segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Ethos debate pesquisa do Ibope sobre percepção da Sustentabilidade e o papel do jornalista na afirmação dessa pauta nas redações de todo o País

Juliana Rocha Barroso
Publicado pelo Setor3 em 17/10/07

No dia 3 de outubro, jornalistas, associados e parceiros do Instituto Ethos – Empresas e Responsabilidade Social foram convidados para um encontro em que conheceriam os resultados da pesquisa do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope) "Sustentabilidade: Hoje ou Amanhã?", sobre a percepção dos brasileiros em relação à Sustentabilidade. O encontro desencadeou um importante debate sobre o papel do jornalista na afirmação desse tema nas redações de todo o País e o futuro das ações do próprio Ethos.

Para iniciar, Ricardo Young, presidente do Instituto, destacou que o encontro faz parte de alguns eventos realizados para trazer temas relacionados a Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social que estão em debate na sociedade e disseminar essas informações para o público interno. "Neste caso resolvemos fazer uma coisa mais aberta, chamando os amigos jornalistas e alguns associados, justamente porque o tema é muito quente e importante. Porque é quente? Porque o termo Desenvolvimento Sustentável tem sido muito banalizado. Tudo virou sustentável", declarou Young.

Ele contou ainda que ouviu do professor em gestão da Sustentabilidade e consultor Rubens Mazon, que, hoje, um dos grandes desafios da Academia é conseguir sinônimos adequados para Desenvolvimento Sustentável, que continuem passando a idéia original do termo, definida na Comissão Brundtland, como ficou conhecida a Comissão Mundial para Meio Ambiente e Desenvolvimento (WCED – sigla em inglês), de 1987. O relatório Brundtland é o documento intitulado Nosso Futuro Comum, e concebe o termo como "o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades".

Números que provocam
Paula Sória, diretora do Ibope, contou que o tema, Sustentabilidade, foi escolhido não porque está na moda, mas, principalmente, por ser muito pesquisado pelos clientes do Ibope. O estudo foi realizado em duas frentes: uma feita pela internet com cerca de 500 executivos de áreas distribuídas entre serviços, indústria, comércio. Outra, por telefone, junto à população (a partir de 16 anos), com uma amostra de mil casos.

Revelou que quando se fala em Sustentabilidade, vários outros termos são citados: Empreendedorismo Social, Desenvolvimento Sustentável, Responsabilidade Empresarial, Responsabilidade Socioambiental, Responsabilidade Social, Economia Sustentável, Empreendedorismo Social... "É um pouco de tudo e ninguém tem uma imagem muito clara. Percebemos uma grande confusão."

A diretora destacou que pesquisa revelou que o que faz a diferença para um executivo, para uma organização, é o ser estratégico, mas isso ainda se coloca distante das motivações das empresas. 31% dos executivos disserem que suas empresas têm ações de sustentabilidade para agregar valor à imagem. 18% apontam que isso faz parte da missão da empresa. 13% porque tem consciência de que precisa fazer algo pela sociedade, 9% disseram que as ações são feitas para obter isenções tributárias, 8% para a autopromoção e 7% porque a empresa sente-se socialmente cobrada.

"E vimos que o cidadão percebe. 46% deles acreditam que as marcas que fazem algo pela sociedade e pelo meio ambiente o fazem somente como ação de marketing. Para 31%, a maioria das empresas monitora o impacto ambiental de suas atividades. E aqui é um ponto importante porque eu tenho 1/3 da população falando que as empresas estão monitorando e, conseqüentemente, eu, cidadão, não preciso me preocupar muito com isso. A gente começa a ver uma certa sensação de delegar", disse Paula.

Quase 1/3 dos executivos disseram que é inexistente a divulgação sistemática das práticas de sustentabilidade da organização para clientes, fornecedores e funcionários.

Foi avaliada a diferença entre o discurso e a prática. O resultado é que apesar de nos últimos anos a Responsabilidade Social ter ganhado maior projeção, a expectativa de investimentos não mudou. Como resposta dos cidadãos: 92% acham que separar lixo para a reciclagem é uma obrigação do cidadão, mas apenas 30% separam o lixo para reciclagem em casa, por exemplo.

