também os dados da pesquisa divulgada no último dia 2. Como falta formação para os respondentes, os dados tendem a mostrar números contraditórios, como por exemplo, o dos 69% que não sabem quanto investem. “Tal como não sabem quanto gastam, pois os custos estão diluídos nos custos administrativos do projeto”, lembrou.

Segundo ela, as formas de fortalecer a avaliação passam por quatro grandes desafios: definição de objetivos claros para os projetos; adoção de atividades plausíveis com os objetivos; execução adequada das atividades previstas; e diagnosticar as informações necessárias para acompanhar e julgar resultados.

A diretora do Instituto de Desenvolvimento Educacional, Cultural e de Ação Comunitária (Ideca), Simone Coelho, agregou pontos ao debate, ao deixar claro que a avaliação deve obrigatoriamente ser planejada durante a concepção do projeto. “Não ter recursos para realizá-la demonstra um equívoco. Se a ação nascesse com o propósito de ser avaliada, os custos já estariam na conta”, criticou.

Programa
A pesquisa divulgada na última quinta-feira faz parte um programa maior, idealizado pelo Instituto Fonte e pela Fundação Itaú Social, que irá, nos próximos anos, articular uma série de ações voltadas para empresas, ONGs e universidades.

“O instituto atua há 10 anos no desenvolvimento do campo da avaliação no País. Nesse tempo, percebemos que o debate é muito incipiente e não existe uma comunidade de avaliadores”, explica o consultor associado do Instituto Fonte, Daniel Brandão.

Ele afirma também que a produção teórica é muito reduzida, o que inviabiliza a difusão da cena crítica sobre avaliação. “Não entendemos esse campo. Quem faz? Como faz?”, argumenta.

O início dos trabalhos, o Instituto e a Fundação Fonte está centrado em dois grandes projetos. O primeiro é a pesquisa. Ao mesmo tempo, pretendem identificar e analisar a produção acadêmica brasileira. “Esses dois eixos permitirão conhecer o estado da arte da avaliação no campo social”, garante Brandão.

Com apoio do Instituto de Pesquisas e Projetos Sociais e Tecnológicos (IPSO), o programa pretende organizar, disponibilizar e caracterizar o que se estuda nas universidades, com a promoção de debates focais sobre o material. “Pretendemos tornar mais acessível um conteúdo mais qualificado produzido na academia”, define.


Rodrigo Zavala
redeGIFE Online, 06/10/08

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Unicef e RMG Connect lançam campanha "Doe uma Infância"

Ação incentiva pessoas a contarem histórias de seus tempos de criança.Foi lançada nesta quarta-feira (8) a campanha “Doe uma Infância”, primeira ação online desenvolvida pela RMG Connect para o UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância).

A campanha, iniciada no Mês das Crianças, convida as pessoas a contarem histórias marcantes de seus tempos de criança como forma de envolvê-las com a causa da infância. O principal objetivo da ação é despertar em quem escreve e lê as histórias o desejo de ajudar meninas e meninos mais vulneráveis e de contribuir com o trabalho realizado pelo UNICEF no Brasil.

Por meio do site http://www.doeumainfancia.org.br, o internauta pode relatar sua experiência de infância clicando em uma das fotos de brinquedos da página. Os brinquedos ficam coloridos quando o internauta publica sua história.

Depois de compartilhar a sua história e de ter a oportunidade de ler depoimentos de outras pessoas, o internauta pode ainda fazer uma doação ao UNICEF e ajudar a levar saúde, educação de qualidade e oportunidades para crianças em todo o país.

O usuário também pode ajudar a divulgar a campanha baixando a imagem do brinquedo escolhido com a frase “Eu doei a minha infância” e publicar o relato em seu site pessoal, no seu blog ou em comunidades virtuais como o Orkut.

“Doe uma Infância” contará também com diversas peças onlines e com uma divulgação via bluetooth que acontecerá ainda este mês em São Paulo nas lojas Café Suplicy, Rockafé e Chilli Beans. A ação será realizada em parceira com a Ponto Mob. A tecnologia bluetooth permite que as pessoas possam se conectar para trocar informações entre dispositivos como telefones celulares ou computadores e é usada em áreas de redes sem fio.

