sexta-feira, 30 de maio de 2008

O alcance dos territórios

Programa Territórios da Cidadania investirá mais de R$ 11 bilhões em quase mil municípios brasileiros de baixo IDH na zona rural. TSs farão parte do cardápio, mas ainda enfrentam o desafio de chegar às periferias dos grandes centros urbanos
Foto MDA


Tendo em vista intensificar a reaplicação em escala de Tecnologias Sociais, o CC/RTS decidiu associar, quando possível, a reaplicação das TSs aos Programas de Transferência de Renda, como o Bolsa-Família. Também ficaram definidos, como espaços prioritários de intervenção, as periferias dos grandes centros urbanos e os Territórios da Cidadania.

Lançado pelo governo federal, dia 25 de fevereiro, o programa Territórios da Cidadania reúne 60 territórios rurais de baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), abrangendo cerca de mil municípios em todos os estados da federação. Entre seus objetivos estão a inclusão produtiva das populações pobres destes territórios, a integração de políticas públicas e a busca da universalização de programas básicos de cidadania, com investimentos estimados em R$ 11,3 bilhões para 2008.

“Na época da criação da RTS, buscamos privilegiar os territórios mais fragilizados do país. A idéia permanece e agora os Territórios da Cidadania permitirão alinhar esta reaplicação a um cardápio de políticas públicas”, avalia Lenart Nascimento, coordenador de Tecnologias Sociais da Petrobras. A idéia, avisa, não é atuar com exclusividade nestes territórios, mas se associar aos esforços de desenvolvimento territorial conduzidos por diversos entes de governo.

O Programa integra ações dos governos Federal, estaduais e municipais. Em cada território, um Colegiado Territorial composto pelas três esferas governamentais e pela sociedade determina um plano de desenvolvimento e uma agenda pactuada de ações. Os territórios foram definidos com base em conjuntos de municípios com características econômicas e ambientais comuns e com identidade e coesão social, cultural e geográfica.

Segundo a coordenadora do Instituto de Assessoria para o Desenvolvimento (IADH), Tânia Zapata, um dos grandes desafios do programa será garantir a integração de políticas públicas, tendo em vista a “tradição” do Brasil diante de diferentes e contraditórias políticas territoriais nos mais diferentes níveis de governo, com superposição de ações e desperdício de recursos. “Há recortes territoriais demais. Assim a gente recorta é a cidadania”, diz. Outro desafio, segundo ela, será a capacidade do programa em gerar ações efetivas de empoderamento local. “Na Europa, quando se fala em políticas territoriais se fala em descentralização, protagonismo local e integração de políticas. Não da oferta da instituição, mas da demanda da população”, alerta.

Maiores que o município e menores que o Estado, os territórios servem, em tese, para o planejamento de ações governamentais tendo em vista o desenvolvimento integrado dessas regiões. Em 2008 serão beneficiados 60 territórios em todo o país. Até 2010, outros 60 territórios serão incorporados ao programa. As 135 ações que serão desenvolvidas em 2008 por 15 ministérios, com investimentos da ordem de R$ 11,3 bilhões, vão beneficiar mais de dois milhões de famílias de agricultores familiares, assentados da reforma agrária, quilombolas, indígenas, pescadores e comunidades tradicionais. A esta agenda podem ser acrescidas ações dos governos estaduais e municipais.

“Ações como essas têm um alcance reduzido se não há também um forte trabalho para fortalecer a capacidade local de gerar alternativas e inovações. É preciso reforçar também redes solidárias e parcerias para ampliar e aprofundar a participação de setores tradicionalmente não alcançados por políticas de desenvolvimento”, admite o secretário de Desenvolvimento Territorial do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Humberto Oliveira.