Segundo Paula, a percepção de pertencer a um ecossitema e de que sua atuação tem impactos na sociedade, no meio ambiente e nos seus negócios faz falta no discurso do cidadão e do próprio executivo. "Sentir-se responsável e respeitar o outro são conceitos pouco introjetados e que ainda tem um longo caminho a percorrer nas organizações e também para o cidadão."

Brasil brasileiro
A imagem do País também foi alvo de perguntas na pesquisa. Os resultados foram comparados pela diretora do Ibope com os de uma pesquisa realizada em 2005, com o mesmo questionamento e revelou outro ponto dissonante entre cidadão e executivos. Para os últimos, a imagem do presidente Lula é bastante negativa e piorou em relação a 2005. Os executivos citaram termos como inexperiente, despreparado, perdido; ineficiente; incompetente; não confiável; não cumpre o que promete; falso e dependente. Essa é a mesma opinião das classes A e B, enquanto os mais pobres tem uma imagem positiva.

Os aspectos positivos de 2005 estão perdendo força: nacionalista (de 47% para 28%), preocupado com o social (de 46% para 35%), bem intencionado (de 52% para 31%). Mas o que chamou mais a atenção é que enquanto em 2005 38% citaram aspectos positivo, em 2007, nenhum dos entrevistados citou um aspecto positivo.

Ela concluiu que este cenário contribui para uma percepção negativa do Brasil, principalmente entre os executivos. "A gente percebe que existe uma aceitação de que as coisas vão piorar, ou seja, AIDS, Educação, Meio Ambiente, Corrupção, Justiça, Saúde, Crimes e Impostos têm para os executivos uma tendência muito forte de piorar. E problemas crônicos como pobreza, moradia, segurança, drogas, violência na TV, continuam com níveis graves, porém sem grandes alterações."

Os cidadãos são mais otimistas. Em um comparativo entre o País e uma empresa que poderia ser sustentável, os cidadãos têm uma visão mais positiva: 59% deles acreditam que o Brasil seja um país de sucesso, 51% que o País investe no desenvolvimento econômico; 53% que investe no desenvolvimento social e 38% que preserva o meio ambiente.

Para ela, o contexto político atual dificulta a percepção da importância da responsabilidade socioambiental. "A gente sabe que mudanças no consumidor são fundamentais para desencadear ou fortalecer transformações nas empresas. Neste momento, os cidadãos necessitam de mais informações."

Debate aberto
Os dados apresentados por Paula levaram Oded Grajew, presidente do Conselho Deliberativo do Ethos, e Ricardo Young a comentarem os desafios, dilemas e oportunidades que as informações da pesquisa trazem para o movimento da responsabilidade social empresarial e para o conjunto da sociedade brasileira.

Ricardo Young abre com três observações:

"Desde 2006, a agenda ambiental se acelerou e a social se inibiu. Nós podemos ver a pouca presença da apreciação das questões sociais na pesquisa como um todo, como se o desenvolvimento sustentável não tivesse como pressuposto a questão da inclusão social, que é fundamental. Acho que essa questão está sendo muito desfocada. Isso é preocupante."

A segunda coisa preocupante: "É uma descrença generalizada nas instituições. O Brasil, em 2010, completa o maior período democrático desde a declaração da república. O único período tão extenso de democracia sem interrupções que nós tivemos foi de 1945 a 1964. Então nós completaremos vinte anos de exercício democrático. Evidentemente que nós estamos numa curva de aprendizado enquanto sociedade em relação aos nossos compromissos, o exercício da cidadania. Mas, por outro lado, é muito preocupante ver a deterioração da crença que a elite brasileira tem principalmente em relação às instituições democráticas, aquelas que deveriam ser os pilares da democracia."

