terça-feira, 28 de outubro de 2008

Como Escrever um Projeto

Estas dicas referem-se ao universo de fundações e agências de cooperação não governamentais, brasileiras ou internacionais. Em grande parte, baseiam-se na experiência de muitas organizações, assim como em depoimentos de dirigentes e responsáveis pela análise, seleção e aprovação de projetos naquelas instituições. Portanto, não são regras, mas pontos a serem observados. O importante é alertar que, além de um projeto consistente, é preciso informar-se sobre a instituição à qual vai solicitar apoio e apresentar suas idéias de modo claro e objetivo.

Algumas tendências gerais da cooperação internacional não governamental
Algumas tendências da cooperação internacional já são bastante conhecidas: redução global do volume de financiamentos para a América Latina e o Caribe; maior ênfase no apoio a projetos, reduzindo os chamados apoios institucionais. Mas existem algumas outras características das fundações e agências que vale a pena ter em conta quando se pensa na apresentação de projetos.

Várias fundações e agências têm, assim como as ongs que elas apoiam, passado por profundos processos de reorganização de estruturas e prioridades. Reestruturação, downsizing e profissionalização são termos que, cada vez mais, vêm fazendo parte do cotidiano destas organizações e do seu vocabulário. Estão sendo constantemente cobradas por seus conselhos, doadores e contribuintes quanto ao impacto de sua atuação própria e dos projetos e instituições que apoiam. As tendências que se verificam a partir desta dinâmica são:

Profissionalização dos quadros. Cada vez mais, as pessoas que trabalham nestas instituições conhecem bastante ou tiveram experiência sobre o "outro lado", o dos projetos e ongs.

Maior preocupação em focar a atuação, reduzindo o leque de temas e aspectos nos quais atuam e dão apoio, visando aumentar o seu impacto. Algumas instituições têm, inclusive, optado por fazer doações maiores a um número menor de organizações, de forma a aumentar o impacto de seus fundos.

Opções mais claras relativas ao tipo e ao tamanho das instituições que apoiam. Privilegiam organizações pequenas, com atuação local e capacidade inovadora. Outras têm optado por apoiar grupos maiores, regionais e nacionais com maior possibilidade de difundir experiências, opiniões e influenciar políticas públicas.

Estão se tornando mais pró-ativas e levando mais a sério seu papel na formulação de políticas públicas. Cada vez mais definem objetivos próprios e áreas nas quais querem investir. Assim, procuram organizações parceiras que possam levar adiante estes projetos, reduzindo o orçamento para atendimento a demandas.

Preocupação crescente com a sustentabilidade e a replicabilidade dos projetos e iniciativas. Isto leva à priorização de projetos que nascem e se desenvolvem apoiados em relações de parceria e colaboração entre várias organizações e projetos.

Priorização de projetos participativos, que envolvem o público alvo no desenho de um projeto: na definição do problema, na indicação das soluções e na execução das ações.

O que você deve saber antes de entrar em contato?
Tente se informar o máximo possível sobre a fundação ou agência, dedicando tempo à pesquisa e à preparação, antes de tentar entrar em contato com o possível doador.

Localize ou peça folders, publicações, orientações para envio de projetos. Visite a home page na Internet. Confira as áreas programáticas da fundação. Verifique se você está incluído nas prioridades e se atende aos critérios da entidade. Veja a relação (se disponível) de projetos que eles já apoiaram e compare com o tipo de projeto que você desenvolve ou pretende implementar.

Cheque os procedimentos apontados pela entidade sobre como fazer contato. Algumas pedem uma carta inicial, curta e objetiva. Outras só estabelecem contato a partir do recebimento de projetos apresentados segundo roteiros, formulários e listas de documentos necessários, fornecidos pela entidade. Verifique se existe alguma exigência quanto ao projeto ter sido concebido e estruturado segundo algum método de planejamento específico.

Conheça a si mesmo e à sua organização. Assegure-se de que seu conselho tem clara sua missão. Seja capaz de definir por que vocês são diferentes e como podem resolver os problemas.

Escreva um documento conceitual e deixe-o na gaveta por uma semana. Depois, releia e mostre aos colegas e pergunte se o texto realmente está comunicando o que você está querendo dizer, de maneira honesta e direto ao ponto.

