quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Com apelo natural, marcas brasileiras miram os EUA

Daniela D'Ambrosio e Cynthia Malta
Publicado pelo
Valor Online em 09/01/08

Clelia Angelon, da Surya: seus produtos estão em 30 Estados americanos e exportações já são 50% do faturamento
Foto Ricardo Benichio/Valor

O discurso da biodiversidade tão propagado pela Natura ganha discípulos de todos os tamanhos no Brasil - especialmente daqueles que querem conquistar seu espaço lá fora. Nem o câmbio desfavorável fez esmorecer os planos de companhias nacionais de cosméticos de pequeno e médio porte que elegeram o mercado externo como sua principal estratégia.

E os Estados Unidos - que depois da Europa despertaram para o conceito de produtos naturais - surgem como uma das grandes oportunidades de negócio do momento. Empresas como Surya Brasil, nuNaat, Amazônia Viva e Vita Derm usam de ingredientes como guaraná, açaí e pupunha para emplacar seus produtos nas cobiçadas e disputadas prateleiras americanas.

O primeiro passo - construir uma relação de confiança - já começa a ser dado. "Os EUA só tinham dúvidas a nosso respeito e agora estamos começando a vencer as barreiras", afirma Luis Carlos Basílio, presidente da Abihpec. "É um envolvimento que cresce, conforme se estabelece uma relação de respeito."

Vegetariana e naturalista desde a adolescência, Clélia Angelon é o cartão de visitas da sua empresa, a Surya Brasil. Casada com um indiano, começou vendendo henna, produto natural que tinge os cabelos, e resolveu expandir a linha. A empresa abriu uma subsidiária nos Estados Unidos em 1997 e só a partir de 2005 começou a colher os frutos - prova de que se trata de uma tarefa árdua e demorada. "É um trabalho de formiguinha que exige um conhecimento profundo do mercado", afirma Clélia.

E, apesar do câmbio, este tem sido um dos melhores anos para a companhia No mês de julho o faturamento triplicou em relação a junho. Seus produtos já estão em mais de 30 Estados americanos e conseguiu entrar em lojas de produtos naturais como The Haealth Nuts, Westerly Market, Rickys NYC e Sunflower Market. O impulso veio com a conquista do Ecocert, emitido por uma certificadora francesa de produtos naturais e orgânicos.

"Os consumidores americanos são muito informados e conscientes, já descartam o produto só de olhar a composição", conta. Entre as matérias-primas vetadas estão os parabenos, derivado de petróleo considerado alergênicos, amônia, água oxigenada e até produtos químicos mais técnicos, como o diazolidinil uréia, que contém formol e é considerado cancerígeno.

Embora a Surya tenha uma linha de xampus e cremes batizada "Amazônia Preciosa", um dos carros-chefes é a coloração em pó. Outra coqueluche é a tatuagem de genipapo, 100% natural e que fica 15 dias na pele. As exportações representam 50% do faturamento da Surya Brasil, de R$ 7 milhões no ano passado.

O nome Amazônia, aliás, já está ganhando status de commodity. A Amazônia Viva, empresa de produtos naturais de luxo criada no ano passado - um hidratante para o corpo custa R$ 120 e um xampu R$ 40- pretende pavimentar sua entrada no mercado americano a partir do ano que vem. O plano é começar a vender os produtos daqui a três anos, afirma a empresária Maria Cristina Ferreira, que já exporta para a França e Grã Bretanha. "Vejo mais chance de crescimento no mercado externo do que interno."

Mas em tempos de real valorizado um produto tão caro consegue ter espaço? "O mercado já está pronto para as marcas naturais mais baratas, eu tenho um trabalho adicional de provar a qualidade do meu produto", diz Cristina.

A Vita Derm, que fabrica produtos para tratamento de rosto, cabelo e corpo e faturou US$ 170 milhões em 2006, sendo 5% disso em exportações, inaugurou em março deste ano uma loja, a Spa Vita, em Boca Raton, na Flórida, e está em negociação com uma grande rede de varejo, cujo nome ainda é mantido em sigilo. O modelo de spa tem por objetivo fazer a consumidora testar os produtos, aplicados por profissionais. Se ela gostar, pode levar para casa ou voltar à loja para outra sessões de tratamento. Obter certificação internacional também é considerado ponto importante na conquista da clientela - fora e dentro do Brasil.

A linha Vita Amazônia, por exemplo, é testada por um instituto de bio-engenharia cutânea na França, conhecido pela sigla ISIC. Marcelo Schulman, que tem a produção centralizada no bairro paulistano da Lapa, também estuda instalar uma fábrica no Amazonas, mas argumenta que, apesar dos benefícios fiscais oferecidos pela Zona Franca de Manaus, a distância do seu principal mercado consumidor, o Estado de São Paulo, e dos fornecedores é um ponto negativo expressivo. Ele considera outras alternativas (ver abaixo).

O potencial dos produtos brasileiros com apelo natural em outros países já está atraindo empresas totalmente voltadas ao mercado externo. Com fábrica em São Paulo, a nuNAAT - palavra que significa terra no idioma falado na Groenlândia - foi criada em 2005 somente para exportar. Apesar da falta de referência ao mercado brasileiro, os produtos contêm insumos como guaraná, cupuaçu, karitê e semente de linho. A empresa compra parte da matéria-prima de uma reserva de índios do Mato Grosso que faz extração do óleo de castanha. E, claro, usa isso como importante ferramenta de marketing.

A companhia está abrindo um escritório e um centro de distribuição em Miami e escolheu um nicho para atuar: produtos naturais para o mercado étnico - com grande potencial nos Estados Unidos. "Os Estados Unidos não são tão burocráticos como outros países em termos de normatização e registro dos produtos", afirma Alexandre Vasto, diretor da nuNAAT. "Lá, é preciso ser organizado e ter preço competitivo".

Por conta do interesse maciço de empresas brasileiras em entrar naquele mercado, já existe uma rede de "fornecedores de serviços", que vão desde profissionais que desenvolvem estratégias de marketing até especialistas numa determinada rede de varejo. "O que importa mesmo é é estar lá, estudar e sentir o mercado", diz Vasto.

O mercado americano de cosméticos é o maior do mundo, com uma participação de 19,6%. Faturou US$ 50,35 bilhões no ano passado. O brasileiro, que conquistou a posição de terceiro maior do mundo, faturou R$ 17,5 bilhões.

A Natura, que já tem uma forte presença na América Latina, e em 2005 abriu uma loja em Paris, partirá para o mercado americano no primeiro semestre do próximo ano através do modelo de venda direta. A companhia elegeu a costa oeste para começar o trabalho.


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