terça-feira, 19 de junho de 2007

Indústria do Brasil encolhe frente a emergentes

Sergio Lamucci
Publicado pelo Valor Online em 19/06/07

A produção da indústria manufatureira do Brasil perde cada vez mais importância no mundo emergente. A comparação do desempenho brasileiro com o de países como China, Índia, Coréia do Sul, Malásia e Tailândia mostra uma expressiva falta de dinamismo, como deixam claro os números elaborados pelo professor chileno Gabriel Palma, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido.

Até 1980, segundo Palma, a produção manufatureira no Brasil equivalia à soma de China e Índia, quadro que mudou profundamente em 25 anos: em 2005, a fabricação brasileira de manufaturados correspondia a apenas um oitavo da produção conjunta desses dois países.
O resultado também é bastante desanimador quando comparado com o de tigres asiáticos como Coréia do Sul, Malásia e Tailândia. Se nos anos 70 a produção do Brasil era equivalente a três vezes a registrada por esses três países, em 2005 estava reduzida a um terço da soma da produção coreana, malaia e tailandesa, nota Palma.

Para ele, a perda de terreno do Brasil entre os emergentes na produção manufatureira se deve a um conjunto de políticas equivocadas adotadas nos últimos anos. De um lado, a combinação de juros elevados, câmbio sobrevalorizado e redução drástica dos investimentos públicos em infra-estrutura. De outro, a falta de uma política industrial, comercial e tecnológica desenhadas para a fabricação de produtos de maior valor agregado. Em resumo, o oposto da receita usada pelo países asiáticos. "Na América Latina, especialmente no Brasil, as reformas se fizeram por motivos ideológicos, sem nenhum grau de pragmatismo", afirma Palma. "Na Ásia, as reformas econômicas foram feitas para acelerar o crescimento."

O professor Paulo Gala, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), concorda com Palma, e diz que o problema tem dois vetores, um de curto e um de longo prazo. O primeiro é a combinação de juro alto e dólar barato e o segundo é a falta de políticas de governo voltadas para o desenvolvimento tecnológico, que levem ao aumento da inovação e da produtividade.

Para Palma, o processo que o Brasil passa é o de uma desindustrialização prematura. "Isso é bastante ruim, porque a indústria é motor mais eficiente para o crescimento de um país com renda média como o Brasil." Há uma perda de empregos no setor industrial, que tem produtividade maior do que o agropecuário e o de serviços, diz ele.

Palma usou números do Banco Mundial, que mostram o crescimento real da indústria manufatureira, medido em dólares constantes de 2000. Segundo ele, de 1980 a 2005, a indústria manufatureira no Brasil cresceu a um ritmo anual de apenas 0,7%. Nesse período, a da China avançou 10,9%, a da Índia, 6,7%, a da Coréia do Sul, 9,3%, a da Malásia, 8,8% e da Tailândia, 8,2%.

O economista chileno diz que um fator fundamental para reverter esse processo é o Brasil definir qual será o nicho da indústria manufatureira que o país pretende manter no mundo globalizado. "A China quer ser a fábrica do mundo, a Índia quer ser o escritório do mundo (com a produção de softwares), mas o que quer o Brasil?"

Para Palma, o Brasil deveria investir no nicho de processamento de produtos primários, agregando valor a eles. Não faz sentido, segundo ele, o Brasil exportar mais de 50% do ferro consumido no mundo, mas apenas 2% do aço. O ideal seria vender cada vez mais aço e menos ferro.

"O Brasil deveria colocar muita ênfase numa política industrial, comercial e tecnológica para aumentar o valor agregado das commodities que exporta", diz, apontando o caso dos países nórdicos como um modelo interessante. Além de agregar valor a produtos primários, países como a Finlândia também investiram na produção de insumos utilizados nesse processo para aumentar a industrialização do país. É um processo de adensamento das cadeias produtivas ligadas às commodities.

"Não acredito na maldição dos recursos naturais. Não há nada mal na produção de produtos primários. Eles podem ser uma bênção se forem usados como base para a industrialização", afirma ele. "Foi o que fizeram os nórdicos e também países como a Malásia."
Para Gala, essa tendência de perda de terreno da indústria de transformação é reversível, desde que se altere a combinação de juros altos e câmbio valorizado e também se passe a dar prioridade a políticas de desenvolvimento tecnológico, um receituário bastante semelhante ao proposto por Palma.

O economista chileno insiste na importância de um país como o Brasil dar ênfase à produção manufatureira. Exportar apenas produtos primários, como alguns economistas acreditam ser a vocação do Brasil, é uma estratégia que vai ter custos significativos em termos de crescimento e emprego.

"Qualquer pessoa que conhece a história econômica sabe que as commodities passam por ciclos em que seus preços sobem e descem. Pensar que eles vão se manter nos níveis atuais é um erro muito grande", afirma Palma, para quem vantagens comparativas podem ser construídas. "Elas podem se basear em ativos adquiridos e não apenas herdados, como o investimento para gerar novas capacidades tecnológicas e de inovação, a geração de capital humano de alta especialização e de redes de comercialização, assim como o investimento em capital social e institucional."


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