A concepção do programa permite, por exemplo, que sejam desenvolvidas ações que combinem financiamentos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e ampliação da assistência técnica; construção de estradas e ampliação do Programa Luz para Todos; recuperação da infra-estrutura dos assentamentos e ampliação do Bolsa Família; implantação de Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) e ampliação dos programas Saúde da Família, Farmácia Popular e Brasil Sorridente; e construção obras de saneamento básico e de cisternas.

Olho nos territórios
“O principal desafio da focalização dos territórios e da escala é criar um efeito
demonstrativo que dê visibilidade às TSs Brasil afora, para que outros parceiros possam entrar”, avalia Lenart. Apesar da nova fase, todos os entrevistados ouvidos pelo Portal da RTS salientaram que os Territórios da Cidadania não devem ter exclusividade na reaplicação de Tecnologias Sociais.

“Muitos investidores econômicos querem focar as ações em suas áreas de atuação. As parcerias é que devem determinar os territórios”, diz o presidente da Fundação Banco do Brasil, Jacques Pena. Segundo ele, o desafio prioritário está na definição de Tecnologias Sociais passíveis de reaplicação em escala, capazes de garantir visibilidade e atração de novos parceiros. “O verdadeiro desafio não é investir em diversas TSs ao mesmo tempo, mas gerar convergências de instituições se concentrando em algumas TSs visando a questão da escala”, diz.

Para a reaplicação, a estratégia constituída na criação da RTS foi definir foco e territórios nos quais se concentraria a ação dos parceiros financiadores e reaplicadores. A idéia é que a concentração do financiamento em determinados espaços potencializaria o efeito da ação e dos recursos aplicados por cada um, o que geraria um efeito-demonstração para outras instituições e para o poder público, que poderiam adotar as TSs como política pública.

O foco foi o de geração de trabalho e renda. Já os territórios definidos foram aqueles reconhecidamente mais afetados pela situação de exclusão social: Semi-Árido e Vale do São Francisco, Amazônia e Periferias de Grandes Centros Urbanos, aos quais foi acrescido depois o Cerrado.

Para Juarez de Paula, uma priorização de territórios muito restritiva também pode significar uma barreira de entrada para novos investidores interessados na reaplicação, sobretudo num momento em que se busca fortalecer a RTS e ampliar o conceito de Tecnologia Social. “Se aproximarmos a lente, encontraremos bolsões de pobreza em qualquer território do país. Por que não concentrar os investimentos em áreas de pobreza de um modo geral? Isso significaria ampliar a capacidade de reaplicação e a adesão de novos parceiros em todo o país”, argumenta.

Na opinião do coordenador da Expo Brasil Desenvolvimento Local, Caio Silveira, restringir excessivamente o território é também incorrer no risco de reproduzir erros cometidos pelo próprio modelo de desenvolvimento que se busca alterar. “Não adianta determinar os territórios exogenamente, até porque não se pode considerar as TSs apenas pelo ponto de vista da oferta. Seria voltar a um erro fundamental”, diz.

Vácuo urbano
Um dos principais desafios da RTS, segundo os entrevistados ouvidos pelo Portal, é avançar na consolidação de TSs nos grandes centros urbanos. “Predominam os empreendimentos localizados na área rural. Realmente precisamos avançar nas cidades, onde vive a maior parte da população brasileira”, diz Pena.

Reflexo desta preocupação foi a criação, no âmbito da RTS, de um GT responsável pelo detalhamento de planos estratégicos para a reaplicação em escala de processos de incubação de empreendimentos solidários e de Tecnologias Sociais de reciclagem. Os resultados serão apresentados na próxima reunião do Comitê, marcada para junho. Entre os critérios definidos para a escolha das TSs a serem reaplicadas, estão sua capacidade em atender demandas das comunidades locais, a existência preliminar de resultados comprovadamente geradores de transformação social e o potencial de parceria em torno da TS.

“Temos de fazer esse debate. Será, por exemplo, que hortas comunitárias em ambientes de favela não seriam uma opção? A parte dos centros urbanos ainda tem que ser construída”, admite Lenart.

