domingo, 22 de julho de 2007

Conquistas do Terceiro Setor

Luiz Carlos Merege*
Editorial da Revista IntegrAção de julho/07


Decorridos treze anos desde a publicação do já clássico “O Setor Emergente” (1994) de Lester Salamon as conquistas do terceiro setor podem ser consideradas admiráveis, considerando este curto espaço de tempo.

Vejamos algumas dessas conquistas:

Identidade: A grande batalha travada nos anos noventa foi à criação da identidade do setor. Assim como uma pessoa necessita de um documento que indique a sua nacionalidade e suas principais características, não tínhamos até o inicio dos anos 90 um conceito que distinguia o setor dos demais setores. Foi necessário um grande esforço conceitual para demonstrar que as organizações da sociedade civil possuíam características distintas das organizações estatais e das privadas. Substituir o paradigma de uma sociedade bi-setorial por um novo modelo tri-setorial foi uma tarefa executada principalmente por uma rede de pesquisadores da Europa, Estados Unidos e América Latina. Essa nova estruturação da sociedade passou a ser o referencial que orientou as pesquisas posteriores que passaram a estudar os problemas da sociedade contemporânea e as suas soluções partindo da possibilidade de uma sinergia inter-setorial. Desde então não se fala em política pública como uma atribuição exclusivamente do Estado, assim como não se concebe o setor privado tendo como único objetivo à geração de lucro.

Conhecimento: No Brasil não tínhamos praticamente nenhuma publicação específica sobre o terceiro setor até meados da década passada. Além da importantíssima publicação de Rubem César Fernandes, “Público porém privado: o terceiro setor na América Latina” de 1994 registrava-se as publicações do Instituto de Estudos da Religião – ISER em que apareciam o nome deste pesquisador e o de Leilah Landim. A partir da criação de centros de estudos do terceiro setor nas universidades os artigos acadêmicos assim como as dissertações e teses versando sobre o tema cresceram acentuadamente. Pesquisa recente na base de currículos Lattes indicava a existência de pelo menos dois mil pesquisadores trabalhando a temática do terceiro setor. Atualmente a bibliografia referente ao tema apresenta uma grande diversidade de assuntos abordados que cobrem os mais distintos campos do conhecimento. Pode-se facilmente listar cerca de 100 livros de autores nacionais que se constituem como principal referência bibliográfica existente hoje.

Reconhecimento: Apesar do grande volume de publicações que se acumulou em todo o mundo faltava ainda o reconhecimento oficial do setor por parte de autoridades internacionais que desse legitimidade ao novo modelo de estruturação da sociedade. Este reconhecimento finalmente chegou em março de 2002 quando o Departamento de Estatística da ONU publicou o “Handbook on Nonprofit Institutions in the System of National Accounts”. Este manual convoca as agências nacionais de estatística para que modifiquem o sistema de levantamento de informações econômicas e sociais que são realizadas tendo como referência a metodologia de Contas Nacionais que foi instituída pela ONU em 1948. Para nossa alegria o IBGE adotou o manual como uma referência para publicar as primeiras estatísticas oficiais sobre o setor no Brasil, o que foi feito por meio do documento intitulado “As fundações Privadas e as Associações sem Fins Lucrativos no Brasil.” Com essa publicação o nosso País se insere no grupo de outros 12 países que adotaram a nova metodologia e que seguem uma definição comum no que diz respeito ao conjunto de organizações que compõem o terceiro setor, assim como adotam uma mesma classificação das suas áreas de atuação. É claro que o manual da ONU deixa em aberto a discussão sobre a precisão do conceito de terceiro setor, instigando o debate sobre a natureza e papel do setor nas distintas realidades sociais. Entretanto, o referencial metodológico comum que se estabeleceu permitirá que os países, estados e municípios possam, brevemente, realizar estudos comparativos identificando similaridades e características peculiares do setor em cada realidade.

Neste editorial chamo a atenção para estas três conquistas fundamentais que contribuíram para o reconhecimento da existência e importância do setor. Voltarei ao tema para realçar outras importantes conquistas assim como comentar sobre a necessidade de construção de uma agenda que transforme o setor em um ativo protagonista estratégico para a solução dos graves problemas sociais em nosso País.


* Luiz Carlos Merege é professor titular, doutor pela Maxwell School of Citizenship and Public Affairs da Universidade de Syracuse, coordenador do Centro de Estudos do Terceiro Setor - CETS da FGV-EAESP, do curso de Administração para Organizações do Terceiro Setor e do Projeto Censo do Terceiro Setor do Pará . E-mail: merege@fgvsp.br


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