terça-feira, 14 de outubro de 2008

Formação profissional é foco de programas para jovens

Os institutos, fundações e empresas de origem privada não apenas priorizam a juventude em seus investimentos sociais, como o foco de atuação é a inserção do segmento no mercado de trabalho. Essas conclusões são fruto do Censo GIFE 2007-2008, mapeamento que o GIFE faz sobre o Investimento Social Privado (ISP) de seus associados, que nesta edição traz uma publicação especial dedicada à faixa-etária.

Realizado em parceira com o IBOPE Inteligência/ Instituto Paulo Montenegro e do Instituto ibi, o levantamento mostrou que 77% da Rede GIFE atuam em programas para jovens (em pelo menos uma das três faixas etárias – de 15 a 17 anos, de 18 a 24 anos e de 25 a 29 anos). Destes, cerca de 80% trabalham com temas relativos à educação e formação para o trabalho.

As ações de apoio ao desenvolvimento formativo dos jovens para aumentar suas oportunidades de inclusão social, em especial na geração de trabalho e renda, também aparecem na pesquisa, nas ações de 45% dos respondentes. “O foco na inserção no mercado de trabalho atende a uma demanda evidente desse público, o mais atingido pelo desemprego jovem”, lembra a consultora especial do Instituto de Cidadania e membro do Conselho Nacional da Juventude, Helena Abramo, responsável pelo Censo Juventude.

Embora se restrinja ao universo de 80, das 101 organizações associadas ao Grupo, na época da consulta, o levantamento aponta para as tendências do conjunto do investimento social do setor no país. Isso porque a Rede GIFE é considerada referência nacional na realização planejada de investimentos no campo social.

Para saber, o setor privado brasileiro investe cerca de R$ 5.3 bilhões por ano no campo social, segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O GIFE representa 20% desse montante, com R$1,15 bilhão (base 2007), enquanto o resto do investimento está diluído em mais de 500 mil empresas.

Aprofundamento dos dados
Entre os associados GIFE, o crescimento da atenção aos jovens se verifica desde o Censo 2005-2006, quando ficou evidenciado que a principal faixa etária a compor o público-alvo de seus associados foi o grupo dos 15 aos 24 anos. Neste Censo a tendência se confirma: o grupo etário mais visado pelas atuações é aquele na faixa etária entre 18 e 24 anos, que recebe ações de 67% dos associados; logo atrás vêm os grupos de 15 a 17 anos (para quem 59% dos associados dirigem ações) e o grupo entre 7 e 14 anos (51%).

Caso seja considerada a faixa mais ampla que tem sido definida como juventude (de 15 a 29 anos), 81% dos associados a têm como público-alvo.”O tema juventude entrou na agenda política brasileira na última década, com ações de movimentos sociais e do governo. O setor privado acompanhou essa tendência, que na verdade é mundial”, afirma Helena Abramo, lembrando que o ano 1985 já havia sido instituído como o Ano Internacional da Juventude, pela Organizações das Nações Unidas (ONU).

No total, são quase 600 projetos ou programas voltados especificamente para jovens, somando aqueles executados diretamente pelos associados – ou aqueles executados por terceiros e financiados por eles. O número total de jovens envolvidos nas iniciativas passa de 9 milhões (9.111.731).

”O alcance do benefício é um dado complexo, pois há projetos que beneficiam 5 jovens, há outros que atingem a 1 milhão. Isso pode ser explicado por exemplos simples: enquanto um associado oferece bolsa de estudos para estudantes, outro fornece tecnologias de aprendizados para um rede pública de ensino”, argumenta Helena Abramo.

Investimento
Para atender aos 9 milhões de jovens, os associados destinam mais de R$ 130 milhões para seus programas ou projetos. O dado relativo ao investimento, contudo, alerta para certa ambigüidade presente na importância atribuída à juventude neste universo: embora o público juvenil seja eleito como foco das ações, o volume de recursos aplicados não passa de 11,5% do volume total de investimento do Grupo.

Segundo a socióloga Helena Abramo, as explicações para essa questão se centram na nas diferentes estratégias adotadas pelas instituições. A primeira está na prioridade dada ao segmento frente a outros investimentos sociais: para 29%, ele é a base dos programas; para 39%, ele é um entre outros, constituindo parte de programas maiores; e em 33% das organizações, esta variação está presente em suas definições interna, em que a juventude pode ser considerada público preferencial de alguns projetos, enquanto compõem com outros segmentos, o alvo de outros projetos.

Além disso, também é importante analisar que variam o montante de investimento e o público atingido entre diferentes associados. Enquanto algumas instituições (apenas 3 dos respondentes) investem 100% do seu ISP em programas para jovens, outras (9, ao todo) destinam menos de 10% dos recursos para ações sociais; a proporção daqueles que investem mais de 50% não passa de 20%.

