sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Livro: 80 heróis que estão mudando o mundo

Cada geração escolhe os seus heróis corporativos conforme os valores de seu tempo. Quem tem mais de 30 anos, certamente vai se lembrar dos yuppies, jovens executivos de Wall Street transformados em ícones profissionais dos anos 1980, filhos dos tempos dos governos Ronald Reagan (EUA) e Margareth Tatcher (Inglaterra). Em oposição aos libertários hippies dos anos 1960, os yuppies resgataram os valores tradicionais e conservadores, promovendo uma adoração dos bens materiais da moda. Auto-centrados, ambiciosos por natureza e determinados a acumular muito cedo o primeiro milhão de dólares, eles foram incensados pela mídia e eleitos por uma legião de jovens como símbolo de um capitalismo egocêntrico e sem culpas.

Nesses tempos de sustentabilidade, outros heróis começam a ganhar espaço. Se os valores dos anos 1980 e 1990, no auge do culto ao individualismo, criaram ambiente propício para premiar empreendedores competentes e vaidosos, os da primeira década deste século parecem fadados a reconhecer os mais altruístas. E a plataforma para essa mudança está na crescente consciência de que o sistema econômico depende dos sistemas social e do ambiental, esgarçados em consequência da ampliação das desigualdades, do esgotamento dos recursos naturais e do aquecimento global.

O livro 80 Homens Para Mudar o Mundo (Clio Editora, 2009) representa uma espécie de libelo em favor dos heróis altruístas. O próprio nome da obra não deixa dúvida quanto à intenção de seus autores, Sylvain Darnil e Mathieu Le Roux. Jovens executivos franceses, bem nascidos e bem educados, eles pertencem à sexta parte rica da humanidade que consome 80% dos recursos mundiais e pode beber vinho da Borgonha num restaurante à margem esquerda do rio Sena, em Manhatan ou nos Jardins em São Paulo.

Livres e privilegiados pela sorte, filiam-se ao movimento em expansão dos que rejeitam estruturas organizacionais velhas, questionam os modelos empresariais baseados no bottom line e buscam sentido no trabalho para além do ganhar dinheiro em curto espaço de tempo. Como desejam se ocupar do mundo em que seus filhos vão nascer e viver, dedicam-se a descobrir e trabalhar em soluções inovadoras que possibilitem aos indivíduos, na condição de cidadãos, acionistas, consumidores ou empreendedores, fazer frente aos desafios sociais e ambientais mais importantes deste tempo. Não por acaso, preferem idolatrar Muhamad Yunus, o banqueiro dos pobres, a Warren Bufett, o megainvestidor dos riscos. Mas que ninguém se engane sobre o espírito pragmático que os define: são idealistas sim, mas valorizam soluções viáveis, concretas e mensuráveis.

Para selecionar os “homens que estão mudando o mundo”, os autores viajaram 440 dias, visitaram 38 países em quatro continentes, pesquisaram 113 iniciativas, entrevistaram em oito idiomas e escreveram 80 casos. No livro, são detalhados 32 perfis, entre os quais os de famosos como Yunus, do Grameen Bank, Bill Drayton, criador da Ashoka , organização especializada em empreendedores sociais, e Ray Anderson, o presidente verde da InterfaceFloor. Mas também há espaço para alguns menos conhecidos como o americano Oliver Peoples, da Metabolix, disseminador do bioplástico, o chinês Alen Chan, da Sino Forest, um defensor da ideia do reflorestamento como negócio e o sueco Jan Peter Bergvist, um hoteleiro ecológico.

Do Brasil, os autores entrevistaram Jaime Lerner (definido como o acupuntor urbano), Fábio Rosa, expert em energia sustentável da Ideaas e Rodrigo Baggio, da CDI, um especialista em cidadania digital. Sobre o nosso País, uma informação importante: a ideia do livro começou a tomar forma aqui, a partir do encontro entre Darnill e Le Roux, numa prosaica churrascaria paulistana, em outubro de 2001.

De tão leve e agradável, este é um livro que pode ser lido de uma vez só, ao longo de uma viagem de avião, ou aos poucos, história a história, como se fossem pequenas biografias dedicadas à construção de um mudo melhor e mais sustentável. Que não se procure na obra nenhum tipo de rigor técnico ou aprofundamento das experiências relatadas –há inclusive um erro grosseiro na página 18 quando os atores atribuem o relatório Nosso Futuro Comum, da senhora Gro Bruntland, ao “primeiro-ministro norueguês.” É válida a intenção de ser uma obra de “modelos que consigam dar esperança para lutar contra a sinistrose hoje existente.” Ao privilegiar as soluções possíveis, em vez de ressaltar os problemas, botando o dedo no nariz de um leitor acuado, os autores substituíram uma certa tendência francesa ao mero debate de ideias por um convite a botar a mão na massa da mudança.


Ricardo Voltolini
Publisher da revista Ideia Socioambiental e diretor da consultoria Ideia Sustentável: Estratégia e Inteligência em Sustentabilidade, ricardo@ideiasustentavel.com.br
Envolverde, 11/08/09


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