Números do programa Territórios da Cidadania
* Investimentos do Governo Federal -R$ 11,3 bilhões
* Municípios Beneficiados - 958 (17% dos municípios brasileiros)
* População Total Atendida - 24 milhões (14%)
* População Rural - 7,8 milhões (27%)
* Agricultura Familiar - 1 milhão de agricultores (24%)
* Assentados Reforma Agrária - 319,4 mil famílias (40%)
* Bolsa Família - 2,3 milhões de famílias (21%)
* Comunidades Quilombolas - 350(37%)
* Terras Indígenas - 149 (25%)
* Pescadores - 127,1 mil (33%)

Os critérios
Os territórios rurais do TC reúnem as seguintes características:
* conjunto de municípios com até 50 mil habitantes;
* densidade populacional menor que 80 habitantes/Km2;
* organizados em territórios rurais de identidade;integrados
* com os Consórcios de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local (Consad), do Ministério do Desevnvolvimento Social (MDS) e/ou Mesorregiões, do Ministério da Integração Nacional (MI).

Para identificação de quais territórios seriam o foco da atuação do Programa Territórios da Cidadania, foram considerados:
* menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH);
* maior concentração de agricultores familiares e assentamentos da Reforma Agrária;maior número de beneficiários do Programa Bolsa Família;
* maior concentração de populações quilombolas e indígenas; maior número de municípios com baixo dinamismo econômico;maior organização social (capital social).

A partir desses critérios técnicos, foram identificados 60 Territórios da Cidadania, em todos os Estados e no Distrito Federal, que perfazem os seguintes dados:
* Municípios: 958
* População Total: 23,9 milhões
* População Rural: 6,8 milhões
* Agricultura Familiar: 973.949 famílias
* Assentados Reforma Agrária: 351.056 famílias
* Bolsa Família: 2 milhões de famílias
* Comunidades Quilombolas: 364
* Terras Indígenas: 201

Vinícius Carvalho
Boletim da RTS, 28/05/08

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Incubação de empreendimentos solidários para o Desenvolvimento Local

Projeto Rede CataBahia, que articula seis cooperativas de catadores de materiais recicláveis do Estado
Foto: Petrobras


O impulso dado para o trabalho associado e o cooperativismo na perspectiva da autogestão ganha um suporte decisivo com a atuação das Incubadoras Tecnológicas, enquanto um ambiente de experimentação, apoio e transferência tecnológica com enfoque na sustentabilidade de empreendimentos coletivos. No âmbito da RTS, este esforço tem se dado, especialmente, pelo acompanhamento e avaliação dos projetos de reaplicação dos procedimentos de incubação de cooperativas populares financiados pela Caixa Econômica Federal, Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) e Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).

Lançado em 2005, o edital disponibilizou R$ 3,1 milhões para 21 iniciativas, em 13 estados, que possuem diferentes formatos institucionais e operam a partir de distintas matrizes conceituais e metodológicas. O processo de acompanhamento é realizado pela Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase) em diálogo com o Comitê Coordenador da RTS, envolvendo visitas aos projetos e a realização de seminários com vistas à afirmação, como Tecnologia Social, das metodologias de organização do trabalho associativo voltado para a autogestão.

“O edital visa justamente repassar conhecimentos, formar novos quadros, ampliar os recursos, descentralizar, difundir e interiorizar ações, ampliando a escala, mobilizando atores e repassando a eles os instrumentos desenvolvidos”, diz o coordenador da avaliação e diretor da Fase, Pedro Cunca Bocayuva.

Segundo levantamentos realizados pela organização, as incubadoras beneficiadas pelo edital já representam as três diferentes frentes de atuação das incubadoras no país: a incubação tradicional, com o apoio e capacitação de grupos solidários; a incubação de empreendimentos articulada a políticas públicas estaduais e municipais de economia solidária, incluindo a construção de incubadoras públicas; e a incubação de redes solidárias e segmentos produtivos associados a mais de um empreendimento.