Participam na divulgação ou realização da campanha com o UNICEF e a RMG Connect: Weka, Web Traffic, Única, Ponto Mob, Café Suplicy, Rockafé, Chilli Beans, Estadão, MSN, Yahoo!, Terra, Vírgula, Estrelando, Bolsa de Mulher e Localweb.

O UNICEF não terá nenhum custo com a campanha “Doe uma Infância” como prova de que a RMG Connect está comprometida com os trabalhos da organização que é a principal referência mundial em assuntos relacionados aos direitos de crianças e adolescentes.


Envolverde, 09/10/08
© Copyleft - É livre a reprodução exclusivamente para fins não comerciais, desde que o autor e a fonte sejam citados e esta nota seja incluída.

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A crise das ONGs e das políticas sociais

Há mais de um ano as relações entre o Estado brasileiro e as organizações não-governamentais estão em estado quase catatônico, devido a um enrijecimento crescente dos controles de convênios que regem as parcerias entre ambos.

As causas desse enrijecimento são múltiplas. O número de ONGs vem crescendo cada vez mais depressa, conforme os censos do IBGE das Fasfil (fundações e associações sem fins lucrativos): em 1996, havia 107.332 no Brasil; em 2002, elas passaram a ser 275.895; em 2005 (último censo), eram 338.162. Se o ritmo de crescimento do último triênio meramente se manteve, o número de ONGs deve neste ano andar por volta de 416 mil.

A análise dos resultados do censo de 2005 pelo IBGE aponta algumas razões desse crescimento acelerado: "A idade média das Fasfil, em 2005, era 12,3 anos, e a maior parte delas (41,5%) foi criada na década de 1990.

Entre os vários fatores que contribuíram, naquele momento, para o crescimento acelerado dessas entidades, destaca-se o fortalecimento da democracia e da participação da sociedade civil na vida nacional".

Mais adiante, o texto do IBGE diz que a maioria das entidades a partir dos anos 1990 é voltada para a promoção do desenvolvimento e da defesa dos direitos e interesses dos cidadãos.

À medida que o Brasil se redemocratizou e passou a eleger governos cada vez mais comprometidos com políticas sociais de redistribuição da renda e de luta contra a exclusão social e a pobreza, era inevitável que essas políticas exigissem o engajamento de um número crescente de ONGs dedicadas à educação popular, à prevenção das causas da mortalidade infantil e subnutrição, à organização dos trabalhadores excluídos em associações autogestionárias e muitos outros objetivos análogos.

Com a expansão do número dessas entidades, vieram ONGs falsas, criadas para se apoderarem em proveito próprio de parte das verbas destinadas àquelas políticas.

As fraudes perpretadas pelas falsas ONGs são da mesma índole das praticadas pelos que desviam o recurso público destinado à compra de bens e à contratação de serviços a fim de assim se locupletarem.

As denúncias de fraudes cometidas por meio de ONGs repercutem do mesmo modo que os demais escândalos de corrupção, colocando-as num contexto que leva à suspeita todas as políticas sociais do governo federal.

Como reação natural, os órgãos de controle internos e externos ao governo passam a exigir novos controles, mais rígidos, além de substituir as parcerias entre o governo e as ONGs por chamadas públicas, o que destrói a confiança mútua construída em anos de colaboração entre os dois lados que conveniam e, em seu lugar, instaura a competição entre ONGs que atuam nos mesmos setores.

Estão sujeitos às novas regras institutos de pesquisa científica, entidades de assistência social, hospitais e universidades que não visam lucro, sindicatos, cooperativas, associações esportivas, entidades do Sistema S de ensino profissional, organizações indígenas, de quilombolas etc.

É óbvio que fraudes têm de ser prevenidas e severamente reprimidas, mediante controles cuidadosos e eficazes da natureza da entidade a ser conveniada, do valor a ser expendido, da efetiva execução das ações programadas e dos resultados alcançados.

Mas é fundamental evitar que os controles se somem e se multipliquem, o que não aumenta sua eficiência, só absorve recursos que deveriam ser aplicados na realização dos objetivos dos convênios.

Infelizmente, chegou-se ao extremo de assimilar os procedimentos dos convênios com ONGs aos da contratação de empresas de porte com fins de lucro. O que praticamente impede a realização de convênios com ONGs pobres, emanadas de comunidades carentes, as quais prestam serviços relevantes. E tende a entregar ao mercado a prestação de toda a gama de serviços acima referidos.

