sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Empresa verde é quase sempre um mito

Ben Elgin, BusinessWeek
Publicado pelo
Valor Online em 16/11/07

Planta da Dow Chemical: empresa investiu US$ 1 bi na redução de 19% de emissões de 1994 a 2005, mas custos tecnológicos impossibilitam mais reduções até 2025
Foto Bloomberg

Auden Schendler teve aulas de ambientalismo empresarial diretamente da boca do profeta do movimento. No fim da década de 90, Schendler trabalhava como pesquisador no Rocky Mountain Institute, entidade de pesquisas e estudos em Aspen, Colorado, dirigida por Amory Lovins, lendário autor da idéia de que "abraçando a ecologia" as companhias podem ampliar seus lucros e, simultaneamente, salvar o planeta. Como Lovins dizia a Schendler, elevar a eficiência energética e reduzir emissões é não só um "almoço grátis", mas "um almoço que você é pago para comer".

Inspirado nessa promessa, em 1999 Schendler foi trabalhar na Aspen Skiing, tornando-se pioneiro de uma nova classe de executivos: o da "sustentabilidade empresarial". Oito anos depois, a empresa exibe seus feitos ambientais em seu marketing e decorou sua sede com troféus e placas comemorativas de sua postura ambientalista. No ano passado, a revista "Time" deu a Schendler, de 37 anos, o título de Defensor do Clima.

Mas Schendler não se sente triunfante. Ele pára o carro da empresa no acostamento de uma estrada de terra e desliga o motor. "Quem estamos enganando?" Apesar de seus esforços, a emissão de gases que causam o efeito estufa pela operadora de resorts continua a subir ano a ano. Mais gente de férias implica acomodações que consomem mais energia. Invernos mais quentes demandam toneladas de neve artificial, e mais energia. "Consegui viabilizar muitos projetos atraentes, mas fracassei no que me propus a fazer", diz ele. "Como tornar uma companhia verde? É quase impossível."

Praticamente não passa um dia sem que uma companhia importante anuncie ruidosamente seu mais recentes feitos ecológicos: varejistas reformando suas lojas para reduzir o consumo de energia; companhias de eletricidade desenvolvendo imaculados projetos de energia eólica; grandes bancos investindo bilhões de energia limpa. Não importa o que possam dizer os críticos de Al Gore, não há como negar que a mensagem do ganhador do Nobel da Paz foi ouvida. Com a crescente preocupação dos consumidores, as empresas querem mostrar que fazem parte da solução, diz Chris Hunter, ex-administrador de energia na Johnson & Johnson, que trabalha para a GreenOrder, uma consultoria ambiental. "Dez anos atrás, as companhias queriam de nós uma estratégia digital. Agora, querem uma estratégia ecológica."

Gestão ambiental tornou-se peça fundamental da construção de imagem empresarial. A General Electric diz estar gastando quase todo o seu orçamento multimilionário de publicidade institucional no "Ecomagination", seu elenco de produtos não agressivos ao meio ambiente, apesar de representar apenas 8% das vendas do conglomerado. Yahoo! e Google proclamaram que em 2008 seus escritórios e centros computacionais emitirão "zero carbono". O que alimenta o frenesi de relações públicas é a noção de que preservar o clima é melhor que ser economicamente viável. Mas Schendler, que até há poucos anos considerava-se um destacado defensor dessa teoria, agora refuta penosamente a crença em que práticas empresariais verdes produzem as "verdinhas", do tipo pecuniário.

Contrariando a sedutora tese de Lovins, muitas iniciativas simplesmente não economizam dinheiro. Elas implicam custos que minam a convicção de que a salvação ambiental pode ser barata.

Schendler range os dentes diante do fracasso de propostas modestas, como seu plano, no ano passado, de reformar uma das acomodações mais antigas do resort para consumir menos energia. Ele estimou que um projeto de US$ 100 mil iria pagar-se em sete anos mediante economia de eletricidade. Mas o dinheiro foi para novos teleféricos, snowmobiles e outras compras convencionais.