O que os doadores esperam sobre o modo de contato e de apresentação da proposta?
Informe-se sobre com quem você deve falar: nome, cargo, função. A pior coisa é enviar cartas dirigidas a alguém que não está mais no cargo. Dirija-se diretamente à pessoa e acredite na sua capacidade profissional e inteligência. Siga suas recomendações e seja respeitoso com os procedimentos da entidade. Esforços de lobby, como 25 cartas de apoio de outras instituições, não funcionam.

Evite o uso de contatos pessoais diretos com o conselho da entidade, passando por cima do responsável pelo recebimento e avaliação de projetos. Não tente criar canais pessoais e informais, tais como convites para jantar, a não ser que proposto pela pessoa como um jantar de trabalho.

Prepare-se para a entrevista. Releia o material sobre a fundação ou agência e prepare-se para apresentar com clareza e objetividade sua organização e seu projeto. Focalize mais as soluções (e menos os problemas) que o projeto pretende oferecer. Evite os jargões e a falta de concisão.

Numa entrevista, garanta sempre a presença das pessoas que vão dirigir o projeto, e não apenas do responsável pela captação de recursos.

Jamais pergunte "Quanto devemos solicitar?". Tenha bem definidas as suas necessidades e seu orçamento e apresente-os de forma bem fundamentada.

Quais as características de uma proposta bem sucedida, na opinião dos doadores?
- Quando ela possibilita aos doadores ver como seu investimento resultará num impacto de longo prazo, indicando os planos para a sustentação no futuro;

- A que revela o interesse e o compromisso do Conselho da organização;

- Quando demonstra que o solicitante refletiu claramente sobre o seu papel e suas políticas no contexto em que opera. E que, além de entender profundamente este contexto, consegue articular claramente a essência e a personalidade da organização na busca de soluções;

- Ser bem estruturada, demonstrando com clareza o problema e os objetivos para enfrentá lo; Comprovar que a organização já demonstrou ter capacidade para fazer um trabalho sólido, contando com líderes capazes, comprometidos, perseverantes e efetivos;

- Apresentar maneiras inovadoras, consistentes e pouco usuais para resolver problemas;

- Estar em sintonia com as prioridades da instituição doadora.

Quais são algumas das razões pelas quais uma proposta pode ser rejeitada?
- Despesas administrativas;
- Se não demonstra a capacidade da organização e de seu pessoal de levar adiante o projeto;
- Discurso arrogante ou retórico;
- Falta de honestidade ou falta de caráter.

Na proposta, qual é a seção mais importante, de maior peso?
Há um consenso generalizado entre os doadores sobre a importância da carta inicial ou do chamado sumário executivo, geralmente de uma página ou duas, que apresenta o resumo da proposta. É a primeira coisa que os doadores lêem. Há uma avaliação comum: se você não puder dizer quem é, o que pretende, onde, quando e porquê em uma página, não poderá fazê-lo em dez. Portanto, espera-se que nesta carta inicial ou sumário estejam contidos os seguintes aspectos:

Logo nos primeiros parágrafos, a organização deve dizer o que quer e como a proposta se encaixa nas prioridades programáticas do doador;

Fazer um resumo sobre o problema (ou necessidades), como o diagnosticaram e como pretendem solucioná-lo.

Em seguida, as partes da proposta (texto mais desenvolvido sobre o projeto) que mais merecem a atenção dos doadores são o orçamento e a caracterização da organização e do seu pessoal, para avaliar a capacidade da organização em implementar o projeto.

O que os doadores procuram no orçamento?
Cada doador tem seus formulários, esquemas ou roteiros próprios para apresentação de orçamentos. Mas numa fase de apresentação de propostas ou discussão inicial, você talvez tenha que apresentar seu orçamento a seu modo. Mas, de maneira geral, as atenções para os orçamentos estão voltadas para os seguintes aspectos: A porção do orçamento solicitada ao doador;

As fontes de onde virão os outros recursos (governamentais, associados, outras financiadoras etc.); Como a organização levará o projeto adiante se não obtiver tudo que pretende;

A parcela representada pelo orçamento do projeto no contexto do orçamento global da organização; Comparações, não detalhadas, de três anos quando se trata de projetos em andamento (ano passado, este ano, ano que vem); Os salários dos funcionários principais e o tempo que eles dedicarão ao projeto;

Os valores de contrapartida da organização ou comunidade e como evoluirão no tempo. Mas existem reservas quanto a contrapartidas orçadas em espécie, tais como trabalho voluntário, tempo de reunião etc., que elevam de maneira irreal o custo total do projeto; Orçamentos bem estruturados, que indicam a natureza das despesas e sua evolução no período. Orçamentos muito detalhados são considerados inadequados, devendo ser usados apenas para gerenciamento interno da organização. Detalhes e explicações devem ser dadas em notas de rodapé.