Não há motivos para duvidar das boas intenções dos que promovem a exacerbação dos controles, mas seus efeitos tendem a ser desastrosos para o povo pobre, que depende de serviços gratuitos de saúde, educação, assistência social etc.

É necessário que o desenho dos controles tenha a participação não só de representantes dos órgãos de controle e prevenção de fraudes mas também dos órgãos do governo que realizam convênios para cumprir as missões que a lei lhes atribui e sobretudo dos representantes das próprias ONGs autênticas, que são as maiores interessadas em coibir as práticas desonestas, que só as prejudicam, como as ocorrências do último ano fartamente comprovam.


Paul Singer
76, economista, professor titular da Faculdade de Economia e Administração da USP, é secretário nacional de Economia Solidária do Ministério do Trabalho e Emprego. Foi secretário municipal do Planejamento de São Paulo (gestão Luiza Erundina).
Envolverde, 10/10/08
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Ecoshop vence 4º Prêmio de Responsabilidade Social e Sustentabilidade no Varejo

Fortalecer a produção de artesanato do Amazonas dentro de um padrão que valorize a autenticidade e a preservação do meio ambiente. Essa é a missão da Ecoshop que venceu na categoria Microempresa o 4º Prêmio de Responsabilidade Social e Sustentabilidade no Varejo.

O evento é realizado pelo Centro de Excelência em Varejo da Fundação Getúlio Vargas (FGV-EAESP). Foram premiados trabalhos em seis categorias: micro, pequena, média e grande empresas, shopping center e entidade varejista.

Os organizadores receberam neste ano 104 inscrições de projetos de responsabilidade social/sustentabilidade de empresas e varejistas espalhados pelo País dos mais diversos segmentos. As categorias micro, pequena e média empresas foram responsáveis pela apresentação de 45% dos projetos, sendo seguidas pelo setor de grandes companhias, com 23%, de shoppings, com 12% , e de entidades varejistas (19%).

Ecoshop
Desde 1992, a Ecoshop é a primeira empresa do ramo de artesanato no Amazonas a desenvolver uma linha de ação fundamentada no conceito de desenvolvimento sustentável, valorizando a produção artesanal de caboclos e índios, orientando essa produção e contribuindo para que inúmeras famílias possam tirar seu sustento da atividade artística.

A iniciativa vencedora da Ecoshop será apresentada durante o 6º Seminário de Responsabilidade Social e Sustentabilidade no Varejo, que acontecerá no dia 29 de outubro de 2008, no Auditório da FGV-EAESP. Informações no email: premiocev@fgv.br ou ligue nos telefones: (11) 3281-3276 ou 3281-3654.

Conheça os projetos vencedores:
Microempresa: Ecoshop, de Manaus, com o projeto Ecoshop.
Pequena empresa: Franquia O Boticário - São Paulo e Osasco, projeto Mulheres Fabulosas.
Média empresa: Supermercados Cardoso, Jequié, projeto Sensibilização para a Coleta Seletiva de Materiais Recicláveis.
Grande empresa: Leo Madeiras, São Paulo, Escola de Marcenaria Moderna.
Shopping Center: CenterVale Shopping, São José dos Campos, projeto Desenvolvimento Sustentável, Arquitetura e Meio Ambiente.
Entidade varejista: Sincopetro, São Paulo, projeto Diga Não à Adulteração de Combustíveis.


Andressa Besseler, da Envolverde
Agência Envolverde,10/10/08
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Thais Corral: educação para sustentabilidade é mais que uma disciplina, é uma nova forma de estar no mundo

Thais Corral: educação para sustentabilidade é mais que uma disciplina, é uma nova forma de estar no mundo

Confira entrevista com a especialista em comunicação social e liderança, membro do Conselho Consultivo do Akatu, que há anos vem trabalhando com questões relacionadas a gênero, desenvolvimento sustentável, governança local e global.

O termo ‘sustentabilidade’ vem ganhando força. Profissionais das mais variadas áreas procuram especialização. Empresas, escolas, faculdades, instituições e governo tentam entender o que é, para que serve e como implantá-la de fato. A questão é complexa e existem profissionais que já estão envolvidos nisso há muitos anos.