Freqüentemente vencido nas decisões, o executivo ambientalista admite ter cometido um erro, no ano passado, quando insistiu em que o marketing do resort fizesse ousadas "afirmações verdes" apoiadas na compra de "créditos de energia renovável". Os CER são um tipo de esquema financeiro ao qual as companhias vêm recorrendo cada vez mais para justificar afirmações de terem reduzido sua contribuição líquida para o aquecimento mundial. Mas a maioria dos CERs comumente empregados, que em tese resultam em que um terceiro desenvolva energia não poluente, acaba revelando-se extremamente duvidosa. A Aspen Skiing baseou-se em CERs para declarar ter "contrabalançado 100% de nosso consumo de eletricidade". Schendler agora admite que a afirmação era descabida.

A Aspen Skiing não é a única a fazer afirmações suspeitas sobre sua virtude ecológica. A desconsideração de créditos discutíveis de energia renovável esvaziaria as afirmações de benefícios climáticos por dezenas de importantes companhias celebradas por sua liderança ambiental. A Johnson & Johnson proclamou uma redução de 17% nas emissões de carbono desde 1990, predominantemente baseada em CERs. Descontados os créditos, a gigante farmacêutica teria registrado um aumento de 24% em suas emissões.

Em meio a afirmações inflamadas, algumas companhias têm registrado avanços ambientais legítimos. Dow Chemical e DuPont reduziram seus níveis de emissões. Mas ainda há razões para nos preocuparmos sobre comprometimento de longo prazo. A Dow diz ter investido US$ 1 bilhão para conseguir reduções de 19% de 1994 a 2005. Mas devido a dificuldades e custos tecnológicos, a Dow prevê que reduções adicionais não ocorrerão até 2025, daqui a 18 anos.

Grande parte do ambientalismo empresarial não passa de estatísticas e hipérboles enganosas. Para aferições confiáveis, os feitos genuínos precisam ser separados de gestos inócuos que visam apenas pacificar as consciências. Schendler já não considera o setor privado capaz das mudanças impactantes que considerava possíveis há oito anos, o tipo de mudanças que as companhias acostumaram-se a alardear. Seu próprio empregador é "um exemplo perfeito de porque isso não funcionará", diz ele.

Schendler conseguiu um trabalho, em 1997, no Rocky Mountain Institute (RMI), nas imediações de Aspen, do qual Lovins havia sido um dos fundadores 15 anos antes. Lovins, formado em física, estava trabalhando com sua mulher, L. Hunter Lovins, e o empresário Paul Hawken num livro denominado "Natural Capitalism", que tornou-se um best-seller. Ao repensar suas operações e selecionar sabiamente suas materiais, argumentava o livro, as companhias poderiam gerar menos poluição e lucrar mais.

Em 1999, Auden ficou sabendo que o Aspen Skiing, um complexo de hotéis e pistas de esqui freqüentadíssimo por gente rica em férias, estava buscando um diretor ambiental. O cargo parecia se encaixar perfeitamente. O setor de serviços a esquiadores, que consome enormes quantidades de energia para criar uma fantasia de permanentes montanhas de neve fofa e acolhedores refúgios alpinos, proporcionava um lugar ideal para pôr essas abstrações em prática.

A Aspen Skiing, uma companhia limitada de propriedade da família Crown, de Chicago - que faturou bilhões de dólares por sua participação no grupo General Dynamics, fornecedora de equipamentos ao Exército -, transpira genuína preocupação com a natureza, inclusive porque seus negócios derreteriam se as temperaturas subissem apenas alguns graus.

