Redes sociais, as estrelas da nova publicidade
Os desafios da publicidade diante das aceleradas transformações das mídias atuais mobilizaram pelo menos uma centena da nova geração de publicitários brasileiros e estrangeiros, nos dias 20 e 21 de outubro, em São Paulo, para debater as tendências da atividade. Durante os dois dias, CEOs, sócios-fundadores de agências e criativos discutiram temas como transmidia e storytelling, redes sociais, mobile marketing, marketing de causa, movimento cultural de marca, entre outros, regados por cases de sucesso de suas próprias agências.
Influenciados pelas idéias do pesquisador Henry Jenkins, fundador e diretor do Programa de Estudos de Mídia Comparada do MIT, registradas em seu livro Convergence Culture: Where Old and New Media Collide, a nova safra de publicitários busca formas de transmitir a mensagem de seus clientes centradas no que chamam de “storytelling” (contar histórias), que ganham formatos múltiplos, ou os formatos “transmidia”.
As atuais tendências surgem no momento em que a propaganda tradicional vem enfrentando dificuldades cada vez maiores para alcançar os resultados esperados pelos seus clientes, com a popularização de novas plataformas de comunicação, como destacou Alexandre Peralta, fundador da Peralta-StrawberryFrog, agencia de movimentos culturais associada à StrawberryFrog, com escritórios em Amsterdã, (HOL), Nova Iorque (EUA) e Mumbai (Índia). “Não se consegue mais o mesmo resultado fazendo a mesma coisa”, diz ele.
As soluções tem se concentrado em dar uma atenção mais qualificada sobre o consumidor. Os profissionais da propaganda começaram a “mapear melhor a a cultura do consumidor”, como explica o presidente da StrawberryFrog. Nesse “mapeamento”, a agência seleciona um “elo de conexão” com a cultura da marca e investe nele, para transformá-lo em um “movimento cultural, uma onda que vai empurrar a marca junto com ela”.
Embora com diferentes abordagens, as novas tendências se mantêm focadas também no fenômeno da interatividade. As “storytelling” tomaram o lugar dos tradicionais filmes de 30 segundos, ficaram mais longos e foram para o You Tube, colocando no centro de grandes campanhas histórias populares, simples, criativas e bem humoradas, inspiradas no cotidiano das pessoas, muitas vezes com a participação do próprio consumidor.
Os temas da nova propaganda também são em tudo parecidos com o que circula na rede, imitando inclusive a produção artesanal. Câmeras colocadas como webcam, mostram pessoas falando de si, espontaneamente, fazendo seus próprios shows, ou câmeras escondidas, como nas pegadinhas de TV e nos realities shows, tentando capturar cenas familiares ao consumidor.
Novos tempos levam empresas a reposicionar marcas
Como pano de fundo de toda a transformação que atinge a comunicação publicitária, sobressai a tendência global de revalorização das marcas. Além de oferecer os seus produtos, as empresas precisam agora sair das sombras e mostrar que estão interessadas no seu consumidor e em suas necessidades, inclusive nas suas opiniões, preferências culturais e até nas causas que ele abraça.
A comunicação de mão dupla, além de levar a mensagem ao consumidor, permite também que ele entre nas empresas, que, por sua vez, precisam estar de portas abertas e preparadas para receber a visita. O fenômeno faz crescer a procura por agências de branding, que se especializaram em procurar o “elo” cultural mais adequado entre a marca e o mercado.
Para o gerente das marcas Bubbaloo e Chiclets, da Cadbury/Adms, Gustavo Mesquita, o objetivo de sua empresa é que o consumidor seja um fã da marca, um “consumer fun”, tal como um torcedor de um time de futebol. Foi com base nesse conceito, que a empresa lançou recentemente, em conjunto com a Nokia, um aparelho de celular dirigido para pré-adolescentes, que consomem sua goma de mascar. O objetivo, segundo Mesquita, é falar direto a esse consumidor, que tem como traço marcante de seu perfil estar permanentemente conectado.
Nessa busca pelo reposicionamento da marca, muitas empresas têm procurado também se alinhar às novas exigências da sociedade em relação aos impactos provocados pelo produto sobre o meio ambiente, em toda a sua cadeia de valor. Apesar disso, o tema não teve o espaço que merece, nos debates realizados no encontro, em São Paulo, a não ser pela apresentação de dois cases.
Mike Geiger, criativo da Goodby Silverstein and Partners, de São Francisco, apresentou a campanha feita pela agência para a Haggen Dazs, nos EUA, que alavancou um movimento em favor da preservação das abelhas melíferas, atualmente em risco de extinção e diversos países. Mas, de acordo com o próprio diretor de criação da Goodby, a empresa vinha atravessando um período de crise e precisava retomar suas vendas. A proposta de abraçar uma causa ambiental partiu da agência, numa tentativa de obter grandes resultados com baixo orçamento. Outro case apresentado por Geiger, que é especialista em marketing de causa, foi patrocinado pelo músico afro-americano Kenna, pela preservação da água potável no mundo.
