sábado, 28 de julho de 2007

Redes para o Desenvolvimento: Programa de Formação em Redes

Dalberto Adulis e Cristiano de Brito Lafetá
Tema do mês de julho da
Rits

A profusão da organização em rede
Nas sociedades contemporâneas os atores sociais articulam-se em redes empregando as novas tecnologias de informação e comunicação, especialmente a Internet, como um recurso para acessar, produzir e compartilhar informações. Na sociedade em rede, informação, comunicação, colaboração e conhecimento estão no centro de inovadores processos sociais em rede, como os descritos a seguir.


  • Uma comunidade de milhares de programadores dispersos pelo mundo consegue, através da colaboração, produzir um software livre complexo, como o Linux, e concorrer com a Microsoft.


  • O compartilhamento de arquivos digitais através dos sistemas "peer to peer" na Internet coloca em xeque o modelo tradicional de produção e distribuição de músicas e filmes assim como a noção de direitos autorais.


  • Em diferentes países cidadãos utilizaram o celular para organizar "smart mobs", as mobilizações inteligentes, que possibilitaram a realização de protestos importantes.


  • Usuários da Internet passaram a produzir e disseminar informação através de blogs e portais colaborativos como a Wikipedia, maior enciclopédia do mundo.


  • Milhões de cidadãos utilizam as chamadas "redes sociais" para se organizar em comunidades virtuais em torno de temas ou causas específicos.


  • Organizações da sociedade civil utilizam a Internet como um meio para acessar informação, dar visibilidade a suas causas e projetos, se articular em redes e influenciar outros atores sociais.


  • Redes internacionais, movimentos e organizações da sociedade civil organizaram eventos globais, como o Fórum Social Mundial.


  • Organizações públicas e privadas enfatizam a importância da colaboração, da aprendizagem e da gestão do conhecimento, fomentando a constituição de comunidades de prática e de aprendizagem.


  • Organizações que estimulam processos de desenvolvimento local adotam estratégias voltadas à constituição e fortalecimento de redes sociais locais.

Neste contexto, organizações e movimentos sociais se apropriam das ferramentas e tecnologias de informação e comunicação (TICs) numa resposta à globalização da economia, criando uma nova forma de reivindicação e articulação baseada na colaboração, para atingir seus objetivos e defender suas causas.

Porém, a articulação em rede traz grandes desafios às organizações e movimentos. Entre eles, destacamos a comunicação horizontal, a facilitação, o compartilhamento de informações e conhecimentos, a efetiva participação e a sustentabilidade das redes. Estes desafios motivaram a ABDL - Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Lideranças - a criar um programa de Formação de Liderança em Redes para o Desenvolvimento, o Redesenvolvimento.

Redes em Desenvolvimento
O Redesenvolvimento é um programa de formação e mobilização de atores sociais, que leva à constituição de um ambiente colaborativo voltado ao fortalecimento de redes. A primeira edição do Redesenvolvimento aconteceu entre 2005 e 2006, com o apoio da Fundação Avina, da RITS e da Ashoka. Esta primeira edição contou com a participação de 25 pessoas, das seguintes redes e organizações:


  • Ação Empresarial pela Cidadania (AEC) - visa a sensibilização, motivação e facilitação de políticas de responsabilidade social das empresas, potencializando e qualificando as iniciativas existentes e fomentando novas ações que contribuam para o desenvolvimento sustentável.


  • Comitê de Entidades no Combate à Fome e pela Vida (Coep)- tem a missão de mobilizar organizações e pessoas para desenvolverem iniciativas de combate à pobreza e transformar a luta contra a fome e a miséria na prioridade número um do Brasil.


  • Rede Cyberela - busca fortalecer o trabalho de mulheres comunicadoras no uso das tecnologias de informação e comunicação, promovendo a produção e veiculação de conteúdo com perspectiva de gênero e direitos humanos.


  • Rede de Cooperação Alternativa (RCA) - reúne ONGs indigenistas e organizações indígenas, além de organizações ambientais para pensar alternativas de desenvolvimento sustentado entre povos da floresta.


  • Rede Marinho-Costeira e Hídrica (RMCH-BR) - tem como missão contribuir para a preservação e orientar sobre o uso sustentável dos ecossistemas marinhos e costeiros e bacias hidrográficas no Brasil.


  • RENOVE - promove a utilização das energias renováveis, com o intuito de fomentar o desenvolvimento sustentável por meio da integração com o terceiro setor e com os setores público e privado.

Entre os resultados obtidos na realização desta primeira edição, destacam-se a formação e sensibilização de 25 integrantes de redes; o desenvolvimento de metodologia para o fortalecimento de redes; a sistematização da experiência; e o maior aprendizado/compreensão dos desafios e da dinâmica de funcionamento das redes.

O Programa culminou no seminário Redes e Desenvolvimento, que reuniu público de aproximadamente 300 pessoas e contou com a participação de mais de 40 palestrantes. O evento foi realizado em parceria com o Senac São Paulo, em julho de 2006, e contou com patrocínio da Fundação Vale do Rio Doce e de Furnas Centrais Elétricas.

O Redesenvolvimento 2007
Neste mês a ABDL abriu as inscrições para o Redesenvolvimento 2007, que tem como principais objetivos:


  • Capacitar atores sociais para a articulação em rede


  • Formar uma comunidade de aprendizagem sobre a temática "Redes para o Desenvolvimento"


  • Promover o fortalecimento de redes


  • Produzir e disseminar conhecimento sobre redes

Nesta edição adotamos a perspectiva de que a atuação em redes é, por si só, tão ou mais valiosa do que a organização formal dos atores sociais em "redes de organizações". Desta forma, o principal objetivo do programa passou a ser a formação de atores sociais interessados em fortalecer processos colaborativos e de articulação de redes em diferentes formas de organização, seja uma rede formalmente constituída, uma ONG, um fórum ou uma empresa que deseje promover ações sociais em rede.

Durante o Redesenvolvimento 2007 serão abordados quatro eixos temáticos:


  • Desenvolvimento Sustentável - Desenvolvimento, liderança, participação e cidadania.


  • Redes - Emergência e papel das redes, planejamento, facilitação e avaliação de redes.


  • Comunicação - Acesso à informação, comunicação e colaboração na sociedade em rede.


  • TICs - Tecnologias de Informação e Comunicação para o Desenvolvimento, apropriação e uso social da Internet.

Durante todo o programa estes temas serão trabalhados através de conceitos, casos, ferramentas e atividades práticas que permitam a cada um dos participantes aperfeiçoar sua atuação a partir da incorporação de princípios, metodologias e práticas de trabalho colaborativas que fortaleçam a sua atuação na promoção do desenvolvimento, tanto em suas organizações como nas redes às quais estejam vinculados.

O programa está organizado em três encontros presenciais intensivos, e um seminário aberto, nos moldes do Redes e Desenvolvimento, realizado em julho de 2006 em parceria com o SENAC-SP. Os encontros presenciais serão intercalados por atividades à distância, para compartilhar informações e experiências, empregando-se um ambiente virtual que facilita a aprendizagem e a colaboração. Os participantes ainda poderão participar do Seminário Internacional do LEAD International e passar a integrar a Rede Lead, formada por mais de 1.600 pessoas de diferentes países que atuam na construção de um mundo sustentável.

O seminário internacional do LEAD deste ano será sobre "Liderança e Mudança Climática" e ocorrerá de 26 de novembro e 1º de dezembro de 2007, na Indonésia, às vésperas da Conferencia sobre do Clima, organizada pela ONU. Os participantes do programa que tiverem interesse poderão integrar a delegação do LEAD que participará da Conferência em Bali.

Ao se inscrever no programa os participantes devem apresentar uma proposta de ação voltada à promoção e implantação de ações que favoreçam a disseminação de práticas de trabalho em rede em seus projetos, organizações ou redes.

Para saber mais sobre o Redesenvolvimento, visite: www.abdl.org.br; ou escreva para redes@abdl.org.br.

Faça o download do Resumo executivo do Redesenvolvimento 2007 (em pdf, 226Kb)

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Decreto nº. 6.170, de 25 de julho de 2007

Publicado no Diário Oficial nº 143, quinta-feira, 26 de julho de 2007 – Seção 1

Dispõe sobre as normas relativas às transferências de recursos da União mediante convênios e contratos de repasse, e dá outras providências.


O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 10 do Decreto-Lei no 200, de 25 de fevereiro de 1967, no art. 116 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, e no art. 25º. da Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000,


D E C R E T A


CAPÍTULO I - DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1º. Os programas, projetos e atividades de interesse recíproco dos órgãos e entidades da administração pública federal e de outros entes ou entidades públicas ou privadas sem fins lucrativos serão realizados por meio de transferência de recursos financeiros oriundos de dotações consignadas no Orçamento Fiscal e da Seguridade Social e efetivadas por meio de convênios, contratos de repasse ou termos de cooperação, observados este Decreto e a legislação pertinente.

