terça-feira, 15 de maio de 2007

Hospitais e operadoras buscam cura pelo ganho de escala e eficiência


Publicado No Valor Online em 15/05/2007

Graziella Valenti e Roberta Campassi


Melhor prevenir do que remediar. A velha máxima difundida pelas avós de todos nós só agora começa a ser utilizada na administração do setor de saúde. Essa lógica é o norte das mudanças que estão se processando no funcionamento desse segmento. O setor começa a caminhar para um futuro em que os hospitais poderão ser organizações de saúde e não mais simples locais para tratamento de doentes.


"Vivemos um ponto de inflexão no setor privado. Entramos num caminho sem volta para nos tornarmos igual aos outros setores econômicos", resume o presidente da rede de hospitais São Luiz, André Staffa Filho. A cadeia de serviços iniciou a profissionalização de sua gestão há pouco tempo e agora deve inserir a lógica econômica em sua rotina, incluindo a aplicação de conceitos de boa governança corporativa, com aumento da transparência e o desenvolvimento de métricas de eficiência.


O foco em prevenção é o resultado esperado de toda essa movimentação. Porém, ainda há um longo tratamento a ser aplicado até lá. Os desafios não são pequenos para os profissionais que assumiram a administração do setor e têm a tarefa de tratar das mazelas que prejudicam a saúde das empresas. Os hospitais privados movimentam R$ 24 bilhões anualmente, de acordo com dados da consultoria especializada Primeira Consulta. As seguradoras, por sua vez, giram R$ 20 bilhões.


O quadro clínico a ser tratado é preocupante. De um lado, um incurável crescimento de custos, puxado por vultosos investimentos em pesquisa, constante atualização tecnológica e lançamento de drogas cada vez mais avançadas e caras. Do outro, a limitada renda do brasileiro, que o impede de acompanhar a necessidade de remuneração dessa cadeia.


O equilíbrio do setor pressupõe uma combinação de remédios, até agora aplicados em doses homeopática. A prescrição para esse caso contém ganho de escala, aumento da eficiência e simplificação dos processos. Trata-se de um caminho já trilhado por boa parte dos setores e que deve ser perseguido com mais afinco na saúde a partir de agora.


O espaço para consolidação fica evidente ao se examinar os números desse setor.No Brasil, há inúmeros hospitais, operadoras, distribuidoras de remédios e laboratórios, mas grande parte têm tamanho bastante reduzido.


Fernando Barreto, sócio da Primeira Consulta, afirma que, no caso dos hospitais, o ganho de escala se dará pelo surgimento de redes, em substituição ao modelo atual, de unidades individuais. "As redes são essenciais para alavancar sinergias e reduzir gastos", diz Barreto. "No Brasil, elas praticamente não existem, mas nos Estados Unidos há grupos com 300 hospitais."
José Antônio de Lima, presidente da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), acredita que a formação de redes deverá ser facilitada pelo aumento da profissionalização do setor, já que empresas maiores exigem mais preparo administrativo.


A escala é fundamental para que os elevados custos dos hospitais sejam reduzidos e, com isso, o dos convênios, oferecidos pelas operadoras de saúde. Ao diminuir os preços, as empresas poderão alcançar também clientes na baixa renda - hoje impossibilitada de acessar planos privados, devido ao alto custo.


O já reduzido atendimento da população pela rede privada ficou ainda mais espremido com a lei dos planos de saúde, de 1998. No pacotes para pessoas físicas, o governo limitou o reajuste a ser aplicado sobre as mensalidades e definiu um conjunto de coberturas obrigatórias para as operadoras.


Preocupadas em administrar um serviço tão complexo e caro, as companhias tendem a selecionar sua rede de hospitais credenciados atentas aos custos e à rentabilidade. Tal situação gera um cenário de competição crescente, dado o aumento da pressão para que os hospitais diminuam os preços.


O grupo paulista São Luiz é, entre os hospitais de ponta, aquele que possui um dos projetos mais alinhados com as tendências. Staffa já havia divulgado o interesse de constituir uma rede paulista. À frente da gestão desde 2006, em substituição aos herdeiros das famílias fundadoras Vasone e Marco Antônio, fala agora de planos mais ambiciosos para o longo prazo e admite a possibilidade de tornar o São Luiz uma cadeia nacional.


