segunda-feira, 11 de junho de 2007

Ensino baseado no trabalho, uma alternativa viável

Carmen Maia
Publicado pelo Valor Online em 11/06/07


Recentemente, o primeiro ministro britânico, Tony Blair disse que grandes empresas como Tesco, Asda, Sainsbury, entre outras, poderiam conceder certificação acadêmica com seus cursos "in house". Essa decisão causou um verdadeiro rebuliço na área de ensino superior do Reino Unido, onde as tradicionais universidades se mostraram totalmente "decepcionadas", para não dizer outra coisa, com a posição ministerial.
A justificativa para essa decisão não deixa dúvidas: "Existe uma necessidade de personalização e customização nos cursos de formação profissional, em várias áreas, que as universidades tradicionais não conseguem suprir. Nada mais natural que as empresas invistam nessa qualificação e sejam reconhecidas e acreditadas por esse valoroso trabalho", disse o primeiro-ministro.

O CEO do QCA (Qualifications and Curriculum Authority) do Reino Unido, Ken Boston reforçou a decisão dizendo que "era preciso encontrar novas formas de reconhecer e acreditar os cursos de treinamento oferecidos pelas grandes empresas, pois eles são de grande valia para seus funcionários e podem servir para a qualificação em áreas vocacionais ou técnicas".

O que eles, Tony Blair e Ken Boston, não sabiam, até então, era que os cursos que estão sendo oferecidos por essas empresas a seus funcionários já passaram pelo selo de qualidade do City & Guilds, líder no desenvolvimento de cursos vocacionais no Reino Unido. Há muito tempo os cursos oferecidos por grandes empresas britânicas como British Airways, Tesco, HSBC, London Underground já são desenhados com o auxílio desse órgão e certificados por ele.

A certificação do governo nada mais é do que o reconhecimento do ótimo trabalho que já vem sendo feito nessa área. É uma forma de acabar com o preconceito e a hipocrisia de que é preciso ter uma formação acadêmica para se obter uma qualificação. A vida tem mostrado que isso não é verdade.

O Reino Unido foi um dos primeiros países a implementar há pelo menos 20 anos o conceito de "work-based learning" (aprendizado baseado no trabalho). Uma alternativa de aprendizagem para estudantes "maduros", que já estão no mercado de trabalho, mas ainda não possuem curso superior. Sabemos que a experiência e o dia-a-dia no trabalho são tão importantes no aprendizado quanto a teoria oferecida em sala de aula. Paulo Freire já dizia que é preciso trabalhar a realidade cotidiana do estudante para se obter uma efetiva aprendizagem. A fundamentação teórica é complementar à prática.

Diversos cursos na Inglaterra são desenvolvidos no ambiente de trabalho com a supervisão das universidades. Os mentores são os próprios colegas de empresa, que complementam a aprendizagem. O dia-a-dia do trabalho serve como base curricular. Os programas são desenhados em conjunto com o aluno/trabalhador em função do que ele faz: "work is the curriculum" (trabalho é o currículo). Essa é a palavra-chave, e o mais interessante nesse processo, é que a universidade não é excluída. Ela é participante ativa e interessada nesse desenvolvimento.

Os cursos, apesar de quase personalizados, são oferecidos pelas universidades que colocam seus professores para acompanhar o trabalho desenvolvido pelo aluno. É o aprender fazendo e pensando a respeito do que está sendo feito. Tudo o que todas as teorias da aprendizagem preconizavam há mais de 50 anos e as universidades teimavam em ignorar. A demanda por esse tipo de curso tem sido crescente. Não apenas por parte dos alunos, mas das universidades que estão oferecendo essa metodologia.
Há três anos, apenas 10 instituições de ensino em todo o Reino Unido ofereciam "work-based learning", como a Middlesex University, University of Derby, University of Chester, University of Bristol, University of Westminster, entre outras. Hoje, a maioria das universidades já inclui em seu catálogo essa modalidade.

Nesse modelo, todos ganham: estudantes, professores, universidade e empresa, além é claro, do próprio país que pode se orgulhar em ter mais da metade de sua população adulta trabalhadora com curso superior atuando na sua respectiva área de trabalho.

Primeiro mundo é assim. Educação vem sempre em primeiro lugar e não faltam oportunidades e alternativas para quem quer e precisa aprender. Um bom modelo se pensar em oferecer e implementar nas instituições de ensino brasileiras.


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