“Isso recoloca a área de extensão das universidades dentro de um novo patamar, porque a incubadora consegue concretamente articular as três dimensões de ensino, pesquisa e extensão não apenas para gerar conhecimento por meio de teses e dissertações, mas também conhecimento apropriado pela sociedade”, avalia o diretor do Departamento de Estudos e Divulgação da Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes), Roberto Marinho.

Trajetória
O processo de construção das incubadoras de empreendimentos solidários no Brasil iniciou-se com a fundação em 1995 da primeira incubadora universitária de cooperativas populares, a ITCP/COPPE-UFRJ. Nos últimos anos, graças aos esforços de professores e alunos de diversas universidades e ao apoio recebido do Programa Nacional de Incubadoras de Cooperativas (Proninc), esse processo tem se expandido consideravelmente. Atualmente, existem cerca de 80 incubadoras universitárias de empreendimentos solidários ligadas ao Proninc, além de outras que ainda não se vincularam ao programa.

Os debates sobre o fortalecimento das incubadoras de cooperativas populares estão relacionados, segundo Marinho, à ampliação do número de empreendimentos solidários em todo o país. O último levantamento da Senaes aponta a existência de 21.859 Empreendimentos Econômicos Solidários (EES) no Brasil, distribuídos em 52% dos municípios brasileiros com mais de 1,6 milhão de trabalhadores.

Entre os principais motivos para a criação dos empreendimentos, segundo a pesquisa, estão a alternativa ao desemprego, a complementação da renda e a capacidade que a mobilização oferece para o acesso a novos financiamentos. Entre as principais dificuldades, 60% dos EES apontaram a comercialização, seguida do acesso ao crédito (48%) e do Apoio e Assistência Técnica (25%). “Fato é que a demanda da sociedade é muito maior do que as incubadoras conseguem ofertar”, afirmou Marinho.

Segundo Rodrigo Fonseca, analista de projetos da Área de Tecnologia para o Desenvolvimento Social da Financiadora de Estudos e Projetos, o reconhecimento dos processos de incubação como Tecnologia Social é um passo importante para ampliar o alcance destas iniciativas. “Estamos num momento em que é importante dar outro status ao conhecimento, ao trabalho e ao território. E a RTS é um canal estratégico para fazer a aproximação entre TSs e a economia solidária”, disse.

Incubadoras públicas
Diante do aumento da demanda por incubação, a consolidação de Incubadoras Públicas de EES, ligadas a governos estaduais ou municipais, começa a ser apresentada como estratégia para a disseminação dos procedimentos de incubação junto às iniciativas no campo da economia solidária. “É preciso dar escala ao processo de incubação enquanto política de Estado. Isso significa consolidar bases sociais que permitam a estas incubadoras ultrapassar os próprios governos” defendeu André Santana, da Rede de Gestores Públicos em Economia Solidária.

Além de disporem de mais recursos financeiros e materiais do que as incubadoras ligadas a universidades ou a ONGs, as incubadoras públicas, por estarem inseridas na estrutura estatal, possuiriam condições potencialmente mais favoráveis de articular ações intra-governamentais que contemplem as diferentes dimensões envolvidas nos processos de incubação. Contudo, este processo também traz incertezas, como a dificuldade de assegurar a continuidade dos processos de incubação para além dos mandatos executivos e a maior possibilidade de ingerências políticas, tanto no tocante à escolha das equipes técnicas quanto na seleção das comunidades e dos empreendimentos atendidos.

Durante o seminário "Tecnologia Social e economia solidária: estratégias de formação e desenvolvimento local", realizado em Salvador/BA, nos dias 10 e 11 de abril, a Superintendência de Economia Solidária da Secretaria de Trabalho e Emprego da Bahia (Sesol) deu sinal desta tendência ao anunciar a criação de oito centros públicos de economia solidária no Estado. Os centros funcionarão como espaços multifuncionais de desenvolvimento e fomento à economia solidária nas áreas de formação, incubação e concessão de microcrédito, além de disponibilizar infocentros e lojas solidárias.