Este é o caso de Thais Corral, que vem trabalhando com temas relacionados a sustentabilidade desde 1990. “Por ser esta uma área central na minha trajetória de vida, todos os projetos em que estou envolvida têm a ver com a sustentabilidade. Eu diria, porém, que não é só ambiental e sim a busca de uma integração entre a sustentabilidade ambiental e outras sustentabilidades, pois todas elas estão integradas”, afirma ela. Descrever Thais Corral não é nada fácil, a começar pelo currículo extenso*. Sua experiência perpassa diferentes setores. É possível considerá-la pioneira na questão da educação para a sustentabilidade e no desenvolvimento de lideranças.

Você é presidente do Conselho da ABDL (Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Liderança). Quais os desafios de uma instituição pioneira na educação para a sustentabilidade?
Thais Corral: Os pioneiros têm a seu favor o fato de poder experimentar e tornar-se referência. Correm por outro lado o risco de tornarem-se obsoletos sem se dar conta. Muitas vezes, quando se tem sucesso com um projeto, é difícil perceber o que a dinâmica das mudanças pede. O início da ABDL foi concomitante com o da internet. Fomos uma das primeiras organizações de educação no Brasil a usá-la como ferramenta de trabalho. Hoje, grande parte das organizações utiliza a internet, e esse diferencial que tínhamos não existe mais.

A ABDL hoje se diferencia por três aspectos. O primeiro deles está no DNA do programa e esteve sempre presente: é propiciar a possibilidade de uma interação multi-setorial. A ABDL sempre investiu para ter em suas turmas um equilíbrio na diversidade entre os participantes provenientes do terceiro setor, setor privado, governo e mídia. A interação entre os setores, a formação de uma rede de colaboração entre lideranças que provêm de vários setores é um dos propósitos do programa.

O segundo aspecto é a dinâmica do aprendizado que se dá a partir da elaboração de projetos que cada um dos participantes no programa desenvolve durante o período de interação com os outros membros do grupo. Essa perspectiva de aprender a partir da prática vem se demonstrando muito positiva, pois permite a interação com os outros membros do grupo, facilitadores e docentes de forma mais efetiva.

O terceiro é o desenvolvimento de habilidades pessoais que também chamamos de recursos internos. Nossos encontros presenciais são feitos em lugares onde há uma forte presença da natureza, do cuidado com as pessoas e isso acaba facilitando uma relação mais profunda consigo próprio e com as outras pessoas. Nossa abordagem de desenvolvimento de liderança está inspirada na visão de que a sustentabilidade tem que se dar no nível das pessoas com elas mesmas, com as outras pessoas e com o planeta.

O que é, para você, educação para a sustentabilidade? É possível implantá-la? Como?
Thais Corral: Na realidade a educação para a sustentabilidade é hoje a principal educação, já que encontrar alternativas para a crise ambiental, e em particular à crise climática, passou a ser essencial para que continuemos a ter as nossas bases de vida no planeta. Não se trata mais de um tema complementar. A questão é que é mais do que uma disciplina, trata-se de uma nova forma de estar no mundo. No programa Liderança para a Segurança Climática que a ABDL lançou este ano estamos abordando o tema da sustentabilidade e a transformação individual é central. Sabe-se hoje que sem que a pessoa se disponha a um processo de transformação, os resultados não são profundos o suficiente a ponto de obter uma mudança à altura dos desafios da sustentabilidade.

Qual era o perfil da liderança há alguns anos, como é hoje e o que você pensa que pode ser a liderança num mundo sustentável?
Thais Corral: Até alguns anos atrás o modelo de liderança mais comum era o do comando e controle, muito baseado na autoridade e no poder de coerção. Ao líder era concedido o poder de proteger, dirigir, orquestrar os conflitos, alocar papéis na sociedade. Em geral o estereótipo do líder estava associado ao do macho alfa dos chimpanzés. Os atributos de força e poder psíquico para coagir, para impor uma norma eram muito importantes. Essa percepção vem mudando em função de todas as conquistas sociais e democráticas do século 20 e da complexidade dos problemas. Hoje, a capacidade de liderar exige habilidades que vai muito além da força, tem muito mais a ver com a capacidade de influência, de apoiar as pessoas a fazer um processo de adaptação para a mudança. Tem a ver com empatia, cuidado e capacidade de ajudar as pessoas num processo de transformação que é necessário.

