sábado, 10 de novembro de 2007

Jogo na web arrecada arroz para alimentar milhares, diz ONU

Publicado pela BBC Brasil

O jogo já arrecadou 1 bilhão de grãos de arroz

Um jogo de internet arrecadou uma quantidade de arroz suficiente para alimentar 50 mil pessoas por um dia, informou a FAO (a agência das Nações Unidas para a agricultura e a alimentação).
O jogo, que ganhou o nome de FreeRice (Arroz de graça), testa o vocabulário dos participantes.

Para cada resposta certa, o site gera dinheiro suficiente para comprar dez grãos de arroz. A verba é fornecida pelos anunciantes do site à FAO, que fica responsável pela compra e distribuição do alimento.

O jogo está disponível na internet pelo site www.freerice.com desde o início de outubro e desde então arrecadou 1 bilhão de grãos de arroz.

A diretora da FAO, Josette Sheeranz, disse que o FreeRice demonstra como a “internet pode ser usada para conscientizar as pessoas e levantar fundos para a primeira necessidade do mundo”.

Ela disse que o jogo foi amplamente divulgado com a ajuda de pessoas que mantêm blogs e de sites como o de relacionamentos Facebook e o de vídeos YouTube.

O jogo foi criado pelo americano John Breen, pioneiro na criação de ações para levantamento de fundos pela internet.

Antes do FreeRice, Breen já havia criado o The Hunger Site (O site da fome).

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Eles usam black-tie

Maria Cristina Fernandes
Publicado pelo
Valor Online em 09/11/07

Edson Bazílio: depois de ser dispensado do programa de estágio firmado entre a Unipalmares e um banco, usou a indenização de R$ 5 mil para abrir empresa de comércio virtual voltada para o mercado afro
Foto Davilym Dourado

Vai ser a maior festa de formatura que já se viu. O número de formandos até que é modesto, 126. Grande é a platéia. Para a colação de grau em março foi reservado o Ginásio do Ibirapuera, com capacidade para 12 mil pessoas. A maioria deles levará para casa o primeiro diploma universitário de suas famílias. "Minha filha disse que tem um limite de dez convites, mas na nossa família tem pelo menos 50 parentes que querem muito ir", diz a auxiliar de enfermagem Marilena Duarte, de 46 anos, mãe de Elaine Duarte Damião, de 23, uma das integrantes da primeira turma de formandos da Universidade Zumbi dos Palmares.

Criada em 2003 com a reserva de metade de suas vagas para estudantes que se declarem negros, a universidade tem hoje entre seus 1,5 mil alunos 87% de afrodescendentes. Oferece cursos de Administração de Empresas e Direito e, a partir do próximo ano, terão início Comunicação Social e Informática, somando 2 mil alunos.

A impressão de que os portões da antiga fábrica que abriga a universidade, na Barra Funda (centro de São Paulo), dão acesso a um gueto, se desfaz à entrada da sala de aula da turma do último ano de Administração. Um grupo de alunos cerca o professor de Finanças Internacionais, Jorge Max Lucki, branco até o último fio de cabelo. Discutem os últimos IPOs, sigla em inglês da oferta inicial de ações, com a animação de quem conversa sobre a rodada do Brasileirão do fim de semana.

"Vocês querem passar o resto da vida ganhando dinheiro para os outros?", provoca o professor, ao perceber que desconheciam detalhes das últimas operações do mercado. O grupo desfaz-se e toma seus lugares nas carteiras, onde não se vê aluno falando ao celular, folheando revistas, jogando truco ou entrando e saindo da sala. "Além de demonstrarem interesse acima da média em sala de aula, eles também são mais afetuosos e nos tratam com muito mais respeito", comenta, ao fim da aula, o professor, que, assim como a maioria dos outros 73 da universidade (60% de brancos), dá aulas em outras escolas particulares de São Paulo.