§ 1º. Para os efeitos deste Decreto, considera-se:

    I - convênio - acordo, ajuste ou qualquer outro instrumento que discipline a transferência de recursos financeiros de dotações consignadas nos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União e tenha como partícipe, de um lado, órgão ou entidade da administração pública federal, direta ou indireta, e, de outro lado, órgão ou entidade da administração pública estadual, distrital ou municipal, direta ou indireta, ou ainda, entidades privadas sem fins lucrativos, visando a execução de programa de governo, envolvendo a realização de projeto, atividade, serviço, aquisição de bens ou evento de interesse recíproco, em regime de mútua cooperação;

    II - contrato de repasse - instrumento administrativo por meio do qual a transferência dos recursos financeiros se processa por intermédio de instituição ou agente financeiro público federal, atuando como mandatário da União;

    III - termo de cooperação - modalidade de descentralização de crédito entre órgãos e entidades da administração pública federal, direta e indireta, para executar programa de governo, envolvendo projeto, atividade, aquisição de bens ou evento, mediante portaria ministerial e sem a necessidade de exigência de contrapartida;

    IV - concedente - órgão da administração pública federal direta ou indireta, responsável pela transferência dos recursos financeiros ou pela descentralização dos créditos orçamentários destinados à execução do objeto do convênio;

    V - contratante - a instituição financeira mandatária, representando a União e respectivo Ministério ou órgão/entidade federal, e que se responsabilizará, mediante remuneração, pela transferência dos recursos financeiros destinados à execução do objeto do contrato de repasse;

    VI - convenente - órgão ou entidade da administração pública direta e indireta, de qualquer esfera de governo, bem como entidade privada sem fins lucrativos, com o qual a administração federal pactua a execução de programa, projeto/atividade ou evento mediante a celebração de convênio;

    VII - contratado - órgão ou entidade da administração pública direta e indireta, de qualquer esfera de governo com a qual a administração federal pactua a execução de contrato de repasse;

    VIII - interveniente - órgão da administração pública direta e indireta de qualquer esfera de governo, ou entidade privada que participa do convênio para manifestar consentimento ou assumir obrigações em nome próprio;

    IX - termo aditivo - instrumento que tenha por objetivo a modificação do convênio já celebrado, vedada a alteração do objeto aprovado;

    X - objeto - o produto do convênio ou contrato de repasse, observados o programa de trabalho e as suas finalidades; e

    XI - padronização - estabelecimento de critérios, por parte do concedente, especialmente quanto às características do objeto e a seu custo, a serem seguidos em todos os convênios ou contratos de repasse com o mesmo objeto.

§ 2º. A entidade contratante ou interveniente, bem como os seus agentes que fizerem parte do ciclo de transferência de recursos, são responsáveis, para todos os efeitos, pelos atos de acompanhamento que efetuar.

§ 3º. Excepcionalmente, os órgãos e entidades federais poderão executar programas estaduais ou municipais, e os órgãos da administração direta, programas a cargo de entidade da administração indireta, sob regime de mútua cooperação mediante convênio.


CAPÍTULO II - DAS NORMAS DE CELEBRAÇÃO, ACOMPANHAMENTO E PRESTAÇÃO DE CONTAS

Art. 2º. É vedada a celebração de convênios e contratos de repasse:

    I - com órgãos e entidades da administração pública direta e indireta dos Estados, Distrito Federal e Municípios cujo valor seja inferior a R$ 100.000,00 (cem mil reais); e

    II - com entidades privadas sem fins lucrativos que tenham como dirigentes:

      a) membros dos Poderes Executivo, Legislativo, Judiciário, do Ministério Público e do Tribunal de Contas da União, bem como seus respectivos cônjuges, companheiros, e parentes em linha reta, colateral ou por afinidade até o 2o grau;

      b) servidor público vinculado ao órgão ou entidade concedente, bem como seus respectivos cônjuges, companheiros, e parentes em linha reta, colateral ou por afinidade até o 2o grau; e

    III - entre órgãos e entidades da administração pública federal, caso em que deverá ser observado o art. 1o, § 1o, inciso III.

Parágrafo único. Para fins de alcance do limite estabelecido no inciso I, é permitido:

    I - consorciamento entre os órgãos e entidades da administração pública direta e indireta dos Estados, Distrito Federal e Municípios; e

    II - celebração de convênios ou contratos de repasse com objeto que englobe vários programas e ações federais a serem executados de forma descentralizada, devendo o objeto conter a descrição pormenorizada e objetiva de todas as atividades a serem realizadas com os recursos federais.

Art. 3º. As entidades privadas sem fins lucrativos que pretendam celebrar convênio ou contrato de repasse com órgãos e entidades da administração pública federal deverão realizar cadastro prévio no Sistema de Gestão de Convênios, Contratos de Repasse e Termos de Parcerias - SICONV, conforme normas expedidas pelo órgão central do Sistema.

§ 1º. O cadastramento de que trata o caput poderá ser realizado em qualquer órgão ou entidade concedente e permitirá a celebração de convênios ou contratos de repasse enquanto estiver válido o cadastramento.

§ 2º. No cadastramento serão exigidos, pelo menos:

    I - cópia do estatuto social atualizado da entidade;

    II - relação nominal atualizada dos dirigentes da entidade, com Cadastro de Pessoas Físicas - CPF;

    III - declaração do dirigente da entidade:

      a) acerca da não existência de dívida com o Poder Público, bem como quanto à sua inscrição nos bancos de dados públicos e privados de proteção ao crédito; e

      b) informando se os dirigentes relacionados no inciso II ocupam cargo ou emprego público na administração pública federal;

    IV - prova de inscrição da entidade no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas - CNPJ; e

    V - prova de regularidade com as Fazendas Federal, Estadual e Municipal e com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS, na forma da lei.

Parágrafo único. Verificada falsidade ou incorreção de informação em qualquer documento apresentado, deve o convênio ou contrato de repasse ser imediatamente denunciado pelo concedente ou contratado.


Art. 4º. A celebração de convênio com entidades privadas sem fins lucrativos poderá ser precedida de chamamento público, a critério do órgão ou entidade concedente, visando à seleção de projetos ou entidades que tornem mais eficaz o objeto do ajuste.

Parágrafo único. Deverá ser dada publicidade ao chamamento público, especialmente por intermédio da divulgação na primeira página do sítio oficial do órgão ou entidade concedente, bem como no Portal dos Convênios.


Art. 5º. O chamamento público deverá estabelecer critérios objetivos visando à aferição da qualificação técnica e capacidade operacional do convenente para a gestão do convênio.


Art. 6º. Constitui cláusula necessária em qualquer convênio dispositivo que indique a forma pela qual a execução do objeto será acompanhada pelo concedente.

Parágrafo único. A forma de acompanhamento prevista no caput deverá ser suficiente para garantir a plena execução física do objeto.


Art. 7º. A contrapartida do convenente poderá ser atendida por meio de recursos financeiros, de bens e serviços, desde que economicamente mensuráveis.

§ 1º. Quando financeira, a contrapartida deverá ser depositada na conta bancária específica do convênio em conformidade com os prazos estabelecidos no cronograma de desembolso, ou depositada nos cofres da União, na hipótese de o convênio ser executado por meio do Sistema Integrado de Administração Financeira - SIAFI.

§ 2º. Quando atendida por meio de bens e serviços, constará do convênio cláusula que indique a forma de aferição da contrapartida.


Art. 8º. A execução de programa de trabalho que objetive a realização de obra será feita por meio de contrato de repasse, salvo quando o concedente dispuser de estrutura para acompanhar a execução do convênio.

Parágrafo único. Caso a instituição ou agente financeiro público federal não detenha capacidade técnica necessária ao regular acompanhamento da aplicação dos recursos transferidos, figurará, no contrato de repasse, na qualidade de interveniente, outra instituição pública ou privada a quem caberá o mencionado acompanhamento.


Art. 9º. No ato de celebração do convênio ou contrato de repasse, o concedente deverá empenhar o valor total a ser transferido no exercício e efetuar, no caso de convênio ou contrato de repasse com vigência plurianual, o registro no SIAFI, em conta contábil específica, dos valores programados para cada exercício subseqüente.

Parágrafo único. O registro a que se refere o caput acarretará a obrigatoriedade de ser consignado crédito nos orçamentos seguintes para garantir a execução do convênio.


