quinta-feira, 31 de maio de 2007

A forma de remuneração mais eficiente para o captador de recursos

Renata Brunetti
Publicado pela revista IntegrAção



Como professora de captação de recursos, sou constantemente questionada sobre a forma ideal de se remunerar o captador profissional. Parece que passa automaticamente pela cabeça das pessoas, a idéia de remuneração proporcional ao valor a ser captado.

A primeira pergunta que costumo fazer aos alunos dos cursos de especialização em mobilização de recursos é: como são remunerados os demais funcionários da instituição em que trabalham? Normalmente, a resposta é a esperada: um salário fixo, um valor determinado pelas horas trabalhadas e definido também pelo mercado de trabalho. Em seguida, pergunto: por que não remunerar o captador de recursos da mesma forma? A resposta que se segue é quase sempre: se estou precisando de um profissional para captar recursos para minha instituição é porque não tenho recursos! Como vou remunerá-lo, então?

Esses tipos de respostas parecem naturais e justas. Entretanto, tal forma de remuneração é proibida tanto nos Estados Unidos quanto na Europa. Por que o assunto é ainda tão polêmico aqui no Brasil?

Por termos hoje duas posturas antagônicas formalizadas. A primeira e mais antiga segue o determinado pela lei de incentivo à cultura – Lei nº 8.313, também conhecida como Lei Rouanet (1991) –, que autoriza disponibilizar um percentual do custo do projeto para a remuneração de um captador de recursos. Ou seja, a remuneração atrelada ao valor e ao sucesso imediato da captação. A outra postura é a definida pela ABCR (Associação Brasileira de Captação de Recursos), que, ao acompanhar as determinações internacionais, desautoriza que se remunere o profissional de forma comissionada, propondo outras alternativas.

A ABCR, fundada em 1999, pretende não só representar formalmente o captador, mas também profissionalizá-lo regulamentando suas atividades e garantindo uma ética em sua atuação.

A Lei Rouanet foi uma inovação no que diz respeito aos incentivos fiscais, uma vez que possibilita que empresas invistam diretamente em projetos culturais. Trata-se de uma idéia interessante e de grande impacto na área cultural brasileira, embora não se perceba ainda uma mudança significativa no comprometimento das empresas em continuarem investindo. Poderíamos nos perguntar se esse relacionamento estratégico – investimento versus dedução de imposto – garantiria um maior envolvimento entre as partes. Uma empresa que investe seus próprios recursos percebe logo as vantagens de ver sua marca associada a atividades culturais. Com boas experiências, poderá continuar a investir em cultura no país, mesmo que o incentivo fiscal venha a ser extinto. A percepção do setor é que se os incentivos deixarem de existir, provavelmente o valor investido também cairá.

No que diz respeito à remuneração dos captadores de recursos, a Lei deixa claro: "Nenhuma aplicação de recursos poderá ser feita por meio de qualquer tipo de intermediação. Todavia, a contratação de serviços necessários à elaboração de projetos para obtenção de doação, patrocínio ou investimento, bem como a captação de recursos ou a sua execução por pessoa jurídica de natureza cultural não configura intermediação”. Ela foi, porém, reformulada no decorrer dos anos. Na primeira versão, constava que deveria ser pago ao captador 10% sobre qualquer valor captado. Hoje, esse percentual foi revisto e se reduz proporcionalmente ao aumento do valor captado.

Já a ABCR segue as determinações internacionais que não autorizam uma remuneração vinculada ao valor captado. Essa proibição não se apóia em valores morais e, sim, em resultados práticos obtidos.

O que se aponta, entre outras coisas, é o enfraquecimento do argumento do captador no ato de captar, caso seu interesse pessoal fale mais alto do que a causa pela qual está lutando.

A ABCR fez modificações em seu código de ética no que diz respeito a remuneração do captador para ajustar as determinações internacionais – com seus argumentos importantes – à realidade das instituições brasileiras, quando apresentam a dificuldade real em financiar uma área de captação de recursos.

A primeira versão, o código de ética da ABCR previa: "Trabalhar em troca de remuneração pré-estipulada e não aceitar comissionamento – trabalhando por um salário ou honorários, e não em troca de comissão ou remuneração condicionada a resultados. Pode-se aceitar uma retribuição baseada em desempenho, por exemplo, em bônus, quando estes estejam de acordo com as práticas seguidas pelas próprias organizações. Não deve ser aceita retribuição baseada em porcentagem sobre os fundos filantrópicos obtidos".

Já a segunda versão sugere que: "o captador de recursos deve receber pelo seu trabalho apenas remuneração pré-estabelecida – não aceitando, sob nenhuma justificativa, o comissionamento baseado em resultados obtidos; e atuando em troca de um salário ou de honorários fixos definidos em contrato; eventual remuneração variável, a título de premiação por desempenho, poderá ser aceita em forma de bônus, desde que tal prática seja uma política de remuneração da organização para a qual trabalha e estenda-se a funcionários de diferentes áreas”.

Penso que, aos poucos, a captação de recursos motivada pela remuneração percentual, principalmente nos casos ligados a projetos de organizações sem fins lucrativos e de utilidade pública, deveria ser revista. Essa forma de remuneração ainda presente no Brasil deveria ser analisada, como ocorreu nos demais países, sob a ótica de eficiência de resultados.

Para colaborar com o esclarecimento dessa polêmica tão presente, seguem alguns argumentos que podem justificar a importância de não vincular a remuneração do captador de recursos ao valor do projeto. Tais argumentos foram desenvolvidos por uma escola norte-americana de captação de recursos – The Fund Raising School, Center of Philantropy, Indiana University.

1. A captação de recursos é um processo longo. Inicia-se com a preparação da instituição para tal. Antes de “sair” para captar recursos, a instituição precisa ter muita clareza de sua missão, seus objetivos e suas metas. Precisa conhecer também suas necessidades e priorizá-las. Enfim, será necessário dedicar algum tempo a um processo que envolve muitas pessoas e que não se capta nenhum recurso. Como remunerar o captador nessa fase? E os demais envolvidos, quanto devem receber por esse trabalho?

2. Mesmo no momento de negociação, o captador conta com a colaboração de outras pessoas. Normalmente, nessas horas, está acompanhado de um diretor e/ou um voluntário. Faria sentido “ratear” a comissão do captador? Quanto caberia do valor captado a cada uma dessas pessoas?

3. É sabido e comprovado que a ferramenta de maior sucesso em uma negociação de parceria é a “causa”. O que poderia acontecer se, no momento da negociação, o interesse pessoal do captador em sua remuneração transparecesse? Não estaríamos assim correndo o risco de ter os argumentos enfraquecidos e a transparência da relação comprometida?

Sugere-se, assim, que o captador tenha um ganho fixo, quer seja por hora, quer por projeto. Nunca vinculado ao valor captado.


Um comentário:

Anônimo disse...

Continuamos sem saber como remunerar o captador quando não se dispõe de recursos iniciais para pagar um salário fixo.



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