Na turma de formandos, mais de um terço dos alunos é estagiário em bancos por meio de convênios firmados entre a universidade e instituições financeiras. Daí que se avistem mais terno e tailleur do que chinelo de dedo ou bata indiana nas salas de aula.

Ao contrário de colegas de universidades públicas ou particulares que estabeleceram políticas de cotas minoritárias, não são submetidos a pichações racistas nos banheiros. A lei ali é deles. É antes no estágio, que na universidade, que eles se sentem participantes de uma experiência de política de cotas.

O reitor José Vicente atribui a esmagadora maioria de negros da faculdade à mensalidade módica e à publicidade que, inicialmente, foi mais dirigida ao público das escolas de samba e dos bailes funk. A mensalidade é de R$ 260, 50% do custo. A outra metade é bancada por parceiros da escola. Além dos bancos, a lista de colaboradores inclui empresas como a Nestlé e instituições de ensino privadas, como a Universidade Metodista e a Unip, de João Carlos di Genio, que chegou a custear a folha de funcionários da escola no início do projeto.

"Vimos que trabalhar para colocar negros na USP e na Unicamp era como enxugar gelo", diz o reitor sobre a origem da Unipalmares, um curso preparatório de vestibular dirigido a afrodescendentes. No fim da década de 1990, haviam conseguido colocar 520 negros bolsistas em 12 faculdades particulares, que ofereciam vagas em troca de perdão de débitos fiscais.

Filho de bóia-fria e lavadeira, nascido em Marília (SP), casado e pai de três filhos, Vicente chegou a São Paulo pelos quadros da Polícia Militar. Fez Direito em Guarulhos, mas foi na Escola de Sociologia e Política de São Paulo que reuniu o grupo de 30 colegas que fundaria a Unipalmares.

De gravata e camisa social branca de manga curta, dois celulares na cintura, José Vicente explica por que a escola teve início pelo curso de Administração de Empresas. Afirma haver um grande mercado de produtos voltado para negros que é comandado por brancos. Dos 77 mil periódicos em circulação no país, conta, há um único dirigido para a comunidade negra, a revista "Raça", que é de uma descendente de coreanos, Joana Woo - "até galinha preta, farofa e todos os paramentos do candomblé são produzidos por brancos".

Vem de um aluno excluído da mais vistosa parceria empresarial da escola - os convênios com os bancos - uma das principais iniciativas na conquista desse mercado. Filho de um encanador industrial e de uma diarista e primeiro de seis irmãos a se formar, Edson Bazílio, 29 anos revelados a contragosto, era estagiário de um banco até agosto. A experiência, que durou um ano e um mês, começou pela área de Recursos Humanos do banco. Era o único negro num setor de 40 pessoas. Um dia, ao voltar do almoço, ouviu de um gerente: "Edson é negro, por isso fede que nem merda." Ficou mudo. "Em outra situação teria reagido, mas aprendi aqui a importância da inteligência emocional", conta, com voz baixa e pausada, em uma mesa de canto da biblioteca da faculdade.

Relatou o acontecimento à sua chefe e depois ao chefe da chefe. O gerente explicou a todos eles que tinha sido uma brincadeira. Os chefes disseram a Edson que ele receberia um pedido de desculpas e, em seguida, aceitaram sua transferência para outra área do banco. "Saía para a balada com a turma do banco, mas depois disso minha auto-estima ficou abalada e me isolei", relembra. "Eles faziam palestra sobre diversidade para os estagiários da Unipalmares, mas quem tinha que estar na platéia era a maioria branca do banco."

Três meses depois da transferência, foi chamado pelo chefe. Achou que receberia a notícia de sua efetivação por ter fechado dez contratos no período. Acabou demitido. Foi até a mesa do gerente agressor se despedir. Nem assim ouviu o prometido pedido de desculpas. Com os R$ 5 mil da indenização, montou uma loja virtual. Quer focar no mercado afro oferecendo cosméticos, roupas, ingressos para shows, eventos e treinamento.