É consenso, entre eles, que uma abordagem superficial do tema pode ser um risco muito grande. “Muitas marcas começaram a falar do assunto mas não a praticar, e é preciso lembrar que paralelamente há um movimento do consumidor exigindo a transparência das empresas. Para que a publicidade toque nesse assunto, a marca precisa ter lastro. É impossível hoje esconder uma verdade, com o advento da internet, porque o assunto se alastra”, explica Alexandre Peralta, que é responsável pelas campanhas de diversos produtos da Natura, uma das pioneiras em ações de responsabilidade socioambiental no Brasil.
Ivan Askwith, diretor da Big Spaceship, de Nova Iorque, acredita que a publicidade tem um papel importante no desenvolvimento de uma economia verde. “Ela pode ajudar as pessoas a entenderem cada vez mais o que está acontecendo, é uma ótima forma de divulgação dessas questões”, diz ele. Mas observa também que o mais importante é que a empresa seja realmente sustentável. “A prática é mais importante a mensagem, porque é isso que realmente vai mudar as coisas”, ressalta.
Engin Celikbas, sócio-diretor da holandesa Kassels Kramer, diz que sua agência também se preocupa em avaliar os valores de seus clientes e já recusou diversos trabalhos por causa disso, entre eles, da Shell, de alguns laboratórios e de empresas de cigarro, mas ainda assim, acha que a maior responsabilidade está nas mãos de seus clientes, que estão sendo diretamente pressionados pelos consumidores.
José Felipe Torres, presidente da Bloom Consulting, de Madri, lembra que já existem algumas agências que se especializaram em projetos de comunicação voltados para as questões de sustentabildiade e, de um modo geral, a maioria está atenta para a questão do greenwash, por exemplo. Ressalta que o nível de consciência evoluiu bastante e cresce cada vez mais. “Eu sei de muitas agências que se negaram trabalhar com clientes que não eram eticamente responsáveis, ou pelo menos não estavam tentando, o que também é importante”, diz ele.
Para José Eduardo MacFarland, diretor da rede de relacionamento global Good People Share, realizadora do encontro, “a publicidade funciona como um porta-voz das empresas, que hoje estão mudando a sua forma de pensar, sua forma de construir o produto, portanto, a agência automaticamente levará uma mensagem nova”. Mas ressalta que algumas já perceberam esse movimento no mundo empresarial e já se anteciparam com forma de atrair mais clientes.
Ainda é fraco o debate sobre sustentabilidade
Mas o principal motor de todas essas transformações, como observa MacFaland, ainda são as vantagens econômicas, que começam a se tornar importantes como fator de competitividade e, cada vez mais, como nicho de negócios. Segundo ele, “muitas agências já estão conversando com seus clientes sobre sustentabilidade o tempo todo, no desenvolvimento qualquer projeto, tal o nível de importância da questão alcançou para essas empresas”.
Uma pesquisa feita nos sites de entidades representativas do setor revela que o tema ainda não é muito debatido pelos profissionais da publicidade, apesar de o Código de Autorregulamentação Publicitária, editado pelo Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), prever, em seu artigo 36, que os anúncios que direta ou indiretamente estimulem a poluição do ar, das águas, das matas e dos demais recursos naturais devem “vigorosamente combatidos”.
O Código, que é bem atualizado, inclusive em relação a anúncios veiculados na internet, ainda não inclui, por exemplo, recomendações para o esclarecimento dos impactos ambientais de produtos ou para o descarte adequado de resíduos, nem sugere a informação de níveis de emissões, certificados de origem de recursos naturais utilizados, entre outros, que ajudariam na conscientização do consumidor, como acontece com produtos regulamentados em lei, como bebidas, cigarros e remédios.
A iniciativa mais forte nessa área partiu da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap), que incluiu no IV Congresso Brasileiro de Publicidade, realizado em julho de 2008, uma comissão para debater a responsabilidade socioambiental da propaganda. O documento final produzido pela comissão apresentou uma série de recomendações às agências, entre elas, a criação de um grupo de trabalho para a elaboração de um pacto de responsabilidade socioambiental da indústria da propaganda.
Cases
Haagen Dazs
http://www.youtube.com/watch?v=OPpLUQEObhA
http://www.youtube.com/watch?v=445m_ohiWCM
ideaWins – Microsoft
http://www.youtube.com/watch?v=62O6TzWWKvw
Kenna e o Kilimanjaro
http://www.youtube.com/watch?v=pWN1PZjUv4M
Mais Cases
http://www.nbc09.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=76&phpMyAdmin=VQhXLI4A6yYjmpSjmfZ0RJ9mLF8
Cultura da Convergência, Henry Jenkins
http://www.livrariacultura.com.br/scripts/cultura/resenha/resenha.asp?nitem=2618680&sid=896219637117261612474653&k5=3998E5B9&uid=
Palestrantes
http://www.nbc09.com.br/index.php?option=com_content&view=section&layout=blog&id=6&Itemid=54
Congresso da Abap
http://www.congressodepublicidade.com.br/abap/techEngine?sid=abap&command=mainSite
Celso Dobes Bacarji
Envolverde, 26/10/09
© Copyleft - É livre a reprodução exclusivamente para fins não comerciais, desde que o autor e a fonte sejam citados e esta nota seja incluída.
Nenhum comentário:
Postar um comentário