terça-feira, 14 de outubro de 2008

Avaliação ainda causa confusão no campo social

O que se entende por avaliação no campo social e como seu processo é implementado em 211 empresas com investimentos comunitários. Esse foi o enfoque de pesquisa divulgada pelo Instituto Fonte e pela Fundação Itaú Social, no último dia 2, que mostrou existir não só uma confusão conceitual sobre o tema, como também soluções caseiras para seu desenvolvimento.

Realizado pela TNS InterScience, empresa de pesquisa de mercado, com apoio do GIFE, o levantamento trouxe dados curiosos quanto ao planejamento, aplicação e validação das análises realizadas pelas empresas. Enfim, o “estado da arte” da avaliação do setor privado sobre seus projetos, nos anos de 2006 e 2007.

“Quando a idéia de filantropia passou a ser investimento social, foi incorporado o conceito de resultado. O objetivo da pesquisa foi identificar as percepções e decisões dos investidores sobre a avaliação”, afirmou o presidente da agência, Paulo Roberto Secches, durante o evento de divulgação dos dados, na sede do Instituto Itaú Cultural, em São Paulo.

Entre os números apresentados, um dos que mais chamam a atenção se refere à questão central do trabalho: se a organização avalia seus projetos. Segundo as respostas, 75% afirmam que o fazem, contra 25%. No entanto, quanto estes 75% são questionados sobre o valor gasto nessa avaliação, 69% disseram “não saber”.

“Como não sabe? Se não tem essa informação é porque não o faz. Creio que o número verdadeiro, daqueles que realmente avaliam é o oposto, apenas 25%”, analisou Secches. Mesmo assim, ele não perdeu o otimismo: “creio que a resposta politicamente correta para isso é que, pelo menos, eles acham importante pensar em avaliação”.

Para aqueles que não fazem, os 25% restantes, apenas 2% não acham necessário realizar avaliação. Para os respondentes, as principais razões são: confiam nas organizações sociais que apóiam (28%), falta de recursos humanos e financeiros (21%) ou realizam ações de mensuração, mas não de forma estruturada (17%).

Outro número importante mostra quem são os responsáveis pela avaliação. Em 53% dos casos, ela é interna, coordenada pelos profissionais envolvidos nos programas. Isto é, em mais da metade há um conflito, em que não há diferença entre avaliador e avaliado. “Isso mostra uma solução caseira para o problema. Quem faz não pode avaliar, por melhor que seja a intenção”, argumentou Secches.

Confusão
Para analisar os dados da pesquisa, o Instituto Fonte e a Fundação Itaú Social realizaram um evento com a participação da diretora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Anna Maria Peliano, e do gerente de Projetos do GIFE, Fernando Nogueira. Eles trouxeram novos estudos para contextualizar o debate com a platéia. “Os dois maiores desafios globais atuais são como avaliar os resultados das ações sociais e como dar escala a esses projetos”, apontou Nogueira.

Ele apresentou alguns números do censo realizado pelo GIFE com seus associados, cujo investimento somado em iniciativas sociais chegou a R$ 1,3 bilhão em 2007, cerca de 72% das fundações e institutos e 74% das empresas fazem o monitoramento de todos os projetos. Dessas, 64% das fundações e institutos e 58% das empresas fazem avaliação de resultado de todos os projetos.

No entanto, segundo dados do IPEA, as empresas não tem sido tão eficientes quanto os associados ao GIFE. Para saber, o setor privado brasileiro investe cerca de R$ 5.3 bilhões por ano no campo social. O GIFE representa 20% desse montante, enquanto o resto do investimento está diluído em mais de 500 mil empresas. Essa é a base do estudo divulgado por Anna Maria Peliano. Realizado em cinco regiões do país, o levantamento concluiu que elas falham na hora de avaliar o destino dos recursos.

Questionadas se possuem avaliação documentada das ações sociais desenvolvidas, 79% disseram não. “Não há compreensão sobre o conceito, tal como não existem metas ou objetivos claros. Pelas entrevistas realizadas percebemos que os responsáveis pelos investimentos têm entusiasmo para fazê-lo, mas confundem monitoramento com avaliação”, afirmou.

A diretora acredita que essa imprecisão conceitual explica também os dados da pesquisa divulgada no último dia 2. Como falta formação para os respondentes, os dados tendem a mostrar números contraditórios, como por exemplo, o dos 69% que não sabem quanto investem. “Tal como não sabem quanto gastam, pois os custos estão diluídos nos custos administrativos do projeto”, lembrou.

Segundo ela, as formas de fortalecer a avaliação passam por quatro grandes desafios: definição de objetivos claros para os projetos; adoção de atividades plausíveis com os objetivos; execução adequada das atividades previstas; e diagnosticar as informações necessárias para acompanhar e julgar resultados.

A diretora do Instituto de Desenvolvimento Educacional, Cultural e de Ação Comunitária (Ideca), Simone Coelho, agregou pontos ao debate, ao deixar claro que a avaliação deve obrigatoriamente ser planejada durante a concepção do projeto. “Não ter recursos para realizá-la demonstra um equívoco. Se a ação nascesse com o propósito de ser avaliada, os custos já estariam na conta”, criticou.

Programa
A pesquisa divulgada na última quinta-feira faz parte um programa maior, idealizado pelo Instituto Fonte e pela Fundação Itaú Social, que irá, nos próximos anos, articular uma série de ações voltadas para empresas, ONGs e universidades.

“O instituto atua há 10 anos no desenvolvimento do campo da avaliação no País. Nesse tempo, percebemos que o debate é muito incipiente e não existe uma comunidade de avaliadores”, explica o consultor associado do Instituto Fonte, Daniel Brandão.

Ele afirma também que a produção teórica é muito reduzida, o que inviabiliza a difusão da cena crítica sobre avaliação. “Não entendemos esse campo. Quem faz? Como faz?”, argumenta.

O início dos trabalhos, o Instituto e a Fundação Fonte está centrado em dois grandes projetos. O primeiro é a pesquisa. Ao mesmo tempo, pretendem identificar e analisar a produção acadêmica brasileira. “Esses dois eixos permitirão conhecer o estado da arte da avaliação no campo social”, garante Brandão.

Com apoio do Instituto de Pesquisas e Projetos Sociais e Tecnológicos (IPSO), o programa pretende organizar, disponibilizar e caracterizar o que se estuda nas universidades, com a promoção de debates focais sobre o material. “Pretendemos tornar mais acessível um conteúdo mais qualificado produzido na academia”, define.


Rodrigo Zavala
redeGIFE Online, 06/10/08


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