Art. 10º. As transferências financeiras para órgãos públicos e entidades públicas e privadas, decorrentes da celebração de convênios e contratos de repasse, serão feitas exclusivamente por intermédio do Banco do Brasil S.A. ou da Caixa Econômica Federal, que poderão atuar como mandatários da União para execução e fiscalização, devendo a nota de empenho ser emitida até a data da assinatura do respectivo acordo, convênio, ajuste ou instrumento congênere.

§ 1º. Os pagamentos à conta de recursos recebidos da União, previsto no caput, estão sujeitos à identificação do beneficiário final e à obrigatoriedade de depósito em sua conta bancária.

§ 2º. Excepcionalmente, mediante mecanismo que permita a identificação, pelo banco, do beneficiário do pagamento, poderão ser realizados pagamentos a beneficiários finais pessoas físicas que não possuam conta bancária, observados os limites fixados na forma do art. 18.

§ 3º. Toda movimentação de recursos de que trata este artigo, por parte dos convenentes, executores e instituições financeiras autorizadas, será realizada observando-se os seguintes preceitos:

    I - movimentação mediante conta bancária específica para cada instrumento de transferência (convênio ou contrato de repasse);

    II - pagamentos realizados exclusivamente mediante crédito na conta bancária de titularidade dos fornecedores e prestadores de serviços; e

    III - transferência das informações mencionadas no inciso I ao SIAFI e ao Portal de Convênios, em meio magnético, conforme normas expedidas na forma do art. 18.


§ 4º. Os recursos de convênio, enquanto não utilizados, serão obrigatoriamente aplicados em cadernetas de poupança de instituição financeira pública federal se a previsão de seu uso for igual ou superior a um mês, ou em fundo de aplicação financeira de curto prazo ou operação de mercado aberto lastreada em títulos da dívida pública, quando a utilização desses recursos verificar-se em prazos menores que um mês.

§ 5º. As receitas financeiras auferidas na forma do § 4º serão obrigatoriamente computadas a crédito do convênio e aplicadas, exclusivamente, no objeto de sua finalidade, observado o parágrafo único do art. 12º.

§ 6º. O convenente ficará obrigado a prestar contas dos recursos recebidos no prazo de trinta dias, contados da data do último pagamento realizado.

§ 7º. O concedente terá prazo de noventa dias para apreciar a prestação de contas apresentada, contados da data de seu recebimento.

§ 8º. A exigência contida no caput poderá ser substituída pela execução financeira direta, por parte do convenente, no SIAFI, de acordo com normas expedidas na forma do art. 18º.


Art. 11º. Para efeito do disposto no art. 116 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, a aquisição de produtos e a contratação de serviços com recursos da União transferidos a entidades privadas sem fins lucrativos deverão observar os princípios da impessoalidade, moralidade e economicidade, sendo necessária, no mínimo, a realização de cotação prévia de preços no mercado antes da celebração do contrato.


Art. 12º. O convênio poderá ser denunciado a qualquer tempo, ficando os partícipes responsáveis somente pelas obrigações e auferindo as vantagens do tempo em que participaram voluntariamente do acordo, não sendo admissível cláusula obrigatória de permanência ou sancionadora dos denunciantes.

Parágrafo único. Quando da conclusão, denúncia, rescisão ou extinção do convênio, os saldos financeiros remanescentes, inclusive os provenientes das receitas obtidas das aplicações financeiras realizadas, serão devolvidos à entidade ou órgão repassador dos recursos, no prazo improrrogável de trinta dias do evento, sob pena da imediata instauração de tomada de contas especial do responsável, providenciada pela autoridade competente do órgão ou entidade titular dos recursos.


CAPÍTULO III - DO SISTEMA DE GESTÃO DE CONVÊNIOS E CONTRATOS DE REPASSE - SICONV E DO PORTAL DOS CONVÊNIOS

Art. 13º. A celebração, a liberação de recursos, o acompanhamento da execução e a prestação de contas dos convênios serão registrados no SICONV, que será aberto ao público via rede mundial de computadores - Internet, por meio de página específica denominada Portal dos Convênios.

§ 1º. O Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão é o órgão central do SICONV, ao qual compete estabelecer as diretrizes e normas a serem seguidas pelos órgãos setoriais e demais usuários do sistema.

§ 2º. Serão órgãos setoriais do SICONV todos os órgãos e entidades da administração pública federal que realizem transferências voluntárias de recursos, aos quais compete a gestão dos convênios e a alimentação dos dados que forem de sua alçada.

§ 3º. O Poder Legislativo, por meio das mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, o Ministério Público, o Tribunal de Contas da União e a Controladoria Geral da União, bem como outros órgãos que demonstrem necessidade, a critério do órgão central do sistema, terão acesso ao SICONV, podendo incluir no referido Sistema informações que tiverem conhecimento a respeito da execução dos convênios publicados.


CAPÍTULO IV - DA PADRONIZAÇÃO DOS OBJETOS

Art. 14º. Os órgãos concedentes são responsáveis pela seleção e padronização dos objetos mais freqüentes nos convênios.


Art. 15º. Nos convênios em que o objeto consista na aquisição de bens que possam ser padronizados, os próprios órgãos e entidades da administração pública federal poderão adquiri-los e distribuí- los aos convenentes.


CAPÍTULO V - DAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS

Art. 16º. Os órgãos e entidades concedentes deverão publicar, até cento e vinte dias após a publicação deste Decreto, no Diário Oficial da União, a relação dos objetos de convênios que são passíveis de padronização.

Parágrafo único. A relação mencionada no caput deverá ser revista e republicada anualmente.


Art. 17º. Observados os princípios da economicidade e da publicidade, ato conjunto dos Ministros de Estado da Fazenda, Planejamento, Orçamento e Gestão e da Controladoria Geral da União disciplinará a possibilidade de arquivamento de convênios com prazo de vigência encerrado há mais de cinco anos e que tenham valor registrado de até R$ 100.000,00 (cem mil reais).


Art. 18º. Os Ministros de Estado da Fazenda e do Planejamento, Orçamento e Gestão elaborarão ato conjunto para execução do disposto neste Decreto.


Art. 19º. Este Decreto entra em vigor em 1º. de janeiro de 2008, exceto os art. 16º. e 17º., que terão vigência a partir da data de sua publicação.


Art. 20º. Ficam revogados os art. 48 a 57 do Decreto no 93.872, de 23 de dezembro de 1986, e o Decreto no 97.916, de 6 de julho de 1989.


Brasília, 25 de julho de 2007;
186º. da Independência e 119º. da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Paulo Bernardo Silva

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Governo muda regras de convênios com Estados, municípios e ONGs para impedir fraudes

Agência Brasil
Publicado pelo
Valor Online em 27/07/07

O governo federal alterou as regras de convênios com estados, municípios, organizações não-governamentais (ONGs) e outras entidades privadas, para evitar desperdício de dinheiro público e fraudes como o esquema de superfaturamento de ambulâncias detectado pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Sanguessugas.

O decreto com as novas regras foi publicado quarta-feira no Diário Oficial da União e entra em vigor em janeiro do ano que vem. "Temos um baixo grau de eficiência na gestão das transferências de recursos", reconheceu o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, ao anunciar ontem as medidas.

"Nosso objetivo, com esse decreto, é estabelecer um controle melhor, mais eficaz e mais eficiente sobre os recursos que transferimos através de convênios", enfatizou. Segundo o ministro, o governo federal repassa anualmente, por convênio, R$ 12,2 bilhões para estados e municípios, e R$ 3 bilhões para ONGs e outras entidades privadas.

Entre as novas regras está a proibição de convênios com entidades que tenham, entre seus dirigentes, membros de qualquer Poder, servidores públicos do órgão concedente e parentes deles até segundo grau. "Com certeza, isso evita influências indevidas", avaliou Paulo Bernardo.

Outra medida é a proibição de convênios com o setor público de valor inferior a R$ 100 mil. O governo pretende, ainda, padronizar convênios mais celebrados, com a definição, por exemplo, do tipo de obra que cada município pode contratar a partir do tamanho da população. "Vamos restringir a possibilidade de fazer uma obra ou convênio com um município que claramente não comporte um investimento tão grande", explicou Paulo Bernardo.

As entidades privadas interessadas em firmar convênios serão cadastradas nos moldes do Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf). Isso significa obrigatoriedade de comprovação de inexistência de dívidas com o poder público, não ter inscrição nos bancos de dados de públicos e privados de proteção ao crédito, e regularidade com as Fazendas federal, estadual e municipal e com o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).

O decreto determina também a obrigatoriedade de registro em conta específica do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi) dos convênios com vigência plurianual, visando à eliminação de obras inacabadas. Isso significa que cada ministério terá de registrar sua dotação para convênios no Siafi e manter uma previsão no orçamento do ano seguinte. "A partir do momento em que ele gastar toda a sua dotação, o sistema vai impedir novos convênios", explicou o ministro.