Seu primeiro alvo foi o Little Nell Hotel, com 90 quartos. A luxuosa infra-estrutura de hospedagem aninhada na base da montanha Aspen devora tanta eletricidade, que Schendler estava convencido de que seria fácil melhorar a eficiência. Ele disse ao então gerente, Eric Calderon, que queria instalar lâmpadas fluorescentes em todos os quartos de hóspedes. As novas lâmpadas durariam dez vezes mais tempo, consumiriam 75% menos potência e se pagariam em apenas dois anos. A resposta foi negativa. Calderon preocupava-se com que uma lâmpada fluorescente sugeriria um ambiente de sala de espera, pondo em risco a classificação cinco estrelas do estabelecimento. "Sempre há uma necessidade de equilibrar preocupações ambientais e a satisfação das expectativas da clientela", diz ele.

Schendler voltou sua atenção para a garagem subterrânea do Little Nell. Os hóspedes nunca a viam, porque manobristas estacionavam todos os carros. Schendler disse que, por US$ 20 mil, poderia substituir luminárias fluorescentes de 175 watt por lâmpadas, e economizar US$ 10 mil por ano. Sem se deixar impressionar, Calderon novamente rejeitou a proposta. Se ele dispusesse de US$ 20 mil para gastar, preferiria usá-lo em coisas que os hóspedes notariam: suntuoso mobiliário em couro ou novas louças para os banheiros.

Na reunião seguinte da alta administração da companhia, Schendler trouxe um cartaz para a apresentação de seus argumentos defendendo a nova iluminação para a garagem. Mas Donald Schuster, o diretor de infra-estrutura, não acreditava que o esquema proposto pouparia dinheiro. "Eu estava cético sobre os cálculos de retorno sobre o investimento de Auden referentes à mudança na iluminação", relembra Schuster. "Uma das preocupações foi de que estaríamos investindo em mudanças com base em retornos teóricos, sem nenhuma oportunidade real para aferir os retornos reais."

Foram precisos dois anos para que Schendler superasse a resistência à substituição da iluminação da garagem, e apenas depois que ele obteve uma dotação de US$ 5 mil de uma organização local sem fins lucrativos. Ele reconhece ser estranho que uma companhia com uma receita anual em torno de US$ 200 milhões, segundo gente do setor (a companhia nega-se a fornecer seus números), recorra a uma ONG para reduzir seu consumo de eletricidade.

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"Quem estamos enganando? ... Como tornar uma companhia verde? É quase impossível."
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Versões em maior escala dessa briga sobre luminárias estão acontecendo em diversas outras companhias. Elogiada por seu pioneirismo ambiental, a FedEx diz em seu website estar "comprometida com a adesão a inovações e tecnologias para minimizar a geração de gases causadores do efeito estufa". Com 70 mil carros e caminhões e 670 aviões torrando combustível, a maior transportadora de encomendas do mundo é uma enorme produtora de gases que aprisionam calor. Em 2003, a FedEx anunciou que em breve começaria a utilizar caminhões híbridos "limpos" ao ritmo de 3 mil por ano, chegando ao ponto de evitar o lançamento de 250 mil toneladas de gases de efeito estufa anualmente na atmosfera por seus veículos de motores a diesel. "Esse programa poderá substituir os 30 mil caminhões de médio porte da companhia nos próximos dez anos", anunciou a FedEx à época. A Agência de Proteção Ambiental (EPA, na sigla em inglês) deu à iniciativa um prêmio de "Clean Air Excellence".

Quatro anos depois, a FedEx tinha comprado menos de cem caminhões híbridos, ou seja, menos de um terço de 1% de sua frota. Com preços a partir de US$ 70 mil, os híbridos custam pelo menos 75% mais do que os caminhões convencionais, embora a economia de combustível deva cobrir a diferença durante os dez anos de vida útil dos veículos. A FedEx, que registrou lucro recorde de US$ 2 bilhões para o ano fiscal findo em 31 maio, decidiu que equilibrar os custos com a economia de uma década não representava a o melhor emprego de capital pela companhia. "Nós temos uma responsabilidade fiduciária para com nossos acionistas", diz Mitch Jackson, diretor ambiental da FedEx. "Não podemos subsidiar o desenvolvimento dessa tecnologia em benefício de nossos concorrentes."