Por que jovens?
A maior parte dos motivos se relaciona, de um lado, 66% dos respondentes, aos fatores que tornam a juventude um segmento populacional especialmente afetado pela estrutura social e conjuntura histórica (peso demográfico, desemprego, índice de violência etc) e, por outro, 63% dos associados, o papel que os jovens podem ter na sociedade – como protagonistas de mudanças sociais e desenvolvimento. Por fim, a percepção de que faltam políticas públicas para o segmento é destaque em 43% das respostas.

Diferentes pesquisas corroboram para essa visão. De acordo com o relatório Jovens em Situação de Risco no Brasil, divulgado pelo Banco Mundial em 2007, as taxas de desemprego excepcionalmente altas entre jovens de 16 a 24 anos resultam em rendimentos anuais perdidos de até R$ 1,2 bilhão.

Pelo levantamento, um em cada cinco jovens trabalha e estuda simultaneamente e 60% dos brasileiros entre 15 e 19 anos são trabalhadores não-pagos ou sem carteira de trabalho assinada. São dados preocupantes que terão um impacto extremamente negativo a curto e longo prazo.

Outra pesquisa, esta realizada pelo Ipea, mostrou que cerca da metade do total de desempregados no Brasil tem entre 15 e 24 anos. Segundo os dados do estudo, a proporção entre o número de jovens desempregados e o total de pessoas sem emprego no País era de 46,6% em 2005, a maior taxa entre os dez países pesquisados. No mesmo período, no México, esta proporção é de 40,4%; na Argentina, de 39,6%; no Reino Unido, de 38,6%; e, nos Estados Unidos, de 33,2%.

A pesquisa chama atenção também para a defasagem escolar. De acordo com o estudo, cerca de 34% dos jovens entre 15 e 17 anos ainda estão no ensino fundamental, enquanto apenas 12,7% dos jovens de 18 e 24 anos freqüentam o ensino superior. "Em suma, com o aumento da idade diminui a freqüência de jovens à educação escolar", aponta o estudo.

Esse contexto explica, pelo menos em parte, porque os associados colocam a educação e trabalho como as prioritárias. “Mas a discussão do trabalho é muito polêmica no país. Quanto esses programas são capazes de impactar no segmento? O aumento da escolaridade significa inserção no mercado?”, questiona Helena Abramo.

Avaliação
Os participantes do Censo GIFE acreditam, majoritariamente, no impacto positivo na vida dos jovens beneficiados, principalmente com relação a chances de acesso, retorno e desempenho escolar e à profissionalização/capacitação para o trabalho, em alguns casos promovendo sua inserção no mercado de trabalho.

Essa percepção sobre a importância das ações para os jovens segue na mesma linha da avaliação que os associados fazem do conjunto de suas ações: 55% avaliam que o impacto causado sobre os beneficiários é positivo, e mais 36% o percebem como muito positivo.

ISP como inovação
Para o ex-diretor regional para a América Latina e Caribe da Fundação Kellogg, Francisco Tancredi, os investidores sociais devem assumir o que ele chama, humoradamente, de “Escala Tancredi de Ousadia em Filantropia” . O modelo nada mais é que uma linha evolutiva do próprio ISP: aquela que se diferencia da prática tradicional da filantropia pela ação estruturada, planejada, e que busca resultados mensuráveis.

Segundo ele, existem três tipos de estratégia:
a) o fazer o bem: “quando o investidor social tem um trabalho comunitário nobre, mas limitado, com retorno imediato”;
b) o de inovar: “quando o investidor financia uma idéia para se tornar uma tecnologia social inovadora, que seja eficaz para mudar uma realidade. Esta estratégia exige certa pré-disposição para a perda. Mas, quando a idéia dá certo, é como ganhar na loteria”; e
c) o de incidir em políticas públicas: “quando o investimento se centra em inserir essas tecnologias inovadoras em políticas nacionais, seja de educação, cultura ou saúde. Em que você mude sistemas públicos”.

As colocações de Tancredi levam ao seguinte raciocínio: para os próximos passos, associados devem encaram com mais ousadia seus projetos em juventude. “O investidor social privado deve iluminar caminhos, despertar a sociedade para temas que não estavam em pauta. Não pode apenas remendar situações”.

Tal como Helena Abramo, ele acredita que existe um passo importante para trabalhar com jovens, percebendo-o como agente de transformação social. “Ele deve ser um ator político, para pensar o país que o Brasil quer ser no futuro. Não podemos tê-lo apenas como um beneficiário de projetos de qualificação profissional. O prisma para enxergá-lo é maior”, crê o ex-diretor do da Fundação Kellogg.

Um dos passos para isso é escutar o jovem, acredita um dos membros do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), Rui Mesquita, Program Associate da Fundação W.K. Kellogg para a América Latina e o Caribe. Ele lembra da 1ª Conferência Nacional da Juventude, realizada em abril deste ano com a participação de 400 mil pessoas, que definiu 22 políticas públicas prioritárias para o segmento.

Legitimadas por movimentos juvenis de todo o Brasil, além de temas como educação e trabalho, as proposições abarcam cultura, saúde e sexualidade, participação política, meio ambiente, segurança e direitos humanos, diversidade e políticas afirmativas, esporte e lazer, fortalecimento institucional da política da juventude, mídia e tecnologia da informação, drogas, cidades, família, campo, povos e comunidades tradicionais.

