quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Crise financeira leva investidores sociais privados à reflexão

“Sem dúvida, estamos em um período de crise. Ninguém ainda sabe direito a dimensão. Como todos os outros setores, no investimento social privado, os cintos serão apertados para se preparar para crise. No entanto, nossa visão é de crise com otimismo”, comenta o secretário-geral do Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife), Fernando Rossetti.

O Gife é a entidade que reúne os principais investidores sociais privados do país. No ano passado, a rede, composta por 80 associados, investiu cerca de R$ 1,15 bilhão em ações sociais, culturais e ambientais. Esse montante é representativo no universo do investimento social privado. De acordo com a pesquisa Ação Social das Empresas, publicada em 2006 pela pesquisadora Anna Peliano, do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), 600 mil empresas brasileiras investiram no ano de 2004 cerca de R$ 5,3 bilhões em programas sociais.

Com a crise, o Gife estima que haja um corte entre 10% e 30% nos investimentos das empresas em ações sociais. “Se fosse há dez anos, as ações simplesmente seriam cortadas. A crise nos faz pensar estrategicamente como usamos o nosso dinheiro. Servirá para o Terceiro Setor sair mais maduro e estruturado”, afirma Rossetti.

Para diretora da Associação Brasileira de Organizações Não-governamentais (Abong), Tatiana Dahmer, o momento é para o terceiro setor parar e refletir sobre suas ações e seus modelos de captação de recursos e investimentos.

Modelos de investimento
Segundo o último levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre fundações e associações, havia cerca de 338 mil organizações no Brasil em 2005. Essas associações se sustentam de diferentes maneiras, com investimentos privados, recursos públicos, fundos patrimoniais e outros. No entanto, a maior parte das receitas do Terceiro Setor brasileiro está relacionada aos resultados das empresas em cada ano.

Embora reconheça as possibilidades de cortes, Rossetti vê com otimismo a crise. “Devemos pensar se o investimento social privado e a responsabilidade social já viraram cultura empresarial ou é só gordura. O que estamos notando é que a ação social da empresa não está desvinculada do centro do negócio”.

Segundo o diretor do Instituto Camargo Correa, Francisco Azevedo, a entidade pretende dar continuidade a todos os projetos, orçados em R$ 16 milhões. “Vamos continuar todos os compromissos assumidos. Talvez tenhamos que fazer alguns ajustes, porém nada que comprometa os programas em andamento”.

A Fundação Odebrecht também pretende manter para 2009 o investimento de R$ 16 milhões no Programa de Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Baixo Sul da Bahia, no qual apóia mais de 13 associações do local, atendendo mais de 9 mil pessoas.

“Mesmo em momentos de instabilidade econômica, nunca se pode perder o foco no crescimento orgânico da empresa e das comunidades onde ela está inserida”, afirma o presidente executivo da Fundação Odebrecht Maurício Medeiros.

Sustentabilidade

A sustentabilidade das ações sociais é um ponto importante neste momento. Para Fernando Rossetti, as associações que dependem de um ou mais financiadores poderão ter mais problemas neste período de crise. “As associações menores devem sofrer mais o impacto da instabilidade econômica”.

Os institutos e fundações podem sofrer redução dos recursos, pois suas receitas estão ligadas ao desempenho das empresas. No entanto, como tem um mantenedor, os programas não serão extintos. No caso do Instituto Camargo Correa, é o grupo Camargo Correia, composto por cinco áreas de negócio de construção civil a têxtil, que teve uma receita bruta em 2007 de R$ 12,4 bilhões.

Nos Estados Unidos, as fundações e os institutos têm suas receitas provenientes de fundos patrimoniais. Quando a empresa decide investir socialmente, cria um fundo para este propósito. Dessa maneira, não precisa destinar parte do seu orçamento às ações sociais, as receitas são retiradas do capital aplicado.

Segundo Rossetti, os fundos patrimoniais são pouco comuns no Brasil, porque a legislação não favorece esse tipo de ação. “Há uma cobrança muito alta de imposto sobre esse fundo”, explica.

“É preciso haver um maior diálogo entre as organizações e o governo para que possamos fazer pequenas alterações nas leis. É preciso discutir também quem acessa os recursos governamentais e para quê”, comenta Tatiana Dahmer, da Abong.

Estratégias
Como a mudança de modelos de financiamento e diversificação das receitas é algo para longo prazo, o Terceiro Setor começa a pensar em soluções para curto e médio prazo diante da crise.

De acordo com o presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS), Marcos Kisil, é hora de fazer um planejamento estratégico, definindo as áreas de atuação.

“As estratégias devem resultar de estudos analíticos que definam as melhores formas possíveis de se alcançar objetivos e/ou metas específicas, aplicando da melhor forma os meios e recursos disponíveis, para se conseguir o máximo aproveitamento dentro do contexto onde o investidor pretende atuar”, comenta Marcos.

Pensar estrategicamente também é fazer alianças e articulações. “Acreditamos que haverá um efeito de maior alinhamento, vai se conhecer melhor o que o outro está fazendo”, afirma Rossetti.

“As alianças e parcerias são fundamentais em qualquer momento, porque na parceria você consegue potencializar as ações. O que gera resultados mais eficazes em um custo menor”, afirma Azevedo.


Bruna Souza e Talita Mochiute, do Aprendiz
Envolverde, 02/12/08
© Copyleft - É livre a reprodução exclusivamente para fins não comerciais, desde que o autor e a fonte sejam citados e esta nota seja incluída.


Nenhum comentário:



Acesse esta Agenda

Clicando no botão ao lado você pode se inscrever nesta Agenda e receber as novidades em seu email:
BlogBlogs.Com.Br