quarta-feira, 27 de junho de 2007

The Guardian aponta falhas do mercado de compensação de emissões

Paula Scheidt, do CarbonoBrasil
Publicado pela Envolverde em 25/06/07


Uma investigação realizada recentemente pelo jornal britânico The Guardian alerta para as falhas em esquemas de neutralização de emissões de gases do efeito estufa, algo que pode afugentar grandes empresas deste tipo de negociação.

A reportagem flagra diversas falhas em projetos chamados de compensação de emissões de dióxido de carbono (CO2).

Um dos exemplos é da empresa Equiclimate, recomendada pelo governo britânico, que têm vendido milhares de toneladas de compensações sem nenhum valor ambiental ou financeiro, através da compra de permissões que foram depois também distribuídas pela comissão européia. As pessoas acreditavam que estavam neutralizando as emissões ao se cadastrarem no esquema Calor Gas. No entanto, o fato triste é que ele se baseava em 5 mil toneladas de permissões européias que foram compradas da Equiclimate, quando a maior parte delas já não valia nada. “Nós escolhemos eles por recomendação do governo”, disse um executivo da Calor Gas.

O próprio governo foi flagrado pelo jornal, segundo o qual supostas neutralizações da presidência do G8 em 2005 não passaram de uma notícia fria. A então secretária do meio ambiente, Margaret Beckett, havia dito que as emissões de CO2 de todas as reuniões e viagens ligadas à presidência naquele ano seriam neutralizadas.

Delegados participantes do encontro de Gleneagle em julho de 2005 receberam inclusive certificados declarando que as emissões haviam sido compensadas. Porém isso nunca aconteceu.

O plano era gastar 150 mil libras em Kuyasa, um subúrbio de Cape Town na Africa do Sul, reequipando cabanas com telhados selados, painéis solares para a geração de eletricidade e lâmpadas longa vida. O projeto, que deveria cortar emissões e ajudar pessoas necessitadas, acabou travado por processos burocráticos. A líder do mesmo, Shirene Rosenberg, disse que ainda está lutando para mantê-lo vivo sem uma data de início no horizonte.

A tensão entre a demanda do planeta e o comércio imperativo se sobrepõe no coração da resposta global para as mudanças climáticas e, em particular, na neutralização de carbono. A idéia de cancelar as emissões de gases do efeito estufa através do pagamento de reduções realizadas em outro lugar nasceu junto com as primeiras políticas climáticas. O conceito, adotado por lobistas corporativos na reunião de Kyoto de 1997, tem se desenvolvido como um desengonçado e problemático adolescente – confuso, imprevisível e difícil de confiar.

A preocupação demonstrada pelo jornal britânico foca-se no mercado voluntário, onde companhias aéreas, energéticas, bancos e fabricantes de automóveis que ainda não são obrigadas a reduzir as emissões de acordo com Kyoto fazem fila para neutralizar as emissões e encorajar os clientes para fazerem o mesmo.

Um problema de cara duplaEste problema tem duas faces, afirma o The Guardian. A primeira delas é que os esquemas voluntários não são regulamentados e estão facilmente abertos a fraudes. Não existe nada senão a astúcia do cliente para impedir uma empresa de aclamar que participa de um esquema que não existe, de declarar cortes drásticos de emissões, de vender neutralizações que já foram vendidas ou de cobrar preços altamente inflacionados.

A segunda questão é que, como nos exemplos, mesmo o mais bem intencionados sofrem com as fraquezas básicas na idéia de compensação de emissões – uma idéia vinda de políticos e empresários (não ambientalistas e cientistas) que tentam atender a demanda por ação através da preservação do status comercial. Isto falha em pelo menos três pontos essenciais.Primeiro isto requer uma medida apurada das emissões que serão compensadas, o que se descobre ser uma charada de incertezas. O Painel Intergovernamental de Mudanças do Clima (IPCC) encontrou uma margem de erro de 10% para medir as emissões da produção de cimento e fertilizantes, 60% nas indústrias petroleiras, de gás e carvão, e 100% em alguns processos industriais.

