quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Identificando as empresas esforçadas em sustentabilidade

No artigo da semana passada, arriscou-se aqui, a pedido dos leitores, classificar as empresas segundo o seu envolvimento com o tema sustentabilidade. Mesmo admitindo de antemão que, por mais bem intencionadas, classificações são, por natureza, simplistas, o desafio foi encarado como uma forma de orientar aqueles que querem mais informações para distinguir as empresas sustentáveis das que não são.

Usando como norte a distância e a coerência entre discurso e práticas sustentáveis, propôs-se dividi-las em quatro categorias: as líderes, as esforçadas, as cínicas e as indiferentes.

Sobre as líderes, houve pouca dúvida. A julgar pelos e-mails recebidos, os leitores sabem identificá-las, talvez porque normalmente elas são as maiores, já estejam na estrada sustentável há pelo menos dez anos ou tenham conseguido comunicar, com maior eficácia, os seus compromissos socioambientais. A condição de líder, no entanto, não assegura, por si só, uma nota 10 em sustentabilidade. Apenas indica que caminharam mais e, de modo mais intenso, na incorporação do conceito.

Em relação às esforçadas, sobraram algumas dúvidas. Compreensíveis, na verdade. Dada a sutileza da principal diferença apontada para as líderes - o ritmo lento e tortuoso com que avançam nas práticas de responsabilidade social - é razoável que muitos leitores não saibam distingui-las das que compõem a primeira categoria. Agrava ainda o fato de que informações sobre esses processos não costumam ser de conhecimento geral.

Nunca é demais lembrar: nas esforçadas, como o próprio nome sugere, há um interesse honesto pela inserção da sustentabilidade na cultura organizacional, embora este conceito, ainda expresso na forma de práticas isoladas, não tenha entrado na estratégia de negócio a ponto de romper o modo habitual de pensar e fazer negócios. Se isso não ocorreu –vale frisar – não foi necessariamente por falta de vontade. Pode ser conseqüência de se estar em um negócio complexo, instável e baseado em modelo difícil de mudar no curto prazo. Pode ser também resultado da falta de prioridade ao tema, da ausência de líderes afinados com ele, de uma cultura resistente à mudança ou ainda temerosa do risco de assumir o custo presente de mudar, substituindo estratégias negociais historicamente vitoriosas e lucrativas.

Nas esforçadas, o conceito segue, no entanto, ainda mais atrelado às noções de risco e custo do que às de oportunidade e investimento, o que explica, em alguma medida, a sua trajetória não tão linear, marcada por avanços e retrocessos, dilemas e contradições.

Como então identificá-las? Não há respostas absolutas. Uma medida sensata é analisar a evolução de suas práticas a partir, por exemplo, da leitura de relatórios de sustentabilidade. A publicação desses documentos é, como medida, um bom indício de honestidade de intenções. Atesta que, no mínimo, a empresa está disposta a compartilhar informações sobre sua atuação sustentável com diferentes públicos de interesse. Mas, evidentemente, apenas publicar pode não significar grande coisa até porque, como se sabe, papel e espaço na internet aceitam tudo.

Para aqueles que querem, de fato, fazer uma avaliação mais criteriosa do quanto as práticas socioambientais estão evoluindo numa empresa, recomenda-se o seguinte passo a passo:

Identificada a empresa, acessar o site e verificar a existência de um link específico para donwload de relatório de sustentabilidade, normalmente em campo para Responsabilidade Social. A não existência dele configura, de partida, pouco interesse (e baixo grau de transparência) em disponibilizar informações para diferentes públicos. Muitas empresas preferem distribuir relatórios impressos para públicos que variam entre 2 mil e 5 mil pessoas. Quanto maiores as empresas, e mais superlativos os seus impactos, maior deve ser a preocupação em relatar seus compromissos sustentáveis. Eis um item importante de análise

Acessado o relatório, analisar há quanto tempo a empresa o publica. Tempo é importante, pois indica compromisso. No entanto, mais importante do que o tempo é o modo como a empresa sistematiza as informações socioambientais e as relaciona com os seus negócios.

Os melhores relatórios são os que seguem alguma diretriz capaz de organizar as informações. Ferramentas como os Indicadores Ethos e, mais recentemente, o GRI (Global Reporting Intiative), ajudam a ter uma visão mais ampla do conjunto de ações socioambientais da empresa. O conjunto é importante na medida em que reflete a preocupação mais abrangente da companhia com o conceito. Tão importante quanto atender a um amplo check list de práticas ideais é a qualidade das ações, algo que pode ser analisado a partir da descrição delas.

Se o objetivo é avaliar a evolução, apenas a leitura de uma série de relatórios possibilita uma comparação. Um cuidado importante é verificar como, e com que nível de honestidade, as empresas equilibram as notícias boas (práticas bem resolvidas) com as ruins (áreas nas quais ainda há muito por se fazer). O bom senso manda desconfiar de documentos que retratam perfeição, até porque, em tema tão recente, nenhuma empresa pode se atribuir notas elevadas. Outra dica: verificar se os relatórios têm algum tipo de auditoria externa. Não só em número mas em procedimentos.

Na próxima semana, a coluna vai tratar de como identificar as empresas cínicas.


Ricardo Voltolini, da Revista Idéia Socioambiental
Imagem: The Son of Man, de Rene Magritte
Envolverde, 20/08/08

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