E por fim a terceira: "Quando vemos a diferença da visão do futuro do Brasil entre cidadãos e executivos, lembro muito de um artigo histórico do Carlos Lessa, que foi publicado no jornal Valor Econômico, acho que no final de 2005, em que ele questionava duramente a elite brasileira, que a partir do momento em que se torna elite se desapega da sua condição de brasileiro e se projeta nos países desenvolvidos. Ele pergunta neste artigo como pode uma elite que se espelha nos países desenvolvidos se responsabilizar e assumir a sua cota e responsabilidade de obrigação na construção e na liderança do enfrentamento aos grandes obstáculos à construção da democracia. É um artigo histórico, muito bem fundamentado e que coloca a gente um pouco em cheque. Quer dizer, o cidadão apesar de ter um pessimismo e estar até mais exposto a várias das coisas que foram mostradas na pesquisa, continua acreditando no País e a elite empresarial, que tem uma responsabilidade na liderança dos processos, na formação de opinião, na influência de hábitos, modelos e valores, não acredita no País. Esse é um aspecto da pesquisa que eu acho bastante preocupantes."

Oded Grajew relembra o lançamento do Instituto Ethos, em 1998, que contou com a presença de jornalistas. "O nosso objetivo, nossa maior preocupação era explicar o que se tratava essa tal Responsabilidade Social Empresarial. Naquela época, nem o termo existia. Explicar que não era filantropia, assistencialismo, que era gestão, que implicava na relação da empresa com todos os seus públicos. E esse era o nosso maior desafio, explicar o conceito. E acho que o conceito hoje é entendido. Outra coisa é ser praticado." E como Young, Grajew sinaliza preocupações com o risco de apropriação indevida dos conceitos e valores, deturpando seus sentidos. "Outro dia minha mulher estava ouvindo o rádio, em que uma entidade religiosa dizia o seguinte: democracia é isso, cada um fazendo a sua parte. Faça a sua. Contribua com a igreja... Isso é democracia? Renan Calheiros também fala de ética no Senado."

Para Grajew, a elite brasileira é, em geral, omissa. "Eu faço parte do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Falo do Renan, da corrupção e até do presidente. Depois todo mundo me cumprimenta, mas na hora H ninguém abre a boca, ninguém fala, ninguém se coloca. E lá tem 100 pessoas que são escolhidas como parte da elite brasileira. Não existe apenas a elite empresarial, tem a elite sindical e a elite da sociedade civil. Acho que essa pesquisa dá sinais para a gente, mostra que temos que tomar consciência. Alguma coisa diferente tem que ser feita: mais coragem, mais contundência, mais articulação, outro tipo de ação, porque, na verdade, a mídia e nós deixamos rolar essas deturpações. Sustentabilidade acaba sendo apropriado por todos e acaba querendo dizer nada ou dizer tudo. Eu acho que é um momento de radicalizar, e radicalizar significa ir às raízes. E as raízes de onde estão os problemas."

Confira mais trechos do debate:


Amélia Gonzalez (editora do Razão Social): Até que ponto a mídia é responsável por este pessimismo dos cidadãos, deixando as coisas boas em pequenos espaços ou deixando muitas delas de fora?

Oded Grajew: A mídia tem sido o grande baluarte hoje de combate à corrupção, o que é uma distorção, porque você tem o Poder Judiciário, a Controladoria Geral da União, mas a mídia, sob este aspecto, está sendo muito positiva. O Judiciário brasileiro sempre corre atrás da mídia. Vários jornalistas realmente comprometidos com a responsabilidade social têm dificuldade mesmo de colocar isso de uma forma correta. Existe uma tendência de passarem pautas de filantropia. Acho que batalhamos muito para mudar essa visão, a fim de que as redações falem mais de responsabilidade social. Eles falavam que isso não vende. Há alguma dificuldade em denunciar determinadas coisas para não entrar em conflito com a área comercial. É o que muitos jornalistas contam para a gente nas conversas. Inclusive, se estamos falando em responsabilidade social, um veículo de mídia é uma empresa e também devia aplicar os indicadores, fazer balanço social. O mesmo em relação à responsabilidade social interna, na relação com o funcionário, em toda aquela agenda. Empresa é empresa. Esse estado de coisas é fruto de desinformação ou de informação errada. E a mídia tem um grande poder de mobilização e de formação.

Amália Safatle (editora da revista Página 22): Se as empresas associadas ao Ethos tiveram acesso a essas informações, como é possível fazer algum trabalho para que todo esse discurso se transforme em prática? Como é o trabalho do Ethos em relação a isso?