O insucesso de Edson é uma exceção no programa de estagiários, mas todos têm histórias de dificuldades na adaptação aos bancos. Para Flávio Batista, de 35 anos, filho de sapateiro e cabeleireira, a maior dificuldade do início do estágio no setor de auditorias do Citibank foi o inglês: "Os outros estagiários são de universidades top de linha e estudam inglês desde os 8 anos de idade. A defasagem é muito grande".

Denise dos Santos, de 29, estagiária no marketing estratégico do Itaú, queixa-se das resistências ao que os colegas chamam de privilégios dos cotistas, como, por exemplo, a semana a que têm direito, uma vez por mês, para se dedicar ao curso de formação de jovens executivos na Unicamp. Filha de um motorista aposentado e de uma costureira, diz que todos ali são contra a perpetuação do benefício - "A cota é para resolver uma situação emergencial de exclusão."

Todos têm respostas na ponta da língua para contestar os adversários da iniciativa. Ao argumento de que o país estaria sendo apresentado a uma divisão por raças até então inexistente, Maira Barbosa, de 27 anos, dois filhos, colega de Denise no Itaú, afirma que a racialização já existe, não são as cotas que a estão criando: "Ainda me choca muito quando vejo as pessoas no banco comentarem um crime cometido por um dentista, por exemplo. Dizem logo que o cara deve ter algum problema psicológico. Se for um negro, é porque não presta mesmo."

À alegação de que a política de cotas é inconstitucional, porque afronta o princípio da igualdade, Kátia Botelho, de 22 anos, estagiária do Bradesco, responde que a desigualdade no acesso à educação de qualidade é que não está prevista na Carta: "Somos parte de um problema social que engloba a cor da pele, mas não se restringe a ela." Quando defronta com colegas que questionam sua presença no banco pela cota afro, conta que antes de entrar no estágio do banco tentou colocar seu currículo numa empresa de recrutamento pela internet. Procurou a lista de faculdades relacionadas e não encontrou a Zumbi dos Palmares.

A resistência interna às cotas não é suficiente para reverter os programas das instituições financeiras. Depois que o Ministério Público do Trabalho ajuizou ações contra os cinco maiores bancos privados brasileiros pela reduzida presença de negros entre seus funcionários, foram firmados termos de compromisso para garantir sua ampliação no quadro funcional. Nessas ações, os procuradores citaram dados do IBGE em que constatam que a maior presença de negros nas instituições financeiras se dá na manutenção (65%) ou nas funções de contínuos (57%) e copeiros (50%). Nas atividades que permitem ascensão funcional na carreira, a presença é mais reduzida: há 5% de escriturários, 13% de caixas e 15% de gerentes.

O quadro alastra-se em outros setores da economia. Pesquisa do Instituto Ethos/Valor, com as 500 maiores empresas do país, constatou 26,4% de negros em seu quadro funcional. Entre os executivos, essa participação reduz-se para 3,4% .

Hoje, oito bancos já oferecem estágios para alunos da Unipalmares: Itaú, Bradesco, Safra, Citibank, HSBC, Real, Santander e Unibanco. O Itaú, pioneiro nos convênios, começou com 20 alunos em 2005 e hoje já tem 91 ou 20% do total de seus estagiários. Metade dos 20 que estão na turma de formandos já passou no certificado da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid) e 5 já foram efetivados. Começam com uma remuneração de R$ 842 e chegam a R$ 1,1 mil, além dos benefícios assistenciais. No Itaú, não há queixas formalizadas. Atribuem-se suas dificuldades à "cultura distinta do mundo corporativo", que inclui desde o vestuário ao comportamento no restaurante. "Eles chegaram com defasagem muito grande em relação aos demais estagiários, mas tiveram uma evolução brilhante nesses três anos", diz Valéria Riccomini, responsável pela gestão do projeto no Itaú.