Para permitir o controle pela sociedade civil, será criado o Portal dos Convênios, com informações detalhadas e atualizadas sobre a seleção e execução dos convênios. "Qualquer cidadão poderá ter acesso ao nosso portal e verificar o andamento de um convênio, desde a assinatura até a prestação de contas. Portanto vai aumentar muito a transparência ", informou o ministro.

De acordo com o Ministério do Planejamento, há 92 mil processos de convênios pendentes de análise pelo governo federal e alguns são ainda da década de 70. A cada ano, 32 mil novos convênios são firmados, com custo operacional de R$ 100 mil. Com as novas regras, o governo federal espera reduzir em 15 mil o total anual de convênios, o que deve resultar em uma economia de R$ 1,5 bilhão apenas em custos operacionais.

O Ministério do Planejamento e a Controladoria Geral da União (CGU) trabalharam durante um ano no Decreto 6.170/07, com ajuda do Ministério da Fazenda, da Casa Civil e do Tribunal de Contas da União. Paulo Bernardo admitiu que os trabalhos foram acelerados em função dos resultados da CPI dos Sanguessugas. "Já estávamos trabalhando em medidas para melhorar o nosso desempenho, a nossa gestão, e facilitar o trabalho dos nossos parceiros. Esse chamado 'escândalo dos sanguessugas' colocou claramente que havia falhas gritantes nos nossos procedimentos e passamos a trabalhar com maior celeridade, com mais afinco, para buscar uma solução. Nós queremos, se não impedir completamente, coibir com muita força desvios e irregularidades", afirmou.

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Consulta pública vai definir regras sobre fiscalização de transgênicos

Agência Brasil
Publicado pelo V
alor Online em 27/07/07

Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) vai criar uma norma para fiscalizar se os alimentos contendo transgênicos provocam risco à saúde. O regulamento técnico, como é chamado, ainda está em elaboração. O esboço foi aberto a consulta pública na internet. As sugestões podem ser enviadas pela internet ou pelo fax.

Quando for publicado, após consulta, o regulamento vai definir as normas para avaliar a segurança sobre o consumo humano de alimentos transgênicos ou que usem transgênicos em sua elaboração.

A consulta pública da Anvisa, de número 63, contém 119 perguntas ao público. "Com a consulta, os diferentes segmentos da sociedade podem avaliar esse roteiro, dizer se está correto ou se está incompleto; se aborda ou deixa de abordar aspectos importantes; para que se chegue a um texto que permita avaliar a segurança no consumo de transgênicos", explica o diretor-presidente da Anvisa, Claudio Maierovitch.

Maierovitch disse que as regras para a avaliação dos produtos devem garantir que eles não sejam tóxicos, não causem alergias, nem causem infecções. "Algumas questões serão respondidas com as declarações das empresas sobre os produtos, mas outras precisam trazer os resultados de laboratório e de estudos que comprovem que aquela resposta é verdadeira".

O diretor da Anvisa lembrou que a lei determina que produtos que contenham mais de 1% de material transgênico devem trazer a identificação na embalagem. "Isso é lei, não é uma definição da Anvisa", afirma.

A Anvisa esclarece que o regulamento técnico vai preocupar-se apenas com a possibilidade do transgênico trazer danos à saúde humana. Não serão analisadas questões ambientais. O texto da Consulta Pública 63 está disponível na página da agência www.anvisa.gov.br. Quem quiser participar poderá enviar sugestões, até o próximo dia 10 de setembro, através do e-mail gacta@anvisa.gov.br ou pelo fax (61) 3448.6274.

(Agência Brasil)

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Três gerações de políticas sociais

Augusto de Franco, 2003

As políticas de intervenção centralizada do Estado, as políticas públicas de oferta governamental descentralizada e as políticas públicas de parceria entre Estado e sociedade para o investimento no desenvolvimento social, representam três gerações diferentes de políticas sociais. Pelo menos no Brasil, os dois primeiros tipos de políticas mencionados, que predominaram, respectivamente, nas décadas de 1980 e 1990, foram gestados, em grande parte, na década imediatamente anterior. E cada geração de políticas, ao se tornar dominante, incorpora ou mantém a geração anterior de modo subordinado.


A primeira geração: políticas de intervenção centralizada do estado

Nos anos 80, predominaram as políticas de intervenção centralizada do Estado, quer pela ação redentora de uma tecnoburocracia pretensamente iluminada, quer pela atuação clientelista e paternalista de atores políticos populistas ou de setores oligárquicos conservadores. Mas as sementes desse tipo de política foram plantadas nos anos anteriores, em grande parte na década de 1970. No Brasil, aliás, a Ditadura Militar se orgulhava do prodígio de ter elevado significativamente (quase) todos os indicadores sociais (o que é verdade, se considerarmos os indicadores sociais tradicionais, ou seja, aqueles que não pretendem medir a produção e a reprodução do capital social).

As políticas de intervenção centralizada do Estado são as políticas sociais de primeira geração, para as quais:

i) o Estado é suficiente;

ii) os benefícios são uma espécie de concessão do poder e/ou de intermediação político-partidária, eleitoral ou institucional;

iii) seus serviços não são encarados propriamente como direitos; e

iv) a gestão governamental não é pública porquanto não é transparente, admite graus insuficientes de accountability e não incorpora – em uma dinâmica democrática – outros atores na sua elaboração, na sua execução, no seu monitoramento, na sua avaliação, no seu controle ou na sua fiscalização.


A segunda geração: políticas públicas de oferta governamental descentralizada

Nos anos 90, predominaram as políticas públicas universais, baseadas na oferta estatal e que podem ser resumidas na célebre (e um tanto surrada) máxima: “direito do cidadão, dever do Estado”. No entanto, as idéias e as práticas seminais que possibilitaram o florescimento desse tipo de política foram experimentadas na década de 1980 e, no Brasil, tiveram sua expressão-síntese legal na Constituição de 1988.

As políticas públicas de oferta governamental descentralizada são as políticas sociais de segunda geração, para as quais:

i) o Estado não é mais suficiente porém cumpre ainda um (quase) exclusivo papel protagônico (desde que consiga se publicizar, razão pela qual as políticas públicas são encaradas, apenas ou principalmente, como políticas governamentais);

ii) deve-se perseguir os objetivos da despartidarização e da despersonalização, com o fim da intermediação político-partidária, eleitoral ou mesmo institucional, na oferta dos recursos públicos;

iii) deve-se eliminar progressivamente o clientelismo e o assistencialismo;

iv) deve estar obrigatoriamente presente a preocupação com a eficiência, a eficácia e a efetividade dos programas e das ações de governo, com seu monitoramento e avaliação e com a sua fiscalização ou controle por parte da sociedade;

v) embora admitam ações focalizadas em alvos ou públicos específicos (trabalho infantil, portadores de deficiências, crianças, gestantes e nutrizes em situação de risco etc.) os programas universais ainda são concebidos, em grande parte, de forma centralizada e sua execução é pensada a partir da oferta massiva e indiferenciada, enfatizando-se sempre, e não por acaso, os bilhões destinados para programas de previdência social, saúde e saneamento, educação, qualificação para o trabalho, combate à pobreza e distribuição de terra e de renda, os quais comporiam uma “rede” de proteção social, suposto sucedâneo, ou melhor, substitutivo, no caso do Brasil, do inatingido (e inatingível) Welfare State.


A terceira geração: políticas públicas de parceria entre estado e sociedade para o investimento no desenvolvimento social

Nos primeiros anos do Século 21, entretanto, ainda não floresceram plenamente as idéias e práticas seminais incubadas nos anos 90 e que constituiriam uma terceira geração de políticas sociais, a qual poderia ser resumida pela nova máxima giddensiana: “nenhum direito sem responsabilidade”. As políticas sociais de terceira geração são políticas multi e intersetoriais de desenvolvimento social, de investimento em ativos (nas potencialidades já existentes em setores e localidades) e não apenas de gasto estatal para satisfazer necessidades setoriais.

Para essa terceira geração de políticas sociais:

i) o Estado é necessário, é imprescindível, é insubstituível, porém não é suficiente, ou melhor, o Estado é tão necessário quanto insuficiente, devendo-se, portanto, lançar mão de parcerias e buscar constelar sinergias entre todos os setores (o Estado, o mercado e a sociedade civil) para promover o desenvolvimento;

ii) política pública não é sinônimo de política governamental, o Estado não detem nem deve deter o monopólio do público, existe uma esfera pública não-estatal em expansão, constituída por entes e processos da sociedade civil de caráter público, voltados, cada vez mais, à promoção do desenvolvimento;

iii) promover o desenvolvimento social não constitui uma tarefa lateral e separável das outras tarefas do Estado como indutor do desenvolvimento, na medida em que todo desenvolvimento é desenvolvimento social;

iv) induzir o desenvolvimento significa investir em capacidades permanentes de pessoas e comunidades (ou seja, basicamente, investir em capital humano e em capital social) para que possam afirmar uma nova indentidade no mundo ao ensaiar seu próprio caminho de superação de problemas e de satisfação de necessidades, tornando dinâmicas suas potencialidades para antecipar o futuro que almejam.