Ricardo Young: Ainda bem que você, Oded, fez essa colocação, porque acho que a palavra que você usou na primeira fala sua fracassamos é muito forte. Inclusive vou propor para vocês do Ibope uma nova pesquisa, usando essa mesma referência de perguntas, entre as empresas socialmente responsáveis ou que adotam os indicadores Ethos ou GRI (Global Reporting Initiative). Fazer essa mesma pesquisa nesse universo e ver como responde. A agenda da responsabilidade social fez avançar toda uma consciência que provavelmente não foi totalmente expressa no corte da amostragem que vocês fizeram. Não fracassamos. Estamos muito longe de cumprir nossa missão, o que é outra coisa. Estamos num processo que ainda não foi capaz de reverter uma tendência inexorável, a insustentabilidade, ao combate de todos estes males. Mas não há dúvida de que estamos hoje melhores do que estávamos há cinco anos. Essa discussão toda de aquecimento global, meio ambiente, sustentabilidade obedece uma curva exponencial, e nós conhecemos isso, porque o próprio processo do Ethos foi exponencial. No primeiro ano 11 associados, no segundo ano 60 e assim por diante. Acredito que você tem toda razão quando diz que precisamos radicalizar. A imprensa também tem que radicalizar.

Adalberto Marcondes (diretor responsável da revista digital Envolverde): Os indicadores da economia são todos positivos. No entanto, os executivos, que são os beneficiados e os beneficiários desse momento econômico, avaliam para o País com um olhar muito negativo. Isso me traz uma certa esquizofrenia, porque quem se beneficia acha que não está bom e quem ainda estão precisando galgar degraus no desenvolvimento social, que é a população, principalmente os mais pobres, são os que dizem que as coisas estão boas. Outra coisa, não existe um vínculo entre a responsabilidade social e a sustentabilidade da empresa e seus processos de comunicação e de financiamento à informação para a sociedade. A pesquisa também mostra que a sociedade tem uma demanda por informações nesta área, não suprida. No entanto, veículos como a revista Agenda 22, o caderno Razão Social, a Envolverde, e outros, que estão trabalhando a questão da responsabilidade social e da sustentabilidade de uma forma efetiva não recebem verbas publicitárias. Não há juízo de valor entre a informação e o que a verba publicitária financia para a sociedade. E aí eu faço uma provocação: não está na hora do Ethos chamar este pessoal que decide essas verbas e que financia a informação para a sociedade para conversar? Fazendo a intermediação e mostrando que existe uma necessidade de informação?

Paula Sória (Ibope): Os executivos vêem com muito otimismo a economia no Brasil e os investimentos externos que estão sendo feitos no Brasil. Então está parte é super coerente. O pessimismo gira em torno de tudo que é mais vinculado à ética e à questão social no Brasil. Isso realmente apareceu de uma maneira muito forte, uma descrença e um crescimento muito grande. Esta questão entre a elite e população em geral a gente vê isso em todas as pesquisas seja de mercados, seja de produtos, enfim, em qualquer tipo de serviço que a gente avalie, sempre as classes mais altas avaliam de uma forma mais crítica e aqui acontece a mesma coisa. Quando a gente está falando com os executivos, estamos falando com menos de 1% da população e comparando com algo em torno de 45% da população brasileira. Então é normal que exista essa discrepância.

Ricardo Young: Acho que a esquizofrenia é ótima porque mostra a incerteza e a falta de convicções, seja no plano ideológico, no plano mesmo dos valores e das práticas. Mostra claramente um momento de transição, quer dizer, a sociedade passa a compreender que verdades absolutas estão indo por terra e é necessário construir um outro caminho. Como se constrói esse novo caminho ninguém sabe. A esquizofrenia mostra que as certezas absolutas estão sendo colocadas em cheque. A pergunta seguinte é qual a capacidade de polarização e de discussão que a sociedade vai ter para fazer avançar a agenda na direção do desenvolvimento sustentável. Um segundo ponto é a coerência entre a consciência e a prática.

Nós não vamos acelerar o processo de transformação sem o engajamento da universidade, da mídia, das empresas socialmente responsáveis e da sociedade civil organizada. Essas são as quatro forças aglutinadoras da energia cidadã, da participação cidadã que podem fazer a diferença.