O Bradesco tampouco registra queixas dos alunos da Unipalmares. "Não haveria por quê. Todos estão indo muito bem e é ampla a perspectiva de efetivação", informa José Luiz Bueno, diretor de Recursos Humanos do banco. Atribui-se a facilidade de adaptação à chamada carreira fechada da instituição, política de ingresso que prevê a ascensão de escriturários ao topo da carreira. Dos 30 iniciais, 4 desistiram. Hoje somam 76, 17% do total de estagiários do banco. A remuneração é de R$ 1,2 mil, além dos benefícios. Tanto o Itaú quanto o Bradesco investem em formação suplementar dos estagiários com cursos de formação de executivo, respectivamente, na Unicamp e na USP.

Luiz Henrique Ferreira diz nunca ter se sentido hostilizado no Bradesco, mas atribui o ambiente de trabalho antes ao respeito à hierarquia das políticas do banco: "Sabe-se que se é algo que as diretorias do banco e da faculdade assinaram é porque precisa ser cumprido. Tem gente que não tem preparo para conviver com a diversidade, mas é levada a aceitá-la."

Maira Barbosa atribui sua adaptação no Itaú ao desempenho de seu gestor no campo minado do debate das cotas: "Ele me disse que eu deveria me sentir como qualquer outro estagiário ali porque minha efetivação não dependeria da cota, mas de meu desempenho."

No Citibank, a diretora de Recrutamento e Seleção, Fernanda Pacheco, tampouco registra dificuldades de adaptação dos estagiários. São 40 alunos da Unipalmares de um total de 600 estagiários do banco. "Como a aceitação foi muito grande, já ficou mais fácil ampliar o programa", conta. Atribui a adaptação aos cursos oferecidos pelo banco, como o de resolução de conflitos ou de "postura em ambiente de trabalho", que ensina desde como atender ao telefone até como escrever uma mensagem eletrônica profissional. O índice de contratação dos alunos da Unipalmares já se igualou ao do programa regular de estagiários do banco, 50%.

Edinilson Nascimento, de 32 anos, estagiário do Citibank, relata que uma das perguntas que mais lhe faziam no banco era por que a Universidade se chamava Zumbi dos Palmares. "'Vocês querem se segregar?', me perguntavam." Diz ter um bom ambiente de trabalho e bons colegas, "mas amizade de olhar no olho é difícil porque não há comunhão de idéias". Ele acha que os mundos são muito distintos. "O padrão é de branquinhos, lourinhos, sem filhos, com carro e com a idéia fixa de que os dados do IBGE são manipulados e o o país é movido pela meritocracia". A maioria de seus amigos de banco é de outros estagiários da Unipalmares.

Todos sonham em ser efetivados. Mas não é apenas por isso que evitam formalizar queixas nas instituições. A maioria considera as resistências pessoais que encontram nos bancos apenas mais um capítulo das adversidades que costumam enfrentar.

"Eles se agarram com unhas e dentes a essa oportunidade", diz o professor de Economia Edmilson Costa. Egresso do grupo de professores que fundou a Unipalmares, Edmilson acompanha a turma desde o primeiro ano. Diz que eles chegaram com muita deficiência de formação básica, combatida com aulas aos sábados de português e matemática, além do curso de inglês oferecido pela Alumni. "Não queríamos que eles adquirissem a mentalidade 'Quem mexeu no meu queijo'", diz, numa referência a uma das bíblias do senso comum da Administração de Empresas. "Fomos muito exigentes com eles desde o início. Não tínhamos a intenção de formar agitadores, mas queremos que eles tenham espírito crítico."

Eles praticamente não conversam em sua aula. Um aluno desvia a atenção do quadro-negro para consultar o livro "A Dialética Radical do Brasil Negro", de Clóvis Moura, e o fecha cinco minutos depois. Fazem muitas perguntas. O professor exemplifica como se chega à média do PIB per capita: "Imaginem um cara com os pés enfiados no freezer e a cabeça no fogão. Ele teria a temperatura média do seu umbigo, mas, na verdade, está morto. O PIB per capita é assim. Mede pouco quando a renda é muito desigual. É o mesmo que tirar uma média entre a renda de Alphaville e a de uma favela vizinha em Barueri", exemplifica.