Schendler tem de enfrentar a questão do retorno sobre investimentos de quase todas as propostas que defende. Hierarquicamente, ele está abaixo da alta administração da Aspen Skiing, mas participa da maioria de suas reuniões importantes. Schendler nunca sossega, metendo o nariz em tudo.

Um das vitórias de que Schendler mais se orgulha é a pequena usina hidrelétrica que, para ser instalada em uma das encostas usadas pelos esquiadores, custou US$ 150 mil à companhia em 2003. Ela é acionada durante dois meses do ano por um córrego caudaloso quando a neve derrete. A despeito do empenho, Schendler começa a sentir mais frustração. Somados, os projetos de energia hídrica e solar poderão chegar a gerar menos de 1% da necessidades energéticas da companhia. Empenhado em promover uma iniciativa inédita no setor, em 2005 decidiu explorar os créditos de energia renovável.

Lançados no início da década, os CERs visavam canalizar as forças de mercado em apoio às energias eólica e solar. Os desenvolvedores de energia limpa vendem CERs, geralmente quantificados em megawatt-horas de eletricidade, para compradores que desejem contrabalançar a poluição que geram investindo em energia não agressiva ao meio ambiente.

Schendler sabia que os CERs e transações financeiras similares estavam conquistando rápida popularidade, à medida que mais companhias buscavam credibilidade ambientalista e proliferavam os corretores de CERs. Em 2006, ele convenceu seus superiores a gastar US$ 42 mil por ano, ou seja, um ágio de 2% sobre os custos energéticos da companhia, para comprar CERs por aproximadamente US$ 2 o megawatt-hora. De acordo com princípios comumente aceitos, esse investimento, menos de um terço do necessário para construir a usina hidrelétrica, permitiu que a Aspen Skiing afirmasse ter contrabalançado todo o seu uso de energia da queima de carvão.

Colegas não pouparam elogios a Schendler. Em comunicado à imprensa, Pat O´Donnell, então CEO da companhia, disse: "Esta compra representa nosso princípio norteador em ação". Elogios chegaram da EPA; jornais noticiaram o feito.

Ele gastou horas ponderando sobre como descrever, para fins de marketing, a compra dos CERs. Segundo a formulação que concebeu, a Aspen Skiing tinha contrabalançado "100% de nosso emprego de eletricidade com créditos de energia eólica, evitando o lançamento de 455 toneladas de poluição na atmosfera". Essa mensagem foi afixada nos teleféricos, impressa em livretos promocionais e repetida em incontáveis e-mails enviados pela companhia.

Mas, mesmo enquanto participava do lançamento dessa campanha, uma sensação constrangedora apossou-se de Schendler. Ele suspeitava de que os créditos de carbono não implicava a construção de fazendas eólicas. Literalmente, eles não estavam contrabalançando coisa alguma. Ele se sentiu angustiado. "Sei claramente o que é certo e o que funciona e o que importa", diz ele. "Também tenho consciência do posicionamento de marca. Parte do meu trabalho é manter a liderança [da Aspen Skiing]. O setor vai assumir essa postura em grande estilo. Um pequeno resort na Califórnia já tinha inaugurado a tendência e precisávamos avançar. Meu consolo era o valor educacional da iniciativa. As discussões que provocariam seriam valiosas, mesmo se os CERs não tivessem repercussão real."

Sua previsão foi correta. No ano e meio após a compra de CERs, mais de 50 outras operadoras de resorts para esquiadores também adquiriram os certificados. Nada menos que 28 delas alegaram usar "100% de energia eólica". Seduzidas por um esquema barato que permite propagandear-se como responsáveis em relação ao meio ambiente, companhias em outros setores têm se mostrado igualmente entusiasmadas.