Para ter acesso a pesquisa clique aqui ou acesse o site do IBOPE.


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Artigo de Especialista em Desenvolvimento Local explica a importância da atuação do gestor social na sociedade atual

Vilma Ambrósia Jurevicius*
Publicado pelo
Setor3 em 17/10/07

Pensar o papel do Gestor Social no Brasil nos faz refletir sobre a construção histórica da democracia e a entender a participação do cidadão nesse processo.

O gestor é um promotor da cidadania, independentemente do público ou causa em que ele está atuando. Reafirmar constantemente seu papel é fundamental entendendo que a localidade pode ser o maior campo de atuação para empreender mudanças sociais significativas.

O processo de participação das pessoas em nossa sociedade foi incentivado ou reprimido com maior ou menor ênfase, de acordo com o cenário político da época e os interesses econômicos vigentes. Atualmente os efeitos da globalização e do mercado aumentam a concentração de renda e a exclusão social.

Na contramão, está o "setor cidadão" que acredita na construção de uma sociedade mais justa e igualitária, democrática e participativa. Passa-se a crer no sonho, na utopia de um mundo equânime, no empoderamento de um grupo de pessoas que acreditam que essa mudança local pode interferir globalmente nas grandes discussões que afetam em maior ou menor grau a coletividade.

O que nos afeta individualmente, afeta o coletivo e vice versa. Participar, assumir nossas responsabilidades e reconhecer nossos direitos é contribuir para a consolidação da democracia.

É expressiva a diferença entre as cidades, comunidades, localidades onde a participação das pessoas acontece e outros locais em que residem velhas formas de organização e os efeitos de colonização do nosso país.

Essas últimas são localidades que dão a impressão de abandono, cidades vocacionadas que com o tempo perderam sua identidade. As pessoas que nelas habitam parecem adormecidas, inoperantes. A mesmice impera e elas crêem que nada podem mudar em suas vidas, em suas casas, na vila. Passivamente esperam que algo mude, ou alguém possa fazer a mudança com fórmulas mágicas. A mágica reside exatamente na crença de que pessoas podem com objetivos comuns operar mudanças significativas.

Vemos a clara diferença em localidades onde uma parcela significativa da sociedade participa, como na Comunidade Heliópolis, onde o líder comunitário, o arquiteto, o empresário, o maestro, vários profissionais das artes, jornalistas e cidadãos comuns estão engajados organizando seus espaços, rádios comunitárias, lavanderias comunitárias, centros de geração de trabalho e renda com parcerias de multinacionais. O trabalho avança, a comunidade se apropria cada vez mais dos espaços e mudanças significativas acontecem.

A solução em nossas mãos
Não podemos isentar o papel do Estado em qualquer âmbito, mas exigir que ele cumpra sua parte como prestador de serviço público. Os cidadãos têm as soluções para seus problemas e é preciso romper com a inversão que muitas vezes se pretende de que as ONGs nasceram para cumprir o papel do Estado.

O terceiro setor surgiu a partir de pessoas que abraçaram causas, cansados de testemunhar a incompetência do Estado. Essa área apareceu para enfrentar os problemas, organizar a sociedade civil, mas não para substituir ou atuar no lugar do Estado. Governo, empresas e a sociedade civil precisam atuar juntos, cada um cumprindo o seu papel.

Vivemos uma realidade onde milhões de pessoas não conseguem exercer plenamente a sua cidadania e a democracia ainda precisa ser conquistada para esse grande contingente de pessoas excluídas.

Mais uma vez, o gestor social pode contribuir na promoção da dignidade ou da cidadania, ter clareza que democracia é o ponto de partida para garantir a participação das pessoas em todas as discussões, em todas as áreas.

Identificando as causas e procurando agir com os diversos setores da sociedade, os cidadãos podem influenciar na aplicação de políticas públicas enquanto o Gestor social, empenhado em buscar o cumprimento da missão organizacional, tem como maior desafio obter efetividade nas ações.

Se a missão é contribuir para erradicar a evasão escolar, por exemplo, é fundamental ter uma proposta político pedagógica que consiga envolver o público alvo, com a atuação de profissionais e pessoas comprometidas com a causa da organização.