Como desenvolver lideranças em linha com as idéias de sustentabilidade?
Thais Corral: A emergência dessa liderança depende do desenvolvimento de recursos pessoais e interpessoais que permitam a emergência da inteligência coletiva, ajudando as pessoas a criarem as condições necessárias para as mudanças que tem que ocorrer. A questão da segurança climática oferece uma oportunidade única por contemplar o aspecto do tempo. A transformação para estabilizar o clima terá que acontecer nos próximos 20 anos. Isso significa uma grande mudança nos padrões de produção e consumo que irão impactar fortemente nossas vidas.

Qual o papel da mulher nesse processo?
Thais Corral: Mais do que a mulher enquanto categoria de gênero propriamente dita são as qualidades do feminino (empatia, cuidado, flexibilidade) que podem estar presente em mulheres e homens que fazem uma grande diferença neste momento. A mulher continua a ter um papel importante por estar muito presente no âmbito da reprodução da sociedade, na educação das crianças, no cuidado da família, dos velhos, das comunidades. A questão é que até agora esse trabalho foi invisível, neste momento de crise esse papel se torna muito mais visível e ganha relevância inclusive em nível das políticas públicas que valorizam o desenvolvimento do capital humano, fundamental para que superemos a crise da sustentabilidade e da nossa cultura.

Conte-nos um pouco sobre o seminário internacional "Megacidades e Mudanças Climáticas", organizado pelo LEAD Internacional (www.lead.org) instituição à qual a ABDL está vinculada.
Thais Corral: O Programa Liderança para a Segurança Climática (LSC) faz parte de um conjunto de mudanças curriculares e organizacionais que vem ocorrendo na ABDL desde 2001, quando a organização deixou de receber recursos institucionais da Fundação Rockefeller, principal patrocinador do programa de formação de lideranças para a sustentabilidade. Essas mudanças se traduzem também em novas articulações institucionais, novas temáticas e na busca da sustentabilidade econômico-financeira.

Como parte de seu processo formativo, o Programa de Liderança para a Segurança Climática, 13ª turma do Programa LEAD Brasil, terá seminário internacional realizado na cidade do México, entre 16 e 22 de novembro próximo. O seminário reunirá lideranças de todo o mundo para trabalhar o tema 'Megacidades e Mudanças Climáticas: cidades sustentáveis num mundo em mudança'.

O seminário, promovido pelo LEAD International e pelo LEAD México, é uma chance única de compartilhar conhecimento e informação com participantes do Programa LEAD vindos de cinco continentes. A turma 13 do programa LEAD é realizada em 11 centros ao redor do mundo e reúne a diversidade cultural de mais 40 países.

Sob o tema-chave das Megacidades no contexto do mundo em transformação, serão formadas quatro unidades temáticas: Água e Saneamento, Produção e Consumo de Energia, Uso da terra e planejamento urbano, e Transporte e Mobilidade urbana.

Os seminários internacionais são também uma chance para entrar em contato com os participantes de programas semelhantes em outros países e poder ter essa exposição a outras culturas e visões. Os seminários internacionais também estão no DNA da LEAD Internacional.

Você é coordenadora do Projeto Pintadas Solar, um dos cinco vencedores do prêmio SEED de 2008. Qual o objetivo dessa rede global? E quais são os objetivos do Projeto?
Thais Corral: A iniciativa SEED ( http://www.seedinit.org), é uma rede global fundada pelas organizações IUCN, PNUD e PNUMA, que tem como missão promover parcerias em prol do desenvolvimento sustentável em sintonia com as Metas de Desenvolvimento do Milênio e a Cúpula de Desenvolvimento Sustentável também conhecida como Rio +10.

Selecionado entre mais de 400 projetos de várias partes do mundo, Pintadas Solar conquistou o prêmio pela estratégia inovadora do projeto que promove o uso de tecnologias apropriadas de irrigação e bombeamento de água com o objetivo de fortalecer a agricultura de pequena escala, a segurança alimentar e a geração de renda no promissor mercado brasileiro dos bio-combustíveis. Um dos principais objetivos do projeto é desenvolver estratégias de adaptação às mudanças do clima que se fazem particularmente sentir nas regiões semi-áridas onde a escassez de chuva e as temperaturas altas acabam por agravar a situação já muito difícil.

