quarta-feira, 16 de maio de 2007

UE propõe este mês parceria com Brasil


Humberto Saccomandi e Sergio Leo
Publicado no Valor Online de 15/05/2007

A União Européia divulga no final deste mês documento no qual oferece uma parceria estratégica ao Brasil. Apesar de ser uma proposta de acordo político, e não comercial, a parceria deve incluir dispositivos para facilitar e incrementar o comércio entre Brasil e UE. E pode gerar constrangimentos na relação brasileira com os parceiros do Mercosul, embora o governo brasileiro defenda o contrário.

A proposta, intitulada "Parceria Estratégica com o Brasil", será encaminhada pela Comissão Européia (órgão executivo da UE) ao Parlamento Europeu e o Conselho Europeu (que reúne líderes do bloco). E deve ser discutida na cúpula da UE em junho. Europeus e brasileiros concordam em dar destaque à colaboração na área de biocombustíveis e mudança climática.
A proposta oficial será encaminhada ao governo brasileiro na primeira cúpula UE-Brasil, em Lisboa, em 4 de julho. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participará do encontro. De lá, segue para uma conferência sobre biocombustíveis em Bruxelas, na qual "será a grande estrela", segundo um diplomata europeu. A conferência foi uma iniciativa do atual presidente da Comissão, o português José Manuel Durão Barroso, impressionado com o programa brasileiro de combustíveis renováveis.

A escolha do Brasil como parceiro preferencial dos europeus no continente tem o potencial de despertar ciúmes dos vizinhos com fortes laços econômicos e culturais com o Velho Continente, como a Argentina, e alimentar especulações sobre um possível "descolamento" do Brasil em relação a seus sócios no Mercosul. O Itamaraty diz não ver motivo para isso, argumentando que esse tipo de parceria é uma relação bilateral, um tipo de acordo político que o Brasil já vem mantendo individualmente. Estaria em nível semelhante a articulações como o IBAS, que une Brasil, Índia e África do Sul.

O governo brasileiro vê a aproximação com a UE, porém, como decorrência natural do longo relacionamento com o bloco europeu e do maior protagonismo brasileiro em instâncias políticas internacionais, como a ONU e a Organização Mundial do Comércio (OMC).

A proposta ao Brasil é uma iniciativa do governo português, que assume em julho a Presidência rotativa da UE. "O objetivo é elevar a relação com o Brasil para o mesmo patamar que a dos parceiros mais importantes da UE", disse ontem o ministro das Relações Exteriores de Portugal, Luis Amado, antes de reunião com colegas europeus.

A proposta de parceria ao Brasil altera um ponto importante da política da UE para a América do Sul, que vinha privilegiando negociações entre blocos econômicos. No caso do Brasil, com o Mercosul. Desde 1999, os dois blocos negociam um acordo comercial. Mas a UE revisou esta política e decidiu que "não poderia mais ignorar o sócio maior do Mercosul".

Segundo o Valor apurou, contribuiu para que a UE decidisse descolar o Brasil do Mercosul a entrada da Venezuela e da Bolívia no bloco sul-americano. Para um diplomata europeu, agora "não é fácil conversar com o Mercosul como um todo". Isso não significa que o Brasil negociará pelo Mercosul com a UE. Só que ganhará um canal de diálogo próprio e privilegiado com os europeus.

Indiretamente, a UE espera que isso ajude a avançar o acordo com o o Mercosul, criando um clima propício para as negociações. Teme-se, porém, a reação dos parceiros sul-americanos a essa aproximação entre Brasil e UE.

As negociações para o acordo de comercial entre Mercosul e UE não serão tratadas nas conversas para a parceria estratégica, porque só serão retomadas após a definição das discussões comerciais mais amplas entre os sócios da OMC. Antes disso, nem os europeus nem os brasileiros se sentem em condições de decidir que ofertas farão.

Um diplomata europeu ouvido pelo Valor deixou claro que, embora a parceria estratégica não substitua o acordo comercial, poderá incluir dispositivos comerciais. Ele citou explicitamente a questão das exportações de carne e de etanol do Brasil para a UE.

Esses dispositivos não devem mexer nas tarifas aplicadas a produtos brasileiros, mas podem reduzir outras restrições, como cotas ou barreiras fitossanitárias. A parceria com a Rússia (de 1997), por exemplo, proíbe a imposição de quotas de importação. Ele contém ainda uma série de dispositivos facilitadores do comércio, além de garantias a investimentos.

Outra questão comercial que pode constar do acordo é um mecanismo de resolução de litígios, que trataria de pendências antes que elas fossem levadas à OMC.

Um diplomata brasileiro na Europa disse ao Valor que esse acordo é o "sonho de consumo" do Brasil nas relações com a UE. O Brasil já tem "parcerias estratégicas" com a maioria dos países europeus individualmente, o que, na avaliação do Itamaraty, tem facilitado as discussões bilaterais. O acordo com a UE daria uma dimensão maior, em assuntos como facilitação de comércio e ciência e tecnologia.

A UE já tem acordos de parceria estratégica com EUA, Japão, China, Canadá, Índia e Rússia, e negocia com a África do Sul.

Os termos da parceira ainda terão de ser negociados pelos dois lados, mas na proposta a ser encaminhada ao Brasil, a UE deve destacar alguns pontos, como energia e meio ambiente. Um preocupação européia é com o fornecimento de etanol, alternativa à excessiva dependência do continente de energia importada da Rússia.

A UE quer negociar o acordo até meados de 2008, para assiná-lo numa cúpula no Brasil, já na Presidência francesa da UE. A acordo de parceria estratégica implica uma notável aproximação política, com a institucionalização de diversos níveis de diálogo e negociação. O mais importante é uma cúpula anual de líderes da UE com o presidente brasileiro.


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