Pensar coletivamente é assumir que a evasão escolar não se restringe a um problema da escola ou do projeto social, mas é característica de crianças de uma dada localidade, uma causa que também é da escola, dos conselhos de direitos, de programas de amparo à família, do posto de saúde. Enfim, é de todos nós.

Tecido Social
Mas como trabalhar coletivamente de forma democrática e participativa? Desenvolvendo o trabalho em rede e estabelecendo parcerias que formam o tecido social para renovar e consolidar as ações que geram impacto social.

O que a maioria das pessoas faz é agir individualmente no imediatismo. Ainda há gestores de organizações que trabalham de forma isolada, sem efetividade, sem ressonância. Já ouvi depoimentos como: ter a impressão de estar enxugando gelo, apagando incêndio o tempo todo, os problemas se avolumam e nada modifica.

As dificuldades são muitas e complexas em um cenário onde o descrédito das instituições é cada vez maior. Outro desafio é conscientizar e sensibilizar os atores locais para o protagonismo individual e coletivo.

O sentimento do gestor de impotência no enfrentamento da pobreza econômica, política, étnica, cultural e social existente tem exigido uma postura de ruptura com velhas formas de atuação e a necessidade de atuar cada vez mais integrado, em rede. Para isso, há um resgate de valores como solidariedade, colaboração e história, pois nos remete a entender como alguns grupos sociais se organizaram e se desenvolveram, formando comunidades de projetos e de aprendizagens.

O Gestor Social pode ser o protagonista da formação da Rede, assim como qualquer cidadão comprometido pode adotar a metodologia do trabalho em rede, mobilizando e articulando as pessoas, grupos representativos de cada segmento. Juntos discutirão uma agenda de prioridades, destinação de recursos e ações para enfrentamento dos graves problemas sociais, ambientais, educacionais, econômicos de geração de trabalho e renda que afetam sua localidade.

Nas incursões pelas periferias deste país vemos pessoas de boa vontade contrariando a lógica das coisas, realizando projetos criativos que oferecem oportunidades.

O nosso país é muito jovem, tem muito por fazer. Paulatinamente, O Brasil vem consolidando importantes processos como o de romper com antigas formas de coronealismo, clientelismo, assistencialismo, centralização do poder.

Não vamos nos acostumar com as injustiças sociais que impedem a grande parcela da população de ter cidadania plena e se consolar com o sentimento de impotência. Qual o legado que estamos deixando para as futuras gerações? Qual a lição de cidadania que estamos passando para os nossos jovens? Qual o protagonismo juvenil estamos fomentando?

"Nunca duvide de um pequeno grupo de pessoas conscientes e engajadas possa mudar o mundo; de fato, sempre foi somente assim que o mundo mudou". (Fritjof Capra)

*A autora do texto pedagoga especialista em Desenvolvimento Local pela Organização Internacional do Trabalho em Turim, pós-graduada em Gestão do Terceiro Setor. É especialista em Treinamento e Técnicas de Aprendizagem pela John Hopinks University e colaboradora do Senac São Paulo há 6 anos nas áreas de desenvolvimento social, Redes Sociais e Capacitação de Gestores.

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Yes, nós temos governança

Danilo Fariello
Publicado pelo
Valor Online em 29/10/07

Algumas das empresas da América Latina com melhores práticas de governança corporativa decidiram assumir a responsabilidade de ser um canal de comunicação pelo mundo afora para mostrar o valor do mercado local. O Círculo de Companhias da Mesa-Redonda Latino Americana de Governança Corporativa - que conta com 14 empresas de cinco países da região para disseminar procedimentos responsáveis para as outras empresas - resolveu agir como intermediário entre empresas daqui e agências que avaliam a governança local, situadas principalmente nos EUA. A iniciativa é uma forma de melhorar a visão dos estrangeiros sobre as empresas da AL e, por conseqüência, aumentar a vazão de recursos para cá.