Evidentemente, essa terceira geração de políticas sociais corresponde a uma pauta de superação dos anos 90. Entretanto, por alguma razão, essa pauta ainda não está vigorando, a não ser de modo fragmentado e disperso, em localidades e setores, em geral periféricos do ponto de vista do padrão predominante de desenvolvimento.

Ora, isso indica três coisas. Em primeiro lugar, que os anos 90 devem ainda ser revelados. Em segundo lugar, que se deve trabalhar para difundir uma nova pauta para as primeiras décadas do presente século, uma pauta que materialize as inovações introduzidas na década anterior. E, em terceiro lugar, que enquanto esses trabalhos de convencimento e de disseminação não se consumam, a semeadura da década de 1990 deve ser protegida.


Desvelando os anos 90: do novo paradigma da administração pública para um novo padrão de relação entre estado e sociedade

Os anos 90 foram os anos em que se materializou um novo paradigma da administração pública, representado por uma reforma administrativa da estrutura e do funcionamento do aparelho de Estado que contemplava, entre outras coisas:

i) a redefinição do papel do Estado e a reformatação legal de seus organismos;

ii) a privatização e a publicização de funções consideradas não privativas ou exclusivas de Estado e a execução descentralizada e, em alguns casos, terceirizada, de programas governamentais;

iii) a idéia de direito universal à oferta estatal de políticas de qualidade;

iv) a satisfação do beneficiário como cliente de serviços públicos;

v) a avaliação de resultados com base em critérios de eficiência, eficácia e efetividade (impacto); e

vi) o controle social de programas e ações de governo por parte de uma grande variedade de conselhos setoriais de políticas públicas com participação cidadã.

Todavia, nos anos 90 foram também lançadas as sementes de um novo padrão de relação entre Estado e sociedade, que poderia ser representado por algo como uma “reforma” das políticas sociais. Tal “reforma” foi prefigurada, porém não foi consumada. Ao contrário das outras reformas – digamos, clássicas – do Estado, ela não seria baseada em uma nova lei, nem seria operada por atores político-institucionais tradicionais, mas seria feita “por dentro”, como rebatimento de um experimentalismo inovador que apenas começou a vicejar sob o influxo de novas realidades emegentes, tais como:

i) a expansão de uma esfera pública não-estatal;

ii) o crescimento espantoso de um chamado terceiro setor;

iii) o surgimento de novas idéias e práticas de responsabilidade social por parte de empresas e instituições da sociedade civil;

iv) a progressiva mudança da configuração da sociedade hierárquica para uma sociedade-rede (com destaque para a possibilidade da conexão global-local viabilizada pela Internet); e,

v) a construção de novos desenhos de programas públicos, mais compatíveis com essa nova configuração da sociedade – os chamados programas inovadores: focalizados, flexíveis, que desencadeiam inovações capazes de alterar seu desenho original, baseados em múltiplas parcerias, preocupados com monitoramento e avaliação constantes e voltados para a conquista da sustentabilidade.

Sobre esse último ponto, correndo os riscos do esquematismo e da caricaturização, sempre presentes nas tentativas de contrapor características de realidades diversas, poder-se-ia elaborar um quadro comparativo de programas tradicionais conservadores versus programas experimentais inovadores (ver Tabela 1). Como em todo esquema, as características assinaladas nas duas colunas da Tabela 1 constituem limites, em geral não-atingíveis plenamente. Por exemplo, não existem ações setoriais totalmente desarticuladas e, em contraposição, também não existem ações globais totalmente integradas. Para sermos mais precisos deveríamos dizer que os programas conservadores tendem a ser mais setorais e mais desarticulados do que os programas considerados inovadores. A rigor, portanto, não existem programas (totalmente) conservadores e programas (totalmente) inovadores. Nos programas realmente existentes predominam, todavia, ou características conservadoras ou características inovadoras.

Tabela 1



É preciso ver ainda que nos anos 90 foram também experimentados novos modelos de programas sociais como programas de indução ao desenvolvimento, baseados em uma nova concepção de desenvolvimento (humano, social e sustentável). Isso tudo teve a ver com inovações conceituais surgidas em diversos lugares do mundo e que, sobretudo graças à Internet, puderam ser compartilhadas em tempo real.

Apenas para dar um exemplo dessas inovações em termos de concepções que influenciaram fortemente a experimentação de novos programas e de novas ações de desenvolvimento, poder-se-ia citar:

i) a concepção sistêmica, sobretudo a concepção dos sistemas complexos adaptativos, trazendo consigo as idéias de sustentabilidade como função de integração e como conservação da adaptação (destacando-se nesta área o papel do Santa Fe Institute, fundado pelo físico Murray Gell-Man em 1984 mas que somente na década de 1990 pôde apresentar resultados mais significativos no tocante a uma nova visão sistêmica sobre as interações sociais);

ii) a hipótese da existência de vários fatores do desenvolvimento – não como externalidades, porém com o mesmo status de centralidade, os quais foram interpretados, assim, como outros tipos de “capitais” – e sobretudo o conceito de capital social (de vez que foi nos anos 90 que surgiu a maior parte das teorias do capital social, inclusive aquelas baseadas no suposto da capacidade da sociedade humana de gerar ordem espontaneamente a partir da cooperação);

iii) a idéia de cooperação e de cooperatividade sistêmica como elementos sem os quais a competição e a competitividade sistêmica levam a crescimento concentrador e, portanto, a crescimento sem desenvolvimento;

iv) a idéia da sociedade-rede (devendo ser lembrado que a obra principal de Castells, que melhor identificou tal fenômeno, é um fruto dos anos 90) bem como o desenvolvimento de uma nova disciplina de análise das redes sociais (Social Network Analysis), o surgimento das redes P2P e o estudo do encurtamento do tamanho do mundo em virtude do aumento da conectividade (o efeito “small-world networks”);

v) a idéia da radicalização ou democratização da democracia, da democracia em tempo real, democracia digital ou cyberdemocracy, e a compreensão das relações intrínsecas entre desenvolvimento e política (quer dizer, a concepção de desenvolvimento como mudança social);

vi) a compreensão da existência e do papel estratégico, para o desenvolvimento, da nova sociedade civil (ou seja, daquele conjunto de entes e processos extra-estatais e extra-mercantis, também chamado de terceiro setor);

vii) a compreensão do fenômeno complexo chamado de globalização e a idéia de glocalização; e

viii) o reflorescimento da perspectiva comunitária, a ‘volta ao local’, a revolução do local e a reformulação da idéia original de glocalização como localização (ou seja, a idéia de que ‘o local conectado é o mundo todo’ – esta última, porém, já fruto dos primeiros anos do terceiro milênio).

Tais idéias induziram (e continuam induzindo) profundas mudanças nas maneiras de pensar e de fazer políticas públicas. Não podemos simplesmente ignorá-las, sob pena de perder boa parte do que de inovador foi aportado pelos anos 90. Ao ficar fora da década de 1990 (neste sentido) corremos o risco de não perceber a promessa de “reforma” das políticas sociais que foi prenunciada por arte do experimentalismo inovador e que ainda poderá ser consumada.

Por isso é tão importante fazer um balanço da década anterior, investigando, por um lado, as políticas (governamentais) de segunda geração que nela se desenvolveram e, por outro lado, o experimentalismo pulverizado e desordenado da sociedade (muitas vezes em parceria com o Estado) em uma antecipação das políticas de terceira geração. Se não fizermos isso, corremos o risco de ser automaticamente remetidos ao passado, ficando sujeitos a ser orientados por concepções e práticas dos anos 80 (que nos induzirão a reeditar políticas de primeira geração).

De qualquer modo faz parte do exercício da nossa responsabilidade política pelo desenvolvimento social do Brasil tentar colocar na ordem do dia uma nova pauta, mais sintonizada com o novo século.


Uma nova pauta para as primeiras décadas do século 21

Uma pauta capaz de dar continuidade às inovações introduzidas nos anos 90, ou melhor, capaz de ensejar o pleno florescimento das idéias e práticas seminais experimentadas na década passada, constituiria uma proposta-base para um novo consenso, nem mercadocêntrico nem estadocêntrico, porém centrado na sociedade. Uma pauta como essa deveria contemplar, pelo menos, os oito pontos seguintes:

1 – Como correspondente da disciplina e da responsabilidade fiscal, a responsabilidade social de indivíduos e organizações.

