segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Internet: um bilhão online, mas mundo questiona como incluir cinco bilhões restantes

Agnes Dantas
Publicado pel'
O Globo Online em 18/11/07

Internet: um bilhão online, mas outros cinco bilhões excluídos

Foto Arquivo

Internet na tela do celular, via redes comunitárias sem fio ou mesmo por meio da tradicional linha telefônica discada. Já não importa o meio de acesso quando a questão é buscar alternativas para evitar o agravamento de um panorama mapeado pela Organização das Nações Unidas: mais de um bilhão de cidadãos em todo o mundo estão plugados à internet, mas pelo menos cinco bilhões de pessoas ainda são excluídos digitais. (Leia também: embaixador americano, David Gross, defende mais acesso, liberdade de expressão e elogia o Brasil) .

Para defender novos modelos de acesso às chamadas Tecnologias de Informação e Comunicação (ICTs, da sigla em inglês) na redução do vão que aumenta com o avanço da internet em todo o mundo, especialistas e organizações não governamentais de mais de 70 países sentaram à mesa no Rio de Janeiro durante o IGF Brazil 2007 - Fórum sobre Governança da Internet para conhecer e divulgar alternativas de acesso. Apoiado pela ONU, o evento ganhou ares de cúpula mundial e deixou o Brasil e suas políticas de democratização de acesso público expostos a elogios e críticas por parte de líderes de países ricos e pobres.

- Dados recentes dão conta que o Brasil tem 20 milhões de internautas residenciais, sendo que o programa Computador para Todos já facilitou a venda de mais de 1,5 milhão de computadores. Sabemos que é pouco, mas acreditamos que estamos indo pelo caminho certo - afirmou o ministro das Comunicações, Helio Costa, durante o evento.

Mas alguns especialistas defendem que a nova fronteira de democratização do acesso à informação já não deve ser limitada ao computador como intermediário. Valeria D'Costa, consultoria mundial do programa Informação para o Desenvolvimento (infoDev - www.infodev.org), mantido pelo Banco Mundial, destacou que políticas devem ser mudadas juntamente com as tendências mundiais. E citou como exemplo a Índia, país em que existem 50 milhões de usuários de computador e mais de 225 milhões de telefones celulares, plataforma móvel que "pode e deve ser usada como um novo veículo de inclusão" mas que não vem sendo considerada por governos e empresas de telecomunicações.

- Investir em tecnologias é levar aos cidadãos todos os serviços a que eles têm direito, como saúde e educação. Se isso pode ser feito pelo celular, por uma estrutura já acessível, para quê serve uma rede de gigabyte de velocidade se isso não chega a quem é de direito? Chegar a estes bilhões de excluídos significa ouvir o que eles têm a dizer e oferecer acesso à internet e à tecnologia da forma mais direta possível - defendeu a especialista, que citou a massa de mais de 100 milhões de usuários de telefones celulares no Brasil.

Em localidades remotas de países como a Colômbia, Peru e Uruguai, vilarejos fugiram às regras de mercado e estão se conectando entre si através de rede sem fio nos mais diversos padrões (Wi-Fi, WiMESH, WiMax etc) - inclusive a partir de equipamentos usados e readaptados para freqüências de rádiotransmissão. Na prática e sem ameaçar redes já existentes de comunicação - como freqüências de aeroportos e emissoras de radiodifusão - vilas inteiras acessam a internet, realizam comércio eletrônico e preservam sua identidade cultural em redes sociais locais. O exemplo do "Instituto para la Conectividad en las Américas" e da Fundação Escola-Latino Americana de Redes, da Colômbia (ESLARED) foi exibido pela consultora Sylvia Cadena, uma das coordenadoras do projeto e representante da WiLAC, entidade que debate o compartilhamento de tecnologias sem fio na região (www.wilac.net).

- Mais de 70% da população da América Latina vive em zonas rurais. O que acontece é que os atuais modelos de regulamentação, de negócios e de serviços de telecomunicações são baseados em padrões que atendem apenas áreas urbanas. É nesta realidade, da periferia e das áreas rurais que os modelos de leis e de negócios devem estar baseados, e não serem tratados como exceção - destacou Sylvia Cadena, que questiona os modelos de regulamentação de internet e de tecnologias que limitam a democratização do acesso público.

A consultora lembrou que os marcos regulatórios limitam o uso de tecnologias alternativas para a popularização de baixa renda ou de áreas remotas. Segundo ela, as pequenas comunidades não conseguem ter acesso a internet via rede de energia elétrica "porque têm que pagar altas taxas pela importação dos equipamentos", ao mesmo tempo em que taxas impostas aos provedores de acesso e de serviços (ISPs, da sigla em inglês) reduzem os incentivos para a oferta de acesso em comunidades remotas ou populações rurais.

- Em uma comunidade remota do Peru, entregamos nas mãos dos cidadãos de vilarejos rurais antigos equipamentos de rede e eles foram adaptando cada uma destas tecnologias para construir engenhocas capazes de conectá-los. Foi uma das soluções encontradas para buscarmos representatividade, já que o mercado ignora esta realidade - relatou a consultora, ao se referir ao Tricalcar, projeto de redes sem fio comunitárias em vilas da América Latina e Caribe.

Roque Gagliano, um dos executivos da Antel, única operadora de telefonia fixa e 100% controlada pelo governo, reforçou o argumento de que para incluir digitalmente os próximos bilhões de usuários será preciso mudar os modelos vigentes de acesso à internet. Ele lembrou que o Uruguai paga 100% de custos sobre a interoperabilidade de acesso para levar internet ao país porque não há alternativas.

- Atualmente as empresas que precisam se conectar a servidores ou a provedores de serviços e estes entre si precisam trafegar dados entre países, precisam entrar em redes internacionais de acesso para oferecer serviços localmente. Não precisamos interconectar países. Precisamos permitir que provedores de conteúdo, empresas ou clientes se comuniquem localmente, precisamos defender a conectividade regional - afirmou.

E quando o assunto é inclusão digital em massa em países pobres, a África exibe alguns dos mais bem sucedidos exemplos de superação, destacaram integrantes da ONU presentes ao IGF Brazil 2007. A ONG Associação pela Comunicação Progressiva (APC, da sigla em inglês) é uma das entidades não governamentais que tem unido governos, iniciativa privada, mídia e sociedade civil na implementação de programas de inclusão digital no continente, e apresentou casos de comunidades rurais que alfabetizam adultos e crianças, que geram conteúdos locais na internet e que têm criado redes de comunicação entre vilarejos com a ajuda da rede mundial. (http://apc.org)

- As comunidades usam a infra-estrutura da qual dispõem, que as vezes é (acesso) via celular ou via modem (internet discada), e através dela criam atividades e grupos responsáveis pelo desenvolvimento social e cultural, pelo resgate dos valores daquela pequena sociedade - afirmou Anriette Esterhuysen, diretora-executiva da APC, referindo-se a telecentros comunitários gerenciados pela ONG em países como o Quênia, a Etiópia e o Senegal.


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