“Essas demandas podem ser caminhos que os associados e, por extensão, do investidor social brasileiro, adotem para a diversificação de seus projetos”, acredita Rui.

Contexto
Segundo o Censo Juventude, é possível ter uma medida da amplitude e da diversidade que tem ganhado esta questão, no plano internacional, quando a juventude entrou na agenda de dois atores muito diferentes na sua constituição e propósito: o Banco Mundial e o Fórum Social Mundial.

O primeiro, entre suas ações, produziu recentemente o “Relatório de Desenvolvimento Social 2007: o desenvolvimento e a próxima geração”. O segundo, inclui, desde sua primeira edição, um espaço especial para os jovens, consubistanciado pelo no Acampamento Internacional da Juventude, que, na última edição no Brasil, em 2005, reuniu 35 mil jovens de diferentes países.

No plano continental, a articulação dos países da América Latina com dois países ibéricos ligados à sua história (Portugal e Espanha) gerou uma série de cooperação intergovernamental, fomento e estímulo para a implantação de uma agenda voltada para a Juventude: desde 1987, a realização de Conferências Intergovernamentais sobre Políticas Públicas de Juventude e a estruturação da OIJ (Organização Ibero-americana de Juventude) são os principais marcos.

O Brasil, polarizado por uma agenda interna diferenciada, incorporou-se a essa movimentação um pouco mais tarde, com algumas singularidades. No período sbsequente à reestruturação democrática e ao processo constituinte, quando se reoganizaram as pautas referentes aos direitos e às políticas públicas, o esforço da movimentação social ficou concentrado no tema urgente e dramática da infância e da adolescência, que pautou a implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Apenas mais recentemente, depois da segunda metade dos anos 1990, é que a “questão da juventude” entrou efetivamente na pauta. É a partir desse período que se pode observar “a passagem das políticas de Juventude como estado de coisas para a formação de uma agenda pública que considera os jovens como um problema político, isto é, como objeto especifico de intervenção do Estado”, aponta o Censo.

No plano governamental, assistimos à proliferação de organizamos gestores específicos de Juventude nos âmbitos municipal, estadual e federal, principalmente com a proposição e criação da Secretaria Nacional da Juventude e do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), ambos definidos por decreto presidencial em 2005, além de iniciativas no Legislativo, como a criação da Frente Parlamentar, que desenvolve o debate sobre a elaboração de um plano nacional para o segmento.

No que cerne as políticas públicas, o programa federal mais significativo foi o o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (PROJOVEM). Executado em parceria com os governos estaduais e o Distrito Federal, por meio dele, jovens entre 18 e 24 anos que não concluíram o ensino fundamental têm oportunidade de elevar seu grau de escolaridade, tal como oferece qualificação profissional voltada à inclusão social e estimula a prática de ações comunitárias e o exercício da cidadania.

O jovem matriculado no ProJovem recebe um benefício de R$ 100,00 mensais durante o período do curso (12 meses), desde que cumpra as metas estipuladas e tenha freqüência mínima de 75% nas aulas.

Segundo o secretário executivo do Conjuve, José Eduardo de Andrade, as previsões orçamentárias para o programa ficaram em torno de R$ 4 bilhões para os próximos três anos. “Mas é uma previsão, pode não ocorrer. Daí a importância do ISP nessas ações. Esses investidores estão na vanguarda das ações sociais”, alega.

Organizações de origem privada
Tal como nas políticas governamentais, também foi crescente o número de ações realizadas por diversas entidades da sociedade civil organizada e do setor empresarial. Movimentos de articulação público-privadas, na busca de parâmetros para programas e na criação de redes sociais.

De acordo com a pesquisa “As fundações privadas e as associações sem fins lucrativos no Brasil”, que levantou dados sobre 275.895 entidades, em 2004, houve um crescimento de organizações voltadas para a promoção e defesa dos direitos (em especial das crianças e adolescentes). Promovido pelo IBGE, IPEA, GIFE e Abong, o levantamento mostrou que esse tipo de entidade representava 16% do total, sendo que ¾ delas foram criadas a partir de 1990.

Em 2006, o IBGE realizou uma nova pesquisa, focada neste último conjunto, sobre as “Entidades de Assistência Social Privada sem Fins Lucrativos” (PEAS), em que se notou a importância do público adolescente e jovem como foco das ações: das 16.089 entidades pesquisadas no país, 51,7% desenvolvem ações que envolvem pessoas com idades entre 15 e 24 anos; 46% na faixa de 7 a 14 anos.

Outro estudo, este realizado pelo Ipea em 2006, diagnosticou que, entre os anos de 1999 e 2003, os jovens começaram a despontar como um grupo significativo nas empresas que realizam ações sociais. O percentual de organizações do setor privado com projetos para o segmento cresce de 23% (em 1999), para 39% (2003), com foco principalmente na qualificação profissional.


Rodrigo Zavala
redeGIFE Online, 13/10/08


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