terça-feira, 18 de setembro de 2007

Fôlego do crescimento opõe economistas e ministro em debate

Sergio Lamucci
Publicado pelo
Valor Online em 18/09/07

Nakano, diretor da Escola de Economia da FGV: dúvidas quanto ao fôlego do atual ciclo de expansão ainda persistem
Foto Carol Carquejeiro/ Valor

Um país que já entrou na fase do crescimento sustentado, exibindo solidez nas contas externas, inflação sob controle e redução das desigualdades sociais e regionais. Esse é o retrato do Brasil apresentado ontem pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, que esbanjou otimismo no 4 Fórum de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de Sao Paulo, criticando o que considera "análises distorcidas" sobre os avanços recentes da economia brasileira. Já os outros participantes do evento - como Yoshiaki Nakano, Eliana Cardoso e Luiz Carlos Mendonça de Barros - disseram que de fato o país vive um momento positivo, com crescimento mais robusto, mas colocaram em xeque a idéia de que o ciclo atual é sustentado - sobraram críticas para a dupla juro alto e câmbio valorizado, assim como para a carga tributária elevada e a expansão firme dos gastos públicos.

Segundo Mantega, o governo Lula adota o modelo do social-desenvolvimentismo, marcado pelo "crescimento econômico mais vigoroso e mais equilibrado e pela redução das desigualdades sociais e regionais". O ministro lembrou que o Produto Interno Bruto (PIB) cresce há 22 trimestres consecutivos na comparação com o mesmo trimestre do ano anterior. "É um ciclo sustentável. Não é mais um espasmo."

O ministro também destacou a solidez das contas externas, caracterizada pelo superávit comercial superior a US$ 40 bilhões por ano e pelas reservas internacionais de US$ 163 bilhões. Desse modo, o país está bem menos vulnerável à piora do cenário externo. Segundo ele, mesmo se houver uma desaceleração mais acentuada da economia global, o Brasil deve deixar de crescer apenas 0,1 a 0,3 ponto percentual em 2008. "Em vez de 5%, o país cresceria 4,7%, 4,8%", afirmou ele. Mantega disse ainda que o investimento no aumento da capacidade produtiva avança a um ritmo duas vezes superior ao do PIB, o que seria uma garantia de que não haverá desequilíbrios entre oferta e demanda. Mantega disse que o país "não está no Paraíso", mas se queixou do que avalia como uma resistência dos analistas brasileiros em aceitar as melhoras do país. Segundo o ministro, os avanços do Brasil têm sido mais reconhecidos no exterior. Deu como exemplos a revista "The Economist" e o Fundo Monetário Internacional (FMI).

Nakano, diretor da Escola de Economia de São Paulo (EESP) da FGV, fez uma avaliação bem menos positiva. Ele acha possível que o país cresça mais "dois ou três anos" a um ritmo razoável, devido ao colchão de reservas e ao superávit nas contas externas, mas tem dúvidas quanto à sustentabilidade do atual ciclo de expansão. Para ele, a taxa de investimento como proporção do PIB, que deve terminar o ano na casa de 17,5%, é muito baixa para o Brasil avançar a 5% ao ano por períodos prolongados. A carga tributária, superior a 34% do PIB, também é um obstáculo.

Nakano reiterou suas críticas à combinação de juros elevados e câmbio valorizado. Segundo ele, países que cresceram por décadas a taxas expressivas mantiveram o câmbio desvalorizado, para estimular as exportações de manufaturados. Para ele, o país deveria mudar seu mix de política macroeconômica, passando a usar o câmbio - num nível desvalorizado e mais estável - para controlar a inflação e estimular o crescimento das exportações, enquanto os juros serviriam para equilibrar o fluxo de capitais. Para impedir que a desvalorização do câmbio gere inflação, seria necessário também forte ajuste fiscal, para diminuir a demanda por bens e serviços não-comercializáveis no exterior ("non tradables", em economês).

Eliana Cardoso discordou da proposta de Nakano, dizendo que a política monetária é o instrumento mais adequado para controlar a inflação. O câmbio flutuante tem a vantagem, segundo ela, de absorver choques e dar liberdade ao manejo das taxas de juros. Ela lembrou que países que tiveram longos períodos de expansão também tinham como característica importante uma política fiscal austera.

Mendonça de Barros disse que a economia brasileira, de fato, passou por mudanças estruturais significativas nos últimos anos, devido à forte mudança nas contas externas, que reduziu a volatilidade do câmbio, abrindo espaço para a queda dos juros. A questão, para ele, é que essa virada no balanço de pagamentos se deveu basicamente ao cenário externo. Com o forte crescimento da economia global, melhoraram significativamente os preços das exportações brasileiras, o que possibilitou a mudança no balanço de pagamentos do país, análise compartilhada por Eliana. O mérito do governo na melhora das contas externas seria pequeno.

Mendonça de Barros criticou o forte crescimento dos gastos públicos, superior a 10% ao ano. Esse aumento das despesas, segundo ele, é preocupante num momento em que outros componentes da demanda, como o investimento e o consumo das famílias, avançam a um ritmo forte. Há o risco de um aumento dos preços dos "non tradables", que não podem ser atendidos por importações, advertiu.

O secretário de Acompanhamento Econômico da Fazenda, Nelson Barbosa, rechaçou a idéia de que haja pressões inflacionárias preocupantes. Segundo ele, "é necessário diferenciar o que é elevação temporária de preços do que é aumento permanente da inflação". Barbosa disse que boa parte das altas dos índices de preços se deve ao choque de alimentos, decorrente de fatores internacionais e da entressafra. A alta dos serviços pessoais seria uma questão "mais estrutural ligada ao modelo de desenvolvimento do país". Mais emprego e mais renda levam a um aumento relativo dos preços de serviços em relação a outros bens, disse ele. "É uma mudança estrutural de preços, que gera um aumento temporário de inflação", afirmou Barbosa, que também chamou a atenção para o fato de o investimento crescer acima do PIB.

Ele também aproveitou para defender a iniciativa do governo de fixar a meta de inflação de 2009 em 4,5%, o mesmo número que vale para este ano e para o próximo. "Os analistas que diziam que reduzir a meta não teria custo adicional são os mesmos que dizem que a inflação está ali na esquina, esperando para nos pegar. Nós permanecemos calmos em relação à inflação, mas atentos. No passado, ela não era motivo de euforia e atualmente não é motivo de desespero."


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