A meta é implementar também 40 incubadoras públicas até 2010, das quais 10 devem ser instaladas ainda este ano. Entre as ações previstas estão a formação técnica e gerencial, o incentivo à legalização dos empreendimentos e a ampliação do crédito. “O objetivo é avançar na articulação dos empreendimentos em redes solidárias, da produção à comercialização”, disse Tatiana Reis, do Projeto Estadual de Incubadoras Públicas da Sesol.

Outra experiência beneficiada pelo edital construído no âmbito da RTS é o Programa Estadual de Economia Solidária do Acre. Iniciado no segundo semestre de 2007, o programa encontra-se em fase de implantação. Seu objetivo é a incubação de empreendimentos econômicos solidários por meio de um conjunto de ações articuladas, incluindo qualificação empreendedora, produtiva e gerencial; elaboração de projetos técnicos e planos de negócios; concessão de microcrédito produtivo orientado; certificação socioambiental e prospecção de mercado e apoio à comercialização.

O programa é coordenado pela Secretaria de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia do Acre, mas a sua execução envolve também a participação de prefeituras municipais e de organizações da sociedade civil como o Fórum Estadual de Economia Solidária, a ACS Amazônia (entidade certificadora) e a Amazoncred (Oscip de microcrédito). Na sua fase inicial, o programa tem como meta a incubação de 15 empreendimentos em sete municípios do estado, com apoio da Universidade Federal do Acre. O objetivo é fortalecer a infra-estrutura, a organização do trabalho para o aumento da produção e a orientação para a participação em licitações. Para esta ação, o programa conta com R$ 8 milhões até 2010.

Destaque ainda para o Programa Osasco Solidária, instituído por lei municipal em dezembro de 2005. A principal instância operacional é a Incubadora Pública de Empreendimentos Populares e Solidários (Ieps), que consiste em um espaço público destinado a apoiar a criação, organização e consolidação de EES no município. As ações implementadas pela Ieps envolvem, entre outras, a realização de cursos de gestão de empreendimentos solidários, assessoria multidisciplinar, realização de oficinas por segmento econômico e de experiências práticas de produção e comercialização. A Ieps conta com uma equipe técnica interdisciplinar, formada por profissionais de 12 áreas de conhecimento.

Incubação de redes solidárias e segmentos produtivos
Outro fator destacado pelos participantes do seminário é a incapacidade da incubação resolver por si só os desafios de estruturação dos empreendimentos. De acordo com pesquisa da Senaes, apenas 16% dos EES tiveram acesso ao crédito nos últimos 12 meses, ao passo que 73% dos empreendimentos disseram ter acesso a assistência técnica. “Para terem o mínimo de autonomia, os EES precisam ver combinadas a incubação com qualificação social e profissional e com crédito e financiamentos solidários. Isso sem falar na construção de redes, já que empreendimentos isolados não vão a lugar nenhum”, alertou Marinho.

Uma das iniciativas contempladas pelo edital que faz essa aposta é executada pelo Pangea, que trabalha na articulação em rede entre cooperativas de catadores tendo em vista estabelecer uma relação comercial direta com a indústria recicladora. “Há intermediários que alugam os carrinhos de coleta aos catadores ao mesmo tempo em que compram o material coletado a preços irrisórios, gerando ganhos de até 600%”, alerta o diretor do Centro de Estudos Socioambientais Pangea, Antônio Bunchaft.