2 – Ao invés de contenção (ou do aumento) do gasto público na área social, a mudança do perfil desse gasto, com a progressiva mas determinada substituição de programas centralizados e baseados na oferta estatal (principalmente os de transferência direta de recursos ou de renda) por programas descentralizados, que promovam a negociação e exijam contrapartidas locais visando estabelecer o casamento entre oferta e demanda, e por programas de indução ao desenvolvimento e de investimento em capital humano e em capital social baseados na parceria com o mercado e com o terceiro setor.

3 – Para além de uma reforma tributária que evite déficits fiscais, uma reforma tributária que também desonere a produção formal, abarque a economia informal e estimule o engajamento do terceiro setor nas atividades de interesse público.

4 – Concomitantemente com políticas voltadas para o saneamento e o fortalecimento do sistema financeiro nacional, o incentivo à construção de um sistema microfinanceiro, a ser operado tanto pelo mercado quanto pelo terceiro setor, tendo por objetivo ofertar crédito produtivo para tomadores formais e informais que não possam apresentar garantias reais, e com condições de captar poupança popular e de prestar outros serviços financeiros às populações sem acesso ao crédito formal e à propriedade produtiva.

5 – Contrabalançando políticas de privatização, políticas de publicização que envolvam a parceria com a sociedade e, em alguns casos, a transferência, para organizações da nova sociedade civil situadas na intercessão com o Estado e para organizações da sociedade civil de caráter público constituídas sob o influxo de razões de Estado, de funções até então desempenhadas pelo Estado.

6 – Juntamente com a desregulamentação, a instituição de mecanismos de controle social do Estado pela sociedade, de orientação social do mercado e de responsabilização social de todos os setores, que promovam a correspondência entre direito e responsabilidade (segundo a máxima “nenhum direito sem responsabilidade”).

7 – Avançando sobre o aumento das garantias associadas aos direitos de propriedade para os setores produtivo e financeiro, uma reforma legal que promova o acesso aos direitos formais de propriedade, das posses imobiliárias de pessoas de baixa renda, com o intuito de possibilitar sua utilização como alavanca para obter crédito e gerar capital.

8 – Por último, uma reforma do marco legal que regule as relações do Estado com o terceiro setor e com o mercado (com tratamento diferenciado para organizações da sociedade civil de interesse público e para micro e pequenas empresas), facilite as parcerias intersetoriais, possibilite a construção de um sistema de financiamento mais sustentável para o terceiro setor, promova a inclusão da economia informal, crie ambientes locais e setoriais favoráveis à obtenção de sinergias entre ações governamentais e não-governamentais, de modo a aumentar a eficiência e a eficácia das políticas públicas e a alavancar recursos novos — que não podem ser extraídos como receita fiscal, mas podem ser mobilizados na base da sociedade e direcionados para o desenvolvimento dos ativos já existentes, a dinamização das potencialidades latentes e a satisfação das necessidades das populações.

É importante frisar que uma pauta como essa, de seguimento dos anos 90, é também uma pauta de superação dos consensos mercadocêntricos (como o chamado “Consenso de Washington”) que floresceram na década de 1990 (conquanto, no Brasil, tais consensos não tenham prevalecido tanto assim quanto se afirmou). E que uma volta aos anos 80 representaria uma volta à concepções estadocêntricas de décadas pretéritas, cujas raízes são anteriores inclusive aos anos 70, ou seja, representaria uma espécie de “fuga pra trás” que, no afã de se contrapor ao neoliberalismo, poderia reintroduzir idéias e práticas contra-liberais e regressivas capazes de ameaçar a integridade das sementes usinadas pelo experimentalismo inovador exercitado durante a década de 1990. Por isso torna-se fundamental proteger tais sementes.


Protegendo a semeadura dos anos 90

Para continuar com a metáfora da semente, podemos dizer que do ponto de vista da nova geração (prenunciada) de políticas sociais, os anos 80 foram anos de preparação da terra. Os anos 90 foram anos de semeadura. Mas a primeira década do século 21, a julgar pelos acontecimentos ocorridos, no plano global, nos seus primeiros anos – sobretudo a “America’s new war”, um ‘estado de guerra’ permanente, introduzido pelo governo da maior nação do planeta, acarretando um recrudescimento do estatismo no mundo inteiro – não será, ainda, de pleno florescimento, porém, em grande parte, de germinação (o tempo em que “o grão tem que morrer”). Por isso, ao que tudo indica, será uma era de (aparente) retrocesso em vários campos e em vários lugares, com a retomada de velhos paradigmas de administração pública e de velhos padrões de relação entre Estado e sociedade – e isso de várias maneiras, patrocinadas por atores conflitantes e em circunstâncias contraditórias.

Oxalá nossos novos governos, eleitos em 2002, consigam compreender e acompanhar o caminho já iniciado por múltiplos setores de nossa sociedade, que estão neste momento se mobilizando e se organizando para definir seus próprios caminhos de desenvolvimento. E não sucumbam à tentação de resolver tudo para o povo e pelo povo, despejando “tapetes de programas” (parodiando a expressão “tapete de bombas”, usada por um membro do Estado Maior dos USA na guerra atual contra o Iraque), baseados puramente na oferta de recursos para suprir necessidades, ao invés de empoderar as populações para que elas próprias se emancipem, encorajando e capacitando suas lideranças para que invistam em seus próprios ativos.

Como tenho repetido, em várias ocasiões, a questão da pobreza no Brasil é muito mais uma questão política do que de carecimento de recursos. Como todo desenvolvimento é desenvolvimento social e como desenvolvimento social é mudança social e como mudança social é uma questão política, tudo depende – muito mais do que, às vezes, imaginamos – de não reproduzir uma atuação política intervencionista, verticalista e centralizadora, pois é esse tipo de atuação que extermina capital social e impede que pessoas e comunidades valorizem e desenvolvam seus próprios ativos, encontrando suas próprias soluções para resolver seus problemas, da sua maneira, afirmando a sua identidade.

Mesmo em um cenário mundial adverso (como o que provavelmente teremos pela frente), cabe aos governos e às organizações indutoras ou promotoras do desenvolvimento, se quiserem surfar nessa nova onda, incentivar a participação de atores locais e setoriais na esfera pública, estimular a cooperação e a conexão horizontal entre pessoas, comunidades e organizações e democratizar procedimentos e processos decisórios, quebrando os elos inferiores da cadeia clientelista para libertar latentes energias empreendedoras coletivas e individuais.

Os que apostam nesse caminho – sejam governos, de qualquer nível, empresas ou organizações da sociedade, nacionais ou internacionais – têm agora a missão de construir “viveiros” ou “incubadoras” para que as experiências-semente de uma terceira geração de políticas sociais, ensaiadas na década de 1990, não desapareçam antes de poderem florescer, algum dia, em toda a sua plenitude.

Brasília, abril de 2003.

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“É necessário voltar os olhos para o cidadão. As ONGs não podem seguir a lógica das empresas”

Eliane Iensen
Publicado no site da Secretaria de Justiça e Desenvolvimento Social do Rio Grande do Sul


Entrevista com Augusto de Franco (foto)

Considerado um dos maiores especialistas em desenvolvimento local e inclusão social, Augusto de Franco busca de forma constante superar antigos paradigmas. Ex-coordenador-geral da Agência de Educação para o Desenvolvimento (2001-2005), atualmente está com o projeto chamado Nan Daí, uma rede de desenvolvedores independentes que trabalham com o ‘Triângulo da Sustentabilidade’: Desenvolvimento- Redes Sociais- Democracia. Entre 1995 e 2002, foi coordenador executivo do Conselho da Comunidade Solidária, onde foi o responsável pelas Rodadas de Interlocução Política que geraram, por exdentre outros resultados: a chamada Nova Lei do Terceiro Setor (Lei 9790/99, que criou as Oscips); a estratégia de indução ao Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável (Programa Comunidade Ativa); e o início do processo de regulamentação da atividade microfinanceira no Brasil.

Autor de mais de 12 livros, Augusto de Franco é também um crítico contumaz. Defende que a formação de redes não pode ser apenas instrumento para reivindicação ou um meio de ‘pendurar’ ao Estado demandas das comunidades. “Elas devem detectar as necessidades, identificar os ativos que existem e alavancar recursos novos”, sintetiza. Entende que o terceiro setor não deve seguir nem a lógica das empresas nem do Estado, mas tem de ser capaz de articular redes de pessoas em vez de erigir estruturas burocráticas. Segundo ele, esse também é o caminho para o desenvolvimento social. A seguir, a síntese da entrevista.