Os alunos falam de seus professores preferidos como brancos com alma de negro. Um deles é o professor de filosofia Hudson Marcelo da Silva. "Ele dizia que estávamos aqui para escapar dessa sina de curso técnico. Que a periferia tinha que contestar essa coisa de todo negro pobre ter que fazer um curso técnico", conta Luiz Henrique. "Eles são muito politizados. Carregam a sina da humilhação. Mas nunca lhes demos moleza. Debatíamos a política de cotas. Dizia a eles que alguma coisa tinha que ser feita para se reparar a injustiça histórica com os negros, mas que não se devia perder de vista o princípio constitucional da igualdade", relembra.

A questão divide os alunos. Celso Falcini Santos, de 40 anos, funcionário público municipal e um dos poucos brancos da turma, é contrário à política de cotas: "Eles já carregam o rótulo de negros. Não precisam carregar mais um, o de cotista. Não merecem isso." Mas entre os que concordaram com Celso no questionário elaborado pelo Valor, há pelo menos dez negros. Um deles é Ivone Lopes, de 25 anos, auxiliar administrativa. "Nós negros, às vezes, nos fazemos de coitados." Marta Rufino, de 27, estagiária do Itaú, diz que, apesar de beneficiária da política, não tem opinião formada sobre as cotas: "Mas desejo, sinceramente, que meus filhos não precisem delas." Na maioria que é favorável às cotas, grande parte se manifesta pela necessidade de não perpetuá-la. "A alternativa às cotas é igual à alternativa para o Brasil. Quem ganha menos paga menos", resume Edinilson, num grupo de sete colegas, sem ser contestado.

A enquete foi conduzida pelo Valor com 34 dos 126 formandos. A maioria afirma que os preconceitos racial e social são igualmente difíceis de ser enfrentados. Um dos nove alunos que responderam ser a discriminação racial a mais difícil, resumiu numa frase sua resposta: "Cor não se muda." O estudante não quis se identificar.

O perfil característico do militante esquerdista do movimento negro está longe de ser dominante na universidade. Assemelham-se à maioria da população brasileira na identificação dos maiores problemas do país - educação e desigualdade. Um único aluno menciona o racismo entre os maiores problemas.

Na lista de livros dominam os manuais de administração e os textos utilizados para o trabalho de conclusão de curso. Mas surpreende que, numa turma que não vai para a cama antes da meia-noite e dificilmente acorda depois das 5 horas e gaste, em média, quase quatro horas de deslocamento em transporte público, haja quem encontre tempo para atravessar Dante Alighieri e disposição para encarar as memórias políticas do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

O professor Hudson teme pelo futuro de seus ex-alunos. Diz que basta consultar as estatísticas para concluir que um negro com má formação no ensino superior tem chances menores de conseguir emprego do que aquele que tenha apenas o ensino médio.

Tem recebido em seu escritório de advocacia alunos como João Bosco, militante do movimento negro e dono de uma pequena empresa de recrutamento de mão-de-obra. Um dos inadimplentes da turma, ele está impedido de freqüentar as aulas e corre o risco de não se formar. A turma está fazendo rifas e organizando festas na tentativa de arrecadar dinheiro suficiente para regularizar a situação dos colegas inadimplentes. Dos 200 alunos que iniciaram o curso, 74 o abandonaram ao longo dos quatro anos.

Hudson foi demitido no ano passado depois de um confronto com a reitoria, a quem acusou de associar a instituição com o grupo político do ex-governador de São Paulo e ex-candidato à Presidência da República Geraldo Alckmin.