Medir as emissões de aeronaves é acompanhado de desentendimentos sobre o que exatamente deveria ser medido e agravado por variações como a altura do vôo, a capacidade de carga e as condições climáticas. Quando a Universidade Tufts, no Maine (EUA), analisou sites de compensações, descobriu que as emissões vindas de vôos entre Boston e Frankfurt eram calculadas em alguma coisa entre 1,43 a 4,14 toneladas.

Captura de CO2 pelas árvores é dificil de mensurarA medida de quanto de CO2 será salva em qualquer outro lugar também precisa ser exata. A maior parte dos projetos iniciais de compensação envolvia a plantação de árvores, que naturalmente absorvem carbono em um complexo e imprevisível processo que impede medidas precisas. Projetos focados na eficiência energética são ainda mais traiçoeiros.

Outra empresa recomendada pelo governo britânico, a Carbon Offsets Ltda, vende compensações de um projeto na África do Sul conhecido como Basa Magogo. Este encoraja proprietários de casas que fazem fogo com carvão em perfurar latas chamadas imbuwalas e fazer fogo de uma maneira diferente. Ao invés de usar o papel, depois a madeira e o carvão no topo, eles fariam com mais carvão na base, o que produziria mais calor e menos fumaça.

Mas como alguém checa quantos constroem desta maneira? E quantos imbuwalas devem queimar desta maneira e por quanto tempo para salvar uma toneladas de CO2? Um dos fundadores da Carbon Offsets, Hugh Somerville, que segundo o jornal claramente se esforça para oferecer um serviço decente, confessa que ninguém havia feito esta pergunta antes.

Finalmente, a idéia de compensação se baseia no que é chamado adicionalidade – uma evidência de que a redução de emissões não aconteceria naturalmente ou na vida comercial da região. A Climate Care, outra gigante do Reino Unido neste mercado, distribuiu 10 mil lâmpadas eficientes energeticamente em uma cidade da África do Sul, oferecendo reduções de CO2 como compensação. Porém logo após isso, descobriu que a companhia energética estava distribuindo a mesma lâmpada de graça para a grande massa de clientes, incluindo a cidade onde haviam promovido a ação. OU seja, mesmo sem a intervenção da Climate Care a redução já seria realizada, o que destrói o projeto.

O resultado desses problemas fundamentais é uma crise de legitimidade no mercado voluntário, uma vez que as empresas que oferecem o serviço de compensação afirmam ter certezas que estão fora do seu alcance. Dan Welch, um jornalista de Manchester que investiga estas companhias para a revista Ethical Consumer, resumiu assim: “compensação é uma commodity imaginária criada a partir da dedução de que você espera que vai acontecer, em cima daquilo que você acredita que poderia acontecer.”

Faltam padrões e verificações
Se a indústria de compensação de emissões não estabelecer um padrão no qual os clientes possam confiar, as empresas mais poderosas do mercado irão fugir dos créditos de carbono com o aumento das evidências de que alguns esquemas têm um valor duvidoso, segundo o chefe-executivo da CarbonNeutral, Jonathan Shopley.

Muitos ambientalistas estão cada vez mais se opondo a compensação porque temem que as empresas optem por esquemas de troca baratos e ineficientes ao invés de cortar suas próprias emissões de CO2.

“Existe credibilidade, mas os ‘cowboys’ estão por aí. Isto é o provável que se espera de uma indústria neste estágio de desenvolvimento, porém nós precisamos de padrões e verificação externa para que esta auto-regulamentação crie um mercado íntegro”, disse Shopley. A CarbonNeutral é uma das maiores empresas de compensação de emissões do Reino Unido e, segundo o chefe-executivo já estabelece padrões e verificações.CarbonoBrasil com informações do The Guardian

Leia a matéria na íntegra na nossa versão em inglês do CarbonoBrasil


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