O resultado recente mais espantoso para as empresas foi a última edição do ranking dos mercados divulgado no mês passado pela Governance Metrics Internacional (GMI), que coloca o Brasil na 39ª colocação em uma lista de 50 países segundo a governança, atrás de México, Rússia e Venezuela. O grupo acredita que as agências de ratings de governança avaliam as empresas da região sob a ótica estrangeira, sem considerar as peculiaridades e os avanços das empresas da AL. "As agências começaram a olhar para a região no ano passado e ainda usam uma lente única, em que predominam os assuntos de lá", diz Sandra Guerra, coordenadora do Círculo das Companhias.

Um dos exemplos citados na reunião anual do grupo, que ocorreu neste mês em Medellín, na Colômbia, é a diferença da estrutura societária das empresas da região e as americanas. Como lá a maior parte das empresas tem o controle pulverizado, as agências de rating de governança olham muito para o compromisso e remuneração dos administradores, mas aqui é diferente, com muitos grupos de acionistas majoritários. Isso muda totalmente a análise da governança da empresa, diz ela. "E um bloco de controle não é necessariamente negativo, pois tem a virtude de um dono vigilante, por exemplo."

As empresas que fazem parte do Círculo de Companhias são Argos e ISA, da Colômbia; Atlas, da Costa Rica; Buenaventura e Ferreyros, do Peru; Homex, do México - recém-ingressa, acrescentando mais um país ao grupo -; e CCR, CPFL Energia, Embraer, Marcopolo, Natura, Net, Suzano e Ultrapar, do Brasil. O grupo foi formado por uma iniciativa do Banco Mundial, seu braço financeiro, o International Finance Corporation (IFC), e a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

O senso comum entre as empresas do grupo, acostumadas a lidar com investidores de grande porte, é que a escolha das empresas para aplicar será cada vez mais pautada por aspectos de governança, em paralelo à previsão de crescimento das próprias ações, diz Sandra. "Se os resultados são vistos superficialmente, isso poderá prejudicar a decisão de investimento", diz ela, relatando opinião do grupo.

Só agora começamos a ter questões de governança comparáveis ao exterior, comenta Marco Geovanne, presidente da comissão Internacional do Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (Ibri). "Não me estranha a colocação brasileira nesses rankings, porque equilíbrio entre poderes de acionistas, transparência, prestação de contas, responsabilidade social e mesmo o próprio Ibri - com dez anos - são fatos ainda recentes no país."

Geovanne lembra, ainda, que o mercado brasileiro tem algo que prejudica a avaliação e com razão muito justa: a existência des ações preferenciais, que não dão direito a voto. "Com pouco mais de 25% do capital social você controla uma empresa aqui e isso não é comum lá fora, porque fere o preceito de eqüidade entre os acionistas."

Apesar da abordagem genérica internacional - o GMI avaliou 44 empresas brasileiras para dar os pontos e a colocação de 39º ao Brasil - e de o Brasil ter muito a avançar, o país conta com empresas com aspectos de governança superiores a diversas companhias do primeiro mundo, diz Geovanne. Ele destaca que os EUA conquistaram o nível atual a duras penas, após as crises de gigantes como Enron e Worldcom e a conseqüente promulgação da Lei Sarbanes-Oxley, que elevou os critérios mínimos de governança.

Os ratings de governança corporativa ainda são pouco usados em comparação àqueles de risco de crédito, mas tendem a ganhar importância conforme se amplie o consenso em torno dos critérios. Além da GMI, também fazem estudos similares no mundo, atualmente, a RiskMetrics e The Corporate Library. A internacional Standard & Poor's já considera critérios de governança corporativa como um dos elementos avaliados no rating de crédito. É nessas portas que o Círculo das Companhias deverá bater para explicar as diferenças do mercado regional em relação ao internacional. No Brasil, a única empresa a fazer análise de governança é a Austin Rating, que concedeu nota AA ao Bradesco, primeira companhia no Brasil a divulgar sua classificação.

A tendência do mercado, porém, é de universalizar os critérios de avaliação de governança, diz Sandra, mas por enquanto os pesos e medidas conforme a região ainda são muito diferentes. "As práticas de governança e sua avaliação tendem a ser harmonizadas em níveis internacionais", acrescenta Geovanne, do Ibri. Mas isso não exclui a necessidade de as empresas avançarem em governança.

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