Imprensa SJDS - A formação de redes, envolvendo governos, setor privado e organizações sociais, vem se constituindo em alternativa para a execução de demandas apresentadas pelas comunidades? A participação de comunidades, organizadas em territórios, é fundamental para que haja execução de políticas públicas com qualidade?


Augusto de Franco - A formação de redes representa sempre um avanço em relação às formas tradicionais de organização burocrática e piramidal. Redes envolvendo os três setores: Estado, mercado e sociedade civil são importantes porque conseguem, por meio da parceria, extrair sinergias da combinação dessas três formas de agenciamento. No entanto, essas redes não devem ser olhadas, nem apenas, nem principalmente, como forma de apresentar demandas das sociedades aos governos, mas como formas de enfrentar problemas e aproveitar oportunidades (inclusive por meio da parceria com governos). As redes não podem ser instrumentos para reivindicação nem ser usadas como modos de pendurar ao Estado as diversas demandas dos setores sociais. Elas devem detectar as necessidades, identificar os ativos que existem e alavancar recursos novos. A vantagem das parcerias intersetoriais – operacionalizadas em rede – é, precisamente, aportar novos pontos de vista, incorporar iniciativas inéditas, novos modos de fazer e, inclusive, assumir novas responsabilidades na execução do que precisa ser feito para promover o desenvolvimento social (e não apenas ficar discutindo o que “terceiros”, via de regra o Estado ou o governo, devem fazer). É preciso ver que a participação das comunidades é fundamental para a execução de políticas públicas com qualidade. Não se pode entender por políticas públicas apenas as políticas governamentais. Políticas feitas por comunidades em prol do seu desenvolvimento são políticas públicas, embora nem sempre sejam governamentais stricto sensu. Além disso, o fundamental em uma política é que ela promova o desenvolvimento e não o fato de ela ser tomada nominalmente como política pública. Boa parte das políticas governamentais, embora assim se considere, não são públicas coisa nenhuma, ou seja, não há qualquer publicização na sua elaboração, na sua execução, no seu monitoramento, na sua avaliação e na sua fiscalização, em suma, na sua gestão. A gestão das políticas públicas governamentais ainda está longe de ser pública. Em geral, elas são concebidas e realizadas por burocracias que não acham que seja possível e necessário incorporar outros atores no processo. Não é por acaso que, não raro, as tais políticas públicas governamentais são promovidas por único ator, desperdiçando as energias e os recursos latentes nas comunidades. E não é por acaso que, nessas políticas, ainda se empreguem expressões como “público-alvo” e “beneficiários”, em vez de participantes, o que denota que o “povo”, os “pobres” ou as “populações carentes” às quais se destinam são encarados como objetos e não como sujeitos das ações. Políticas concebidas dessa maneira podem até ser chamadas de políticas públicas, mas concorrem para transformar as populações em beneficiárias passivas e permanentes de programas que vêem do alto. Do ponto de vista do desenvolvimento humano e social sustentável é mais importante que uma política seja democratizante, incorporando e valorizando a participação dos cidadãos, do que ser autonomeada política pública. Há um mito e muito blá-blá-blá em torno da noção precaríssima de “política pública”. Redes propriamente ditas devem ser redes de pessoas, P2P ou peer to peer. Isso não significa que não devamos fazer redes de instituições para aproveitar as sinergias. Mas significa que os fenômenos inéditos que podem acontecer em redes distribuídas não acontecerão nas redes descentralizadas de organizações hierárquicas que articulamos setorialmente sob o guarda-chuva genérico da palavra rede (que está na moda).

Imprensa SJDS - Nas últimas décadas, ocorreram mudanças intensas nas organizações do terceiro setor. Hoje, fala-se em planejamento estratégico, objetivos, metas e resultados. Esses conceitos de gestão, somado ao fato de as ONGs contarem com profissionais qualificados, contribuem para sua profissionalização? Qual a sua avaliação sobre o terceiro setor no Brasil?

Augusto - Minha avaliação já foi mais otimista do que é hoje. E posso falar com tranqüilidade porquanto sou um participante do chamado terceiro setor há quase 30 anos (desde 1979). O terceiro setor está diante de um desafio: ou consegue superar a sua forma de organização predominante (a nova burocracia associacionista que constituiu) ou não vai mais poder cumprir um papel inovador. É forçoso reconhecer que as organizações da sociedade civil, em sua imensa maioria, ainda se estruturam como mainframes e não como networks. Quando se denominam redes, quase sempre, isso é feito de forma indevida. É aplicada a estruturas verticais de poder, com baixíssimo grau de rotatividade nas suas direções e uma burocracia que, a despeito de ser reduzida pela falta de recursos, não deixa de ser formalmente semelhante a qualquer outra burocracia baseada na opacidade dos procedimentos e na verticalidade do fluxo comando-execução. Também é forçoso reconhecer que o paradigma organizativo dessas entidades ainda é aquele, digamos, das fronteiras fechadas. Essa conversa de que as ONGs vão se profissionalizar acaba enfraquecendo a sociedade civil. As organizações do terceiro setor não têm de imitar as empresas (e muito menos os governos) e sim afirmar a sua identidade própria de organizações da sociedade civil, presididas por uma lógica e uma racionalidade diferente daquela que rege o mercado (e da que rege o Estado). Se não se reciclar, a ‘nova burocracia associacionista das ONGs’ virará, em breve uma força francamente regressiva em termos da democratização da democracia e do desenvolvimento humano e social sustentável. Em geral me perguntam: então o que podemos fazer, nós que priorizamos a atuação na sociedade civil, no terceiro setor – para dar nossa contribuição à democracia e ao desenvolvimento? Minha resposta tem sido sempre a seguinte: articulem redes de pessoas em vez de erigir estruturas burocráticas. Não façam igrejinhas. Não construam castelinhos. Não tentem privatizar o capital social do seu entorno ou do seu setor. Capital social é um bem público: quando privatizado, estraga. E pode dar origem a certas formas perversas de sociabilidade. Sobretudo, não tentem jogar usando como cacife às relações alheias, negociando a partir da apropriação da vida social das comunidades, organizando, por exemplo, um “curral de pobres” para conseguir uma verba governamental, para atuar como terceirizada na implantação de uma política de assistência social. É necessário voltar os olhos para o cidadão, desorganizado do ponto de vista tradicional, mas muito conectado, que está emergindo neste dealbar do século 21. É incrível como, quando se fala de sociedade civil, esquece-se de que ela é composta por cidadãos. Fala-se ainda de “sociedade civil organizada” como se isso fosse grande coisa diante de milhões de pessoas que podem opinar e participar, não arrebanhadas ou acarreadas por organizações hierárquicas, mas diretamente, personalizadamente.

Imprensa SJDS - Como promover o desenvolvimento humano e social sustentável num país em que ainda predominam os cenários de desigualdades e casos de corrupção?

Augusto - Os cenários de desigualdades – não apenas de renda, mas também de riqueza, de conhecimento e de poder – são o motivo pelo qual se torna necessário promover o desenvolvimento humano e social sustentável. Já os casos de corrupção, sobretudo de corrupção política e de ‘corrupção de Estado’ (como estamos assistindo no Brasil a partir de 2003), esses sim, constituem obstáculos gravíssimos à promoção do desenvolvimento. Não há fórmula para enfrentar isso. É preciso que cada qual assuma, para além da sua responsabilidade social, a sua responsabilidade política (e essa é uma conversa que só agora começa a surgir, por exemplo, no seio do empresariado). Nas organizações da sociedade civil, porém, temos um problema: grande parte delas está politizada e partidarizada e, assim, não quer ver o problema. Quem duvidar dessa avaliação que faça uma pesquisa sobre como votaram os dirigentes das organizações da sociedade civil mais conhecidas nacionalmente nas oito últimas eleições (considerando primeiro e segundo turnos dos pleitos presidenciais de 1989 a 2006) e comprovará por si mesmo se é verdade ou não o que estou afirmando.

Imprensa SJDS - Que meios podem ser usados para estimular a participação da sociedade civil em ações que visem ao desenvolvimento da sociedade?

Augusto - Creio que o melhor meio é a promoção do desenvolvimento local (como se sabe, todo desenvolvimento é social e local) de um ponto de vista sistêmico, ou seja, investindo em capital humano (capacidades permanentes) e em capital social. Capital social é um recurso para o desenvolvimento aventado recentemente para explicar por que certos conjuntos humanos conseguem criar ambientes favoráveis à boa governança, à prosperidade econômica e à expansão de uma cultura cívica capaz de melhorar as suas condições de convivência social.