Em vez de desfrutar seu papel como pioneiro no esquema dos CERs, Schendler sentiu-se cada vez mais preocupado. Reservadamente, ele pressionou os corretores de CERs a fornecer evidências concretas da construção de capacidade de geração eólica. A reação evasiva deles o atormentava. O problema decorre da equação econômica básica dos CERs. É lógico que créditos comprados a US$ 2 por megawatt-hora, o preço pago pela Aspen Skiing e por muitas outras companhias, não podem produzir grandes conseqüências. As geradoras de eletricidade eólica recebem cerca de US$ 51 por megawatt-hora pela eletricidade que vendem para as companhias distribuidoras de eletricidade. Elas recebem outros US$ 20 em incentivos tributários federais, e o equivalente a até outros US$ 20 na forma de depreciação acelerada de seu capital em equipamentos. Até mesmo muitos desenvolvedores de equipamentos para conversão da energia eólica potencialmente beneficiários dos CERs admitem que as geradoras que ganham US$ 91 por megawatt-hora não irão expandir a produção por outros US$ 2.

Algumas companhias empregam métodos mais diretos, por exemplo, construindo sua própria capacidade adicional de geração de energia limpa. Em agosto, o Jiminy Peak Mountain Resort, em Hancock, Massachussets, pôs em funcionamento uma nova turbina eólica com altura de 120 metros e capacidade para suprir 50% da demanda de eletricidade do resort. O projeto levou três anos para ser concluído e custou US$ 4 milhões.

Mas muitas companhias de maior porte defendem sua política de custo mais baixo. Mark Buckley, vice-presidente da Staples para questões ambientais, defende os CERs, dizendo que eles "indiscutivelmente mandaram o recado correto ao mercado".

No primeiro semestre deste ano, Schendler concluiu que tinha de reverter seu curso, convencer seu empregador a distanciar-se dos créditos de energia renovável que endossara apenas meses antes - e defender projetos verdes mais significativos. Seus colegas reagiram com perplexidade e irritação. A companhia continuará a comprar CERs pelo menos até 2008, quando caduca seu atual contrato. Seus executivos dizem-se relutantes em interromper as compras de CERs antes desse prazo, porque não querem passar uma imagem de indiferença diante dos problemas ambientais, quando concorrentes afirmam ser movidos exclusivamente por energia eólica.

Schendler, em contrapartida, tornou-se um destacado crítico das CERs, uma posição potencialmente confusa, pois seu empregador as compra. Em abril, em carta ao Center for Resource Solutions, uma organização sem fins lucrativos em San Francisco que certifica créditos, ele disse que os CERs têm igual efeito sobre o desenvolvimento de novos projetos de energia renovável quanto teria o comércio de "pedras, notas promissórias ou abobrinhas".

Hoje, simultaneamente dentro e fora de círculos ambientalistas empresariais, Schendler delicia-se com sua notoriedade. "A idéia de que posturas ecológicas são divertidas, fáceis e baratas é perigosa. Ser verde implica trabalho duro. A coisa toda é complexa. Nem sempre lucrativa. E as companhias precisam inaugurar o placar e passar efetivamente a fazer algo."

(Tradução de Sergio Blum)

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O marco legal do cooperativismo

Mauro Scheer Luís*
Publicado pelo
Valor Online em 16/11/07

Muito se discute sobre a flexibilização da legislação trabalhista. No meio da discussão, temos o seguinte embate público: de um lado, os firmes e no mais das vezes irredutíveis defensores dos direitos adquiridos dos trabalhadores, sobretudo aqueles obtidos desde a época do governo de Getúlio Vargas. Estamos falando de direitos como férias, décimo-terceiro salário, Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), entre outros. Do outro lado, estão os defensores da flexibilização como forma de criação de novos postos de trabalho.