O grupo já soma 500 leitos com duas unidades na cidade de São Paulo - uma na Vila Olímpia e outra no Morumbi. A terceira será inaugurada em breve no bairro Anália Franco. O projeto prevê ainda outros dois hospitais até 2008. Para os cinco anos seguintes, estão programadas mais cinco novas unidades - sempre na capital paulista. O investimento total necessário é da ordem de R$ 500 milhões. Em 2006, o faturamento consolidado alcançou R$ 432 milhões.
A expansão pode trazer vantagens competitivas relevantes aos hospitais. Quanto maior for a empresa, mais poder de barganha haverá para compra de equipamentos, materiais e medicamentos. A mesma lógica serve para distribuidoras de produtos farmacêuticos e laboratórios. No caso das operadoras, o maior número de beneficiários dilui o risco de casos em que as despesas são muito altas.


O surgimento das redes hospitalares no país deverá passar por fusões e aquisições - também como resposta à consolidação que deve ocorrer entre os outros segmentos da cadeia de saúde. Como nos demais setores da economia, a construção de uma unidade nova tenderá a ser mais cara, na comparação com a compra de instalações prontas. Staffa, do São Luiz, estima que o retorno de um empreendimento em saúde leve cerca de oito anos.


No Brasil, a formação de uma cadeia com larga escala enfrenta ainda mais outro desafio. Nomes relevantes no atendimento em saúde, como Hospital Albert Einstein, Sírio-Libanês e Oswaldo Cruz , são entidades filantrópicas e não têm interesse em criar redes. Cerca de 40% dos hospitais nacionais não possuem fins lucrativos. Nessas instituições, a redução ou o simples controle dos preços cobrados passa, necessariamente, pelo aumento da eficiência, uma vez que o ganho de escala será limitado.


Para o superintendente corporativo do Sírio-Libanês, Maurício Ceschin, o ganho de competitividade é simples. "Barato em saúde é fazer bem feito e uma vez só. O resto é caro." Ciente disso, o executivo foca os esforços em transparência.


Ceschin contou que o hospital quer criar e divulgar indicadores de eficiência junto com o desempenho financeiro deste ano. Além disso, programa publicar um encarte organizado com os balanços operacional e social. A expectativa é que, ao mostrar e provar sua eficácia, conseguirá atrair um número maior de atendimentos e, com isso, ampliar a arrecadação.
Sergio Lopez Bento, superintendente de operações do Samaritano, explica que a gestão profissional permitirá a criação de parcerias no uso de equipamentos caros entre hospitais próximos. Dessa forma, o custo dos aparelhos seria dividido e seu uso maximizado.
Existem ainda as questões culturais a serem trabalhadas e que devem fazer parte de um novo modelo de negócios para o setor. O nível de conforto oferecido é uma delas. Apesar dos preconceitos que existem, os hospitais deverão ter menos quartos individuais e mais coletivos. Porém, a solução mais efetiva no controle de custos será, de fato, a prevenção. As pessoas poderiam adotar comportamentos e um estilo de vida mais saudável, além de uma rotina organizada de diagnósticos, que diminua a dependência do hospital.


Ganhar dinheiro com prevenção significa para os hospitais romper um paradigma. "É preciso mudar a lógica. Os hospitais precisam parar de encarar o indivíduo como um doente", enfatiza Ceschin, do Sírio. Ele mostra em números porque evitar as doenças: 20% das patologias respondem por 80% dos custos.


Somente problemas pulmonares, cardiovasculares, metabólicos (como diabete), oncológicos e ostioarticulares respondem por 70% dos gastos de um hospital. "Ao focarmos na prevenção desses casos, será possível obter alta economia de custos", destaca o executivo.


A maior atenção na prevenção levará os hospitais a ampliar a atuação, acredita Staffa, do São Luiz. As unidades hoje de atendimento deverão tornar-se organizações completas de saúde. A idéia é que os indivíduos sejam atendidos no conjunto de suas necessidades, para que se evite duplicação de consultas e exames. O setor deve simplificar a estrutura e permitir que num único lugar seja possível acessar diversas modalidades médicas, o que tornaria o diagnóstico mais rápido e eficiente.


A transformação dos hospitais promoverá a redução dos desperdícios. A economia com um atendimento correto, mais uma vez, tende a reduzir o custo do atendimento e, conseqüentemente, dos planos oferecidos à população.


Nenhum comentário:



Acesse esta Agenda

Clicando no botão ao lado você pode se inscrever nesta Agenda e receber as novidades em seu email:
BlogBlogs.Com.Br