Imprensa SJDS - O senhor fez parte atuante do comitê responsável pela elaboração da Nova Lei do Terceiro Setor (9.790/99), que criou as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscips). Que avaliação o senhor faz da implementação dessa lei no atual contexto? Ela tem sido satisfatória? O que pode ser aperfeiçoado?

Augusto - Quando coordenei esse processo, entre 1996 e 2002 (a lei das Oscips foi aprovada em 1999), não pensava exatamente como penso hoje, sete anos depois. Creio que as Oscips tiveram uma grande expansão (o que pode ser um bom sinal, sobretudo se considerarmos que várias delas são dedicadas à promoção do desenvolvimento). No entanto, a nova lei enfrentou a resistência feroz, por um lado, dos estatistas (que achavam se tratar de um expediente neoliberal para enfraquecer o Estado) e, por outro lado, do mundo jurídico tradicional (abrigado nos nichos de uma velha cultura jurídica, também estatista, que remanescem dentro do Estado, em especial nas assessorias, procuradorias e outros departamentos jurídicos de órgãos governamentais). É claro que já sabíamos, quando propusemos a lei, que ela não seria suficiente, representando apenas um pequeno primeiro passo da necessária reforma do marco legal do terceiro setor. Infelizmente, depois de 2002, esse processo de reforma foi abortado. Hoje penso que precisaríamos de outros dispositivos legais e infralegais que ensejassem e estimulassem a participação dos cidadãos como tais, sem necessidade de serem adotados por alguma estrutura organizativa tradicional.

Imprensa SJDS - A Secretaria da Justiça e do Desenvolvimento Social está desenvolvendo o projeto Rede Parceria Social. Qual sua avaliação sobre essa iniciativa?

Augusto - Creio que está no bom caminho. E espero que a secretaria continue nesse caminho, inclusive quando se der conta de que, para além de promover arranjos de instituições, será necessário conectar pessoas-com-pessoas para a promoção do desenvolvimento social de comunidades e setores. E será necessário adotar uma postura corajosa de defesa da promoção do desenvolvimento social que ultrapassa as ações setoriais voltadas à assistência social. Isso significará ter de enfrentar uma cultura muito disseminada na chamada “área social”. Porque quando falam em ‘social’ as pessoas, em geral, ainda querem se referir àquelas condições que permitem a satisfação de necessidades humanas. Não é por acaso que as chamadas políticas sociais, sobretudo para os governos, são aquelas que ofertam produtos (ações, programas e serviços) de educação, saúde. Ou seja, componentes do capital humano (ou do desenvolvimento humano) e não do capital social (ou do desenvolvimento social). Há, ainda, um sentido mais restrito – quase pejorativo – do termo social: aquele que se pega emprestado para designar políticas de combate à pobreza ou à desigualdade, sejam políticas de geração de emprego e renda (tomando a pobreza como insuficiência de renda e a desigualdade como desigualdade econômica, quer dizer, verificada na distribuição desigual da renda), sejam políticas ditas de assistência social. Não se pode negar que aqui se encontram aqueles elementos do “pobrismo” – um tipo de ideologia que contaminou os discursos de inclusão social dos que defendem o protagonismo único ou preponderante do Estado na promoção do desenvolvimento social. Isso precisa ser enfrentado.

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Bolsa especial vai tentar melhorar qualidade em 3 áreas

Lisandra Paraguassú
Publicado pel'
O Estado de São Paulo em 28/07/07

Serão contemplados alunos de licenciaturas críticas, como Física e Química.

O Ministério da Educação (MEC) vai criar um programa de bolsas para estudantes de licenciatura nas universidades federais, com ênfase para aqueles que estejam na área de Física, Química e Matemática. A intenção é treinar os alunos de licenciatura em projetos didáticos desde o início dos cursos, assim como já é feito com programas de iniciação científica.

A falta de um programa de treinamento para os estudantes de licenciatura foi uma das críticas recebidas pelo MEC contrárias ao Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), apresentado em abril.

Segundo o ministro da Educação, Fernando Haddad, a crítica chamou a atenção do ministério. “Essa situação retrata um pouco o que era uma visão existente, de se apoiar a educação voltada para a pós-graduação e desassistir a educação voltada para o ensino básico”, afirmou. “Privilegiava-se o bacharelado e não a licenciatura.”

A estimativa do Conselho Nacional de Educação é que, hoje, faltem 246 mil professores para o ensino básico, especialmente nas áreas de ciências.

O programa está em fase de estruturação e deve ser implementado em 2008. Vai seguir os mesmos princípios do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic), existente hoje para os bacharelados. No Pibic, os alunos da graduação recebem uma bolsa para trabalhar em um projeto de pesquisa composto também por alunos da pós-graduação, orientados por professores da instituição.

O objetivo é despertar o mais cedo possível o interesse dos alunos pelo desenvolvimento de pesquisas científicas.

Integração
O Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid), como já foi batizado o novo programa, terá projetos de desenvolvimento de ensino e didática - também orientados por professores. A intenção é que esses projetos trabalhem diretamente com escolas públicas, servindo também como integração entre as universidades federais e os sistemas públicos de ensino.

“Será uma bolsa para amparar estágios, treinando já os estudantes para dar aulas. Estamos definindo como será a seleção de projetos, a relação com as escolas públicas. Estamos debruçados sobre os critérios”, explicou o ministro.

Haddad garante, no entanto, que já haverá recursos no Orçamento de 2008 para iniciar o programa.

As bolsas de graduação do Pibic são concedidas pelo Ministério de Ciência e Tecnologia, por meio do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq). Já os do Pibid deverão ser financiadas pelo próprio MEC. Hoje, o valor da bolsa de iniciação científica está em torno de R$ 300. As de iniciação à docência deverão seguir o mesmo padrão.

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Decreto torna mais rigoroso repasse a ONGs

Publicado pel'O Estado de São Paulo em 27/07/07

Decreto que regulamenta o repasse de verbas da União para organizações não-governamentais (ONGs) e da sociedade civil de interesse público (Oscips), Estados e municípios, publicado ontem no Diário Oficial, deverá resultar na economia de R$ 1,5 bilhão por ano aos cofres públicos.

A decisão, antecipada pelo Estado no dia 8, torna os convênios mais transparentes e faz uma série de exigências preventivas para que sejam assinados. O decreto foi planejado depois do escândalo dos sanguessugas, quando foi descoberto pela Polícia Federal o desvio de cerca de R$ 110 milhões do Orçamento destinado à compra de ambulâncias.

De acordo com o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, só em 2006 o governo federal repassou R$ 15,2 bilhões em convênios, sendo R$ 12,2 bilhões a Estados e municípios e R$ 3 bilhões a ONGs e Oscips. 'O decreto resultou de um trabalho conjunto dos ministérios da Fazenda e do Planejamento, do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Controladoria-Geral da União (CGU).

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Regiões Norte e Nordeste têm altos índices de desvios de recursos, diz CGU

Gabriela Guerreiro
Publicado pela
Folha Online em 24/07/07

Com base em trabalhos de fiscalização realizados pelo governo federal desde 2003, a CGU (Controladoria Geral da União) apontou nesta terça-feira as regiões Norte e Nordeste do país como campeãs em irregularidades na gestão de recursos públicos.

O ministro-chefe da CGU, Jorge Hage, disse que as duas regiões são as de "maior atraso político e menor acesso à informação", o que justificaria os altos índices de desvios em recursos públicos nessas localidades.

"Não é por acaso que há dificuldade de maior modernização da sociedade nesses locais", disse Hage. Segundo ele, a CGU já executou ações de fiscalização em mais de 1.200 municípios de todas as regiões do país - com o controle de pelo menos R$ 8 bilhões de recursos públicos.

O ministro realizou na manhã de hoje o sorteio de 60 municípios e oito Estados do país que serão fiscalizados pela CGU nos próximos meses. Os auditores da CGU vão visitar obras, hospitais, escolas e fazer a checagem de documentos e bens na tentativa de reduzir desvios - como a não-execução de contratos e o pagamento de propinas para a liberação de obras.

Hage reconheceu, no entanto, que as ações do governo não são suficientes para combater fraudes na gestão dos recursos públicos, uma vez que os criminosos acabam muitas vezes sem ser punidos. "Os corruptos sabem e podem pagar bons advogados", admitiu.

O ministro afirmou que a atuação da CGU permitiu a redução de fraudes como as descobertas pela Operação Navalha, da Polícia Federal, que desmontou esquema comandado pela empreiteira Gautama.

Nesta segunda-feira, a CGU considerou a Gautama inabilitada para firmar novos contratos com a administração pública federal. "Esperamos que isso sirva de exemplo e inibição para outras empresas que costumam ter as mesmas práticas e não foram descobertas", defendeu o ministro.

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