segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Receita do petróleo e gás pode pagar fundo antiaquecimento

Daniela Chiaretti
Publicado pelo
Valor Online em 16/11/07

Capobianco: "O fundo para mudanças climáticas pode ter 70% de R$ 1 bilhão"
Foto Fabiano Cerchiari/Valor


A idéia é buscar o antídoto no veneno. É a partir dos recursos da extração do petróleo, o combustível fóssil tido como o grande vilão do efeito estufa, que o governo brasileiro pretende criar um fundo nacional para enfrentar as mudanças climáticas. A proposta faz parte de um conjunto de medidas elaboradas pelo Ministério do Meio Ambiente e que acaba de aterrissar em outros ministérios. Se aprovado, o fundo pode significar cerca de R$ 700 milhões ao ano para ações de adaptação aos impactos do aquecimento global, redução na emissão de gases e desenvolvimento de pesquisas no tema.

A área ambiental chega nesta discussão dentro do governo com um trunfo na manga. Nos próximos dias será divulgado o índice oficial do desmatamento da Amazônia para 2006/2007 e que, estima o governo, ficará em 10 mil km2. "Este terá sido o ano com o menor índice de desmatamento da Amazônia desde o início do monitoramento em 1988", diz João Paulo Capobianco, secretário-executivo do MMA. O aumento das queimadas e de áreas desmatadas registrado em agosto e setembro só entrará na taxa do ano que vem. "Trata-se de uma redução contínua por três anos consecutivos, e isto é importante", diz Capobianco. "Claro que o aumento verificado a partir de agosto preocupa. Temos que reverter esta tendência."

A proposta do fundo criado com recursos provenientes da extração de petróleo e gás depende de um ajuste à Lei 9.478, de agosto de 1997. Hoje a legislação prevê uma participação especial sobre a receita bruta da produção (deduzidos royalties, investimentos na exploração e custos operacionais) de 10% ao MMA para pesquisas relacionadas às fragilidades ambientais das áreas de extração e a danos causados por acidentes e vazamentos de óleo. É esta cláusula que o MMA sugere modificar. "Trata-se de cerca de R$ 1 bilhão ao ano para o ministério, mas como existe restrição ao uso, hoje a verba não pode ser utilizada na questão climática", diz Capobianco.

Segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, a ANP, de outubro de 2006 a setembro de 2007, o MMA recebeu R$ 656 milhões como repasse de participações especiais. Parte desta verba tem sido utilizada no mapeamento ambiental e de risco dos campos de petróleo, especialmente das bacias de Santos e Campos. O restante vai para as contas do governo, já que não têm ocorrido acidentes. A idéia, agora, é destinar 30% desta verba na contenção de eventuais vazamentos e acidentes e 70% para iniciar o fundo nacional de mudanças climáticas. Em princípio, a sede do fundo seria o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, o BNDES.

O fundo é um dos vértices de um triângulo de medidas que o governo vem discutindo nos últimos dias tendo as mudanças do clima como foco. Há ainda um decreto presidencial que pretende organizar a ação federal na área, com ações de vários ministérios e desembocando em um plano nacional de mudanças climáticas. O plano, anunciado pelo presidente Lula em setembro, durante evento nas Nações Unidas, só deve estar pronto em maio. A partir daí, será submetido a consulta pública.

Na base do tripé está a política nacional de mudanças climáticas, uma lei que envolverá o governo federal, os estaduais e municipais. Dará as normas gerais em quatro áreas: mitigação das emissões, adaptação às mudanças, pesquisa e comunicação com a sociedade. A intenção é enviar o projeto ao Congresso no início de 2008, adianta Capobianco. "O fundamental é institucionalizar no país um processo para criar oportunidades e ações nesta área", diz ele. "Ações em mudança climática são transversais. Temos que ter um sistema de articulação do governo."

De imediato serão anunciadas duas investidas na esfera do Ministério da Ciência e Tecnologia, o MCT. A primeira é uma rede nacional de pesquisas em mudanças climáticas que vem sendo estruturada há meses, deve reunir os principais institutos e universidades do país e será coordenada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o Inpe. A outra é um centro de pesquisa e monitoramento de florestas tropicais, com sede em Belém, e também sob o guarda-chuva do Inpe. Trata-se de um projeto ambicioso que prevê o trabalho em cooperação com países amazônicos e, no futuro, com África e Ásia. Os investimentos iniciais no centro são de R$ 10 milhões.

Outra iniciativa é a implantação de uma antena na região de Boa Vista, em Roraima, para que se obtenham as imagens que faltam ao monitoramento da floresta, com cenas da Amazônia Ocidental e da América Central. No futuro, o monitoramento de queimadas e desmatamento, hoje feito a partir de São José dos Campos, a sede do Inpe, passará gradativamente a ser feito dentro da própria Amazônia.

As propostas foram apresentadas na quarta-feira em reunião com vários ministérios e serão coordenadas pela Casa Civil. As sugestões foram bem recebidas, na avaliação de Capobianco. "A idéia do fundo foi vista como uma boa solução, de curto prazo, com base em um recurso que já tem provisão legal", diz ele. "Agora depende do cenário econômico." O dinheiro vindo da exploração de petróleo seria só um dos alicerces do fundo, que pretende captar recursos também da cooperação internacional. O plano de incentivos positivos à redução de emissões por desmatamento evitado, nome da proposta brasileira para preservar a Amazônia, é outra fonte possível. O debate destas propostas deve estar fechado para que o resultado saia antes do encontro da ONU sobre mudanças climáticas, em dezembro, em Báli, na Indonésia.


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