Qual é considerado o tamanho ideal de uma proposta?
Embora cada doador tenha seus formulários e roteiros próprios, há uma grande tendência de valorizar propostas iniciais que tenham, no máximo, entre 3 e 8 páginas, com no máximo um ou dois anexos que sirvam para aumentar a compreensão de algum aspecto da proposta ou da organização. Informações detalhadas demais, que não foram solicitadas, ou pré propostas de 30 páginas, tendem a ser avaliadas por último. Os doadores alegam que, neste estágio inicial, uma organização deve colocar a essência do que está propondo. As informações adicionais são geralmente requeridas através dos formulários ou a partir do desenvolvimento do interesse pelo projeto.

A melhor forma de sua proposta chamar a atenção está no fato dela ser capaz de, assim como a carta inicial ou sumário executivo, apresentar claramente o problema e o modo como serão construídas as soluções, de modo direto, breve e sem jargões.

Qual a importância do layout na apresentação da proposta?
Os critérios fundamentais que elegem uma proposta com uma boa apresentação não estão ligados à capacidade de chamar a atenção pela sua forma, ao contrário do que muitas vezes se pensa. Pense nos profissionais que lerão sua proposta como pessoas que têm muitas outras propostas para analisar e que estão principalmente interessados nos conteúdos delas. A proposta não deve ser uma peça publicitária. O fundamental é que ela seja apresentada de modo a facilitar e agilizar o seu manuseio, a leitura e a compreensão do projeto. Para tanto, indica-se que uma proposta:

- Apresente o pensamento escrito de maneira lógica, levando o leitor progressivamente a compreender a natureza e as características da execução do projeto;

- Tenha tipos e tamanhos de letra que tornem a leitura fácil;

Seja grampeada, pois torna-se mais fácil desmontá-la e arquivá-la. Capas duras, espiral e pastas de plásticos com folhas soltas não são indicadas;

- Contenha poucos materiais anexos, apenas os que realmente acrescentarem informações relevantes para a compreensão de seu projeto e que não exijam tempo ou esforço demasiado para serem vistos. Recortes de jornal, brochuras ou cartilhas, vídeos, gráficos e dados estatísticos têm valor limitado e muito provavelmente não são objeto de atenção, a não ser que sejam claramente muito importantes. - Além da experiência do autor, o texto se baseia também em um conjunto de opiniões de representantes de fundações americanas, contidas no livro Guide to proposal writing, de Jane C. Geever & Patricia McNeill, The Foundation Center, NY, 1993.

- Além da experiência do autor, o texto se baseia também em um conjunto de opiniões de representantes de fundações americanas, contidas no livro Guide to proposal writing, de Jane C. Geever & Patricia McNeill, The Foundation Center, NY, 1993.

Leandro Lamas Valarelli
Educador, consultor em planejamento e desenvolvimento institucional de organizações e projetos na área socioambiental. O presente artigo foi publicado no site do Rits ( Rede de informações do Terceiro setor), do qual o autor é leandro@rits.org.br
Revista Eletrônica Integração - Edição nº 89 - Outubro de 2008


Um comentário:

Lorena Sandes disse...

Claudia,

mais uma vez meus agradecimentos pelas matérias postadas no blog. É incrível o nivel de atualização e a qualidade dos textos.
Vou dar o meu primeiro curso sobre elaboração de projetos, e apesar da experiência, não estava sabendo como condensar os assuntos em tres horas de palestra. Vc simplesmente tirou uma preocupação da minha cabeça, pois , peço licença , vou utilizar a postagem como roteiro.

Posso postá-la no meu blog? com as devidas referências, é claro.

Parabens pelo trabalho.

Lorena Sandes
www.terceirosetorpi.blogspot.com



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