"O governador Alckmin apoiou nosso projeto antes mesmo que se tornasse uma iniciativa vencedora. Já esteve na nossa escola pelo menos umas dez vezes. Numa dessas oportunidades, antes de deixar o mandato para disputar a Presidência, disse que gostaria de nos visitar. Fomos mal compreendidos pelos petistas, mas não queremos partidarizar a escola", defende-se o reitor, que cita a deputada Luiza Erundina (PSB-SP), a ex-senadora Heloísa Helena (Psol) e o senador Paulo Paim (PT-RS) como políticos engajados no projeto da universidade. "Minha gestão é contestada por movimentos que não aceitam que o cargo seja ocupado por quem não freqüentou os porões da ditadura", defende-se.

Na enquete do Valor, a turma aparece dividida entre aqueles que votaram no presidente Luiz Inácio Lula da Silva e em Alckmin. Nas conversas com os alunos, freqüentemente se colhem depoimentos de decepção com o governo e revolta com a corrupção, mas o presidente da República é um dos poucos políticos a aparecer na lista das pessoas que os alunos mais admiram.

Presidente da Comissão de Formatura, Sônia Maria da Silva, de 47 anos, afirma já ter confirmada a presença de Lula como patrono da turma e de Alckmin e do governador de São Paulo José Serra como paraninfos. A lista de convidados inclui Nelson Mandela, ex-presidente da África do Sul, e a secretária de Estado dos Estados Unidos, Condoleezza Rice. Quer fazer da festa de formatura um tributo à negritude. "Um mini-Pan da cultura negra", resume. O orçamento é de R$ 2 milhões. A empresa de formaturas Dorana Forte Real está captando patrocínios, mas já teve vetada pela comissão de formatura a oferta de uma cervejaria. "Não queremos a formatura associada a bebida ou carnaval", comenta Sônia, funcionária da Caixa Econômica Federal há 26 anos.

Filha de um pequeno empreiteiro de obras e de uma dona-de-casa e fã da apresentadora bilionária da TV americana Oprah Winfrey, é uma das poucas alunas do curso com nítido perfil de classe média. Garante nunca ter sofrido discriminação racial na vida. "Acho que porque sempre fui muito impetuosa", admite. Prestes a se aposentar, quer, como a maioria da turma, fazer pós-graduação. E dedicar-se ao ramo de hotelaria.

Na festa que fizeram no Moinho Santo Antonio, na zona leste de São Paulo, para divulgar a festa de formatura entre possíveis patrocinadores, emocionou-se com o brilho nos olhos dos colegas. Foram servidos prosecco e uísque 12 anos a noite toda.

O sentimento é resumido pelo artista plástico Tom Ruthz, ao relatar as dificuldades no combate ao complexo de penetra da turma. Organizador das exposições de arte, festivais de cinema e desfiles de moda da faculdade, conta que os colegas se aproximavam acanhados e perguntavam: "Tenho que comprar um quadro para entrar?"

A turma de ex-acanhados rejeitou a oferta do Jockey Club de São Paulo para o baile de formatura porque as corridas de cavalo começam cedo e a festa teria que terminar às 4 horas. Optou-se pelo World Trade Center, o complexo empresarial mais sofisticado de São Paulo, na zona sul da cidade, cujo espaço de eventos, com capacidade para 5 mil pessoas, será inaugurado pela formatura da Unipalmares.

Raquel Celestino Leite, de 35 anos, funcionária pública da Secretaria da Educação, onde recebe menos de dois salários mínimos, fez poupança desde o primeiro dia da faculdade para poder participar da festa de formatura. "Vou ser a heroína da família com esse diploma", revela, numa referência ao sonho da mãe, morta há oito anos, em vê-la formada. Ao saber que a festa seria patrocinada, comemorou. Poderia encomendar seu vestido. Vai ser azul, como o de todas as colegas, explica, sem esconder o espanto com o desconhecimento, àquela altura dos acontecimentos, de que o azul é a cor da Administração de Empresas: "Quero três peças, um bolero de renda, uma regata e uma saia evasê, num tecido brocado, azul acinzentado."

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