Durante o seminário, ele apresentou a experiência do Projeto Rede CataBahia, que rompeu este ciclo ao implantar uma rede solidária de coleta e comercialização de materiais recicláveis, em grande escala, a partir da união de seis cooperativas. A iniciativa, que conta com patrocínio da Petrobras e parcerias da Fundação Banco do Brasil, Fundação Avina e MNCR, possibilitou a diminuição dos custos operacionais e melhorias nos preços de venda dos resíduos, aumentando para mais de dois salários mínimos a renda média gerada para cada catador. Entre julho de 2003 e dezembro de 2007, o grupo coletou 15 mil toneladas de recicláveis.

A metodologia de construção do Projeto Rede CataBahia abarca seis etapas, não necessariamente subseqüentes. A primeira consiste no diagnóstico da composição gravimétrica, quando são aferidos os valores de contribuição de resíduos per capita (kg/habitante/funcionário x dia) e os percentuais da composição dos resíduos domiciliares (matéria orgânica, materiais recicláveis e rejeitos), de modo a orientar o planejamento na hora da coleta.

A segunda etapa envolve a assistência social integrada, quando os catadores são cadastrados no Bolsa Família, alfabetizados em articulação ao Programa Mova Brasil da Petrobras e têm seus documentos regularizados. Só então é realizada a capacitação, que traz módulos profissionalizantes com princípios de gestão de cooperativas e de comercialização do material coletado. Por fim, são realizadas a incubação, quando começam a ser estruturados os sistemas de logística de captação de resíduos, padronização da triagem e comercialização em Rede, e as ações de comunicação e mobilização social, com a formação de multiplicadores e ações de educação ambiental.

Outra experiência apoiada pela RTS que também avança no processo de incubação e criação de redes e cadeias produtivas está na Incubadora Social de Comunidades do Instituto Gênesis, ligada a PUC/RJ. A incubadora tem como objetivo fomentar o “empreendedorismo” entre os moradores de quatro comunidades de baixa renda do município, por meio da identificação de produtos e serviços com potencial de integração a cadeias produtivas.

Os critérios para incubar uma determinada iniciativa são a qualidade e viabilidade do produto e/ou serviço e a “incorporação de características empreendedoras” pelos beneficiários. Os empreendimentos visitados nas áreas de artesanato em tecidos e jornal e hospedagem comunitária inserem-se dentro de uma estratégia para fomentar uma cadeia produtiva ligada ao turismo, ligada a um público interessado em uma hospedagem de custo mais baixo e em conhecer o dia-a-dia de uma comunidade na cidade do Rio de Janeiro.

Saiba mais sobre a Trajetória da Economia Solidária no Brasil.

Vinícius Carvalho

Boletim da RTS, 28/05/08

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Um clube para quem tem no mínimo US$ 10 milhões

"Riquistão - Como Vivem os Novos-Ricos e Como Construíram suas Megafortunas" - Robert Frank.
Manole, 256 págs. R$49,90


"Riquistão" é leitura que pode interessar a novos ricos, àqueles que desejam ser ricos, aos que trabalham, prestam serviços ou vendem produtos para ricos ou burgueses decadentes. O fato de o livro retratar essencialmente a questão da riqueza na sociedade americana não retira valor ao trabalho de Robert Frank. Afinal, hábitos e comportamentos típicos do capitalismo americano se alastraram pelo mundo todo.

Ao falar da origem de novas fortunas, Frank, jornalista que vive em Nova York, as localiza entre pessoas que não as herdaram, mas as acumularam por conta própria. Baseando-se em dados do livro "Wealth and Democracy", do economista Kevin Phillips, Frank diz que os grandes picos da prosperidade americana foram impulsionados pela mesma convergência de forças: novas tecnologias, aumento da especulação financeira e governos que deram apoio aos mercados livres e à riqueza.