O projeto leva o nome do município, de apenas 11 mil habitantes situado a 250 KM de Salvador. Em Pintadas, quase todos os 1.600 domicílios rurais contam com cisternas para armazenar água de chuva. Esse fato somado à forte organização comunitária atraiu o interesse de parceiros externos para realização do projeto Pintadas Solar, cuja fase piloto durou dois anos, de 2006 a 2008.

Agora partiremos para a segunda fase do projeto que será de dar escala às ações piloto. Pretendemos implementar nesta próxima etapa todos os aspectos que podem fazer do projeto Pintadas Solar um modelo a ser replicado não só no Brasil como no mundo.

Você está envolvida em vários projetos cujo foco é a sustentabilidade. Conte-nos um pouco sobre essas iniciativas.
Thais Corral: Sustentabilidade é uma área em que venho trabalhando desde 1990. Por ser esta uma área central na minha trajetória de vida, todos os projetos em que estou envolvida têm a ver com a sustentabilidade. Eu diria, porém, que não é só ambiental e sim a busca de uma integração entre a sustentabilidade ambiental e outras sustentabilidades, pois todas elas estão integradas.

Sou co-diretora de capacitação da Rede Sul Sul Norte (http://www.southsouthnorth.org), que existe em 6 países e implementa projetos de mitigação e adaptação à mudança climática com redução da pobreza. Sou também co-coordenadora do projeto da Comunidade Júlio Otoni (http://julio-otoni.org) que tem por objetivo transformar uma favela do Rio de Janeiro numa comunidade saudável. Sou também uma das fundadoras do Centro de Desenvolvimento Vista Alegre (www.vista-alegre.org), o lugar é um dos mais especiais no entorno do Rio de Janeiro com a presença de cachoeiras e da mata atlântica. Lá, a exuberância do lugar está unida ao cuidado de cada detalhe, da comida ao tratamento das pessoas. Vista Alegre tem como principal proposta acolher programas e oficinas de desenvolvimento de lideranças.

No nível internacional sou também co-diretora da REDE Global Leadership, nossa visão é a de levar trabalhar uma visão da liderança que articule setores, culturas, além do desenvolvimento de habilidades internas e externas em prol de propiciar as bases para uma mudança civilizatória.

* Thais Corral - sua área de interesse atual se dá no campo do desenvolvimento de lideranças para a transição para a sustentabilidade. Coordena a Rede de Desenvolvimento Humano (REDEH) desde 1990. É também presidente do conselho diretor da Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Lideranças (http://www.abdl.org.br) e membro do conselho deliberativo do LEAD Internacional (http://www.lead.org). É também co-diretora da Global Leadership Network (http://www.globalleadershipnetwork.net) que acaba lançar o livro “Leadership is Global” no qual 22 autores provenientes de várias disciplinas, setores e áreas do planeta compartilham visões e práticas inovadoras que fortalecem a perspectiva de sustentabilidade. Ela também faz parte do Conselho Consultivo do Instituto Akatu.


Naná Prado, para o Instituto Akatu
Envolverde, 10/10/08
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O Museu Lasar Segall realiza na terça-feira (14) tradicional leilão anual de pratos de arte, em prol da instituição. A 11ª edição do evento, organizado pela Associação Cultural de Amigos do Museu Lasar Segall com apoio do Ateliê Barro Blanco e restaurante Trio, tem campanha publicitária criada pela Ogilvy, com direção de criação de Rubens Filho e veiculação no jornal Folha de S.Paulo.

Em uma das peças, um convite ao público com a frase "Como em qualquer restaurante, quando quiser um prato é só levantar o braço". A agência também criou ação para o restaurante Trio (local do leilão), durante este mês, com ilustração de um prato em jogo americano com o título "Enquanto os outros não ficam prontos, desenhe aqui o seu". Os clientes que frequentam o restaurante recebem giz de cera para desenhar.

O artista Feres Khoury comandará o XI Leilão de Pratos que terá 48 participantes, entre eles Regina Silveira, Sérgio Fingermann, Iran do Espírito Santo, Arnaldo Bataglini e o argentino León Ferrari.

No ano passado, prato produzido por Carmela Gross foi arrematado por R$ 12 mil, em disputa acirrada. "A generosidade dos artistas tem ajudado o leilão a fazer história no cenário das artes brasileiras e manter viva a tradição das oficinas do Museu Lasar Segall", afirma Sonia Matarazzo, da associação de amigos do museu.


Meio & Mensagem Online, 10/10/08

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