A flexibilização, entretanto, não pode ser entendida como a supressão de direitos já conquistados pelos trabalhadores. A compreensão deve ser ampla, e neste aspecto, é mais factível discutirmos a flexibilização das relações de trabalho, e não apenas da legislação já existente. Novas formas de trabalho devem ser criadas e melhoradas, de forma a satisfazer não só as necessidades dos trabalhadores, mas também a realidade do mercado atual. É com pesar que o brasileiro recebe notícias como as que hoje estão sendo divulgadas pela mídia, de que o Brasil perde bilhões em exportações em função da falta de competitividade em relação à China. Com efeito, em países como a China, a mão-de-obra, além de precarizada (em alguns casos ela é escrava ou semi-escrava), não sofre a incidência dos onerosos encargos trabalhistas e previdenciários que por aqui existem.

O cooperativismo do trabalho, por exemplo, é uma relação de trabalho que vem crescendo cada vez mais na Europa, nos Estados Unidos e também no Brasil. Em nosso país, contudo, em parte pelo desconhecimento de empresários, governantes e até de advogados e magistrados, e em parte pela ação fraudulenta de algumas cooperativas, o ramo "trabalho" do cooperativismo é crucificado e condenado de forma constante. De fato muitas cooperativas de trabalho atuam de forma fraudulenta, evidenciando a precarização da mão-de-obra e a instituição de verdadeiros "donos" de cooperativas, figuras que jamais poderiam existir dentro do sistema cooperativista.

Entretanto, são muitos os benefícios da associação de um trabalhador a uma cooperativa de trabalho que atue de forma congruente como o sistema cooperativista. O objetivo da cooperativa de trabalho não é locar nem intermediar mão-de-obra. Temos muitos exemplos positivos que podem ser citados. Na cidade de São Paulo, por exemplo, existem dezenas de cooperativas de reciclagem de lixo, que ora agem como cooperativas de trabalho, ora como cooperativas de produção. São associações de profissionais autônomos que catam lixo reciclável nas ruas e fazem o trabalho de prensagem, preparação e venda do material a empresas que, posteriormente, usarão esse material na fabricação de novos produtos. O que chama a atenção, entretanto, é a remuneração mensal que esses cooperados recebem em decorrência do seu trabalho: cerca de 30% a 50% a mais do que catadores de lixo que não se agrupam para um objetivo comum. Além disso, estão segurados e protegidos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), além de comprovarem de forma legal sua renda.

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Estamos muito próximos de definir o marco regulatório do cooperativismo de trabalho no país
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Por que as cooperativas são tão massacradas pela sociedade? É evidente que falta um marco regulatório. O parágrafo único do artigo 442 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) determina que não há vínculo de emprego entre os cooperados, cooperativas e tomadores de serviço. Por outro lado, o artigo 9º do mesmo diploma legal sentencia que, havendo manobras do empresário que objetivem fraudar a relação de emprego (ou seja, tentar transformar uma relação de emprego em algo que ela não é), o juiz pode decretar a nulidade do ato fraudulento, fazendo prevalecer a relação de emprego.

Estamos muito próximos de definir o marco regulatório. Trata-se do Projeto de Lei nº 7.009, de 2006, de iniciativa do Poder Executivo, e atualmente relatado pelo deputado Tarcísio Zimmermann. Ao citado projeto foram apensados outros, com o mesmo objetivo. Embora esse projeto, sem dúvida alguma, desvirtue alguns princípios cooperativistas em vigência na Europa e nos Estados Unidos - locais onde o número de cooperativas é extremamente grande -, o projeto, se aprovado, regulamentaria uma série de situações, tais como a questão dos direitos fundamentais, como jornada de trabalho, piso salarial, normas de saúde e segurança do trabalho, entre outras, estabelecendo melhores condições de trabalho.