Frank descreve em detalhes as diferentes etapas em que emergiram novas fortunas na sociedade americana. Mas o grande momento está naquilo que ele chama de "evento de liquidez". É o momento em que o empreendedor ou o executivo de uma empresa vende sua participação em ações da companhia por uma vultosa quantia. Irônico, Frank comenta que "banqueiros adoram eventos de liquidez, pois lhes proporcionam uma montanha de dinheiro para administrar". Estão nessa categoria fundadores de empresas, executivos que lhes são vinculados e que obtiveram significativas participações acionárias, e altos executivos de grandes empresas, com excelentes salários e bonificações. Frank tipifica os integrantes de cada um desses grupos e seus comportamentos.

Ao situar o que se pode entender como uma pessoa rica, Frank afirma que, hoje, ela deve possuir no mínimo US$. 10 milhões. Será o começo para alguém conseguir manter um padrão de vida que possa ser considerado à altura de um rico e suas demandas.

Ao falar de alguns ricos e sua maneira de encarar o assunto, Frank mostra casos interessantes - inclusive, de alguns que satirizam o comportamento de seus colegas de fortuna. O bilionário americano David Tepper afirma que "a riqueza pode trazer à tona o pior - ou o melhor - das pessoas, transformando-as em uma versão um pouco exagerada delas mesmas". Diz também que "o dinheiro é como o soro da verdade. Coloca à mostra a natureza do indivíduo. Assim, se for um imbecil, será um imbecil ainda maior depois de ficar rico".

Existe o medo de perder tudo. Diz o autor: "Embora consigam amealhar grandes fortunas em tempo recorde, os novos ricos podem perdê-las num piscar de olhos. Os mercados financeiros e as tecnologias que mudam em ritmo acelerado criam oportunidades históricas para empreendedores e presidentes corporativos faturarem milhões e bilhões praticamente da noite para o dia. Mas também criam oportunidades históricas para perderem tudo com a mesma rapidez."

Os ricos também curtem suas insatisfações. Estudo realizado em 2005 mostrou que menos da metade dos ricos acha que a riqueza os fez mais felizes. Para 10% dos milionários, e 16% das milionárias, a riqueza criou mais problemas do que solucionou.

Segundo Frank, "os ricos sentem-se frustrados pela competição que existe entre eles. Não importa quão bem estejam se saindo, alguém estará sempre melhor. Essa corrida nunca termina, pois eles querem se tornar os maiorais, esperando por uma tranqüilidade que nunca chega". E aí, então, formam grupos de apoio. Esse mercado de auto-ajuda tornou-se um próspero negócio para os espertos de plantão.

Existem previsões de que, até 2052, devem ser transferidos para herdeiros a importância de US$. 15 trilhões. Na maioria dos casos de fortunas americanas, a destinação para filantropia gira em torno de 15% do total acumulado. O restante cairá nas mãos de herdeiros pouco educados para a herança e, menos ainda, para a própria vida.

Ao falar da conduta consumista dos novos ricos, Frank diz que "nunca foi tão difícil ser um consumista realmente esbanjador, pois há milhões de milionários competindo pelos mesmos símbolos e status e um número ainda maior de consumidores afluentes comprando artigos de luxo para imitar a elite".

"Riquistão" será leitura atraente para uma seleta parcela de brasileiros que vivem esses dilemas ou estão por eles cercados. Não é literatura relevante, mas certamente é interessante.


Renato Bernhoeft, para o Valor, de São Paulo
Valor Online, 29/05/08

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A vírgula...

A vírgula pode ser uma pausa... ou não.
Não, espere.
Não espere.
Ela pode sumir com seu dinheiro.
23,4.
2,34.
Pode ser autoritária.
Aceito, obrigado.
Aceito obrigado.
Pode criar heróis.
Isso só, ele resolve.
Isso só ele resolve.
Ela pode ser a solução.
Vamos perder, nada foi resolvido.
Vamos perder nada, foi resolvido.
A vírgula muda uma opinião.
Não queremos saber.
Não, queremos saber.
Uma vírgula muda tudo.

ABI: 100 anos lutando para que ninguém mude uma vírgula da sua informação.

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