Todavia, não bastará a aprovação de um projeto de lei para que as cooperativas passem a trabalhar de forma mais organizada e com maior respaldo legal. Será essencial a organização destas instituições e a formação de centros de treinamento, para a conscientização do cooperado e da população em geral sobre os princípios cooperativistas. Em outras palavras, é preciso que os trabalhadores "sejam" cooperados, e não apenas "estejam" cooperados por força do número crescente de falta de postos de trabalho. A diferença entre esses dois tipos de cooperados reside justamente na compreensão do verdadeiro cooperativismo pelos trabalhadores: a união de pessoas com um objetivo comum. Resta saber se o marco regulatório será finalmente aprovado. Façam suas apostas.

*Mauro Scheer Luís é advogado atuante na área do cooperativismo e direito do trabalho e sócio do escritório Scheer e Dias Advogados

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

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Programa do BID incentiva 'energia verde'

Mauro Zanatta, de Washington
Publicado pelo
Valor Online em 16/11/07

O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) está prestes a lançar um programa de US$ 300 milhões para incentivar investimentos de menor escala no campo da chamada "energia verde" em países da América Latina e do Caribe. Podem ser contemplados na iniciativa da instituição energias renováveis, biocombustíveis e projetos de eficiência energética.

O foco do novo programa, que deverá ser anunciado oficialmente ainda em novembro, serão os países menos desenvolvidos dessas regiões. O programa, que terá duração de cinco anos, prevê a concessão de empréstimos, garantias, assistência técnica e serviços para facilitar a aproximação com investidores interessados em operações de participações acionários, no modelo conhecido como "equity".

Pelas regras do BID, os empréstimos ficarão entre US$ 5 milhões e US$ 25 milhões. Os projetos selecionados terão um limite máximo por país de até US$ 120 milhões. Como a intenção do banco é desconcentrar a concessão desses empréstimos, um fatia de pelo menos 65% dos US$ 300 milhões serão destinados aos países menos desenvolvidos.

"Nossa idéia é levar essas iniciativas de 'energia verde' aos países menores", afirma o brasileiro Arnaldo Vieira de Carvalho, especialista en Energia Sustentável da Divisão de Finanças e Infra-Estrutura Básica do BID.

Sob o comando do colombiano Luis Alberto Moreno, entusiasta do incentivo aos biocombustíveis, o BID tem passado a atuar de forma mais sistemática no segmento. A carteira de investimentos na área soma US$ 1 bilhões em operações de financiamento estruturado nos segmentos de açúcar, etanol e co-geração de energia do bagaço da cana-de-açúcar. São três grupos dos Estados Unidos e um do Brasil.

"Mas nossa carteira pode chegar a cerca de US$ 3 bilhões no curto prazo", estima a peruana Sylvia Larrea, especialista do Departamento de Finanças Estruturadas e Corporativas do BID.

Em recente operação, o banco fechou o refinanciamento de US$ 120 milhões em dívidas de curto prazo da usina paulista Moema, que processa 4,5 milhões de toneladas de cana por ano, em conjunto com Itaú e o holandês Rabobank. A ação permitiu o alongamento, de cinco para até dez anos, no prazo de vencimento dos débitos. No início do mês, o BID fechou com o banco Indusval a primeira transação de comércio de biocombustíveis via garantia para cobrir nota promissória de financiamento à exportação de etanol brasileiro para a Inglaterra.

Outro foco importante do BID está na criação de um fundo para o setor privado com US$ 40 milhões para auxiliar no financiamento de estudos de viabilidade econômica em biocombustíveis e eficiência energética na Guatemala, Honduras, Paraguai, Peru, Colômbia, Panamá, República Dominicana, El Salvador, México e Chile.

O programa, que está aberto para a candidatura de novas projetos, inclui doação aos setores públicos desses países. "O BID também apóia uma rede de pesquisadores na América Central e oferecerá recursos para plantas piloto de produção de etanol de celulose", afirma Arnaldo Vieira de Carvalho.

O jornalista viajou a convite do Departamento de Estado dos EUA

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